Ser humano

De Dicionrio de Potica e Pensamento

Ser humano, ver também homem, Humano e Ser-com.

Tabela de conteúdo

1

O que o ser humano é não são seus estados e circunstâncias, isto é, sua inserção historiográfica, mas suas possibilidades de e para possibilidades. Isto nos dá vertigem, porque vivemos em cada vivência na atração do abismo do nada, do possível. Mas poderíamos ter riqueza maior? Daí nossa permanente atração pelo nada criativo.


Referência:
CASTRO, Manuel Antonio de. "Ser e estar". In: Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempor Brasileiro, 2011, p. 28.

2

"Para mim o ser humano é uma tremenda criação, um pensamento inconcebível. No ser humano existe tudo, do mais elevado até o mais baixo. O homem é a imagem de Deus e Deus existe em tudo. E assim o ser humano foi criado, mas também os demônios, os santos, os profetas, os artistas e os iconoclastas. Tudo existe lado a lado. É como se fossem desenhos gigantes mudando o tempo inteiro. Da mesma maneira devem existir inúmeras realidades. Não apenas a realidade que percebemos com nossas obtusas sensibilidades, mas um tumulto de realidades arqueando-se uma em cima da outra, por dentro e por fora. É só o medo e o puritanismo que nos levam a acreditar em limites. Não existem limites. Nem para pensamentos nem para sentimentos. A ansiedade é que estabelece os limites" (1).


Referência:
BERGMAN, Ingmar. Fala da personagem "Eva", em relação à morte do filho de quatro anos, no filme: Sonata de outono.

3

" O nome, e só o Nome, é decisivo, pois só então o ser humano se constitui em ser humano. Nesta locução "ser humano", o atributo não é o decisivo, como normalmente se pensa. Todo atributo só pode ser atributo se vigorar no e a partir do ser. O humano só chega ao humano quando se deixa dimensionar pelo ser" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O mito de Cura e o ser humano". In: -----------. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 231.

4

"... o ser humano em sua Essência é uma doação do Ser. Este, doando-se enquanto pensamento e linguagem, é que possibilita ao ser humano consumar o que é, isto é, conhecer e chegar a conhecer-se nas e fora das disciplinas que são, em última instância, uma doação do Ser, da realidade" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O ser humano e seus limites". In: MONTEIRO, Maria da Conceição e Outros (org.). Além dos limites - ensaios para o século XXI. Rio de Janeiro: EDUERJ, 2013, p. 229.

5

"O ser humano, desde Édipo - o mito imemorial que pensa o humano no que lhe é próprio em sua essência sócio-político-histórica - sempre teve a pretensão de ser o sujeito das suas escolhas e realizações. A Moira sorri, em silêncio, diante de tais pretensões, deixando-o iludir-se, em seu pseudo-poder racional de dar-se a existência, segundo a liberdade fundada na sua vontade. É uma ilusão que custa caro e gera o sofrimento de muitos fracassos inúteis" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Eduardo Portella, o professor". In: Quatro vezes vinte - Eduardo Portella - Depoimentos. Rio de Janeiro, Academia Brasileira de Letras, 2012, p. 40.

6

"Para os antigos egípcios, o homem, como um Universo em miniatura, representa as imagens de toda a criação. Já que Ra - o impulso criativo cósmico - é chamado de Aquele que reuniu, surgiu a partir de seus membros, então, o ser humano (a imagem da criação) é, similarmente, Um que reuniu. O corpo humano é uma unidade formada por diferentes partes colocadas juntas. Na Litania de Ra, cada uma das partes do corpo do homem divino é identificado com um neter/netert "(1).


Referência:
(1) GADALLA, Moustafa. "O Ser Humano". In: ---. Cosmologia egípcia - o universo animado. Trad. Fernanda Rossi. São Paulo: Madras Editora, 2003, p. 91.

7

"O on traz em si a ambiguidade da referência do ser à essência do ser humano, do limite e do não-limite, pois todo ser humano enquanto este e aquele humano é limite, e enquanto ser é não-limite".


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O próprio como possibilidades". In: -----. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 129.

