Ser

De Dicionrio de Potica e Pensamento

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== 1 ==
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:"Ser: viver, [[surgimento|surgir]], [[permanência|permanecer]]. Estes sentidos correspondem às três raízes que aparecem no [[verbo]] ser" (1).  
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: "O que impressiona, em primeiro lugar, em [[relação]] ao [[verbo]] [[ser]] é a variedade dos [[étimos]] das [[formas]] de seus [[tempos]] [[verbais]]. Mas toda essa gama de variações pode ser determinada por três [[diferentes]] [[raízes]] [[etimológicas]]" (1).
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:Referência:
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: Referência:
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:(1) HEIDEGGER, Martin. ''Introdução à Metafísica''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1969, pp. 97-8.
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Amar e ser". In:------. ''Arte: o humano e o destino''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 48.
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== 2 ==
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: "No [[infinitivo]], em [[português]], o [[verbo]] ''[[ser]]'' não se originou do [[verbo]] ''esse'' / [[ser]], em [[latim]], mas do [[verbo]] latino ''sedére'': sentar-se; morar; ficar concentrado, recolhido, em repouso. Esta [[proveniência]] do [[verbo]] [[ser]], em [[português]], é [[enigmática]] e faz [[pensar]]" (1).
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:'''Ver também:'''
 
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:*[[Acontecer]]
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: Referência:
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== 2 ==
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Amar e ser". In:------. ''Arte: o humano e o destino''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 49.
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:"Revela-se que o Ser é o encanto das Vozes (isto é, as [[Musas]]) e as Musas não são outra coisa que a múltipla Presença do [[Divino]]" (1). "Relação entre linguagem e ser, ou seja: entre o Canto em seu encanto e a aparição do que se canta, e consequentemente entre a Revelação (''alétheia'') e o Esquecimento (''lesmosýne''/''léthe'')" (2). "A rigor, não há na Teogonia uma relação entre linguagem e ser, mas uma imanência recíproca entre eles" (3).  
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: Como já disse, o [[verbo]] [[ser]], em [[português]], tem mais de uma [[etimologia]], dependendo do [[tempo]] [[verbal]]. Eis a [[etimologia]] do pretérito perfeito: ''fui''. É a raiz indo-europeia:  ''bhü'' ou ''bheu''. "A ela pertence o [[verbo]] [[grego]] ''phyo'': [[surgir]], [[vigorar]], imperar, chegar por si mesmo a pôr-se e permanecer nessa posição” (1). Do mesmo [[radical]] ''ph'' formou-se em [[grego]] ''[[phós]]''. Portanto, todo ''phyein'', de onde se forma ''[[phýsis]]'', seria o [[nascer]] que, por [[vigorar]] e [[brilhar]] na [[luz]], nasce, cresce, aparece, é.
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:Referências:
 
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:(1) TORRANO, JAA. "Introdução". In: ''Hesíodo. Teogonia''. Trad. JAA Torrano. São Paulo: Iluminuras, 1992, p. 28.
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: - [[Manuel Antônio de Castro]]
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:(2) Idem, p. 29.
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:(3) Idem, p. 29.
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: (1) HEIDEGGER, Martin. ''Introdução à metafísica''. Trad. Emmanuel Carneiro Leão. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1969, p. 98.
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:'''Ver também:'''
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== 4 ==
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: "[[Ser]]: [[viver]], [[surgimento|surgir]], [[permanência|permanecer]]. Estes [[sentidos]] correspondem às três raízes que aparecem no [[verbo]] [[ser]]" (1).
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:*[[Música]]
 
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:*[[Mito]]
 
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:*[[Êxtase]]
 
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== 3 ==
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: Referência:
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:Não basta [[ter]] conhecimentos, é preciso ser o que se conhece. Há aqui uma [[tensão]] entre ser e ter. Emmanuel Carneiro Leão trata da questão do ter no ensaio "Leitura órfica de uma sentença grega" (1).  Trata-se do "ter [[linguagem]]". Em que sentido se emprega o "ter"? Diz Márcia Schuback: "'Ser' homem para o grego é 'ter' ''lógos'' (...) Ser homem para o grego significa, sobretudo, estar na disposição do ''lógos''. De modo algum, o homem 'tem' ''lógos'' como uma propriedade dada genética, natural. Tem o ''lógos'' enquanto uma disposição para empenhar-se pelo ''lógos''" (2).
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 +
: (1) HEIDEGGER, Martin. ''Introdução à Metafísica''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1969, pp. 97-8.
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:- [[Manuel Antônio de Castro]]
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: '''Ver também:'''
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: *[[Acontecer]]
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:Referências:
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== 5 ==
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: Ao [[enigma]] que é o [[ser]] podemos chegar por quatro [[vias]], todas integradas na [[questão]] da [[liminaridade]]: a) como [[horizonte]], quando no visível o [[ser humano]] já desde [[sempre]] se lança para o [[invisível]]. Mas esse [[movimento]] de [[ver]] o [[não-visível]] do [[visível]], [[sempre]] se dá num [[movimento]] incessante inerente a toda [[questão]], articulando tanto mais um [[ver]] quanto mais se lança no [[não-ver]]. O [[ser humano]] é convocado pela [[questão]] do [[não-ver]]; b) Como [[saber]], pois quando pergunta, pergunta porque não sabe e quer [[saber]] o [[não-saber]], mas, ao mesmo tempo, só pode [[perguntar]] porque já sabe o [[não-saber]]. E, por isso, o [[ser humano]] é convocado pela [[questão]] do [[não-saber]]; c) Como [[querer]], quando deseja-se isto e aquilo. Mas isto e aquilo são uma posse e não o [[poder]] da posse das [[possibilidades]]. Por isso, isto e aquilo não satisfazem o [[desejo]]. O [[desejo]] não é disto ou aquilo enquanto posse disto ou daquilo. O [[desejo]] é [[sempre]] [[poder]] a posse de todas as [[possibilidades]]. O [[ser humano]] é convocado pela [[questão]] do [[não-querer]]. Só esta posse faz o [[ser humano]] [[feliz]], ou seja, responde e corresponde ao seu [[querer]] / [[desejar]]; d) Como [[ser]], quando questiona "o que é isto?", "o que é aquilo?". Mas ao [[perguntar]] por isto e aquilo, no fundo, não pergunta por isto e aquilo enquanto [[ente]], mas [[sempre]] e já a partir do [[ser]], senão nem poderia [[perguntar]]. Contudo toda [[questão]] pergunta pelo o [[ser]] na [[dimensão]] [[verbo|verbal]] do [[ente]] enquanto não-é: o que é, o que foi, o que será? Por isso, a [[resposta]] da [[questão]] será sempre no plano do [[ente]], recolocando a [[questão]] do [[não-ser]]. O [[ser humano]], contudo, é sempre convocado pela [[questão]] do [[ser]], na [[dimensão]] do [[ver]], do [[saber]], do [[querer]] e do [[não-ser]]. Esse é o [[enigma]] do [[ser humano]] que [[sempre]] se dimensiona na [[questão]] porque nela ele se mede como [[ente]] na medida do [[ser]] por [[não-ser]]. A [[questão]] antes de ser perguntada já nos ultrapassa. Ela é a desmedida de toda [[medida]] da [[pergunta]] por, sobre e com.
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:(1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. ''Aprendendo a pensar II''. Petrópolis: Vozes, 1992.
 
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:(2) SCHUBACK, Márcia Sá Cavalcante. "As cordas serenas de Ulisses". In: ''Ensaios de filosofia''. Petrópolis: Vozes, 1999, p. 174.
 
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== 4 ==
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: - [[Manuel Antônio de Castro]]
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:Ao [[enigma]] que é o ser podemos chegar por quatro vias, todas integradas na questão da [[liminaridade]]: a) como horizonte, quando no visível o ser humano já desde sempre se lança para o [[invisível]]. Mas esse movimento de ver o não-visível do visível, sempre se dá num movimento incessante inerente a toda [[questão]], articulando tanto mais um ver quanto mais se lança no não-ver. O ser humano é convocado pela questão do não-ver; b) Como saber, pois quando pergunta, pergunta porque não sabe e quer saber o não-saber, mas, ao mesmo tempo, só pode perguntar porque já sabe o [[não-saber]]. E, por isso, o ser humano é convocado pela questão do não-saber; c) Como querer, quando deseja-se isto e aquilo. Mas isto e aquilo são uma posse e não o [[poder]] da posse das possibilidades. Por isso, isto e aquilo não satisfazem o desejo. O [[desejo]] não é disto ou aquilo enquanto posse disto ou daquilo. O desejo é sempre poder a posse de todas as possibilidades. O ser humano é convocado pela questão do não-querer. Só esta posse faz o ser humano feliz, ou seja, responde e corresponde ao seu querer/desejar; d) Como ser, quando questiona "o que é isto?", "o que é aquilo?". Mas ao perguntar por isto e aquilo, no fundo, não pergunta por isto e aquilo enquanto ente, mas sempre e já a partir do ser, senão nem poderia perguntar. Contudo toda questão pergunta pelo o ser na dimensão [[verbo|verbal]] do ente enquanto não-é: o que é, o que foi, o que será? Por isso, a resposta da questão será sempre no plano do ente, recolocando a questão do não-ser. O ser humano, contudo, é sempre convocado pela questão do ser, na dimensão do ver, do saber, do querer e do não-ser. Esse é o enigma do ser humano que sempre se dimensiona na questão porque nela ele se mede como ente na medida do ser por não-ser. A questão antes de ser perguntada já nos ultrapassa. Ela é a desmedida de toda medida da pergunta por, sobre e com.
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-
:- [[Manuel Antônio de Castro]]
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: '''Ver também:'''
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: *[[Pensamento]]
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: *[[Mistério]]
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:'''Ver também:'''
 
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:*[[Pensamento]]
 
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:*[[Mistério]]
 
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== 5 ==
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== 6 ==
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:"Ser não pode ser. Se fosse (ser) não mais [[permanência|permaneceria]] ser, mas seria [[ente]]" (1).
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: "[[Tudo]] [[é]] e [[não é]]" (1). Esta afirmação do [[pensador]] Rosa pode ser desdobrada em: Tudo é. [[Tudo]] [[não é]]. Isso que parece tão [[simples]] nos lança no [[mistério]] do ser. Como o ser que é e sem ser não há é, pode ser e não ser? Isso é o que não cabe em nenhuma [[lógica]] e em nenhuma [[identidade]] lógica, metafísica. O [[ente]] foi considerado ao longo do percurso metafísico como ''o que é'', ''o como é'', o ''de onde '' e o ''para que é''. Posteriormente na [[Modernidade]] se acrescentou à reflexão sobre o ente um desdobramento reflexivo, especular, quando se investiga em ''o como é'', ''o como se conhece''. Este pode se encaminhado pela razão subjetiva ou pelo ''pensar'', segundo a sentença de Parmênides, quando diz que pensar e ser são o mesmo. Então a questão do ser se desloca, sem se separar, para a questão da ''[[unidade]]'' de [[pensar]] e [[ser]]. O que sempre ficou impensado em todo esse percurso: o "[[Tudo]] [[não é]]" de que nos fala Rosa. É este ''[[Tudo]] [[não é]]'' o a-ser-pensado. Isto coloca a [[questão]] da [[negatividade]] e [[ser]] de que trata [[Heidegger]] já para o final de ''Carta sobre o humanismo''.
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: - [[Manuel Antônio de Castro]]
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: - Referência:
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: (1) ROSA, João Guimarães. ''Grande sertão: veredas''. Rio de Janeiro: José Olympio, 1968, p. 12.
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== 7 ==
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:"Ser e [[pensar]], em Parmênides, se identificam como condições de possibilidade do existir na mesmidade. Ser e pensar unem e trazem consigo o mundo e a ''phýsis'' como possibilidade de constituição de uma espácio-temporalidade que se estrutura para além do domínio das realizações, mas também o mundo e a ''phýsis'' como espácio-temporalidade de constituição da [[realidade]] do ser como [[desvelamento]]" (1).
:Referência:
:Referência:
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:(1) HEIDEGGER, Martin. In: ''A tese de Kant sobre o ser''. São Paulo: Duas Cidades, 1970, p. 95.
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:(1) JARDIM, Antonio. ''Música: vigência do pensar poético''. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 62.
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== 8 ==
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: "O [[ser]] não é 'algo' que se acha escondido num [[lugar]] supra-sensível ou no alto de uma [[especulação]] distante e elevada. Como nos mostra a todo [[instante]] a palavrinha '[[é]]', [[ser]] 'é' o mais próximo da [[proximidade]]" (1).
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:'''Ver também:'''
 
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:*[[Presença]]
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: Referência:
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== 6 ==
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: (1) HEIDEGGER, Martin. ''Heráclito''. Trad. Márcia Sá Cavalcante Schuback. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 1998, p.115.
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:"Ser e [[pensar]] unem e trazem consigo o mundo e a ''phýsis'' como possibilidade de constituição de uma espácio-temporalidade que se estrutura para além do domínio das realizações, mas também o mundo e a ''phýsis'' como espácio-temporalidade de constituição da realidade do ser como [[desvelamento]]".
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== 9 ==
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: "Tenho [[medo]] de [[dizer]] quem [[sou]]: no momento em que tento [[falar]], não exprimo o que sinto e o que sinto se transforma, lentamente, no que [[eu]] digo" (1).
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:Referência:
 
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:(1) JARDIM, Antonio. ''Música: vigência do pensar poético''. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 62.
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: Referência:  
 +
: (1) LISPECTOR, Clarice. Texto publicado numa montagem artística de fotos com textos de Clarice, sem indicação da fonte.
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:'''Ver também:'''
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== 10 ==
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:"O que verdadeiramente somos é aquilo que o impossível cria em nós" (1).
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:*[[Tempo]]
 
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:*[[Memória]]
 
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:Referência:
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== 7 ==
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:(1) LISPECTOR, Clarice. Texto publicado numa montagem artística de fotos com textos de Clarice, sem indicação da fonte.
-
:"Ser e [[pensar]], em Parmênides, se identificam como condições de possibilidade do existir na mesmidade. Ser e pensar unem e trazem consigo o mundo e a ''phýsis'' como possibilidade de constituição de uma espácio-temporalidade que se estrutura para além do domínio das realizações, mas também o mundo e a ''phýsis'' como espácio-temporalidade de constituição da [[realidade]] do ser como [[desvelamento]]" (1).
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== 11 ==
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: Sabemos muito bem que não basta [[viver]] como não basta [[saber]]. É [[necessário]] [[ser]] o que se sabe. Não basta [[viver]] [[sentindo]], é [[necessário]] [[ser]] o que se sente. Ser sabendo e sentindo é deixar eclodir o [[sentido]] enquanto [[vigorar]] do ser. Sem sentido o viver e sentir perdem o vigorar do viver sendo. Então a [[questão]] que nos orienta e origina torna-se a questão do [[sentido do ser]] vivendo e do viver sendo sentido. O que nos faz [[falta]] é o [[sentido do ser]].
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:Referência:
 
