Trabalho

De Dicionário de Poética e Pensamento

1

É uma questão que aparece na ascese cristã por oposição à gnose – daí o lema de S. Bento: " Ora et labora ", Ora e trabalha. Surge em Marx como possibilidade de realização do homem, fundada no humanismo. Mas aparece também no domínio puramente pragmático do agir instrumental. O leitor confira o livro de Merquior (1), p. 137. Retoma o tema depois à página 198 e seguintes, mas agora a propósito de Nietzsche.


- Manuel Antônio de Castro
Referência:
(1) MERQUIOR, José Guilherme. Saudades do carnaval. Rio de Janeiro: Forense, 1972, p. 137.

2

"A Terra é essencialmente a que se fecha-em-si. Elaborar a Terra significa: trazê-la ao aberto como a que se fecha a si mesma" (1).


Referência:
(1) HEIDEGGER, Martin. A origem da obra de arte. Trad. Idalina Azevedo da Silva e Manuel Antônio de Castro. São Paulo: Edições 70, 2010, p. 117.

3

Caminhar nas e com as questões dá o mesmo trabalho de limpar, arar, semear, plantar, o terreno e esperar a firme, mas lenta maturação do semeado para sua eclosão no e com o tempo propício. A semente para amadurecer precisa de três instâncias: a semente como tal, o terreno, o tempo de maturação. Notamos que a ação do homem - o trabalho - apenas agencia o que já tem ação em si mesmo, mas pelo ordenamento (legein) lhe dá sentido. Isso é o mesmo que questionar e aprender, porque quem medra enquanto aprender é o que se é, a vida que se recebeu e se é, o próprio. Desse trabalho surge o formar do que chega a desabrochar (infelizmente muitas sementes e seres humanos estiolam antes disso tudo acontecer), mas também a forma das obras de arte (e dos utensílios) e do próprio ser humano, que são indissociáveis, sendo impossível haver forma sem o triplo agir (trabalho em sentido amplo), onde se inclui e é necessário incluir o agir da natureza / physis, acima apresentado. Portanto, nada tem a ver com formalismos técnicos. Pelo contrário, é o que os gregos denominavam morphe, a presença da forma enquanto presença do agir e realizar-se. É nesse sentido que a obra de arte é aquela onde se faz presente não apenas uma forma, mas onde nesta vigora o próprio agir enquanto presença do sentido. Se considerarmos que a forma, de alguma maneira, introduz o limite, a presença enquanto sentido projeta o agir da obra para além do limite. É isso a morphe, em sentido grego. Evidente que faltou pensar o trabalho enquanto algo específico do agir do ser humano, ou seja, enquanto o trabalho no horizonte da techne e do logos.


- Manuel Antônio de Castro

4

"Com e na produção total, o homem moderno vive uma determinação bem precisa do real e dá uma decisão bem definida à história humana. A suposição de seu espírito é de que tudo resulta do trabalho de uma racionalidade instrumental e de que o trabalho da razão é capaz de tudo produzir, o real e o irreal, o bem e o mal, a verdade e a não verdade, o ser e o nada" (1).


Referência:
(1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Ócio e negócio". In: Revista Tempo Brasileiro - Caminhos do pensamento hoje: novas linguagens no limiar do terceiro milênio, 136, jan.-mar., 1999, p. 74.

5

O trabalho na dimensão da técnica é produzir para a entificação, isto é, fazer aparecer um ente, é um produzir substancial, pois é a verdade manifestativa d' o que é enquanto ente, por isso, a verdade se reduz à vigência da lógica e não a verdade enquanto aletheia. É um trabalho onde predomina o fazer em detrimento e esquecimento do sentido do ser. Já o trabalho na dimensão do sentido do ser, diz do agir no e pelo pensar, e não simplesmente do fazer, porque nele o agir é deixar a verdade advir em sua essência: manifestação e vigorar do ser do sendo em tudo que é e está sendo. Neste agir, o ser humano não intervém e nem jamais tem a intenção de intervir nem comandar o destino, a manifestação do sagrado, ele se empenha no penhor de chegar deixando advir o bem e ser tomado pelo pensar. Por isso noein e dianoia nos remetem muito mais para o pensar do que para o conhecer, em sentido causal. O conhecer é então o descobrir as leis causais e através delas operar o real dentro de uma finalidade e eficiência funcional. Eis o trabalho técnico.


- Manuel Antônio de Castro

6

"Através da produção total, o homem moderno vive uma determinação bem precisa do real e dá uma decisão bem definida à sua história. A suposição de seu espírito é de que tudo resulta do trabalho da racionalidade e de que o trabalho da razão é capaz de produzir tudo, o bem e o mal, a verdade e a não-verdade, o real e o não-real" (1).


Referência:
(1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Introdução". In: Revista Tempo Brasileiro - Caminhos do pensamento hoje: novas linguagens no limiar do terceiro milênio, 136, jan.-mar., 1999, p. 8.

7

"O mais ativo que o homem pode ser não é, portanto, no trabalho, quando faz alguma coisa, e, sim, no empenho com que se dedica a criar seu modo de ser e a inventar o perfil de sua fisionomia. Os demais seres vivos vivem a sua vida e nada mais. Só o homem vive com o Nada, isto é, sobrevive à vida em sua vida. O homem é, assim, o Único ser vivo que, para viver, não lhe basta viver, tem de empenhar-se por criar vida. É convidado constantemente a assumir a responsabilidade de cuidar da vida, de dedicar-se a viver" (1).


Referência:
(1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "O esquecimento da memória". In: ---. Filosofia contemporânea. Teresópolis / RJ: Daimon Editora, 2013, p. 78.

8

"Hoje não é importante a força de trabalho dos operários. Ela está determinada, em verdade, pelos centros de pesquisa e suas novas descobertas. De fato, é aí que se gera o capital e não mais pela força de trabalho, até porque cabe aos centros de pesquisa inventar também máquinas que dispensam a intervenção da força de trabalho. A máquina realiza isso de uma maneira mais eficiente e sem o perigo das greves. Ironia do destino: a consciência crítica acaba, em última instância, com o operário que, politicamente, é formatado numa consciência crítica. Ora, é aí que se centra o drama das Correntes críticas nas artes. Elas foram ultrapassadas porque não produzem nada que seja funcional dentro de uma sociedade como a de hoje, onde tudo é funcional e onde o ser humano se mede pela funcionalidade e eficiência de seus conhecimentos. Para dar uma função aos conhecimentos críticos, elas tornaram-se totalmente ideológicas. Mas o que pode hoje a ideologia diante do poder da técnica, que determina todas as políticas e está pondo em crise a ideia moderna de Nação?" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Leitura e Crítica". In: ---. Leitura: questões. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2015, p. 131.

9

"Temos de pensar em mecanismos tributários específicos ou num esquema de participação acionária especial para garantir que os benefícios econômicos gerados pela IA sejam amplamente compartilhados. O problema é que nenhum de nós consegue oferecer, até o momento, visão convincente deste novo mundo em que sistemas de IA farão a maior parte do que hoje chamamos trabalho" (1).


Referência:
(1) RUSSELL, Stuart - cientista da computação. "A inteligência artificial vai marginalizar mais pessoas", Entrevista a Eduardo Graça. In: O Globo, p. 12, quinta-feira, 13-01-2022.
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