8

"O que isso significa? Aqui se impõe ainda uma explicação mais profunda do ser humano, como constituído pelo ser e pela essência, pois todo ser humano é e é o que cada um é, ou seja, cada um tem seu próprio, isto é, aquela essência que faz com que ele seja ele e não outro qualquer ente (sendo)" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O ser, o agir e o humano". In: ---------. Leitura: questões. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2015, p. 31.).

9

"Há três principais estados para as criaturas animadas. O primeiro é aquele d' Annwfn (Abismo), que constitui a sua origem. O segundo é aquele d' Abred (Existência), que eles devem atravessar tendo por fim se instruírem. O terceiro é o Gwyfydd (Mundo branco) onde eles todos conseguirão chegar no acréscimo indefinido do Poder, do Conhecimento e do Amor, até ao ponto de não mais ser possível adquirir mais" (1).


Referência:
(1) Llewelyn Sion. Tríadas da ilha da Bretanha (1560). Textos apresentados por Jean Markale. Paris: Albin Michel, Cadernos de Sabedoria, 2004, p. 25. Tradução do francês: Manuel Antônio de Castro.

10

"A essência do ser humano é a sua referência ao ser. Daí não poder ficar determinada pelo instrumental ditado seja lá por qual sistema for. Nesse sentido de disciplina e sistema, a dança é o não-conhecimento porque é o não-sistema, porque é o livre dar-se e manifestar-se do que cada um já desde sempre é. Dança é sempre travessia, história, obra. E obra é o que opera. Opera o quê? A educação do humano pelo deixar vigorar o seu princípio constitutivo. Aqui está a questão. O princípio constitutivo do humano é o estético ou o poético? Dança não pode ficar reduzida a vivências estético-sentimentais, a um espetáculo para os olhos ou prazeres dos sentidos" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Aprender com a dança: fluxos e diálogos poéticos”. In: TAVARES, Renata (org.). O que me move, de Pina Bausch – e outros textos sobre dança-teatro. São Paulo: LibersArs, 2017, p. 82.

11

"O ser humano independente de cultura, tempo e lugar, sempre se depara com essa questão. O que é, afinal, a procura e o acontecer? O que nos provoca, move e comove tão profunda e incessantemente, com e para além de nossa consciência?" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O mito de Cura e o ser humano". In: ---. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 213.

12

"Se já nos descobrimos vivendo nas questões, queiramos ou não queiramos, também só podemos viver na procura das respostas, sempre e inevitavelmente provisórias. O ser humano, sendo, é sempre radicalmente provisório. Mesmo quando não se coloca explicitamente a questão, essa ausência já é uma resposta, que jamais evitará a questão: a “coisa”, a morte" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O mito de Cura e o ser humano". In: ---. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 214.

13

"O traço fundamental da Modernidade é a fundação do ser humano como sujeito, enquanto este sujeito é o exercício da razão. Ao se construir e ao construir racionalmente a realidade, fundando as ciências, algo imemorial no ser humano foi confrontado: a sua memória mítica. A compreensão do ser humano a partir dos mitos foi considerada i-lógica, frente à concepção lógica (racional)" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Poético-ecologia". In: CASTRO, Manuel Antônio de, (org.). Arte: corpo, mundo e terra. Rio de Janeiro: 7Letras, 2009, p. 26.

14

" - O que aprendeu com clientes famosos, como Maradona e a família Kirchner?"
" - Todos nós, seres humanos, necessitamos que nos amem, que nos aceitem e que nos valorizem. Todos. Atrás de todo excesso, seja de trabalho, de amor, de dinheiro, de poder, de prestígio, de fama...atrás de cada excesso, há uma carência, alguma coisa que faltou. O único elemento que dá paz e ordem a seu cérebro é o amor. É impossível não estar feliz se houver amor de boa qualidade" (1).


Referência:
(1) PICASSO, Juan Antônio - terapeuta cogninitivo-comportamental. In: O GLOBO, p. 2, 30-11-2017. Entrevista dada a GABRIEL ROSA.