-
:(1) JARDIM, Antonio. ''Música: vigência do pensar poético''. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 62.
+
: - [[Manuel Antônio de Castro]]
-
== 8 ==
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== 12 ==
-
:"O ser não é 'algo' que se acha escondido num lugar supra-sensível ou no alto de uma especulação distante e elevada. Como nos mostra a todo instante a palavrinha 'é', ser 'é' o mais próximo da [[proximidade]]" (1).
+
: Por já vigorarmos, por tudo já vigorar no ser, ele não é [[fundamento]] de [[nada]], porque ele simplesmente vigora, independentemente de minhas nomeações e reflexões. Ele está tão [[próximo]], tão próximo que até já desde sempre o somos e nele somos o que somos. Mas nossa [[procura]] do [[saber]] do ser acaba se desviando para o saber imperfeito e limitado e não nos abrimos para o seu [[sentido]] que é o máximo de saber, porque o seu sentido é o [[silêncio]] em que ele vigora e se dá a [[ver]] e a saber (que são o mesmo). O sentido, o silêncio, o [[vazio]] são o mais [[presente]] do presente, são sempre o já vigorando e sem o qual nada se dá a saber e a ver. Vigorar diz fundar, dar-se e retrair-se, desvelar-se e velar-se, mas jamais distanciar-se num fundo perdido e inacessível. Ser é mistério porque por mais que seja tudo dele "nada" nos advém. É esse [[mistério]] que nos angustia e dá [[plenitude]]. Vivemos nesse entre.
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: - [[Manuel Antônio de Castro]]
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== 13 ==
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: "Assim devemos dizer que o [[horizonte]] de [[ser]], como condição fundamental de todo [[perguntar]] deve constituir um [[horizonte]] sabido-não-sabido por mim.  Assim [[perguntar]] pelo [[ser]] eu só poderei se o [[ser]] significar sempre para mim um não-sabido além de ser algo de sabido, e assim sucede que meu [[não-saber]] do [[ser]] nunca seja totalmente redutível a um [[saber]], pois então se dissolveria a [[possibilidade]] de [[perguntar]] pelo [[ser]] e, igualmente, a [[possibilidade]] de qualquer outra [[pergunta]].  Assim o [[ser]] - como [[horizonte]] fundamental e [[original]], sabido e não sabido ao mesmo tempo - deve constituir para o [[homem]] um [[mistério]] original, fundamental, e como tal, inesgotável" (1).
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: Referência:
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: (1) HUMMES, o.f.m., Frei Cláudio (Hoje Cardial Hummes). '''Metafísica'''. Mimeo, p. 37. Apostila distribuída no Curso de Filosofia, em Daltro Filho (hoje Imigrantes), RS, 1963, p.36.
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== 14 ==
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:"É que o ser não somente não pode ser definido, como também nunca se deixa determinar em seu [[sentido]] por outra [[coisa]] nem como outra coisa. O ser só pode ser determinado a partir de seu sentido como ele memso. Também não pode ser comparado com algo que tivesse condições de determiná-lo positivamente em seu sentido. O ser é algo derradeiro e último que subsiste por seu sentido, é algo autônomo e independente que se dá em seu sentido" (1).
:Referência:
:Referência:
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:(1) HEIDEGGER, Martin. ''Heráclito''. Trad. Márcia Sá Cavalcante Schuback. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 1998, p.115.
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:(1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. Posfácio. In: HEIDEGGER, Martin. ''Ser e tempo''. Trad. Márcia Sá Cavalcante Schuback. 2. e. Petrópolis: Vozes, 2006, p. 551.
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:"Ao que de ordinário nos rodeia, os [[objetos]] particulares (=os "objetos"), chamamos também de [[ente]], o que [[é]]. Porém, este "é", ao nível do ente, não é, por sua vez, algo de ente, senão o que deixa primeiro a todo ente ser um Ente e por isso o rodeia de [[cuidados]] e o protege. Chamamo-lo [[Ser]]" (1).
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: Referência:
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: (1) HEIDEGGER, Martin. ''La pobreza''. Buenos Aires: Amorrutu, 2006, p. 103.
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== 16  ==
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: "Mas a [[palavra]] mais importante da [[língua]] é uma única letra: [[é]]. É. Estou no seu âmago. Ainda estou. Estou no centro vivo e mole. Ainda. Tremeluz e é elástico. Como o andar de uma negra pantera lustrosa que vi e que andava macio, lento e perigoso. Mas enjaulada não - porque não quero. Quanto ao [[imprevisível]] - a próxima frase me é imprevisível. No âmago onde estou, no âmago do É, não faço perguntas. Porque quando é - é. Sou limitada apenas pela minha [[identidade]]. Eu, entidade elástica e separada de outros [[corpos]]" (1).
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: Referência:
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: (1) LISPECTOR, Clarice. ''Água viva''. Rio de Janeiro: Artenova, 1973, p. 32.
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== 17 ==
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: [[Ser]] é [[agir]] e [[agir]] se manifestando é o advir do [[sentido]] e da [[verdade]], tanto ''do que é'', quanto ''do como se conhece'', isto é, transforma no [[ser humano]] a [[vivência]] em [[experienciação]], daí no [[ser humano]] não haver apenas [[vida]], mas o [[existir]].
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: - [[Manuel Antônio de Castro]]
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== 18 ==
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: "Que o que gasta, vai gastando o [[diabo]] de dentro da gente, aos pouquinhos, é o razoável sofrer. E a alegria de [[amor]] - compadre meu Quelemém  diz. Família. Deveras? [[É]], e [[não é]]. O senhor ache e não ache. [[Tudo]] [[é]] e [[não é]]..." (1).
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: Referência:
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 +
: (1) ROSA, João Guimarães. ''Grande sertão: veredas''. Rio de Janeiro: José Olympio, 1968, p. 12.
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== 19 ==
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: O ser é a [[unidade]] de [[tudo]] que é, o [[silêncio]] fundador do [[sentido]]. Toda fala é fala do [[sentido]], do ser. Por isso, Rosa diz: “Tudo é e não é.” (1), porque o ser é ser do [[vir-a-ser]] ou  [[transformar]] e do [[permanecer]], que, em grego, recebeu o nome ''arche'', traduzido como [[princípio]]. [[Princípio]] é o que originando tudo jamais se esgota e, portanto, é o que, no incessante fluxo das [[mudanças]], permanece. Se muda é porque ainda não é. O é do que não é, [[sendo]], é o que permanece.
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: - [[Manuel Antônio de Castro]]
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: Referência:
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: (1) ROSA, João Guimarães. '''Grande sertão: veredas'''. Rio de Janeiro: José Olympio, 1968, p. 12.
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== 20 ==
 +
: No [[poético]], as [[línguas]] são o [[rito]] da [[Linguagem]]. O [[mito]] narrado não é o [[mito]], mas o [[rito]] e a [[língua]] da [[Linguagem]]. Por isso o [[poético]], toda [[arte]], tem [[origem]] mítica. E tanto o [[mito]] como a [[arte]] radicam no [[sagrado]]. Martin Heidegger afirma: "O [[pensador]] diz o [[ser]], o [[poeta]] nomeia o [[sagrado]]" (1) (2).
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 +
: (1) HEIDEGGER, Martin. "Que é metafísica? - Posfácio (1943)". In: ''Heidegger - Os Pensadores''. São Paulo: Abril Cultural, 1979, p. 51.
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 +
: (2) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ulisses e a Escuta do  canto das Sereias". In: -----. ''Arte: o humano e o destino''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 155.
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== 21 ==
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: Distinguir ser e [[ente]] não é fácil, tratando-se do [[pensamento]] grego, é sobretudo uma [[questão]] de [[pensamento]] e [[tradução]]. Vejamos. Em ''Carta sobre o humanismo'', à p. 24 diz Heidegger: "Por isso, em sentido próprio, só pode ser consumado o que já ''é''. Ora, o que ''é'', antes de tudo, é o ''Ser'' ". Porém, na mesma [[obra]] à p. 56 esclarece: "O ''gibt'' (dá) evoca a [[Essência]] do Ser, que se doa, concedendo a sua [[Verdade]]. O dar-se a si mesmo com a [[abertura]] à [[abertura]] é o próprio Ser. Ao mesmo tempo, emprega-se o ''es gibt'' (se dá), para evitar, por enquanto, a locução: ''o Ser é''; pois o ''é'' se diz comumente daquilo que ''é''. E a isso chamamos [[ente]]" (1).
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: Referência:
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: (1) HEIDEGGER, Martin. '''Sobre o humanismo'''. Trad. Emmanuel Carneiro Leão. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 56.
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 +
== 22 ==
 +
: "Por isso, para Píndaro o [[drama]] mais arcaico da humanidade está na condição [[ontológica]] de simplesmente [[ser]] e/ou [[não ser]], ao mesmo tempo, o quer dizer, que seja num perpétuo [[vir a ser]] a todo [[instante]]. A ''Quinta Ode Pítica'' nô-lo proclama num verso glorioso:
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 +
: ''Epameroi, ti de tis; ti d'ou tis;
 +
: ''sikias onar anthropos''!
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 +
: ''Efêmeros seres de um só dia, que é ser alguém?
 +
: ''Que é ser ninguém?
 +
: ''Um homem, sonho de uma sombra''! (1)
 +
 
 +
 
 +
: Referência:
 +
 
 +
: LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Édipo em Píndaro e Freud". In: ---. '''Filosofia contemporânea'''. Daimon, Teresópolis/RJ: 2013, p. 67.
 +
 
 +
== 23 ==
 +
: [[Sentença]] - '''III'''.
 +
: "... to gar [[auto]] [[noein]] estin te kai [[einai]]" (1). "...pois o [[mesmo]] é [[pensar]] e [[ser]]" (1).
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 +
 
 +
: Referência:
 +
 
 +
: (1) PARMÊNIDES. Sentença '''III''', (Trad. Sérgio Wrubleswski). In: ''Os pensadores originários'' - ''Anaximandro, Parmênides, Heráclito''. Petrópolis / RJ: Vozes, 1991, p. 44 / 45.
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 +
== 24 ==
 +
: "[[Ser]] não é um [[conceito]] [[abstrato]]: são as [[possibilidades]], enquanto [[propriedades]], que cada um de nós recebe para poder [[ser]] no [[sendo]] o [[não-ser]]" (1).
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 +
 
 +
: Referência:
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 +
: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. “A menina e a bicicleta: arte e confiabilidade”. In: ------. ''Arte: o humano e o destino''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 282.
 +
 
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== 25 ==
 +
: "[[Viver]] já estamos vivendo. [[Morrer]] já estamos morrendo sempre. [[Viver]] é [[morrer]] para que morrendo vivamos. O que isso implica? Uma [[procura]] permanente e radical: [[ser]] o que não-é, ou seja, [[ser]] [[feliz]]. Onde [[ser]] [[feliz]] é [[ser]] o [[não-ser]]. Não é apenas uma [[negatividade]] positiva, é toda a [[positividade]] do [[ser]] [[feliz]]. [[Negatividade]], fora das [[relações]] funcionais entitativas, jamais indica [[mal]], só o [[bem]] (1).
 +
 
 +
 
 +
: Referência:
 +
 
 +
: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. “O mito de Midas da morte ou do ser feliz”. In: ------. '''Arte: o humano e o destino'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 206.
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 +
== 26 ==
 +
: "Somente no [[agir]] o [[ser]] é totalmente ele [[mesmo]]. [[Ser]] é [[agir]] e vice-versa. (Não se pode jamais confundir [[agir]] com [[fazer]]. Aquele inclui este, mas este não inclui aquele)" (1).
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 +
 
 +
: Referência:
 +
 
 +
: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O ser, o agir e o humano". In: ---. '''Leitura: questões'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2015, p. 30.
 +
 