15

"Seja para o pensamento, seja para as artes, Éros sempre foi a grande questão, sendo a mais tematizada, interpretada e aprofundada. Por detrás do seu agir, como aquilo que o move, está sempre o Amor do amar. Dessa maneira, há uma certa impropriedade em se falar de Éros como algo substantivo, pois remete facilmente para a sua interpretação e compreensão como algo, como um ente. E não é isso Éros. Como essência do agir é total e completa energia de realização, é luz irradiante em contínuo acontecer. E isso já nos obriga a compreender o que é o corpo do ser humano, em toda a sua complexidade e densidade, muito além de um simples organismo e seu funcionamento. O ser humano, sendo essencialmente o agir de Eros, jamais pode ser reduzido a um corpo orgânico ou mecânico ou virtual. Sendo filhos, como somos de Pênia, a Pobreza, pro-curamos pelo que nos é necessário: o Bem) (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Eros, humano e os humanismos". In: MONTEIRO, Maria Conceição e outros (org.). Eros, Tecnologia, Transumanismo. Rio de Janeiro: FAPERJ, Editora Caetés, 2015, p. 45.

16

"Ora, ninguém é comum. Sem dúvida, há uma pesada estratégia de mercado, que constrói sobre a equalização de ser humano e subjetividade. A partir dessa equalização, reconhecemos como próprio não o que somos, mas o que realizamos sobre ou em relação aos demais. É um sentido terceirizado, relacional, do próprio: identidade" (1).


Referência:
(1) LIRA, André. "O ciborgue frente ao real". In: Revista Tempo Brasileiro: globalização, pensamento e arte, 201/202, abr.-set., 2015, p. 81.

17

"As evidências inquestionáveis que acontecem na dobra tensional de ser e essência do ser humano são:
1ª. Todo ser humano é uma doação presentificadora da phýsis;
2ª. Toda cultura é manifestação da phýsis, enquanto o efetivar-se das possibilidades do humano do ser humano.
Estas duas evidências inquestionáveis nos colocam diante de duas questões em tensão ou dobra permanente: phýsis e ser humano, onde a cultura, como lugar do acontecer dessa tensão, tanto se refere à phýsis quanto se refere ao ser humano. Sem essa referência poética não há cultura nem o humano de todo ser humano se manifesta. Há cultura onde houver sentido e vigorar da linguagem. As diferenças culturais se fundam no acontecer do sentido do ser enquanto linguagem. Tal fundar dá-se e constitui a essência do agir do ser humano. O ser humano torna-se humano quando se experincia no horizonte do sentido do ser e na medida em que habita a linguagem, casa do ser" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. " Phýsis e humano: a arte”. In: ---. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 263.

18

"Já que o ser humano é uma réplica do Universo, uma criança humana, normalmente é concebida, formada, e nasce em nove meses. O número 9 marca o fim da gestação e o fim de cada série de números" (1).


Referência:
(1) GADALLA, Moustafa. "Ra, Força Criativa Cósmica". In: ---. Cosmologia egípcia - o universo animado. Trad. Fernanda Rossi. São Paulo: Madras Editora, 2003, p. 68.

19

Por isso, o índice mais radical do ser humano, a nossa condição, é o não-ser, o nada, a morte. Diante da morte, toda racionalidade se esvai e não resta senão a arrogância niilista, horizonte no qual o humano do homem perde o sentido e sabedoria.


- Manuel Antônio de Castro.

20

"Um ser humano nasce como bebê, se converte em um menino, passa pela juventude, a flor da sua existência. E finalmente volta ser um bebê, antes da sua morte. Esta é, em minha opinião, a forma ideal de vida. Creio que estaria de acordo com que um ser humano chega a ser capaz de produzir obras puras, sem restrição alguma, nos dias da sua segunda infância. Agora tenho 77 anos de idade e estou convencido de que meu verdadeiro trabalho está apenas começando" (1). "Kurosawa viria a falecer em 1998, aos 88 anos de idade, dez anos depois de escrever a carta a Bergman" (2).


Referência:
(1) DIEGUES, Cacá. "A vida começa aos 80". Crônica publicada em O Globo, Caderno Opinião, segunda-feira, 8-07-2019, p. 3. A citação refere-se a uma carta enviada por Kurosawa a Bergman, quando este fez 78 anos.
(2) DIEGUES, Cacá. Transcrição da carta de Kurosawa a Bergman, ditado por Cacá Diegues, na referência anterior.

21

"Todo o mito (toda travessia humana) gira em torno da fala e da escuta" (1). Todo mito é uma experienciação poética da travessia humana, pois todo mito se tece e entretece em torno da alguma questão ou algumas questões. É nestas que todo ser humano realiza a sua travessia.