 +
== 27 ==
 +
: "Alberto Caieiro, o poeta-pensador, já o disse poeticamente:
 +
 
 +
:  '' "Mas isto (tristes de nós que trazemos a [[alma]] vestida!),''
 +
:  '' Isso exige um estudo profundo,''
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:  '' Uma ''[[aprendizagem]] de [[desaprender]]" '' . (Poema XXIV)
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:  '' "Procuro despir-me do que aprendi,:
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:  '' Procuro esquecer-me do modo de lembrar que me ensinaram,
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:  '' E raspar a tinta com que me pintaram os [[sentidos]]" '' ... (Poema XLVI) (1)
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: Isso é [[enigmático]] porque devemos [[aprender]] para [[desaprender]], [[ter]] para [[renunciar]], porque só renunciando chegamos a [[ser]] o que temos, porque só podemos [[ter]] o  que somos e só podemos [[ser]] o que temos. Portanto, não há uma incompatibilidade [[entre]] [[ter]] e [[ser]]. Entra aí uma terceira [[dimensão]] nesse [[jogo]] dialético [[entre]] [[ter]] e [[ser]], e [[ser]] e [[ter]]: o [[desprendimento]], a [[renúncia]], porque a [[renúncia]] não tira, dá. Nesse [[jogo]] [[dialético]] se torna também claro o [[jogo]] [[entre]] [[identidade]] e [[diferença]]. A [[identidade]] nos remete para o [[horizonte]] do [[fundar]], do [[ser]], do [[nada]]. Já a [[diferença]] nos mostra em que consiste o [[próprio]], (ter), que só o [[nada]], (ser), pode [[fundar]]. Enfim, toda [[aprendizagem]] é um [[desaprender]].
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: [[Manuel Antônio de Castro]].
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: Referência:
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: (1) PESSOA, Fernando. ''Alberto Caeiro''. S. Paulo: Cia. das Letras, 2004, p. 60, 84.
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== 28 ==
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: "O [[sofrimento]] e a [[alegria]], o  ser afetado, tomado por uma força, são [[relações]] com o [[ser]]. Mas no [[mundo]] do voluntarismo [[absoluto]] em que a [[técnica]] o mergulha, o [[homem]] não sente mais a [[dor]], ou a sente de modo somente passivo, e, portanto, ressentido e reativo. É principalmente em sua [[indiferença]] frente às consequências destrutivas da [[técnica]], que o "funcionário da [[técnica]]" mostra sua insensibilidade e seu extremo fechamento, pois nele, o mais [[angustiante]] é sua incapacidade de se [[angustiar]]" (1).
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: Referência:
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: (1) UNGER, Nancy Mangabeira. "Heidegger e a espera do inesperado". Rio de Janeiro: Editora Tempo Brasileiro. Revista '''Tempo Brasileiro''': '''Interdisciplinaridade dimensões poéticas''', 164, Jan.-mar. 2006, 179.
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== 29 ==
 +
: "[[Ser]] é deixar-se tomar pelo vigorar do [[silêncio]]. É tomar a [[posição]] do [[acontecer]] do [[silêncio]], isto é, a [[não-posição]], como [[fonte]] de toda e qualquer possível [[posição]]" (1).
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:  Referência:
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:  (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O mito de Cura e o ser humano". In: ---. '''Arte: o humano e o destino'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 272.
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== 30 ==
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: Não basta [[ter]] [[conhecimentos]], é preciso [[ser]] o que se conhece. Há aqui uma [[tensão]] [[entre]] [[ser]] e [[ter]]. Emmanuel Carneiro Leão trata da [[questão]] do [[ter]] no [[ensaio]] "[[Leitura]] órfica de uma [[sentença]] grega" (1).  Trata-se do "[[ter]] [[linguagem]]". Em que [[sentido]] se emprega o "[[ter]]"? Diz Márcia Schuback: "'[[Ser]]' [[homem]] para o grego é '[[ter]]' ''[[logos]]'' (...) [[Ser]] [[homem]] para o grego significa, sobretudo, [[estar]] na [[disposição]] do ''[[logos]]''. De modo algum, o [[homem]] 'tem' ''[[logos]]'' como uma [[propriedade]] dada genética, natural. Tem o ''[[logos]]'' enquanto uma [[disposição]] para empenhar-se pelo ''[[logos]]''" (2).
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: - [[Manuel Antônio de Castro]]
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: Referências:
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: (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. '''Aprendendo a pensar II'''. Petrópolis: Vozes, 1992.
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: (2) SCHUBACK, Márcia Sá Cavalcante. "As cordas serenas de Ulisses". In: '''Ensaios de filosofia'''. Petrópolis: Vozes, 1999, p. 174.
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== 31 ==
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: "[[Mistério]] vem do [[verbo]] grego ''myo''. E ''myo'' diz: trancar-se no centro, concentrar-se; diz: encerrar-se no âmago, recolher-se ao íntimo. Aqui, centro, âmago, íntimo, evocam a [[raiz]] da intensidade, o sumo da [[plenitude]]. [[Mistério]] não diz uma [[coisa]], diz um [[movimento]], o [[movimento]] de [[con-sumar]], de concentrar-se na [[origem]], de [[recolher-se]] à natividade da [[raiz]], de retornar ao sem fundo e [[fundamento]], ao a-bismo de [[ser]]. As [[palavras]], [[Deus]], [[Absoluto]], [[Transcendência]], [[Inconsciente]], [[Espírito]], [[Matéria]], [[Psique]], [[Estrutura]], [[Ser]] são outras tantas redes em cujas malhas o [[poder]] do [[saber]] [[ocidental]] na [[teologia]], na [[filosofia]], na [[ciência]], sempre de novo tentou, mas nunca conseguiu, prender e segurar a natividade do [[mistério]]" (1).
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:  Referência:
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:  (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. “Heidegger e a modernidade: a correlação de sujeito e objeto”. In: ------------.  ''Aprendendo a pensar, II''. Petrópolis / RJ: Vozes,  1992, p. 180.
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== 32 ==
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: "P - O [[vazio]] é então a mesma coisa que o [[nada]], isto é, o vigor que procuramos [[pensar]] como o outro de toda [[vigência]] e de toda [[ausência]]?
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: J - De certo... Para nós, o [[vazio]] é o [[nome]] mais elevado para se designar o que o senhor quer dizer com a [[palavra]] [[ser]]" (1).
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: Referência:
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: (1) HEIDEGGER, Martin. "De uma conversa sobre a linguagem entre um japonês e um pensador". In: ''Ensaios e conferências''. Petrópolis: Vozes, 2003, p. 87.
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== 33 ==
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: "Fala da médica:
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: "Elisabet, não creio que haja [[motivos]] para ficar no hospital. Só lhe faz mal ficar aqui... Pensa que não entendo? O inútil [[sonho]] de [[ser]], não [[parecer]], mas [[ser]]. [[Estar]] alerta em todos os [[momentos]]. A luta: o que você [[é]] com os [[outros]] e o que você [[realmente]] [[é]]. Um [[sentimento]] de vertigem... e a constante fome de finalmente [[ser]] exposta. [[Ser]] vista por dentro, cortada até mesmo eliminada. Cada tom de [[voz]], uma [[mentira]]. Cada [[gesto]], [[falso]]. Cada sorriso, uma careta... Mas pode se recusar a se mover e [[ficar]] em [[silêncio]]. Então, pelo menos, não está mentindo. Você pode se fechar, se fechar para o [[mundo]]. Então não tem que [[interpretar]] [[papéis]], fazer caretas, gestos falsos. Acreditaria que sim, mas a [[realidade]] é [[diabólica]]. Seu esconderijo não é à prova d'água. A [[vida]] engana em todos os aspectos. Você é forçada a reagir. Ninguém [[pergunta]] se é [[real]] ou não, se é sincera ou [[mentirosa]]. Isso só é importante no [[teatro]], talvez nem nele. Entendo por que não fala, por que não se movimenta. Sua [[apatia]] se tornou um [[papel]] fantástico. Entendo e admiro você. Acho que deveria [[representar]] este [[papel]] até o fim, até que não seja mais interessante. Então pode esquecer, como esquece seus [[papeis]]" (1).
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: Referência:
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: (1) BERGMAN, Ingmar. Filme ''Persona''. A médica está se dirigindo à personagem Elisabet, atriz de teatro que, de repente, fica em silêncio e se nega a falar. Não esqueçamos que [[personagem]] vem de [[Persona]].
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== 34 ==
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: "Fora da [[tradição]] [[metafísica]], a [[questão]] do [[destino]] se coloca dentro da [[questão]] [[fundamental]] da [[Totalidade]] harmônica do [[Cosmos]], do [[Ser]]. Mas o que é o [[Ser]]? Não pode ser um [[conceito]] nem [[fundamento]], mas o que vigora como [[silêncio]], [[sentido]], [[linguagem]]" (1).
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: Referência:
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ulisses e a Escuta do Canto das Sereias”. In: -----. '''Arte: o humano e o destino'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 163.
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== 35 ==
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: "A [[experiência]] do [[Ser]] do ponto de vista [[mítico]]-[[poética]] é [[diferente]] da [[experiência]] [[filosófico]]-[[metafísica]]" (1).
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: Referência:
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ulisses e a Escuta do Canto das Sereias”. In: ---. '''Arte: o humano e o destino'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 163.
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== 36 ==
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: "O que é o [[Ser]] para a [[experiência]] [[grega]], [[mítica]], [[arcaica]]? O [[Ser]] se “manifesta como [[numinoso]] e na qual [experiência grega arcaica] o [[universo]] não é senão um conjunto não-enumerável de [[teofanias]]” (Torrano, 1992: 74)(1). Tudo sendo [[teofania]][[numinosa]] é importante entender que tanto “‘faculdades mentais’” de [[Zeus]] como os [[atributos]] constitutivos da [[natureza]] mesma de [[Zeus]] [...] são [[Divindades]] com esfera de [[existência]] e de atribuições [[própria]]” (Torrano: 1992, 76). A [[experiência]] [[filosófica]] de [[Ser]], sobretudo a partir de [[Platão]] e [[Aristóteles]], e mais tarde com o [[platonismo]] e [[aristotelismo]], empobrece a [[riqueza]] do [[pensamento mítico]].
 +
: "Na verdade, o [[pensamento mítico]], servindo-se de [[figuras]] não-conceituais, de [[imagens]] [[concretas]] e [[ideações]] [[plásticas]], servindo-se de relatos e de [[fábulas]] (i.é, disto em que se constituem propriamente os [[mythoi]] e os [[hieroi]] [[lógoi]], os “[[mitos]]” e os “relatos [[sagrados]]”), coloca em seus próprios termos [...] o problema da [[relação]] [[entre]] a [[Alteridade]] e a [[Ipseidade]]. [[Zeus]] é ele-Mesmo e o [[Outro]]; o [[Outro]] é tanto o [[Outro]] quanto é o [[Mesmo]] [...] A [[Alteridade]] coincide com a [[Ipseidade]] tanto quanto dela difere: o [[Outro]] é o [[Mesmo]] (coincide com o [[Mesmo]]) tanto quanto é – na [[referência]] ao [[Mesmo]] – o [[Outro]] (difere de si [[Mesmo]]) (Torrano: 1992, 77)" (2) "(3).
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: Referência:
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: (1) TORRANO, Jaa. '''O sentido de Zeus'''. São Paulo: Iluminuras, 1996.
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== 37 ==
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: " "Para o [[pensamento mítico]] a [[alteridade]] e [[identidade]] “possibilita a [[relação]] de concomitância [[onto]]-[[cronológica]] (isto é, tanto [[temporal]] como [[ontogenética]]) que substitui a [[relação]] de [[causa]] e [[efeito]]” (Torrano: 1992, 77) (1). Dessa maneira, a [[manifestação]] do [[Ser]] no [[pensamento]] [[arcaico]] se reveste de um [[aspecto]] só aparentemente [[oposto]], porque [[desdobramento]] da [[dobra]] [[originária]], ou seja, de ''[[Zeus]]'' e suas uniões, [[manifestações]] do próprio [[sagrado]] (2).
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: Referências:
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: (1) TORRANO, Jaa. "O mundo como função de Musas". In: '''Teogonia'''. São Paulo: Iluminuras, 1992.
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 +
: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ulisses e a Escuta do Canto das Sereias”. In: ---. '''Arte: o humano e o destino'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 165.
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 +
: (2) TORRANO, Jaa. '''O sentido de Zeus'''. São Paulo: Iluminuras, 1996.
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 +
: (3) : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ulisses e a Escuta do Canto das Sereias”. In: ---. '''Arte: o humano e o destino'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 165.
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== 38 ==
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: "O [[esquecimento]] do [[poder]] [[verbal]] da [[palavra]] é tão forte e dominante que, [[gramaticalmente]], o [[verbo]] [[ser]], o [[verbo]] de todos os [[verbos]], não passa de um [[verbo]] de ligação ou auxiliar de outros. Um parasita. Nessa [[tradição]], o [[esquecimento]] do [[destinar-se]] do [[sentido do ser]] nos projeta em [[interpretações]] [[substantivo]]-[[subjetivas]] e não em [[interpretações]] [[verbais]], como é o [[próprio]] [[acontecer]] da [[realidade]], ao qual devemos [[estar]] atentos e [[abertos]] para sua [[escuta]]" (1).
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: Referência:
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Dialética e diálogo: A verdade do humano". In: Revista Tempo Brasileiro, 192, ''Dialética em questão I''. Rio de Janeiro, jan.- mar., 2013, p. 10.
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== 39 ==
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: "Só o [[estar]] é [[substantivo]], o [[ser]] [[é]] e será sempre [[verbal]], [[energia]] irradiante, [[nada criativo]]" (1).
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: Referência:
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Dialética e diálogo: A verdade do humano". In: Revista Tempo Brasileiro, 192, ''Dialética em questão I''. Rio de Janeiro, jan.- mar., 2013, p. 12.
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== 40 ==
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: "P - O [[vazio]] é então a mesma coisa que o [[nada]], isto é, o [[vigor]] que procuramos [[pensar]] como o [[outro]] de toda [[vigência]] e de toda [[ausência]]?
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 +
: J - De certo. É por isso que no Japão logo entendemos a conferência ''O que é metafísica?'' que nos chegou em 1930, numa [[tradução]] feita por um [[estudante]] japonês, seu ouvinte. Ainda hoje estranhamos que os europeus pudessem ter caído na armadilha de [[interpretar]] niilisticamente o [[nada]] discutido na conferência. Para nós, o [[vazio]] é o ''[[nome]]'' mais elevado para se [[designar]] o que o senhor quer [[dizer]] com a [[palavra]] [[ser]]..." (1).
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: Referência:
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: (1) HEIDEGGER, Martin. "De uma conversa sobre a linguagem...". In: ----. ''A caminho da Linguagem''. Trad. Marcia Sá Cavalcante Schuback. Petrópolis (RJ): Vozes. Bragança Paulista (SP): Editora Universitária São Francisco, 2003, p. 87.
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== 41 ==
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: "A [[poética]] é todo e qualquer [[fazer]] que produza o [[encanto]] de [[transformar]] algo que não é no que este algo virá a ser. Ela não ouve, ela não vê, ela não sente, ela [[dá-se]]. [[Dá-se]] como [[tempo]] e [[espaço]] em que estes são suspensos respectivamente, como [[cronologia]] e [[extensão]], e afirmados como [[tempo]] e [[espaço]] vividos. Ela se dá como [[medida]] [[concreta]]. Como [[medida]] [[concreta]] de [[tempo]] e [[espaço]], isto é, [[ser]]. Quando ela se dá instaura simultaneamente [[tempo]] e [[espaço]] e, ao mesmo tempo requisita um [[fazer]] para [[tudo]] que ela [[não é]]. Ela instaura os [[corpos]] como fazeres. Cada [[parte]] do [[corpo]] [[é]]. Essa é a [[magia]]" (1).
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: Referência:
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 +
: (1) JARDIM, Antônio. "Permanência e atualidade da Poética". In: ''Tempo Brasileiro'', 171, out.-dez., 2007, p. 5.
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== 42 ==
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: "''O [[mesmo]] [[é]] [[pensar]]'' e ''O [[mesmo]] [[é]] [[ser]]'', para o [[sujeito]] O [[mesmo]], mas este não pode [[vigorar]] sem o [[ser]] [[sendo]], enquanto [[vigorar]] do [[ser]] em cada e em [[todo]] [[é]]. Mas para ser tal [[vigorar]], o [[é]] de cada [[proposição]] não pode se [[tornar]] um [[verbo]] fraco, de mera [[ligação]], em [[virtude]] do [[poder]] do [[sujeito]], aqui neste caso, do ''[[mesmo]]''. Pelo contrário, é [[impossível]] o ''[[mesmo]]'' [[vigorar]] na [[proposição]] como [[sujeito]] sem o [[vigorar]] do [[é]], isto é, do [[ser]]. É nesse [[sentido]] que o [[ser]] enquanto [[é]] [[é]] o [[ser]] de [[todos]] os [[verbos]] e [[é]] o [[fundar]] do [[sujeito]] no que este se enuncia enquanto [[fundamento]]" (1).
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: Referência:
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. Citação retirada do ensaio "Espelho: o perigoso caminho do  auto-diálogo". Ainda não publicado.
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== 43 ==
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: "O que nos faz falta é o [[sentido do ser]]. O que é o [[sentido]]? Dessa maneira [[tudo]] que acontece fora do [[sentido]] é falta, que é o [[mal]] [[radical]]. É [[mal]] porque sem o [[sentido]] de [[ser]] a [[vida]] perde o seu [[motivo]] de [[viver]]. Mas o que nos [[motiva]] o [[viver]]? O simplesmente [[estar]] ou no e por [[estar]] [[sendo]] deixar o [[ser]] [[ser]] o [[motivo]], isto é, o [[sentido]]? Como se pode [[viver]] sem [[sentido]]? E quem dá o [[sentido]]? A perda de [[sentido]] não é já deixar [[estar]] o [[mal]] nos secando?" (1).
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:  Referência:
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 +
:  (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "A gota d’água e o mar". In: -----. ''Arte: o humano e o destino''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 245.
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== 44 ==
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: "Sabemos muito bem que não basta [[viver]] e/ou [[saber]]. É [[necessário]] [[ser]] o que se sabe. Não basta [[viver]] sentindo o que [[é]], é [[necessário]] [[ser]] o que se sente. [[Ser]] [[sabendo]] e [[sentindo]] é deixar [[eclodir]] o [[sentido]] enquanto [[vigorar]] do [[ser]]. A perda do [[sentido]] do [[viver]] é que acarreta o [[poder]] secar. A falta de [[sentido]] conduz ao secar. Sem [[sentido]] tanto o [[viver]] como o [[sentir]] perdem o [[vigorar]] do [[viver]] [[sendo]]" (1).
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:  Referência:
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 +
:  (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "A gota d’água e o mar". In: -----. ''Arte: o humano e o destino''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 244.
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== 45 ==
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: "Como [[pensar]], então, o [[ser]]? [[Pensar]] o [[ser]] é o [[caminho]] que nos conduz a uma [[possível]] [[resposta]]. Não devemos, porém, superestimar o [[pensar]], ou seja, o seu [[poder]] de formular [[perguntas]] e [[respostas]], nem esquecê-lo. Isso se dá porque [[pensar]] significa deixar-se tomar pela [[questão]]. É deixar a [[realidade]] se [[manifestar]] enquanto [[sentido]] e [[verdade]]: [[mundo]], [[linguagem]]" (1).
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:  Referência:
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:  (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "A gota d’água e o mar". In: -----. ''Arte: o humano e o destino''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 246.
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== 46 ==
 +
: "Em todo [[ato]], o [[vigorar]] já vigora em sua [[plenitude]], mas como esta não é um [[fim]], mas uma [[consumação]], a [[essência]] do [[agir]] tem sua [[medida]] no [[agir]] da [[essência]], daquilo de quem recebemos nosso [[destino]]: o [[ser]]. [[Ser]] é [[verbo]], o [[vigorar]] de todo [[agir]]. [[Ser]] então é a [[necessidade]] necessária" (1).
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: Referência:
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Liberdade, vontade e uso de drogas". In: ----. ''Arte: o humano e o destino''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 277.
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== 47 ==
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: "De todas as [[coisas]] [[eu]] posso [[perguntar]]: o que “[[é]]”?  O que “[[é]]” isto?  O que “[[é]]” aquilo?  Também posso [[perguntar]] por [[tudo]] de uma só vez: o que “[[é]]” isto [[tudo]]?  O que “[[é]]” a [[totalidade]] e a [[unidade]] de [[tudo]] aquilo sobre o que posso [[perguntar]]?  [[Nada]] de [[tudo]] o que é pode fugir à [[possibilidade]] de [[ser]] perguntado se “[[é]]” e o que “[[é]]”. E enquanto ela é perguntável justamente por seu “[[é]]”, ela é de todo perguntável, pois todo o que ela [[é]] entra neste seu “[[é]]”.  E também posso [[perguntar]] para além de todos os [[limites]] por [[tudo]] [[simplesmente]], e [[sempre]] de novo esta [[pergunta]] será sobre o “[[é]]” de [[tudo]] o que ultrapassa os [[limites]] imagináveis.  Significa que [[tudo]] aquilo a que posso dirigir minha [[pergunta]] - e isto significa [[tudo]] o que “[[é]]” de uma ou de outra [[forma]] - tem sua [[unidade]] [[fundamental]] no [[fato]] de que “[[é]]”; de cada [[coisa]] da [[realidade]] em [[particular]] e da [[realidade]] como [[totalidade]], devo [[dizer]] que é perguntável por seu “[[é]]”. Ora, o que “[[é]]”, nós chamamos de [[ente]]" (1).
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: Referência:
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: (1) HUMMES, o.f.m. Cláudio. ''Metafísica''. Mimeo. Daltro Filho / Imigrantes, RS, 1963. Depois tornou-se Bispo e hoje é Cardeal.
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== 48 ==
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: "Ora, todos os [[entes]] não concordam nisto de que são isto ou aquilo segundo uma grande [[variedade]], mas nisto que todos “são”, ou seja de que de cada um posso [[dizer]] que “[[é]]”.  Por isto [[perguntar]] pelo [[ente]] enquanto [[ente]] significa [[perguntar]] por aquilo pelo qual o ente “[[é]]”, pelo qual um [[ente]] [[é]] um [[ente]].  Ora, [[ente]] [[é]] [[ente]] pelo [[fato]] de que ele “[[é]]”.  Assim podemos finalmente [[dizer]], [[ente]] é [[ente]] por virtude do [[ser]]" (1). Aqui se coloca a [[questão]] da [[identidade]] e da [[diferença]]. Para não cair no [[abstrato]] do [[conceito]] é [[necessário]] manter sempre o [[vigorar]] e a [[questão]] da [[proximidade]] e da [[distância]].
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: - [[Manuel Antônio de Castro]].
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: Referência:
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: (1) HUMMES, o.f.m. Cláudio. ''Metafísica''. Mimeo. Daltro Filho / Imigrantes, RS, 1963. Depois tornou-se Bispo e hoje é Cardeal.
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== 49 ==
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: Por já vigorarmos, por [[tudo]] já [[vigorar]] no [[ser]], ele não é [[fundamento]] de [[nada]], porque ele [[simplesmente]] vigora, independentemente de minhas [[nomeações]] e [[reflexões]]. Ele está tão próximo, tão próximo que até já desde sempre o somos e nele somos o que somos. E, seguindo Parmênides, o [[mesmo]] [[é]] [[ser]] e [[saber]]. É este [[ser]] e [[saber]] como o [[mesmo]] que se torna a [[questão]] do [[educar]] [[originário]]. Mas nossa [[procura]] do [[saber]] do [[ser]] acaba se desviando para o [[saber]] imperfeito e [[limitado]] e não nos abrimos para o seu [[sentido]] que é o máximo de [[saber]], porque o seu [[sentido]] é o [[silêncio]] em que ele vigora e se dá a [[ver]] e a [[saber]]. O [[sentido]], o [[silêncio]], o [[vazio]] são o mais [[presente]] do [[presente]], são sempre o já vigorando e sem o qual [[nada]] se dá a [[saber]]  e a [[ver]]. Em virtude de nosso [[limite]] de [[entre-ser]] temos a tendência a [[entificar]] o [[ser]], o [[saber]], o [[silêncio]], o [[vazio]], o [[nada]].
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: - [[Manuel Antônio de Castro]].
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== 50 ==
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: "... devemos [[dizer]] que eu só posso [[perguntar]] o que ainda não sei.  A [[pergunta]] só pode surgir de um [[saber]] que-não-sabe.  Ora, como vimos, a [[possibilidade]] de qualquer [[pergunta]] se [[funda]] na [[possibilidade]] de [[perguntar]] pelo [[ser]].  Por isto, o [[ser]] deve [[significar]] para mim também um [[horizonte]] não-sabido. Assim devemos [[dizer]] que o [[horizonte]] de [[ser]], como condição [[fundamental]] de todo [[perguntar]] deve constituir um [[horizonte]] sabido-não-sabido por mim. Assim [[perguntar]] pelo [[ser]] [[eu]] só poderei se o [[ser]] [[significar]] [[sempre]] para mim um não-sabido além de [[ser]] algo de sabido. E assim sucede que meu [[não-saber]] do [[ser]] nunca seja totalmente redutível a um [[saber]], pois então se dissolveria a [[possibilidade]] de [[perguntar]] pelo [[ser]] e, igualmente, a [[possibilidade]] de qualquer outra [[pergunta]]" (1). É o que se tenta [[dizer]] com a [[liminaridade]], com o [[entre-ser]] em que vigora o [[ser humano]].
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: - [[Manuel Antônio de Castro]].
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: Referência:
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: (1) HUMMES, o.f.m. Cláudio. ''Metafísica''. Mimeo. Daltro Filho / Imigrantes, RS, 1963. Depois tornou-se Bispo e hoje é Cardeal.
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== 51 ==
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: "Assim o [[ser]] - como [[horizonte]] fundamental e [[original]] sabido e não-sabido ao mesmo [[tempo]] - deve constituir para o [[homem]] um [[mistério]] original, fundamental e como tal, inesgotável. Nunca meu [[saber]] poderá [[compreender]] exaustivamente o [[horizonte]] do [[ser]]. Por isto nunca se esgotará minha capacidade de [[perguntar]] e ao mesmo tempo minha [[necessidade]] de [[perguntar]] pelo [[ser]] dos [[entes]].  A [[pergunta]] pelo [[ser]] é [[essencial]] ao [[homem]], expressão de sua [[essência]]: o [[homem]] é o perguntador [[simplesmente]], é quem pode e deve [[simplesmente]] [[perguntar]], é quem pergunta pelo [[ser]], é quem pode e deve [[simplesmente]] [[perguntar]] pelo [[ser]] - esta é sua [[essência]], vista através do prisma do [[exercício]] da [[pergunta]], como típico [[exercício]] do [[sentido do ser]] do [[homem]] pelo [[homem]] mesmo.  Karl Rahner (2) diz: “O [[homem]] existe como [[pergunta]] pelo [[ser]].” " (1).
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: Referência:
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: (1) HUMMES, o.f.m. Frei Cláudio. ''Metafísica''. Mimeo. Daltro Filho / Imigrantes, RS, 1963. Depois tornou-se Bispo e hoje é Cardeal.
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: (2) Karl Rahner, cf. seu livro “Geist in Welt”: ''Espírito no Mundo''.
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== 52 ==
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: A [[essência]] do [[agir]] se [[funda]] numa [[ambiguidade]]: perguntamos e no [[perguntar]] quem, em última [[instância]], se pergunta, porque só podemos ter [[vontade]] de [[perguntar]] porque já [[vigoramos]] no [[querer]] do [[ser]], é o [[ser]].
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: - [[Manuel Antônio de Castro]].
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== 53 ==
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: "O [[ser]] é o [[princípio]] da [[realidade]] do [[ente]], a [[essência]] é o [[princípio]] da [[limitação]] da [[realidade]] do [[ente]]" (1).
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: Referência:
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: (1) HUMMES, o.f.m. Frei Cláudio. ''Metafísica''. Mimeo. Daltro Filho / Imigrantes, RS, 1963. Depois tornou-se Bispo e hoje é Cardeal.
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== 54 ==
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: "O [[ser]] é o [[fundamento]] [[interno]] da [[realidade]] do [[ente]], do [[conteúdo]] entitativo do [[ente]].  Mas [[ser]] como [[fundamento]] do [[ente]] não coincide totalmente com este [[ente]], como se fosse apenas [[fundamento]] deste [[ente]] aqui.  O [[ser]] como [[ser]] é o [[fundamento]] de todos os [[entes]].  Por isto mesmo é que com o [[ser]] não está posta nenhuma [[limitação]] no [[ente]], mas ele precisa de outro [[princípio]] que seja o [[princípio]] de [[limitação]], a [[saber]], o que chamamos de [[essência]].  O [[ser]] é o [[princípio]] da [[realidade]] do [[ente]], a [[essência]] é o [[princípio]] da [[limitação]] e determinação do [[ente]].  [[Ser]] não é [[essência]] e [[essência]] não é [[ser]] sem mais; um não se identifica com a outra.  Há uma [[diferença]] [[entre]] [[ser]] e [[essência]], que está posta no [[ente]] [[finito]] e que pertence [[essencialmente]] ao [[ente]] [[finito]]" (1).
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: Referência:
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: (1) HUMMES, o.f.m. Frei Cláudio. ''Metafísica''. Mimeo. Daltro Filho / Imigrantes, RS, 1963. Depois tornou-se Bispo e hoje é Cardeal.
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== 55 ==
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: "O [[ser]] como tal é positividade pura, [[plenitude]] total, sem sombra de falta de algo, sem sombra de [[negatividade]].  Ele continua sendo-o virtualmente em nós, embora a nossa [[finitude]] atual faça com que sejamos apenas [[algo]] e não [[tudo]].  Em consequência sentimo-nos continuamente movidos, do [[interior]] de nós mesmos, a expandir-nos sempre mais para além de nós mesmos, a conquistar sempre mais a [[realidade]] que nos cerca, seja pela [[inteligência]], conhecendo-a, seja pela [[vontade]], amando-a, seja pela [[técnica]], pondo-a a nosso serviço, seja por tantas outras [[formas]] de [[fazer]] com que a [[realidade]] se torne nossa, para assim cumular nossa [[pobreza]] congênita do [[ser]]. Numa [[palavra]], podemos [[dizer]] que somos atualmente [[finitos]], mas virtualmente [[infinitos]]" (1). Como hoje a [[palavra]] [[virtual]] tomou um [[sentido]] de [[representações]] [[digitais]] possíveis, seria [[melhor]], talvez, falar em [[possibilidades]] [[concretas]], em [[vigorar]] da [[energia]] do  [[ser]] e sua [[possível]] [[manifestação]] como [[luz]] e [[claridade]].
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: - [[Manuel Antônio de Castro]].
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: (1) HUMMES, o.f.m. Frei Cláudio. ''Metafísica''. Mimeo. Daltro Filho / Imigrantes, RS, 1963. Depois tornou-se Bispo e hoje é Cardeal.
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== 56 ==
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: "Pode-se [[estar]] sem [[ser]]? [[Ser]] sem [[estar]]? [[Ser]] não é [[estar]] e [[estar]] não é [[ser]]? Com essa formulação não há o [[perigo]] de se cair em mais uma [[dicotomia]] [[funcional]] e [[metafísica]], tão presentes na [[cultura]] [[ocidental]]? O melhor [[caminho]] para evitar as [[dicotomias]] é sempre [[questionar]] em [[lugar]] de simplesmente [[conceituar]]. Portanto, questionemos: O que é [[ser]]? O que é [[estar]]? Ora, as [[respostas]] não serão [[conceitos]]? Não. São os passos que nos reencaminham para as [[questões]] de [[ser]] estando e de estando [[ser]]" (1).
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: Referência:
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ser e estar". In:------. ''Arte: o humano e o destino''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 21.
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== 57 ==
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: "A grande [[incompreensão]] e [[banalização]] em [[relação]] ao [[ser]] dão-se, justamente, em virtude de nunca se [[pensar]] que não há [[estar]] sem o [[ser]] e que é este e somente este que possibilita qualquer [[estar]], seja referente aos estados internos e externos, seja referente às [[circunstâncias]] onde corre e decorre nossa [[existência]]: [[pessoal]], [[social]], [[familiar]], [[econômica]], [[histórica]], [[afetiva]], [[psíquica]], [[política]], dentre outras, ou seja, ainda em [[relação]] às [[conjunturas]]" (1).
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: Referência:
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ser e estar". In:------. ''Arte: o humano e o destino''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 24.
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== 58 ==
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: "Só [[gramaticalmente]] há o [[ser]], pois o [[ser]] não existe, [[não-é]]. Em [[virtude]] dessa [[aporia]], a [[gramática]] faz do [[ser]] algo [[absurdo]] (e ainda se diz [[lógica]] e [[coerente]]): [[ser]] é [[verbo]] de [[ligação]], muitas vezes nem expresso, porque tal [[ligação]], na [[evidência]] de sua sem importância, nem aparece. De fato, o [[ser]] [[não é]].  Ele [[dá-se]], retraindo-se; fala, silenciando. E como poderia a [[ciência]], ou seja, a [[gramática]], tratar do [[silêncio]], [[fundar-se]] no [[silêncio]], que é sem [[coesão]] e [[coerência]], porque sem [[ser]] não há nem se pode falar em [[coesão]] e [[coerência]]" (1).
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: Referência:
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ser e estar". In:------. ''Arte: o humano e o destino''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 25.
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== 59 ==
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: "Revela-se que o [[Ser]] é o encanto das [[Vozes]] (isto é, as [[Musas]]) e as [[Musas]] não são outra coisa que a múltipla [[Presença]] do [[Divino]]" (1). "[[Relação]] [[entre]] [[linguagem]] e [[ser]], ou seja: [[entre]] o [[Canto]] em seu encanto e a aparição do que se canta, e consequentemente [[entre]] a [[Revelação]] (''[[alétheia]]'') e o Esquecimento (''lesmosýne''/''léthe'')" (2).  "A rigor, não há na Teogonia uma [[relação]] [[entre]] [[linguagem]] e [[ser]], mas uma [[imanência]] recíproca [[entre]] eles" (3).
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: Referências:
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 +
: (1) TORRANO, JAA. "Introdução". In: ''Hesíodo. Teogonia''. Trad. JAA Torrano. São Paulo: Iluminuras, 1992, p. 28.
 +
: (2) Idem, p. 29.
 +
: (3) Idem, p. 29.
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: '''Ver também:'''
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 +
: *[[Música]]
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: *[[Mito]]
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: *[[Êxtase]]
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== 60 ==
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: "Assim, o [[princípio]] “ ''ex nihilo nihil fit'' ”, “de [[nada]] não se cria [[nada]]”, só vale para as transações do já criado. Para o élan criador no sentido estrito, vale o inverso: “ ''ex nihilo omnia fiunt'' ” Aqui o princípio é: “é do [[nada]] que [[tudo]] se cria”. Por isso é que o [[mestre]] Eckhart no século XIV, o pai da [[mística]] renana, podia [[dizer]] para os criacionistas de todos os [[tempos]]: “ ''Esse est Deus et Deus est nihil'' ”. “ ''[[Ser]] é [[Deus]] e [[Deus]] é [[Nada]]'' ” (1).
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: Referência:
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 +
: (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "O que significa pensar?". In: ''Revista da Academia Brasileira de Letras'', maio-junho, 2012.
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== 61 ==
 +
: "O [[ser]] não pode ''[[ser]]''. Se fosse, já não seria [[ser]], mas um [[ente]]. Contudo, o primeiro [[pensador]] que pensou o [[ser]], Parmênides, não diz: ''Esti gar einai" (frag. 6)? ''Há, de fato, [[ser]]'' e ''está presente o ser presente''. Temos que [[pensar]] que se, efetivamente, no ''einai'', ''o ser presente'', está falando a ''[[aletheia]]'', o desvelar-se, acentuado no ''esti'' e dito do ''einai'', [[é]] : ''o deixar que venha à [[presença]]''. [[Ser]]: na [[realidade]] o que permite a [[presença]]"(1). 
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: Referência:
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 +
: (1) HEIDEGGER, Martin. In: ''A tese de Kant sobre o ser''. Trad. Helena Cortés e Arturo Leyte. Madri: Alianza Editorial, 2007, p. 387. (Tradução do espanhol: Manuel Antônio de Castro).
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: '''Ver também:'''
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: *[[Presença]]
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== 62 ==
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: "Quando percorremos os [[sentidos]] principais de [[sedeo]], notamos que, em primeiro [[lugar]], está em [[tensão]] com ''-sto'', indicando [[posições]] inversas a este. De outro lado, notamos que [[sedeo]] acaba realizando os mesmos [[sentidos]] que aparecem nas [[raízes]] de [[ser]]. Significa [[permanecer]], [[habitar]], ou seja, é dotado do [[mesmo]] [[poder]] de [[ser]]. É o [[poder]] do repouso e do [[silêncio]]" (1).
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: Referência:
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ser e estar". In:------. ''Arte: o humano e o destino''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 52.
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== 63 ==
 +
: "Mas a [[fala]] do [[silêncio]] é mais do que [[relação]] e [[comunicação]]. São, portanto, [[linguagem]], [[sentido]] e [[mundo]] que possibilitam as [[posições]] como [[posições]], isto é, são as [[possibilidades]] de [[tempo]] e [[mundo]] e suas [[circunstâncias]]. Sem [[ser]] não há [[linguagem]], [[sentido]] e [[mundo]]" (1).
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: Referência:
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O próprio como possibilidades". In:------. ''Arte: o humano e o destino''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 130.
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== 64 ==
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: "Única [[aproximação]] da [[riqueza]] [[interna]] do [[ser]], ou melhor, da [[estrutura]] [[interna]] do [[ser]], se fez ao [[revelar-se]] o [[ser]] como [[agir]], enquanto o [[agir]] não apenas convém a determinada [[forma]] de [[ser]], mas a [[tudo]] quanto participa do [[ser]] e enquanto participa do [[mesmo]]. Porém,  não se esgota aqui nossa [[possibilidade]] de exprimir a [[riqueza]] [[interna]] do [[ser]], que [[transcende]] – como [[agir]] – toda e qualquer [[forma]] particular de [[ser]] e que convém [[necessariamente]] a [[tudo]] que [[participa]] do [[ser]] e enquanto [[participa]] do [[ser]]" (1).
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:  Esta [[participação]] no [[ser]] acontece na justa medida do que lhe é [[próprio]]. E nesse [[próprio]] nos advém a [[questão]] das [[propriedades]]. Seriam estas os [[transcendentais]]. Claro que eles não poderiam se [[manifestar]] no [[próprio]] [[sendo]] senão na medida em que se [[fundam]] no [[ser]]. Porém, para nós [[finitos]], haverá sempre a [[proximidade]] da [[distância]] e a [[distância]] da [[proximidade]]. Nesta [[tensão]] consiste a nossa [[travessia]] em direção e na volta para [[casa]], no [[dizer]] de [[Rosa]], volta para o [[ser]] enquanto [[sentido]] do [[próprio]] que será o [[sentido do ser]]. É no [[sentido do ser]] que nos manifestamos fundados nos [[transcendentais]]: [[uno]], [[verdadeiro]], [[bom]], [[belo]]. São, portanto, [[atributos]] [[essenciais]], sem dúvida nenhuma, e não meramente [[circunstanciais]], pois dizem respeito a todos os [[sendos]], naquilo que constitui a sua [[essência]] enquanto [[sentido]]. Perguntar-se pelo [[sentido do ser]] é perguntar-se pelos [[transcendentais]].
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: - [[Manuel Antônio de Castro]].
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:  Referência:
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:  (1) HUMMES, o.f.m. Frei Cláudio. ''Metafísica''. Mimeo. Daltro Filho / Imigrantes, RS, 1963. Depois tornou-se Bispo e hoje é Cardeal.
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== 65 ==
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: "... só como [[analogia]] se pode [[pensar]] o [[ser]] no âmbito dos [[transcendentais]], pois é a [[questão]] do próprio [[sendo]] e não e jamais do [[ser]]. Por estarmos no [[ser]] é que pensamos e devemos [[pensar]] os [[transcendentais]] enquanto o [[sentido]] que nos dá [[sentido]] enquanto cada um é um [[próprio]]. Será, contudo, sempre um [[pensar]] que pensa em nossa [[liminaridade]] de [[seres]] do [[entre]], [[seres]] [[metafísicos]], a [[proximidade]] e a [[distância]]. Esta far-se-á [[presente]] em cada [[transcendental]]" (1).
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:  Referência:
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:  (1) HUMMES, o.f.m. Frei Cláudio. ''Metafísica''. Mimeo. Daltro Filho / Imigrantes, RS, 1963. Depois tornou-se Bispo e hoje é Cardeal.
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== 66 ==
 +
: O [[ser]] é e não é, é [[verdadeiro]] e [[não-verdadeiro]], [[belo]] e [[não-belo]], [[bom]] e [[não-bom]], justamente porque o [[ser]] [[é]] e [[não-é]], isto é, sem o [[ser]] nenhum [[sendo]] pode [[ser]], mas nenhum [[sendo]] [[é]] o [[ser]]. O [[ser]] é [[nada]] de [[ente]] e de [[tudo]] que lhe diz respeito, mas, de outro lado, [[tudo]] que diz respeito ao [[sendo]] só pode provir do [[ser]]. Dessa maneira, os [[transcendentais]] são a [[concreticidade]] do [[ser]]. Tal [[concreticidade]] será [[sempre]] a [[dobra]] de [[ser]] e [[pensar]], de [[ser]] e [[estar]]. [[Dobra]] é [[entre-ser]].
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: - [[Manuel Antônio de Castro]].
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== 67 ==
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: "A nossa [[experiência]] cotidiana do [[mundo]] faz encontrar-nos com uma grande multiplicidade de [[entes]]. Quando tomamos a [[pergunta]] como ponto de partida de nossa investigação [[metafísica]], constatamos reflexivamente que somos capazes de [[perguntar]] por [[tudo]] sem [[limitações]]. Mostrou-se também que [[perguntar]] por [[tudo]] não significava [[perguntar]] uma por uma [[todas]] as [[realidades]] particulares, mas, sim, a capacidade de ultrapassar todas as [[particularidades]] e [[perguntar]] de uma vez por [[tudo]], num [[ato]] [[unificador]] através da [[pergunta]]. A [[pergunta]] assim revelava-se como eminentemente [[unificante]], já que por ela não se unificam apenas algumas [[realidades]] particulares, mas [[todas]] de uma vez. Porém, [[poder]] [[unificar]] a [[tudo]] através da [[pergunta]], ou seja, [[poder]] [[perguntar]] por [[tudo]] de uma vez, só é [[possível]] se [[tudo]] forma realmente uma [[unidade]] [[original]]. Em que consiste esta [[unidade]] [[fundamental]]? A isto podemos [[responder]] respondendo à [[pergunta]]: Em [[virtude]] de que a [[pergunta]] unifica [[tudo]]? Quando [[eu]] pergunto: “O que [[é]] isto?”, “O que [[é]] aquilo?”, “O que [[é]] [[tudo]] isto?”, a própria [[pergunta]] nos responde: a [[unidade]] de todo o perguntável é constituído pelo “[[é]]”, que é comum a [[tudo]] aquilo que [[eu]] pergunto, é constituída pelo [[fato]] de que o [[ente]] [[é]], posto no [[ser]] e em [[virtude]] do [[ser]]. Ora, de [[tudo]] posso [[dizer]] que “[[é]]”. Logo posso [[perguntar]] por [[tudo]] unificando a [[tudo]] em [[virtude]] do [[ser]]. O [[ser]] é a [[unidade]] de todo o perguntável e de todo o [[conhecível]], a [[unidade]] de todos os [[entes]]" (1).
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:  Referência:
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 +
:  (1) HUMMES, o.f.m. Frei Cláudio. ''Metafísica''. Mimeo. Daltro Filho / Imigrantes, RS, 1963. Depois tornou-se Bispo e hoje é Cardeal.
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== 68 ==
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: [[Conhecer]] o [[ser]] que nos foi dado é [[renunciar]] aos [[limites]] que o [[ser]] jamais tem, por isso somos, mas estamos [[próximos]] e [[distantes]] do [[ser]], isso para [[dizer]] o quanto nos é [[difícil]] deixarmo-nos tomar pelo [[conhecer]] do [[ser]]. É um [[agir]] tão [[difícil]] e tão especial que ele é sem [[intencionalidade]]. Essa é a [[difícil]] tarefa do [[amar]], isto é, [[amar]] é não [[ter]] [[intencionalidade]], por isso é um [[agir]] que não satisfaz, mas leva à conquista do único que [[satisfaz]]: o [[conquistar-se]], pois no [[sermos]] reside a [[plenitude]], [[conquistar]] é [[conquistar-se]] no que já desde [[sempre]] somos. E este é sem [[intencionalidade]]. É dessa maneira que o que está fora não pode nos [[satisfazer]]. O que está fora nunca para de [[poder]] ser substituído, mas só o [[insubstituível]] nos satisfaz, pois o [[insubstituível]] é sem [[limites]]. [[Pensar]] é [[ser]].
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: - [[Manuel Antônio de Castro]].
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== 69 ==
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: " [[Ser]] é [[obedecer]] como [[Escuta]] à [[voz]] do [[destino]], o contrário seria a [[morte]], não cumprindo o [[destino]] pelo qual cada um se apropria do que lhe é [[próprio]]. A [[ação]] de [[Ulisses]] é guiada pelo [[con-sumar]] [[o que é]] e não pela satisfação de um [[desejo]] cuja extensão seria uma satisfação [[subjetiva]] de pura [[curiosidade]]: como seria o [[canto das Sereias]]?" (1).
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: Referência:
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ulisses e a Escuta do Canto das Sereias”. In: -----. ''Arte: o humano e o destino''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 174.
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== 70 ==
 +
: "Só serei [[feliz]] se souber [[querer]] a [[essência]] do [[agir]] para [[ser]]. Se for no que ajo e conheço, serei [[feliz]]. Isso significa: temos muitos [[empenhos]] na [[vida]], muitas [[ações]], mas só uma e tão-somente uma é [[essencial]] – aquela que implica [[ser]], [[ser]] e nada mais. [[Ser]] [[é]], portanto, [[conhecer-se]] a partir do que já [[é]], do [[vigorar]] do [[ser]]" (1).
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 +
: Referência bibliográfica:
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 +
: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O mito de Midas da morte ou do ser feliz". In: -------. ''Arte: o humano e o destino''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 193.
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== 71 ==
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: "Por que, então, achar que a [[consumação]] do que cada [[ente]] [[é]], ''[[telos]]'', em [[grego]], deve consistir numa dissolução indiferenciante, num ser indiferenciado, se o que cada um [[é]] não lhe é dado pelos [[limites]], mas pelo [[tempo]]-[[ontológico]] como [[doação]] do [[ser]], que, para [[simplesmente]] [[ser]], só pode [[ser]] a [[diferença]] das [[diferenças]], embora se faça [[presente]] no [[presente]] com que presenteia cada [[ente]]-[[ser]]? Como se daria então a [[referência]] [[ser]] (não-mais-ente) / [[diferença]] como [[referência]] ao [[ser]] e como [[referência]] aos [[outros]] seres-não-mais-entes? Uma coisa fica clara. Cada [[ser]]-[[ente]] e cada ser-não-mais-ente é sempre uma [[doação]] do [[ser]]. Daí que o [[ser]] que doa só pode [[doar]] a partir da sua [[riqueza]] e não e jamais a partir do [[niilismo]] ou do [[ser]] como um [[abstração]] generalizante. Não é esse o [[ser]] que [[Heráclito]] nos convida a [[pensar]] [[sempre]], quando diz: "[[tudo]] é [[um]]", indicando esse "[[tudo]]" [[riqueza]] de [[doação]] e [[plenitude]]?" (1).
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: Referência:
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. ''Linguagem: nosso maior bem''. Série Aulas Inaugurais. Faculdade de Letras, UFRJ, 2o. sem. / 2004, p. 21
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== 72 ==
 +
: "O [[ser]], portanto, é [[doação]], [[presentificação]]. O que é essa [[doação]] nós a experienciamos em nós mesmos. E só cada um pode se [[experienciar]] e dizer-se [[linguagem]] / [[ser]], nosso maior [[bem]] como [[escuta]]. Mas o [[ser humano]], porque é [[dizer]]-com - ''[[homolegein]]'', no [[dizer]] de [[Heráclito]] -, procura sempre [[compreender]] e [[dizer]] o que é essa [[plenitude]] de [[doação]]. É realmente o único [[penhor]] de todas as nossas [[ações]], pelas quais, [[sendo]], poderemos [[ser]] o que somos: [[felizes]]" (1).
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: Referência:
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. ''Linguagem: nosso maior bem''. Série Aulas Inaugurais. Faculdade de Letras, UFRJ, 2o. sem. / 2004, p. 24.
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== 73 ==
 +
: "Quem não cultiva o [[silêncio]] não pode [[falar]] a [[fala]] do que [[é]]. E que desafio maior existe para cada um senão [[ser]]? Não qualquer [[coisa]] ou um [[outro]] qualquer, e até um [[outro]] que amamos. [[Ser]] só se é própria e apropriadamente quando marcamos um encontro sempre inadiável com o que nos é [[próprio]]. E o que nos é [[próprio]] ninguém pode dizê-lo nem [[ensinar]]. [[Silêncio]] não é falta de [[voz]] ou som, não é [[pausa]] de [[música]] ou [[fala]]. O [[silêncio]] é ruidoso, oprime e liberta, é [[dor]] e [[alegria]], dissolve a [[subjetividade]] e plenifica o [[ser]] de cada um. O [[silêncio]] é o máximo de [[fala]], quando [[falar]] só se consegue calando. O [[silêncio]] é o mergulho no mais [[profundo]] do [[entre]]/[[interior]] de todo [[horizonte]] em que já estamos sempre lançados e projetados e aliciados. O [[silêncio]] é o [[silêncio]] do culpado e do inocente. O [[silêncio]] é a concentração máxima da ''[[poiesis]]'' como [[essência]] de todo [[agir]]. A [[verdadeira]] e [[fundante]] [[poesia]] é [[sempre]] [[poesia]] do [[silêncio]]" (1).
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 +
: Referência:
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 +
: (1) CASTRO, Manuel Antônio. "As três pragas do século XXI". In: ''Confraria'' - 2 anos. Rio de Janeiro: Confraria do Vento, 2007, p. 19.
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 +
== 74 ==
 +
: "O [[ser]] é [[memória]] e por isso esta é o que há de mais [[misterioso]] em [[nós]]" (1).
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 +
: Referência:
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 +
: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Leitura". In: ---------. ''Leitura: questões''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2015, p. 86.
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== 75 ==
 +
: "''Que é isso o que somos?'' Aqui podemos nos mover numa dupla articulação. (1)No plano do [[ente]]: '''O que é?''' Pois tudo que [[é]] [[é]] [[ente]]. (2)Ou, o que é [[necessário]], movermo-nos no plano do [[ser]] do [[ente]]. Neste caso, o alcance da [[resposta]] será medido não pelo [[ente]], mas pelo [[ser]] do [[ente]]. Isso significa que a [[resposta]] não se dá nunca no âmbito do [[ser]], mas apenas e tão-somente no plano do [[ente]]. Significa isto que a [[resposta]] só em [[parte]] é [[resposta]], porque ela nunca se dá no plano do [[ser]], mas somente no plano do [[ente]] enquanto [[ente]] do [[ser]]. Ou seja, a [[resposta]] vai [[sempre]] [[ser]] [[paradoxal]], pois responde no plano do [[ente]], embora se mova, e só pode se mover, no plano do [[ser]]" (1).
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: Referência:
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 +
:  (1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Heidegger e as questões da arte”. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). ''Arte em questão: as questões da arte''. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 14.
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== 76 ==
 +
: "No fazer [[artístico]] não apenas o [[ser]] se dá em seu [[sentido]] fundando os [[sentidos]], mas se dando constitui o [[ser humano]] em seu [[sentido]]. Por isso, não é o [[ser humano]] que faz a [[arte]]. Pelo contrário, a [[arte]] é que constitui o [[ser humano]] enquanto [[sentido]] de [[destino]]" (1).
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: Referência:
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 +
:  (1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Heidegger e as questões da arte”. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). '''Arte em questão: as questões da arte'''. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 35.
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== 77 ==
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: "Em [[português]], o [[verbo]] [[ser]] origina-se do [[verbo]] latino ''[[sedere]]'': ''assentar-se repousando no recolhimento''. Daí a “[[sede]]” [[significar]] a [[casa]] central. Em sua [[vigência]], ''[[legein]]'' / ''[[legere]]'' fertilizam tanto a [[fala]] e o [[discurso]], quanto o ouvido e a [[escuta]]. [[Fundando]] estes, [[ouvir]] é [[escutar]] o [[agir]] do ''[[legein]]'' / ''[[legere]]'' do [[ser]], pelo qual se dá a [[reunião]] e [[recolhimento]] na [[memória]] do [[curso]] da [[história]]" (1).
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:  Referência:
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:  (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O ler e suas questões". In: ---------. '''Leitura: questões'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2015, p. 21.
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: [[Realização]] é o vir a ser da [[realidade]] no seu manifestar-se em [[real]], ou seja, a [[totalidade]] dos [[entes]] (''ta onta''), dos [[fenômenos]]. Como tal, todo [[fenômeno]] é uma [[realização]] da [[realidade]]  constituindo o [[real]]. Toda [[realização]] é oblíqua e dissimulada porque nela a [[realidade]] se dá e retrai, se manifesta e vela. Toda [[realização]] é uma [[doação]] do [[ser]]. Daí podermos falar de [[real]] e [[irreal]], de [[ideal]] e [[real]], porque este, em verdade, é a [[vigência]] do [[vigor]] da [[realidade]] pondo-se e depondo-se nas [[realizações]]. O [[Ser]] é [[doação]] enquanto [[tempo]], [[presença]], [[mundo]], [[sentido]] e [[realização]].
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: - [[Manuel Antônio de Castro]]
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: "A [[energia poética]] é a [[essência]] de todo [[agir]] e o [[sentido]] de todo [[fazer]] e até do não [[agir]] e do não [[fazer]], do [[ser]] e do [[não-ser]]. Enfim, é a [[realidade]] de todas as [[realizações]]" (1).
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: Referência:
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Poético-ecologia". In: Manuel Antônio de Castro (org.). '''Arte: corpo, mundo e terra'''. Rio de Janeiro: 7Letras, 2009, p. 17.