- Manuel Antônio de Castro.
Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ulisses e a Escuta do Canto das Sereias”. In: ---. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 157.

22

"É necessário retomar o ético de todo conhecimento, na medida em que este tem, necessariamente como medida ontológica e princípio de realização, o humano. O que está faltando é se pensar com radicalidade a essência do agir em tudo, sobretudo no educar do ser humano, uma vez que fazer ainda não é ser. E só na vigência deste se age essencialmente. Não basta fazer é necessário ser o que se faz" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "A globalização e os desafios do humano". In: Revista Tempo Brasileiro, 201/202 - Globalização, pensamento e arte. Rio de Janeiro, abr.-set., 2015, p. 24.

23

"Se globalização é rede, há necessidade para o humano de uma rede poética. Será mais uma rede na feira das redes ou ela se propõe ser mais do que uma entre outras tantas redes? O que nessa rede está em rede? Quando dizemos rede poética não estamos já pensando a essência da rede, se ela por ser poética for ontológica? É o grande desafio: pensar o que nos dá o sentido de existir. O que nos leva a constituir uma rede poética não são os humanismos, nem mais um humanismo, mas o que em todo ser humano o constitui como próprio: é o humano de todo ser humano. Eis o motivo que move a rede poética" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "A globalização e os desafios do humano". In: Revista Tempo Brasileiro, 201/202 - Globalização, pensamento e arte. Rio de Janeiro, abr.-set., 2015, p. 25.

24

"O ser humano simplesmente não está aí entre os outros entes, as coisas como tais. Já vimos que além de viver e ter as suas vivências, o ser humano constitui-se na medida em que faz da vida vivida uma vida experienciada. Ele procura sempre o conhecimento. Mas isso ele só pode fazer porque não conhece o que procura, pois se já o conhecesse não precisava procurar. Uma tal procura do que se é, denomina-se questionar. Por outro lado, se de maneira nenhuma não já conhecesse nem poderia questionar. Isto significa que já está aberto para o poder conhecer o que ainda não conhece" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Interdisciplinaridade poética: o entre". Revista Tempo Brasileiro: Interdisciplinaridade: dimensões poéticas. Rio de Janeiro: 164, jan.-mar., 2006, p. 24.

25

"Está em jogo o profundo mistério da tensão entre ser-humano E ser. É dentro dessa tensão que o ser-humano aparece, queira ou não queira, como um ente-da-liminaridade. Liminaridade significa aí o estar jogado num projeto de realização do que é a partir do ser. Na liminaridade o agir do ser-humano, e só é agindo, sendo poético, encontra o seu vigor e seu horizonte no ser. Seu agir é, pois, algo entre o agir do ser que nele opera (obra/verdade/poiesis) e o seu agir, enquanto desvelo do que ele é. Essa dupla poiesis é que é o paradoxo, o entre. Ser, então, para o ser humano é estar e ser entre, permanentemente. Ele é, queira ou não queira, um entre-ser, porque é um ser-do-entre. Realiza-se sempre na e a partir da liminaridade de “on/ente” E “einai/ser”" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Interdisciplinaridade poética: o entre". Revista Tempo Brasileiro: Interdisciplinaridade: dimensões poéticas. Rio de Janeiro: 164, jan.-mar., 2006, p. 25.

26

"...Uzodinma quis saber se me incomodava ser tratado por mulato. Nunca me reconheci em classificações racistas. Na verdade, nem sequer me reconheço no meu nome, que me soa tão alheio agora quanto me soava quando era criança. Acho tão estranho ser apresentado como branco, quanto como mulato ou indiano - o que também acontece. Nenhuma raça me define. Não sou uma raça. Respondi que aquela palavra tanto pode magoar quanto celebrar ou acarinhar. O que magoa é o sentimento que nela coloca quem a utiliza" (1).


Referência:
(1) AGUALUSA, José Eduardo. "Palavras más". Crônica publicada no "Segundo Caderno", de O Globo, sábado, 21-09-2019, p. 8.

27

"Para o ser humano, crescer não exclui, inclui, porque é mais do que atualizar as possibilidades do código genético. Com isso, o amar recebe toda a sua amplitude. Pois crescer nessa disponibilidade para o apelo tanto do que nos advém do operar do céu quanto da terra é que é amar" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Amar e ser". In: -----. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 302.