Edição atual tal como 20h47min de 15 de Agosto de 2022

1

"O que impressiona, em primeiro lugar, em relação ao verbo ser é a variedade dos étimos das formas de seus tempos verbais. Mas toda essa gama de variações pode ser determinada por três diferentes raízes etimológicas" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Amar e ser". In:------. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 48.

2

"No infinitivo, em português, o verbo ser não se originou do verbo esse / ser, em latim, mas do verbo latino sedére: sentar-se; morar; ficar concentrado, recolhido, em repouso. Esta proveniência do verbo ser, em português, é enigmática e faz pensar" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Amar e ser". In:------. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 49.

3

Como já disse, o verbo ser, em português, tem mais de uma etimologia, dependendo do tempo verbal. Eis a etimologia do pretérito perfeito: fui. É a raiz indo-europeia: bhü ou bheu. "A ela pertence o verbo grego phyo: surgir, vigorar, imperar, chegar por si mesmo a pôr-se e permanecer nessa posição” (1). Do mesmo radical ph formou-se em grego phós. Portanto, todo phyein, de onde se forma phýsis, seria o nascer que, por vigorar e brilhar na luz, nasce, cresce, aparece, é.


- Manuel Antônio de Castro
(1) HEIDEGGER, Martin. Introdução à metafísica. Trad. Emmanuel Carneiro Leão. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1969, p. 98.

4

"Ser: viver, surgir, permanecer. Estes sentidos correspondem às três raízes que aparecem no verbo ser" (1).