28

Não há dúvida nenhuma de que o ser humano muito mais do que ser racional como normalmente se afirma é ser da memória. E isso está cada vez mais se tornando a grande questão em relação ao ser humano. Mas de que memória falamos? Do ponto de vista da ciência, ele já é definido de acordo com seu código genético, ou seja, sua memória genética. E do ponto de vista da técnica, ele cada vez mais é pensado a partir da realidade digital e sendo programado pela inteligência artificial. Mas quando pensamos sua essência, isto é, seu próprio, ele ultrapassa essas concepções, porque ele vigora no e a partir do nada criativo, tendo sempre como presença a energia de sentido e realização como linguagem. É no horizonte do nada criativo que ele recebe e realiza o que lhe foi doado como destino. Diziam os gregos: Moira.


- Manuel Antônio de Castro.

29

O ser humano vive sempre na angústia do nada, pois, de um lado, se descobre sempre, em sua finitude, diante do infinito externo e, de outro, do infinito interno. Só aparentemente estes dois infinitos se opõem, mas se diferenciam. E assim o ser humano vive o dilema, melhor, a angústia de uma eterna aprendizagem de procura de si mesmo. Eis sua riqueza maior: sua finitude como destino de procura até a morte. Neste sentido, a morte é uma necessidade ontológica e jamais o término de tudo. Não será pelo contrário o começo permanente de tudo? Nesse horizonte tanto a psicologia e a psiquiatria quanto toda e qualquer cosmologia se experienciam como sendo as mesmas questões. Daí o enigma e mistério em que vive todo ser humano desde que nasce. Para muitos o difícil é seguir permanentemente esse caminho. Procuramos desesperadamente a resposta dessas questões. E o que aí a ciência pode fazer? Se for verdadeira ciência, pôr-nos a caminho de nos pensarmos.


- Manuel Antônio de Castro.

30

A realidade e o ser humano são muito, mas muito mais do que finalidades funcionais dentro de sistemas de relações, sejam elas quais forem. É que a linguagem, fundamentalmente, não é funcional nem relacional. A linguagem é a unidade do incessante eclodir da realidade em sua verdade e sentido.


- Manuel Antônio de Castro.

31

O pré-saber é o sentido do Ser, em que já nos movemos simplesmente. Para o ser humano trata-se sempre do saber, isto é, do sentido do Ser. O Ser é tão imediato, tão presente, tão sem questionamento, que aquilo que se torna questão para o ser humano é o sentido do ser, isto é, o saber do Ser. Toda a nossa questão é o saber. É no e do saber do Ser que surgem as questões: linguagem, sentido, mundo, verdade. Porém, o pré-saber vigora no não-saber e saber, portanto, há também a não-língua(gem), o não-significado/sentido, o não-mundo/mundo, a não-verdade/verdade. É o que tentamos denominar como silêncio e vazio e nada. Do silêncio, do vazio, do nada, nada podemos dizer, somente experienciá-los. É a condição de nossa finitude, a nossa condição humana.


- Manuel Antônio de Castro.

32

Cada ente, enquanto ser humano, na sua diferença ontológica, ocupa uma posição na realidade e ele recebeu possibilidades absolutamente positivas que fazem com que ele seja o que ele é e não outro, ou seja, um próprio. São possibilidades tão dinâmicas que jamais chegamos a conquistá-las em toda a sua riqueza. Daí o desafio de nos conhecermos no que somos. Por isso, a racionalidade moderna não pode jamais reduzir o ser que cada um é ao determinado por um modelo, mesmo de diferentes teorias, sociais ou psicológicas. Pelo contrário, há a matriz/’’’matrix’’’ (ser) que nos torna inesgotáveis. E é dessa riqueza inesgotável que nos falam as obras de arte. E é por isso que para cada um o viver se torna uma tarefa poética. As obras de arte são como velas onde se concentra uma enorme energia que precisa ser acesa/lida para que a leitura as transforme em chamas que nos iluminam, mas iluminam no sentido de chegarmos a nos conhecermos e libertarmos.


- Manuel Antônio de Castro.

33

"... a crítica acerba ao sistema hegeliano, feita pelos existencialistas (a começar por Kierkegaard), precisamente com a acusação de que, em Hegel, chegou ao seu auge uma filosofia do sujeito, mas em quem o homem concreto, este sujeito concreto, acabou se perdendo na identidade absoluta do sujeito infinito. No sistema hegeliano, o homem concreto e individual não tinha mais sentido como tal. Ora, diziam os existencialistas, é o homem concreto que se trata de salvar e de explicar" (1).
O ser humano faz parte essencialmente da realidade. O lugar do ser humano no todo da realidade é que se torna a grande questão. A experiência histórica, desde Esparta, é que não se pode reduzir a realidade e nela incluído o ser humano a um sistema, por mais ideal que seja, pois a realidade é não se reduzirá jamais a um sistema, pois ela em sua essência é um processo contínuo e complexo. Esse processo é a História como Sentido do Ser.
E é como processo e no processo que cada ser humano encontra o seu sentido de realização. Ele é experienciado por cada um de acordo com seu próprio e manifestado nas obras de arte. A obra de arte inclui trabalho, sentido e existência.


- Manuel Antônio de Castro.
Referência:
(1) HUMMES, o.f.m. Frei Cláudio. Metafísica. Mimeo. Daltro Filho / Imigrantes, RS, 1963. Depois tornou-se Bispo e hoje é Cardeal.

34

"Ora, o homem concreto, eu concretamente existente, não posso ser reduzido a uma definição essencial fixa de uma vez para sempre, diz o existencialismo. E isto precisamente porque o próprio do homem é o escolher. E não se trata de um escolher considerado abstratamente ou como não afetando o meu ser, mas um escolher em toda a sua concretude, em que eu mesmo “entro em jogo, numa tensão existencial entre um ou outro caminho que posso escolher. Por isto nunca se dá um escolher neutro, mas sempre toda escolha significa um escolher-se a si mesmo. Existir, para o homem, significa escolher continuamente ou sua autenticidade ou sua inautenticidade. E é neste sentido que nós, segundo a escolha que fazemos, segundo o modo como nos escolhemos e nos realizamos pela escolha, nos damos a essência: eu sou apenas aquilo que escolho ser. É este o significado fundamental do dito existencialista: “a existência precede a essência”, terminando assim com toda a teoria de um valor filosófico atribuído às essências possíveis, mas ainda não existentes, teoria tipicamente racionalista" (1).
Evidente que o ser humano como ser humano não tem esse poder. É, no fundo, a radicalização do racionalismo. O ser que somos nos foi doado. Porém, a realização deste ser que nos foi doado exige uma caminhada de apropriação, pois todas as nossas escolhas são regidas pela lei do que nos é próprio ou como diziam os gregos: por nossa Moira. E ninguém pode fugir à sua Moira.


- Manuel Antônio de Castro.


Referência:
(1) HUMMES, o.f.m. Frei Cláudio. Metafísica. Mimeo. Daltro Filho / Imigrantes, RS, 1963. Depois tornou-se Bispo e hoje é Cardeal.

35

"A essência de todo ser humano, porém, é ser uma dobra de finito e não-finito, de sendo e pensando. No e pelo pensar nos redimensionamos em nossa finitude constitutiva" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ser e estar". In:------. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 24.

36

"Nunca podemos perder totalmente de vista nosso ponto de partida: a pergunta, ou seja, o homem que se exerce como perguntador, exprimindo assim seu ser próprio" (1). E se exercitando inteiramente no e como saber, como conhecer, de tal maneira que em primeira instância a questão do ser humano é o saber e não propriamente o ser, pois este já está dado. Por isso ele tem que agir sempre, sendo essa a sua caminhada para chegar a ser o que já lhe foi doado.


- Manuel Antônio de Castro.
Referência:
(1) HUMMES, o.f.m. Frei Cláudio. Metafísica. Mimeo. Daltro Filho / Imigrantes, RS, 1963. Depois tornou-se Bispo e hoje é Cardeal.

37

"Educar, em seu sentido originário e radical diz ex- : para fora; e ducere: conduzir, levar. Educar é conduzir para fora, fazer desabrochar, fazer eclodir o ser humano que cada um é, e não entulhar o educando com conhecimentos externos. Para fora não indica um deslocamento espacial, mas a irrupção estruturante do vigor do ser do homem. Educar é fazer desabrochar em plenitude de liberdade o que cada ser humano é" (1).