Referência:
(1) HEIDEGGER, Martin. Introdução à Metafísica. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1969, pp. 97-8.
Ver também:
*Acontecer

5

Ao enigma que é o ser podemos chegar por quatro vias, todas integradas na questão da liminaridade: a) como horizonte, quando no visível o ser humano já desde sempre se lança para o invisível. Mas esse movimento de ver o não-visível do visível, sempre se dá num movimento incessante inerente a toda questão, articulando tanto mais um ver quanto mais se lança no não-ver. O ser humano é convocado pela questão do não-ver; b) Como saber, pois quando pergunta, pergunta porque não sabe e quer saber o não-saber, mas, ao mesmo tempo, só pode perguntar porque já sabe o não-saber. E, por isso, o ser humano é convocado pela questão do não-saber; c) Como querer, quando deseja-se isto e aquilo. Mas isto e aquilo são uma posse e não o poder da posse das possibilidades. Por isso, isto e aquilo não satisfazem o desejo. O desejo não é disto ou aquilo enquanto posse disto ou daquilo. O desejo é sempre poder a posse de todas as possibilidades. O ser humano é convocado pela questão do não-querer. Só esta posse faz o ser humano feliz, ou seja, responde e corresponde ao seu querer / desejar; d) Como ser, quando questiona "o que é isto?", "o que é aquilo?". Mas ao perguntar por isto e aquilo, no fundo, não pergunta por isto e aquilo enquanto ente, mas sempre e já a partir do ser, senão nem poderia perguntar. Contudo toda questão pergunta pelo o ser na dimensão verbal do ente enquanto não-é: o que é, o que foi, o que será? Por isso, a resposta da questão será sempre no plano do ente, recolocando a questão do não-ser. O ser humano, contudo, é sempre convocado pela questão do ser, na dimensão do ver, do saber, do querer e do não-ser. Esse é o enigma do ser humano que sempre se dimensiona na questão porque nela ele se mede como ente na medida do ser por não-ser. A questão antes de ser perguntada já nos ultrapassa. Ela é a desmedida de toda medida da pergunta por, sobre e com.


- Manuel Antônio de Castro


Ver também:
*Pensamento
*Mistério


6

"Tudo é e não é" (1). Esta afirmação do pensador Rosa pode ser desdobrada em: Tudo é. Tudo não é. Isso que parece tão simples nos lança no mistério do ser. Como o ser que é e sem ser não há é, pode ser e não ser? Isso é o que não cabe em nenhuma lógica e em nenhuma identidade lógica, metafísica. O ente foi considerado ao longo do percurso metafísico como o que é, o como é, o de onde e o para que é. Posteriormente na Modernidade se acrescentou à reflexão sobre o ente um desdobramento reflexivo, especular, quando se investiga em o como é, o como se conhece. Este pode se encaminhado pela razão subjetiva ou pelo pensar, segundo a sentença de Parmênides, quando diz que pensar e ser são o mesmo. Então a questão do ser se desloca, sem se separar, para a questão da unidade de pensar e ser. O que sempre ficou impensado em todo esse percurso: o "Tudo não é" de que nos fala Rosa. É este Tudo não é o a-ser-pensado. Isto coloca a questão da negatividade e ser de que trata Heidegger já para o final de Carta sobre o humanismo.


- Manuel Antônio de Castro
- Referência:
(1) ROSA, João Guimarães. Grande sertão: veredas. Rio de Janeiro: José Olympio, 1968, p. 12.

7

"Ser e pensar, em Parmênides, se identificam como condições de possibilidade do existir na mesmidade. Ser e pensar unem e trazem consigo o mundo e a phýsis como possibilidade de constituição de uma espácio-temporalidade que se estrutura para além do domínio das realizações, mas também o mundo e a phýsis como espácio-temporalidade de constituição da realidade do ser como desvelamento" (1).


Referência:
(1) JARDIM, Antonio. Música: vigência do pensar poético. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 62.

8

"O ser não é 'algo' que se acha escondido num lugar supra-sensível ou no alto de uma especulação distante e elevada. Como nos mostra a todo instante a palavrinha 'é', ser 'é' o mais próximo da proximidade" (1).


Referência:
(1) HEIDEGGER, Martin. Heráclito. Trad. Márcia Sá Cavalcante Schuback. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 1998, p.115.

9

"Tenho medo de dizer quem sou: no momento em que tento falar, não exprimo o que sinto e o que sinto se transforma, lentamente, no que eu digo" (1).


Referência:
(1) LISPECTOR, Clarice. Texto publicado numa montagem artística de fotos com textos de Clarice, sem indicação da fonte.

10

"O que verdadeiramente somos é aquilo que o impossível cria em nós" (1).


Referência:
(1) LISPECTOR, Clarice. Texto publicado numa montagem artística de fotos com textos de Clarice, sem indicação da fonte.

11

Sabemos muito bem que não basta viver como não basta saber. É necessário ser o que se sabe. Não basta viver sentindo, é necessário ser o que se sente. Ser sabendo e sentindo é deixar eclodir o sentido enquanto vigorar do ser. Sem sentido o viver e sentir perdem o vigorar do viver sendo. Então a questão que nos orienta e origina torna-se a questão do sentido do ser vivendo e do viver sendo sentido. O que nos faz falta é o sentido do ser.


- Manuel Antônio de Castro

12

Por já vigorarmos, por tudo já vigorar no ser, ele não é fundamento de nada, porque ele simplesmente vigora, independentemente de minhas nomeações e reflexões. Ele está tão próximo, tão próximo que até já desde sempre o somos e nele somos o que somos. Mas nossa procura do saber do ser acaba se desviando para o saber imperfeito e limitado e não nos abrimos para o seu sentido que é o máximo de saber, porque o seu sentido é o silêncio em que ele vigora e se dá a ver e a saber (que são o mesmo). O sentido, o silêncio, o vazio são o mais presente do presente, são sempre o já vigorando e sem o qual nada se dá a saber e a ver. Vigorar diz fundar, dar-se e retrair-se, desvelar-se e velar-se, mas jamais distanciar-se num fundo perdido e inacessível. Ser é mistério porque por mais que seja tudo dele "nada" nos advém. É esse mistério que nos angustia e dá plenitude. Vivemos nesse entre.


- Manuel Antônio de Castro

13

"Assim devemos dizer que o horizonte de ser, como condição fundamental de todo perguntar deve constituir um horizonte sabido-não-sabido por mim. Assim perguntar pelo ser eu só poderei se o ser significar sempre para mim um não-sabido além de ser algo de sabido, e assim sucede que meu não-saber do ser nunca seja totalmente redutível a um saber, pois então se dissolveria a possibilidade de perguntar pelo ser e, igualmente, a possibilidade de qualquer outra pergunta. Assim o ser - como horizonte fundamental e original, sabido e não sabido ao mesmo tempo - deve constituir para o homem um mistério original, fundamental, e como tal, inesgotável" (1).


Referência:
(1) HUMMES, o.f.m., Frei Cláudio (Hoje Cardial Hummes). Metafísica. Mimeo, p. 37. Apostila distribuída no Curso de Filosofia, em Daltro Filho (hoje Imigrantes), RS, 1963, p.36.

14

"É que o ser não somente não pode ser definido, como também nunca se deixa determinar em seu sentido por outra coisa nem como outra coisa. O ser só pode ser determinado a partir de seu sentido como ele memso. Também não pode ser comparado com algo que tivesse condições de determiná-lo positivamente em seu sentido. O ser é algo derradeiro e último que subsiste por seu sentido, é algo autônomo e independente que se dá em seu sentido" (1).


Referência:
(1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. Posfácio. In: HEIDEGGER, Martin. Ser e tempo. Trad. Márcia Sá Cavalcante Schuback. 2. e. Petrópolis: Vozes, 2006, p. 551.


15

"Ao que de ordinário nos rodeia, os objetos particulares (=os "objetos"), chamamos também de ente, o que é. Porém, este "é", ao nível do ente, não é, por sua vez, algo de ente, senão o que deixa primeiro a todo ente ser um Ente e por isso o rodeia de cuidados e o protege. Chamamo-lo Ser" (1).


Referência:
(1) HEIDEGGER, Martin. La pobreza. Buenos Aires: Amorrutu, 2006, p. 103.


16

"Mas a palavra mais importante da língua é uma única letra: é. É. Estou no seu âmago. Ainda estou. Estou no centro vivo e mole. Ainda. Tremeluz e é elástico. Como o andar de uma negra pantera lustrosa que vi e que andava macio, lento e perigoso. Mas enjaulada não - porque não quero. Quanto ao imprevisível - a próxima frase me é imprevisível. No âmago onde estou, no âmago do É, não faço perguntas. Porque quando é - é. Sou limitada apenas pela minha identidade. Eu, entidade elástica e separada de outros corpos" (1).


Referência:
(1) LISPECTOR, Clarice. Água viva. Rio de Janeiro: Artenova, 1973, p. 32.

17

Ser é agir e agir se manifestando é o advir do sentido e da verdade, tanto do que é, quanto do como se conhece, isto é, transforma no ser humano a vivência em experienciação, daí no ser humano não haver apenas vida, mas o existir.


- Manuel Antônio de Castro

18

"Que o que gasta, vai gastando o diabo de dentro da gente, aos pouquinhos, é o razoável sofrer. E a alegria de amor - compadre meu Quelemém diz. Família. Deveras? É, e não é. O senhor ache e não ache. Tudo é e não é..." (1).


Referência:
(1) ROSA, João Guimarães. Grande sertão: veredas. Rio de Janeiro: José Olympio, 1968, p. 12.

19

O ser é a unidade de tudo que é, o silêncio fundador do sentido. Toda fala é fala do sentido, do ser. Por isso, Rosa diz: “Tudo é e não é.” (1), porque o ser é ser do vir-a-ser ou transformar e do permanecer, que, em grego, recebeu o nome arche, traduzido como princípio. Princípio é o que originando tudo jamais se esgota e, portanto, é o que, no incessante fluxo das mudanças, permanece. Se muda é porque ainda não é. O é do que não é, sendo, é o que permanece.


- Manuel Antônio de Castro
Referência:
(1) ROSA, João Guimarães. Grande sertão: veredas. Rio de Janeiro: José Olympio, 1968, p. 12.

20

No poético, as línguas são o rito da Linguagem. O mito narrado não é o mito, mas o rito e a língua da Linguagem. Por isso o poético, toda arte, tem origem mítica. E tanto o mito como a arte radicam no sagrado. Martin Heidegger afirma: "O pensador diz o ser, o poeta nomeia o sagrado" (1) (2).


(1) HEIDEGGER, Martin. "Que é metafísica? - Posfácio (1943)". In: Heidegger - Os Pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1979, p. 51.
(2) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ulisses e a Escuta do canto das Sereias". In: -----. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 155.

21

Distinguir ser e ente não é fácil, tratando-se do pensamento grego, é sobretudo uma questão de pensamento e tradução. Vejamos. Em Carta sobre o humanismo, à p. 24 diz Heidegger: "Por isso, em sentido próprio, só pode ser consumado o que já é. Ora, o que é, antes de tudo, é o Ser ". Porém, na mesma obra à p. 56 esclarece: "O gibt (dá) evoca a Essência do Ser, que se doa, concedendo a sua Verdade. O dar-se a si mesmo com a abertura à abertura é o próprio Ser. Ao mesmo tempo, emprega-se o es gibt (se dá), para evitar, por enquanto, a locução: o Ser é; pois o é se diz comumente daquilo que é. E a isso chamamos ente" (1).


Referência:
(1) HEIDEGGER, Martin. Sobre o humanismo. Trad. Emmanuel Carneiro Leão. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 56.

22

"Por isso, para Píndaro o drama mais arcaico da humanidade está na condição ontológica de simplesmente ser e/ou não ser, ao mesmo tempo, o quer dizer, que seja num perpétuo vir a ser a todo instante. A Quinta Ode Pítica nô-lo proclama num verso glorioso:
Epameroi, ti de tis; ti d'ou tis;
sikias onar anthropos!
Efêmeros seres de um só dia, que é ser alguém?
Que é ser ninguém?
Um homem, sonho de uma sombra! (1)


Referência:
LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Édipo em Píndaro e Freud". In: ---. Filosofia contemporânea. Daimon, Teresópolis/RJ: 2013, p. 67.

23

Sentença - III.
"... to gar auto noein estin te kai einai" (1). "...pois o mesmo é pensar e ser" (1).


Referência:
(1) PARMÊNIDES. Sentença III, (Trad. Sérgio Wrubleswski). In: Os pensadores originários - Anaximandro, Parmênides, Heráclito. Petrópolis / RJ: Vozes, 1991, p. 44 / 45.

24

"Ser não é um conceito abstrato: são as possibilidades, enquanto propriedades, que cada um de nós recebe para poder ser no sendo o não-ser" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. “A menina e a bicicleta: arte e confiabilidade”. In: ------. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 282.

25

"Viver já estamos vivendo. Morrer já estamos morrendo sempre. Viver é morrer para que morrendo vivamos. O que isso implica? Uma procura permanente e radical: ser o que não-é, ou seja, ser feliz. Onde ser feliz é ser o não-ser. Não é apenas uma negatividade positiva, é toda a positividade do ser feliz. Negatividade, fora das relações funcionais entitativas, jamais indica mal, só o bem (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. “O mito de Midas da morte ou do ser feliz”. In: ------. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 206.

26

"Somente no agir o ser é totalmente ele mesmo. Ser é agir e vice-versa. (Não se pode jamais confundir agir com fazer. Aquele inclui este, mas este não inclui aquele)" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O ser, o agir e o humano". In: ---. Leitura: questões. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2015, p. 30.

27

"Alberto Caieiro, o poeta-pensador, já o disse poeticamente:
"Mas isto (tristes de nós que trazemos a alma vestida!),
Isso exige um estudo profundo,
Uma aprendizagem de desaprender" . (Poema XXIV)
"Procuro despir-me do que aprendi,:
Procuro esquecer-me do modo de lembrar que me ensinaram,
E raspar a tinta com que me pintaram os sentidos" ... (Poema XLVI) (1)


Isso é enigmático porque devemos aprender para desaprender, ter para renunciar, porque só renunciando chegamos a ser o que temos, porque só podemos ter o que somos e só podemos ser o que temos. Portanto, não há uma incompatibilidade entre ter e ser. Entra aí uma terceira dimensão nesse jogo dialético entre ter e ser, e ser e ter: o desprendimento, a renúncia, porque a renúncia não tira, dá. Nesse jogo dialético se torna também claro o jogo entre identidade e diferença. A identidade nos remete para o horizonte do fundar, do ser, do nada. Já a diferença nos mostra em que consiste o próprio, (ter), que só o nada, (ser), pode fundar. Enfim, toda aprendizagem é um desaprender.


Manuel Antônio de Castro.


Referência:
(1) PESSOA, Fernando. Alberto Caeiro. S. Paulo: Cia. das Letras, 2004, p. 60, 84.

28

"O sofrimento e a alegria, o ser afetado, tomado por uma força, são relações com o ser. Mas no mundo do voluntarismo absoluto em que a técnica o mergulha, o homem não sente mais a dor, ou a sente de modo somente passivo, e, portanto, ressentido e reativo. É principalmente em sua indiferença frente às consequências destrutivas da técnica, que o "funcionário da técnica" mostra sua insensibilidade e seu extremo fechamento, pois nele, o mais angustiante é sua incapacidade de se angustiar" (1).


Referência:
(1) UNGER, Nancy Mangabeira. "Heidegger e a espera do inesperado". Rio de Janeiro: Editora Tempo Brasileiro. Revista Tempo Brasileiro: Interdisciplinaridade dimensões poéticas, 164, Jan.-mar. 2006, 179.

29

"Ser é deixar-se tomar pelo vigorar do silêncio. É tomar a posição do acontecer do silêncio, isto é, a não-posição, como fonte de toda e qualquer possível posição" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O mito de Cura e o ser humano". In: ---. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 272.

30

Não basta ter conhecimentos, é preciso ser o que se conhece. Há aqui uma tensão entre ser e ter. Emmanuel Carneiro Leão trata da questão do ter no ensaio "Leitura órfica de uma sentença grega" (1). Trata-se do "ter linguagem". Em que sentido se emprega o "ter"? Diz Márcia Schuback: "'Ser' homem para o grego é 'ter' logos (...) Ser homem para o grego significa, sobretudo, estar na disposição do logos. De modo algum, o homem 'tem' logos como uma propriedade dada genética, natural. Tem o logos enquanto uma disposição para empenhar-se pelo logos" (2).


- Manuel Antônio de Castro
Referências:
(1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. Aprendendo a pensar II. Petrópolis: Vozes, 1992.
(2) SCHUBACK, Márcia Sá Cavalcante. "As cordas serenas de Ulisses". In: Ensaios de filosofia. Petrópolis: Vozes, 1999, p. 174.

31

"Mistério vem do verbo grego myo. E myo diz: trancar-se no centro, concentrar-se; diz: encerrar-se no âmago, recolher-se ao íntimo. Aqui, centro, âmago, íntimo, evocam a raiz da intensidade, o sumo da plenitude. Mistério não diz uma coisa, diz um movimento, o movimento de con-sumar, de concentrar-se na origem, de recolher-se à natividade da raiz, de retornar ao sem fundo e fundamento, ao a-bismo de ser. As palavras, Deus, Absoluto, Transcendência, Inconsciente, Espírito, Matéria, Psique, Estrutura, Ser são outras tantas redes em cujas malhas o poder do saber ocidental na teologia, na filosofia, na ciência, sempre de novo tentou, mas nunca conseguiu, prender e segurar a natividade do mistério" (1).


Referência:
(1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. “Heidegger e a modernidade: a correlação de sujeito e objeto”. In: ------------. Aprendendo a pensar, II. Petrópolis / RJ: Vozes, 1992, p. 180.