Referência:
CASTRO, Manuel Antônio de. "Ficção e literatura infantil". In: ------------. Tempos de Metamorfose. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1994, p. 135.

38

"Uma reflexão mínima nos mostra que pensar a formação integral do ser humano se faz dentro de algumas questões básicas, decorrentes da essência do humano, interligadas entre si. Claro que a escolha destas questões é problemática. No entanto, pensando o ser humano sem sistemas logo nos são colocadas as questões que não podem ser omitidas" (1).


Referência:
(1) : CASTRO, Manuel Antônio de. “O mito de Midas da morte ou do ser feliz”. In: ------. ‘’Arte: o humano e o destino’’. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 186.

39

"A ligação do pensamento heraclitiano com o mítico é muito importante, porque a filosofia inaugurada com os sofistas e com o platonismo se esmera em combater os mitos e o pensamento mítico. E nisso esquecem a questão fundamental para o sentido do ser humano: a questão do destino. Neste esquecimento se inscreve a afirmação de Protágoras: O homem é a medida de todas as coisas. Numa posição completamente diferente afirma o pensador Platão: O sagrado/deus é a medida de todas as coisas. O pensador não apreende theos como o fundamento causal que ele se tornará depois. Só aparentemente se afasta do mítico, uma vez que ele não cessa de se servir dos próprios mitos. O afastamento de Platão é muito mais em relação aos ritos retóricos e vazios, que deram lugar à presença viva e atuante do eidos como doação de possibilidades sempre inaugurais. Não é sem motivo que no mito da caverna a plenitude ainda vem da luz, ou seja, Zeus originário. O pensamento de Platão, originário, torna-se doutrina nos platonismos. E com ela fenece o vigorar do pensamento, pois este é sempre questão" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ulisses e a Escuta do Canto das Sereias”. In: -----. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 169.

40

"É necessário denunciar e anunciar que a linguagem – que faz do ser humano, humano – antes de ser científica e lógica – é essencialmente sábia. A via do ser humano não é a via do conhecimento técnico-científico só. É também e, sobretudo, essencialmente a vida e via da sabedoria. Sabedoria desde tempos imemoriais se realiza como poiesis do sagrado" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio. "As três pragas do século XXI". In: Confraria - 2 anos. Rio de Janeiro: Confraria do Vento, 2007, p. 18.

41

"Édipo é o próprio ser humano como questão. Ele não tem ascendência divina, não é um deus. No entanto, nele comparecem todas as questões essenciais em que todo ser humano se vê envolvido. Mas não é um ser humano abstrato, uma essência que está não se sabe onde. Não. A concreticidade de sua realidade está no agir constante e ambíguo pelo qual busca o sentido do que ele é em meio ao enigma do real, do qual ele é participante indissolúvel. Quanto mais Édipo (todo ser humano) procura fugir do destino mais ele o realiza. Ele está sempreentre” o agir da sua vontade e inteligência, e o agir da vontade e saber da Moira (destino). Todo agir essencial do ser humano é ambíguo. Ele é sempre um ser-do-entre" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Heidegger e as questões da arte”. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). Arte em questão: as questões da arte. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 22.

42

"Cada ser humano é antes de tudo também real e do real, mas a grande questão que o real coloca para o ser humano é que ele é uma doação do real e, ao mesmo tempo, cada ser humano deve “realizar” esse mesmo “real” de maneira diferente. Eis aí em poucas palavras a questão central do sentido do ser. Ele se destina no ser humano para que cada ser humano, pelo agir como sentido, realize o próprio ser em seu sentido. O ser humano como doação do real é uma doação ambígua. Por isso, quando a esfinge propõe o primeiro enigma e Édipo responde: o homem, este é e não é a resposta, por um motivo muito simples. Toda questão tem e não tem resposta" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Heidegger e as questões da arte”. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). Arte em questão: as questões da arte. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 22.