32

"P - O vazio é então a mesma coisa que o nada, isto é, o vigor que procuramos pensar como o outro de toda vigência e de toda ausência?
J - De certo... Para nós, o vazio é o nome mais elevado para se designar o que o senhor quer dizer com a palavra ser" (1).


Referência:
(1) HEIDEGGER, Martin. "De uma conversa sobre a linguagem entre um japonês e um pensador". In: Ensaios e conferências. Petrópolis: Vozes, 2003, p. 87.


33

"Fala da médica:
"Elisabet, não creio que haja motivos para ficar no hospital. Só lhe faz mal ficar aqui... Pensa que não entendo? O inútil sonho de ser, não parecer, mas ser. Estar alerta em todos os momentos. A luta: o que você é com os outros e o que você realmente é. Um sentimento de vertigem... e a constante fome de finalmente ser exposta. Ser vista por dentro, cortada até mesmo eliminada. Cada tom de voz, uma mentira. Cada gesto, falso. Cada sorriso, uma careta... Mas pode se recusar a se mover e ficar em silêncio. Então, pelo menos, não está mentindo. Você pode se fechar, se fechar para o mundo. Então não tem que interpretar papéis, fazer caretas, gestos falsos. Acreditaria que sim, mas a realidade é diabólica. Seu esconderijo não é à prova d'água. A vida engana em todos os aspectos. Você é forçada a reagir. Ninguém pergunta se é real ou não, se é sincera ou mentirosa. Isso só é importante no teatro, talvez nem nele. Entendo por que não fala, por que não se movimenta. Sua apatia se tornou um papel fantástico. Entendo e admiro você. Acho que deveria representar este papel até o fim, até que não seja mais interessante. Então pode esquecer, como esquece seus papeis" (1).


Referência:
(1) BERGMAN, Ingmar. Filme Persona. A médica está se dirigindo à personagem Elisabet, atriz de teatro que, de repente, fica em silêncio e se nega a falar. Não esqueçamos que personagem vem de Persona.


34

"Fora da tradição metafísica, a questão do destino se coloca dentro da questão fundamental da Totalidade harmônica do Cosmos, do Ser. Mas o que é o Ser? Não pode ser um conceito nem fundamento, mas o que vigora como silêncio, sentido, linguagem" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ulisses e a Escuta do Canto das Sereias”. In: -----. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 163.

35

"A experiência do Ser do ponto de vista mítico-poética é diferente da experiência filosófico-metafísica" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ulisses e a Escuta do Canto das Sereias”. In: ---. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 163.

36

"O que é o Ser para a experiência grega, mítica, arcaica? O Ser se “manifesta como numinoso e na qual [experiência grega arcaica] o universo não é senão um conjunto não-enumerável de teofanias” (Torrano, 1992: 74)(1). Tudo sendo teofanianuminosa é importante entender que tanto “‘faculdades mentais’” de Zeus como os atributos constitutivos da natureza mesma de Zeus [...] são Divindades com esfera de existência e de atribuições própria” (Torrano: 1992, 76). A experiência filosófica de Ser, sobretudo a partir de Platão e Aristóteles, e mais tarde com o platonismo e aristotelismo, empobrece a riqueza do pensamento mítico.
"Na verdade, o pensamento mítico, servindo-se de figuras não-conceituais, de imagens concretas e ideações plásticas, servindo-se de relatos e de fábulas (i.é, disto em que se constituem propriamente os mythoi e os hieroi lógoi, os “mitos” e os “relatos sagrados”), coloca em seus próprios termos [...] o problema da relação entre a Alteridade e a Ipseidade. Zeus é ele-Mesmo e o Outro; o Outro é tanto o Outro quanto é o Mesmo [...] A Alteridade coincide com a Ipseidade tanto quanto dela difere: o Outro é o Mesmo (coincide com o Mesmo) tanto quanto é – na referência ao Mesmo – o Outro (difere de si Mesmo) (Torrano: 1992, 77)" (2) "(3).


Referência:
(1) TORRANO, Jaa. O sentido de Zeus. São Paulo: Iluminuras, 1996.

37

" "Para o pensamento mítico a alteridade e identidade “possibilita a relação de concomitância onto-cronológica (isto é, tanto temporal como ontogenética) que substitui a relação de causa e efeito” (Torrano: 1992, 77) (1). Dessa maneira, a manifestação do Ser no pensamento arcaico se reveste de um aspecto só aparentemente oposto, porque desdobramento da dobra originária, ou seja, de Zeus e suas uniões, manifestações do próprio sagrado (2).


Referências:
(1) TORRANO, Jaa. "O mundo como função de Musas". In: Teogonia. São Paulo: Iluminuras, 1992.
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ulisses e a Escuta do Canto das Sereias”. In: ---. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 165.
(2) TORRANO, Jaa. O sentido de Zeus. São Paulo: Iluminuras, 1996.
(3) : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ulisses e a Escuta do Canto das Sereias”. In: ---. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 165.

38

"O esquecimento do poder verbal da palavra é tão forte e dominante que, gramaticalmente, o verbo ser, o verbo de todos os verbos, não passa de um verbo de ligação ou auxiliar de outros. Um parasita. Nessa tradição, o esquecimento do destinar-se do sentido do ser nos projeta em interpretações substantivo-subjetivas e não em interpretações verbais, como é o próprio acontecer da realidade, ao qual devemos estar atentos e abertos para sua escuta" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Dialética e diálogo: A verdade do humano". In: Revista Tempo Brasileiro, 192, Dialética em questão I. Rio de Janeiro, jan.- mar., 2013, p. 10.


39

"Só o estar é substantivo, o ser é e será sempre verbal, energia irradiante, nada criativo" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Dialética e diálogo: A verdade do humano". In: Revista Tempo Brasileiro, 192, Dialética em questão I. Rio de Janeiro, jan.- mar., 2013, p. 12.


40

"P - O vazio é então a mesma coisa que o nada, isto é, o vigor que procuramos pensar como o outro de toda vigência e de toda ausência?
J - De certo. É por isso que no Japão logo entendemos a conferência O que é metafísica? que nos chegou em 1930, numa tradução feita por um estudante japonês, seu ouvinte. Ainda hoje estranhamos que os europeus pudessem ter caído na armadilha de interpretar niilisticamente o nada discutido na conferência. Para nós, o vazio é o nome mais elevado para se designar o que o senhor quer dizer com a palavra ser..." (1).


Referência:
(1) HEIDEGGER, Martin. "De uma conversa sobre a linguagem...". In: ----. A caminho da Linguagem. Trad. Marcia Sá Cavalcante Schuback. Petrópolis (RJ): Vozes. Bragança Paulista (SP): Editora Universitária São Francisco, 2003, p. 87.


41

"A poética é todo e qualquer fazer que produza o encanto de transformar algo que não é no que este algo virá a ser. Ela não ouve, ela não vê, ela não sente, ela dá-se. Dá-se como tempo e espaço em que estes são suspensos respectivamente, como cronologia e extensão, e afirmados como tempo e espaço vividos. Ela se dá como medida concreta. Como medida concreta de tempo e espaço, isto é, ser. Quando ela se dá instaura simultaneamente tempo e espaço e, ao mesmo tempo requisita um fazer para tudo que ela não é. Ela instaura os corpos como fazeres. Cada parte do corpo é. Essa é a magia" (1).


Referência:
(1) JARDIM, Antônio. "Permanência e atualidade da Poética". In: Tempo Brasileiro, 171, out.-dez., 2007, p. 5.


42

"O mesmo é pensar e O mesmo é ser, para o sujeito O mesmo, mas este não pode vigorar sem o ser sendo, enquanto vigorar do ser em cada e em todo é. Mas para ser tal vigorar, o é de cada proposição não pode se tornar um verbo fraco, de mera ligação, em virtude do poder do sujeito, aqui neste caso, do mesmo. Pelo contrário, é impossível o mesmo vigorar na proposição como sujeito sem o vigorar do é, isto é, do ser. É nesse sentido que o ser enquanto é é o ser de todos os verbos e é o fundar do sujeito no que este se enuncia enquanto fundamento" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. Citação retirada do ensaio "Espelho: o perigoso caminho do auto-diálogo". Ainda não publicado.


43

"O que nos faz falta é o sentido do ser. O que é o sentido? Dessa maneira tudo que acontece fora do sentido é falta, que é o mal radical. É mal porque sem o sentido de ser a vida perde o seu motivo de viver. Mas o que nos motiva o viver? O simplesmente estar ou no e por estar sendo deixar o ser ser o motivo, isto é, o sentido? Como se pode viver sem sentido? E quem dá o sentido? A perda de sentido não é já deixar estar o mal nos secando?" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "A gota d’água e o mar". In: -----. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 245.


44

"Sabemos muito bem que não basta viver e/ou saber. É necessário ser o que se sabe. Não basta viver sentindo o que é, é necessário ser o que se sente. Ser sabendo e sentindo é deixar eclodir o sentido enquanto vigorar do ser. A perda do sentido do viver é que acarreta o poder secar. A falta de sentido conduz ao secar. Sem sentido tanto o viver como o sentir perdem o vigorar do viver sendo" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "A gota d’água e o mar". In: -----. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 244.


45

"Como pensar, então, o ser? Pensar o ser é o caminho que nos conduz a uma possível resposta. Não devemos, porém, superestimar o pensar, ou seja, o seu poder de formular perguntas e respostas, nem esquecê-lo. Isso se dá porque pensar significa deixar-se tomar pela questão. É deixar a realidade se manifestar enquanto sentido e verdade: mundo, linguagem" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "A gota d’água e o mar". In: -----. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 246.


46

"Em todo ato, o vigorar já vigora em sua plenitude, mas como esta não é um fim, mas uma consumação, a essência do agir tem sua medida no agir da essência, daquilo de quem recebemos nosso destino: o ser. Ser é verbo, o vigorar de todo agir. Ser então é a necessidade necessária" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Liberdade, vontade e uso de drogas". In: ----. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 277.

47

"De todas as coisas eu posso perguntar: o que “é”? O que “é” isto? O que “é” aquilo? Também posso perguntar por tudo de uma só vez: o que “é” isto tudo? O que “é” a totalidade e a unidade de tudo aquilo sobre o que posso perguntar? Nada de tudo o que é pode fugir à possibilidade de ser perguntado se “é” e o que “é”. E enquanto ela é perguntável justamente por seu “é”, ela é de todo perguntável, pois todo o que ela é entra neste seu “é”. E também posso perguntar para além de todos os limites por tudo simplesmente, e sempre de novo esta pergunta será sobre o “é” de tudo o que ultrapassa os limites imagináveis. Significa que tudo aquilo a que posso dirigir minha pergunta - e isto significa tudo o que “é” de uma ou de outra forma - tem sua unidade fundamental no fato de que “é”; de cada coisa da realidade em particular e da realidade como totalidade, devo dizer que é perguntável por seu “é”. Ora, o que “é”, nós chamamos de ente" (1).


Referência:
(1) HUMMES, o.f.m. Cláudio. Metafísica. Mimeo. Daltro Filho / Imigrantes, RS, 1963. Depois tornou-se Bispo e hoje é Cardeal.

48

"Ora, todos os entes não concordam nisto de que são isto ou aquilo segundo uma grande variedade, mas nisto que todos “são”, ou seja de que de cada um posso dizer que “é”. Por isto perguntar pelo ente enquanto ente significa perguntar por aquilo pelo qual o ente “é”, pelo qual um ente é um ente. Ora, ente é ente pelo fato de que ele “é”. Assim podemos finalmente dizer, ente é ente por virtude do ser" (1). Aqui se coloca a questão da identidade e da diferença. Para não cair no abstrato do conceito é necessário manter sempre o vigorar e a questão da proximidade e da distância.


- Manuel Antônio de Castro.
Referência:
(1) HUMMES, o.f.m. Cláudio. Metafísica. Mimeo. Daltro Filho / Imigrantes, RS, 1963. Depois tornou-se Bispo e hoje é Cardeal.

49

Por já vigorarmos, por tudovigorar no ser, ele não é fundamento de nada, porque ele simplesmente vigora, independentemente de minhas nomeações e reflexões. Ele está tão próximo, tão próximo que até já desde sempre o somos e nele somos o que somos. E, seguindo Parmênides, o mesmo é ser e saber. É este ser e saber como o mesmo que se torna a questão do educar originário. Mas nossa procura do saber do ser acaba se desviando para o saber imperfeito e limitado e não nos abrimos para o seu sentido que é o máximo de saber, porque o seu sentido é o silêncio em que ele vigora e se dá a ver e a saber. O sentido, o silêncio, o vazio são o mais presente do presente, são sempre o já vigorando e sem o qual nada se dá a saber e a ver. Em virtude de nosso limite de entre-ser temos a tendência a entificar o ser, o saber, o silêncio, o vazio, o nada.


- Manuel Antônio de Castro.

50

"... devemos dizer que eu só posso perguntar o que ainda não sei. A pergunta só pode surgir de um saber que-não-sabe. Ora, como vimos, a possibilidade de qualquer pergunta se funda na possibilidade de perguntar pelo ser. Por isto, o ser deve significar para mim também um horizonte não-sabido. Assim devemos dizer que o horizonte de ser, como condição fundamental de todo perguntar deve constituir um horizonte sabido-não-sabido por mim. Assim perguntar pelo ser eu só poderei se o ser significar sempre para mim um não-sabido além de ser algo de sabido. E assim sucede que meu não-saber do ser nunca seja totalmente redutível a um saber, pois então se dissolveria a possibilidade de perguntar pelo ser e, igualmente, a possibilidade de qualquer outra pergunta" (1). É o que se tenta dizer com a liminaridade, com o entre-ser em que vigora o ser humano.


- Manuel Antônio de Castro.
Referência:
(1) HUMMES, o.f.m. Cláudio. Metafísica. Mimeo. Daltro Filho / Imigrantes, RS, 1963. Depois tornou-se Bispo e hoje é Cardeal.

51

"Assim o ser - como horizonte fundamental e original sabido e não-sabido ao mesmo tempo - deve constituir para o homem um mistério original, fundamental e como tal, inesgotável. Nunca meu saber poderá compreender exaustivamente o horizonte do ser. Por isto nunca se esgotará minha capacidade de perguntar e ao mesmo tempo minha necessidade de perguntar pelo ser dos entes. A pergunta pelo ser é essencial ao homem, expressão de sua essência: o homem é o perguntador simplesmente, é quem pode e deve simplesmente perguntar, é quem pergunta pelo ser, é quem pode e deve simplesmente perguntar pelo ser - esta é sua essência, vista através do prisma do exercício da pergunta, como típico exercício do sentido do ser do homem pelo homem mesmo. Karl Rahner (2) diz: “O homem existe como pergunta pelo ser.” " (1).


Referência:
(1) HUMMES, o.f.m. Frei Cláudio. Metafísica. Mimeo. Daltro Filho / Imigrantes, RS, 1963. Depois tornou-se Bispo e hoje é Cardeal.
(2) Karl Rahner, cf. seu livro “Geist in Welt”: Espírito no Mundo.

52

A essência do agir se funda numa ambiguidade: perguntamos e no perguntar quem, em última instância, se pergunta, porque só podemos ter vontade de perguntar porque já vigoramos no querer do ser, é o ser.


- Manuel Antônio de Castro.

53

"O ser é o princípio da realidade do ente, a essência é o princípio da limitação da realidade do ente" (1).


Referência:
(1) HUMMES, o.f.m. Frei Cláudio. Metafísica. Mimeo. Daltro Filho / Imigrantes, RS, 1963. Depois tornou-se Bispo e hoje é Cardeal.

54

"O ser é o fundamento interno da realidade do ente, do conteúdo entitativo do ente. Mas ser como fundamento do ente não coincide totalmente com este ente, como se fosse apenas fundamento deste ente aqui. O ser como ser é o fundamento de todos os entes. Por isto mesmo é que com o ser não está posta nenhuma limitação no ente, mas ele precisa de outro princípio que seja o princípio de limitação, a saber, o que chamamos de essência. O ser é o princípio da realidade do ente, a essência é o princípio da limitação e determinação do ente. Ser não é essência e essência não é ser sem mais; um não se identifica com a outra. Há uma diferença entre ser e essência, que está posta no ente finito e que pertence essencialmente ao ente finito" (1).


Referência:
(1) HUMMES, o.f.m. Frei Cláudio. Metafísica. Mimeo. Daltro Filho / Imigrantes, RS, 1963. Depois tornou-se Bispo e hoje é Cardeal.

55

"O ser como tal é positividade pura, plenitude total, sem sombra de falta de algo, sem sombra de negatividade. Ele continua sendo-o virtualmente em nós, embora a nossa finitude atual faça com que sejamos apenas algo e não tudo. Em consequência sentimo-nos continuamente movidos, do interior de nós mesmos, a expandir-nos sempre mais para além de nós mesmos, a conquistar sempre mais a realidade que nos cerca, seja pela inteligência, conhecendo-a, seja pela vontade, amando-a, seja pela técnica, pondo-a a nosso serviço, seja por tantas outras formas de fazer com que a realidade se torne nossa, para assim cumular nossa pobreza congênita do ser. Numa palavra, podemos dizer que somos atualmente finitos, mas virtualmente infinitos" (1). Como hoje a palavra virtual tomou um sentido de representações digitais possíveis, seria melhor, talvez, falar em possibilidades concretas, em vigorar da energia do ser e sua possível manifestação como luz e claridade.


- Manuel Antônio de Castro.
Referência:
(1) HUMMES, o.f.m. Frei Cláudio. Metafísica. Mimeo. Daltro Filho / Imigrantes, RS, 1963. Depois tornou-se Bispo e hoje é Cardeal.

56

"Pode-se estar sem ser? Ser sem estar? Ser não é estar e estar não é ser? Com essa formulação não há o perigo de se cair em mais uma dicotomia funcional e metafísica, tão presentes na cultura ocidental? O melhor caminho para evitar as dicotomias é sempre questionar em lugar de simplesmente conceituar. Portanto, questionemos: O que é ser? O que é estar? Ora, as respostas não serão conceitos? Não. São os passos que nos reencaminham para as questões de ser estando e de estando ser" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ser e estar". In:------. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 21.

57

"A grande incompreensão e banalização em relação ao ser dão-se, justamente, em virtude de nunca se pensar que não há estar sem o ser e que é este e somente este que possibilita qualquer estar, seja referente aos estados internos e externos, seja referente às circunstâncias onde corre e decorre nossa existência: pessoal, social, familiar, econômica, histórica, afetiva, psíquica, política, dentre outras, ou seja, ainda em relação às conjunturas" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ser e estar". In:------. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 24.

58

"Só gramaticalmente há o ser, pois o ser não existe, não-é. Em virtude dessa aporia, a gramática faz do ser algo absurdo (e ainda se diz lógica e coerente): ser é verbo de ligação, muitas vezes nem expresso, porque tal ligação, na evidência de sua sem importância, nem aparece. De fato, o ser não é. Ele dá-se, retraindo-se; fala, silenciando. E como poderia a ciência, ou seja, a gramática, tratar do silêncio, fundar-se no silêncio, que é sem coesão e coerência, porque sem ser não há nem se pode falar em coesão e coerência" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ser e estar". In:------. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 25.

59

"Revela-se que o Ser é o encanto das Vozes (isto é, as Musas) e as Musas não são outra coisa que a múltipla Presença do Divino" (1). "Relação entre linguagem e ser, ou seja: entre o Canto em seu encanto e a aparição do que se canta, e consequentemente entre a Revelação (alétheia) e o Esquecimento (lesmosýne/léthe)" (2). "A rigor, não há na Teogonia uma relação entre linguagem e ser, mas uma imanência recíproca entre eles" (3).


Referências:
(1) TORRANO, JAA. "Introdução". In: Hesíodo. Teogonia. Trad. JAA Torrano. São Paulo: Iluminuras, 1992, p. 28.
(2) Idem, p. 29.
(3) Idem, p. 29.
Ver também:
*Música
*Mito
*Êxtase

60

"Assim, o princípioex nihilo nihil fit ”, “de nada não se cria nada”, só vale para as transações do já criado. Para o élan criador no sentido estrito, vale o inverso: “ ex nihilo omnia fiunt ” Aqui o princípio é: “é do nada que tudo se cria”. Por isso é que o mestre Eckhart no século XIV, o pai da mística renana, podia dizer para os criacionistas de todos os tempos: “ Esse est Deus et Deus est nihil ”. “ Ser é Deus e Deus é Nada ” (1).


Referência:
(1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "O que significa pensar?". In: Revista da Academia Brasileira de Letras, maio-junho, 2012.

61

"O ser não pode ser. Se fosse, já não seria ser, mas um ente. Contudo, o primeiro pensador que pensou o ser, Parmênides, não diz: Esti gar einai" (frag. 6)? Há, de fato, ser e está presente o ser presente. Temos que pensar que se, efetivamente, no einai, o ser presente, está falando a aletheia, o desvelar-se, acentuado no esti e dito do einai, é : o deixar que venha à presença. Ser: na realidade o que permite a presença"(1).


Referência:
(1) HEIDEGGER, Martin. In: A tese de Kant sobre o ser. Trad. Helena Cortés e Arturo Leyte. Madri: Alianza Editorial, 2007, p. 387. (Tradução do espanhol: Manuel Antônio de Castro).
Ver também:
*Presença

62

"Quando percorremos os sentidos principais de sedeo, notamos que, em primeiro lugar, está em tensão com -sto, indicando posições inversas a este. De outro lado, notamos que sedeo acaba realizando os mesmos sentidos que aparecem nas raízes de ser. Significa permanecer, habitar, ou seja, é dotado do mesmo poder de ser. É o poder do repouso e do silêncio" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ser e estar". In:------. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 52.

63

"Mas a fala do silêncio é mais do que relação e comunicação. São, portanto, linguagem, sentido e mundo que possibilitam as posições como posições, isto é, são as possibilidades de tempo e mundo e suas circunstâncias. Sem ser não há linguagem, sentido e mundo" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O próprio como possibilidades". In:------. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 130.

64

"Única aproximação da riqueza interna do ser, ou melhor, da estrutura interna do ser, se fez ao revelar-se o ser como agir, enquanto o agir não apenas convém a determinada forma de ser, mas a tudo quanto participa do ser e enquanto participa do mesmo. Porém, não se esgota aqui nossa possibilidade de exprimir a riqueza interna do ser, que transcende – como agir – toda e qualquer forma particular de ser e que convém necessariamente a tudo que participa do ser e enquanto participa do ser" (1).
Esta participação no ser acontece na justa medida do que lhe é próprio. E nesse próprio nos advém a questão das propriedades. Seriam estas os transcendentais. Claro que eles não poderiam se manifestar no próprio sendo senão na medida em que se fundam no ser. Porém, para nós finitos, haverá sempre a proximidade da distância e a distância da proximidade. Nesta tensão consiste a nossa travessia em direção e na volta para casa, no dizer de Rosa, volta para o ser enquanto sentido do próprio que será o sentido do ser. É no sentido do ser que nos manifestamos fundados nos transcendentais: uno, verdadeiro, bom, belo. São, portanto, atributos essenciais, sem dúvida nenhuma, e não meramente circunstanciais, pois dizem respeito a todos os sendos, naquilo que constitui a sua essência enquanto sentido. Perguntar-se pelo sentido do ser é perguntar-se pelos transcendentais.


- Manuel Antônio de Castro.
Referência:
(1) HUMMES, o.f.m. Frei Cláudio. Metafísica. Mimeo. Daltro Filho / Imigrantes, RS, 1963. Depois tornou-se Bispo e hoje é Cardeal.

65

"... só como analogia se pode pensar o ser no âmbito dos transcendentais, pois é a questão do próprio sendo e não e jamais do ser. Por estarmos no ser é que pensamos e devemos pensar os transcendentais enquanto o sentido que nos dá sentido enquanto cada um é um próprio. Será, contudo, sempre um pensar que pensa em nossa liminaridade de seres do entre, seres metafísicos, a proximidade e a distância. Esta far-se-á presente em cada transcendental" (1).


Referência:
(1) HUMMES, o.f.m. Frei Cláudio. Metafísica. Mimeo. Daltro Filho / Imigrantes, RS, 1963. Depois tornou-se Bispo e hoje é Cardeal.

66

O ser é e não é, é verdadeiro e não-verdadeiro, belo e não-belo, bom e não-bom, justamente porque o ser é e não-é, isto é, sem o ser nenhum sendo pode ser, mas nenhum sendo é o ser. O ser é nada de ente e de tudo que lhe diz respeito, mas, de outro lado, tudo que diz respeito ao sendo só pode provir do ser. Dessa maneira, os transcendentais são a concreticidade do ser. Tal concreticidade será sempre a dobra de ser e pensar, de ser e estar. Dobra é entre-ser.


- Manuel Antônio de Castro.

67

"A nossa experiência cotidiana do mundo faz encontrar-nos com uma grande multiplicidade de entes. Quando tomamos a pergunta como ponto de partida de nossa investigação metafísica, constatamos reflexivamente que somos capazes de perguntar por tudo sem limitações. Mostrou-se também que perguntar por tudo não significava perguntar uma por uma todas as realidades particulares, mas, sim, a capacidade de ultrapassar todas as particularidades e perguntar de uma vez por tudo, num ato unificador através da pergunta. A pergunta assim revelava-se como eminentemente unificante, já que por ela não se unificam apenas algumas realidades particulares, mas todas de uma vez. Porém, poder unificar a tudo através da pergunta, ou seja, poder perguntar por tudo de uma vez, só é possível se tudo forma realmente uma unidade original. Em que consiste esta unidade fundamental? A isto podemos responder respondendo à pergunta: Em virtude de que a pergunta unifica tudo? Quando eu pergunto: “O que é isto?”, “O que é aquilo?”, “O que é tudo isto?”, a própria pergunta nos responde: a unidade de todo o perguntável é constituído pelo “é”, que é comum a tudo aquilo que eu pergunto, é constituída pelo fato de que o ente é, posto no ser e em virtude do ser. Ora, de tudo posso dizer que “é”. Logo posso perguntar por tudo unificando a tudo em virtude do ser. O ser é a unidade de todo o perguntável e de todo o conhecível, a unidade de todos os entes" (1).


Referência:
(1) HUMMES, o.f.m. Frei Cláudio. Metafísica. Mimeo. Daltro Filho / Imigrantes, RS, 1963. Depois tornou-se Bispo e hoje é Cardeal.

68

Conhecer o ser que nos foi dado é renunciar aos limites que o ser jamais tem, por isso somos, mas estamos próximos e distantes do ser, isso para dizer o quanto nos é difícil deixarmo-nos tomar pelo conhecer do ser. É um agir tão difícil e tão especial que ele é sem intencionalidade. Essa é a difícil tarefa do amar, isto é, amar é não ter intencionalidade, por isso é um agir que não satisfaz, mas leva à conquista do único que satisfaz: o conquistar-se, pois no sermos reside a plenitude, conquistar é conquistar-se no que já desde sempre somos. E este é sem intencionalidade. É dessa maneira que o que está fora não pode nos satisfazer. O que está fora nunca para de poder ser substituído, mas só o insubstituível nos satisfaz, pois o insubstituível é sem limites. Pensar é ser.


- Manuel Antônio de Castro.

69

" Ser é obedecer como Escuta à voz do destino, o contrário seria a morte, não cumprindo o destino pelo qual cada um se apropria do que lhe é próprio. A ação de Ulisses é guiada pelo con-sumar o que é e não pela satisfação de um desejo cuja extensão seria uma satisfação subjetiva de pura curiosidade: como seria o canto das Sereias?" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ulisses e a Escuta do Canto das Sereias”. In: -----. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 174.

70

"Só serei feliz se souber querer a essência do agir para ser. Se for no que ajo e conheço, serei feliz. Isso significa: temos muitos empenhos na vida, muitas ações, mas só uma e tão-somente uma é essencial – aquela que implica ser, ser e nada mais. Ser é, portanto, conhecer-se a partir do que já é, do vigorar do ser" (1).


Referência bibliográfica:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O mito de Midas da morte ou do ser feliz". In: -------. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 193.

71

"Por que, então, achar que a consumação do que cada ente é, telos, em grego, deve consistir numa dissolução indiferenciante, num ser indiferenciado, se o que cada um é não lhe é dado pelos limites, mas pelo tempo-ontológico como doação do ser, que, para simplesmente ser, só pode ser a diferença das diferenças, embora se faça presente no presente com que presenteia cada ente-ser? Como se daria então a referência ser (não-mais-ente) / diferença como referência ao ser e como referência aos outros seres-não-mais-entes? Uma coisa fica clara. Cada ser-ente e cada ser-não-mais-ente é sempre uma doação do ser. Daí que o ser que doa só pode doar a partir da sua riqueza e não e jamais a partir do niilismo ou do ser como um abstração generalizante. Não é esse o ser que Heráclito nos convida a pensar sempre, quando diz: "tudo é um", indicando esse "tudo" riqueza de doação e plenitude?" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. Linguagem: nosso maior bem. Série Aulas Inaugurais. Faculdade de Letras, UFRJ, 2o. sem. / 2004, p. 21

72

"O ser, portanto, é doação, presentificação. O que é essa doação nós a experienciamos em nós mesmos. E só cada um pode se experienciar e dizer-se linguagem / ser, nosso maior bem como escuta. Mas o ser humano, porque é dizer-com - homolegein, no dizer de Heráclito -, procura sempre compreender e dizer o que é essa plenitude de doação. É realmente o único penhor de todas as nossas ações, pelas quais, sendo, poderemos ser o que somos: felizes" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. Linguagem: nosso maior bem. Série Aulas Inaugurais. Faculdade de Letras, UFRJ, 2o. sem. / 2004, p. 24.

73

"Quem não cultiva o silêncio não pode falar a fala do que é. E que desafio maior existe para cada um senão ser? Não qualquer coisa ou um outro qualquer, e até um outro que amamos. Ser só se é própria e apropriadamente quando marcamos um encontro sempre inadiável com o que nos é próprio. E o que nos é próprio ninguém pode dizê-lo nem ensinar. Silêncio não é falta de voz ou som, não é pausa de música ou fala. O silêncio é ruidoso, oprime e liberta, é dor e alegria, dissolve a subjetividade e plenifica o ser de cada um. O silêncio é o máximo de fala, quando falar só se consegue calando. O silêncio é o mergulho no mais profundo do entre/interior de todo horizonte em que já estamos sempre lançados e projetados e aliciados. O silêncio é o silêncio do culpado e do inocente. O silêncio é a concentração máxima da poiesis como essência de todo agir. A verdadeira e fundante poesia é sempre poesia do silêncio" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio. "As três pragas do século XXI". In: Confraria - 2 anos. Rio de Janeiro: Confraria do Vento, 2007, p. 19.

74

"O ser é memória e por isso esta é o que há de mais misterioso em nós" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Leitura". In: ---------. Leitura: questões. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2015, p. 86.

75

"Que é isso o que somos? Aqui podemos nos mover numa dupla articulação. (1)No plano do ente: O que é? Pois tudo que é é ente. (2)Ou, o que é necessário, movermo-nos no plano do ser do ente. Neste caso, o alcance da resposta será medido não pelo ente, mas pelo ser do ente. Isso significa que a resposta não se dá nunca no âmbito do ser, mas apenas e tão-somente no plano do ente. Significa isto que a resposta só em parte é resposta, porque ela nunca se dá no plano do ser, mas somente no plano do ente enquanto ente do ser. Ou seja, a resposta vai sempre ser paradoxal, pois responde no plano do ente, embora se mova, e só pode se mover, no plano do ser" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Heidegger e as questões da arte”. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). Arte em questão: as questões da arte. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 14.

76

"No fazer artístico não apenas o ser se dá em seu sentido fundando os sentidos, mas se dando constitui o ser humano em seu sentido. Por isso, não é o ser humano que faz a arte. Pelo contrário, a arte é que constitui o ser humano enquanto sentido de destino" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Heidegger e as questões da arte”. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). Arte em questão: as questões da arte. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 35.

77

"Em português, o verbo ser origina-se do verbo latino sedere: assentar-se repousando no recolhimento. Daí a “sedesignificar a casa central. Em sua vigência, legein / legere fertilizam tanto a fala e o discurso, quanto o ouvido e a escuta. Fundando estes, ouvir é escutar o agir do legein / legere do ser, pelo qual se dá a reunião e recolhimento na memória do curso da história" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O ler e suas questões". In: ---------. Leitura: questões. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2015, p. 21.

78

Realização é o vir a ser da realidade no seu manifestar-se em real, ou seja, a totalidade dos entes (ta onta), dos fenômenos. Como tal, todo fenômeno é uma realização da realidade constituindo o real. Toda realização é oblíqua e dissimulada porque nela a realidade se dá e retrai, se manifesta e vela. Toda realização é uma doação do ser. Daí podermos falar de real e irreal, de ideal e real, porque este, em verdade, é a vigência do vigor da realidade pondo-se e depondo-se nas realizações. O Ser é doação enquanto tempo, presença, mundo, sentido e realização.


- Manuel Antônio de Castro

79

"A energia poética é a essência de todo agir e o sentido de todo fazer e até do não agir e do não fazer, do ser e do não-ser. Enfim, é a realidade de todas as realizações" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Poético-ecologia". In: Manuel Antônio de Castro (org.). Arte: corpo, mundo e terra. Rio de Janeiro: 7Letras, 2009, p. 17.