43

"Édipo, o ser humano, procura sempre a verdade, pois esta constitui o real do que ele é. Édipo em sua resposta não percebeu imediatamente, como em geral não percebemos, que a verdade se constitui de duas irmãs. O percurso poético de Édipo será o percurso do dia, da razão, da inteligência, da percepção, do conhecimento à chegada da noite, à não-luz (cega-se), ao não-conhecimento, à não-ação, ao não-poder, ao silêncio, à sabedoria, à morte. Vida e luz, noite e morte" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Heidegger e as questões da arte”. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). Arte em questão: as questões da arte. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 28.

44

"No fazer artístico não apenas o ser se dá em seu sentido fundando os sentidos, mas se dando constitui o ser humano em seu sentido. Por isso, não é o ser humano que faz a arte. Pelo contrário, a arte é que constitui o ser humano enquanto sentido de destino" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Heidegger e as questões da arte”. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). Arte em questão: as questões da arte. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 35.

45

"Educar não é uma questão de escola e currículo. É uma questão de ser, de humanizar-se sendo o que recebeu para ser. O humano de todos os homens é inerente a todas as épocas, povos e suas culturas. Desde a eclosão do ser humano na vida, há educar porque ele diz respeito à eclosão de mundo, sendo indissociável da essência do ser humano e da verdade no acontecer da realidade. Educar diz respeito sempre, portanto, à realização poética do ser humano enquanto vigora na verdade do sentido do ser" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Educar poético: diálogo e dialética". In: ..... e outros. O educar poético. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2014, p. 15.

46

"A imagem-questão, como a linguagem, não é, dá-se. E, dando-se, é. Por isso, a obra de arte, enquanto operar de poiesis, não é ente. Como a linguagem, é doação do ser. Em vista disso, a imagem-questão não é ente, a obra-de-arte não é ente, como a verdade (aletheia) não é ente. A verdade (aletheia) não pode ser um paradigma, um ethos-valor-moral. É uma força divina, uma deusa. Enquanto imagem-palavra, a imagem é linguagem e, como a linguagem, não-é" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Obra de arte e imagem-questão". In: ---------. Leitura: questões. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2015, p. 235.

47

De maneira alguma devemos pensar a dzoé, a vida de todo ser vivo, no sentido classificatório de gênero e espécie, de inferior e superior. Por exemplo, em relação à distinção do ser-humano, segundo a sentença órfica grega: Dzoion logon echon, animal racional, ou seja, ser vivo dotado de razão, numa tradução muito pobre. Não, dzoé não é animal nesse sentido genérico e lógico. Dzoé é vida, ou seja, todo e qualquer ser vivente: "No modo grego de pensar, o animal se determina a partir do dzoion, do que surge, resguardando-se, portanto, de modo muito peculiar em si mesmo, pelo fato de não se exprimir" (1). O grego quando quer denominar qualquer ser vivente diz bios.


- Manuel Antônio de Castro
Referência:
(1) HEIDEGGER, Martin. Heráclito. Trad. Márcia Sá Cavalcante Schuback. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 1998, 108.

48

O Nada é o véu do Ser. A questão do humano é propriamente essa referência. Nela o ser humano se defronta com o Nada. Originariamente o ser humano já está lançado no Nada, pois seu verdadeiro realizar-se é ser o não-ser que, paradoxalmente, ele já é, na medida em que o recebeu para ser, isto é, seu próprio. Os gregos denominaram o próprio de Moira. Apropriar-se do próprio é desafio cotidiano da caminhada da vida, que Rosa, apropriadamente, denominou Travessia.


- Manuel Antônio de Castro.

49

"O Homem atual "está em fuga do pensamento". Est fuga-aos-pensamentos é a razão da ausência-de-pensamentos. Contudo, tal fuga ao pensamento deriva do fato de o Homem não querer ver nem reconhecer essa mesma fuga. O Homem atual negará mesmo, redondamente, esta fuga ao pensamento. Afirmará o contrário. Dirá - e com pleno direito - que em época alguma se realizaram planos tão avançados, se realizaram tantas pesquisas, se praticaram investigações de forma tão apaixonada, como atualmente" (1).


Referência:
(1) HEIDEGGER, Martin. Serenidade. Lisboa: Instituto Piaget. Trad. Maria Madalena Andrade e Olga Santos, s/d., p. 12.

50

"O ser humano é a obra de arte em sua realização máxima" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "A coisa em questão". Ensaio não publicado.
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