Liminaridade

De Dicionário de Poética e Pensamento

1

"Liminaridade significa aí o estar jogado num projeto de realização do que é a partir do ser. Na liminaridade o agir do ser-humano, e só é agindo, sendo poético, encontra o seu vigor e seu horizonte no ser. Seu agir é, pois, algo entre o agir do ser que nele opera (obra/verdade/poíesis) e o seu agir, enquanto desvelo do que ele é. Essa dupla poíesis é que é o paradoxo, o entre. Ser, então, para o ser-humano é estar e ser entre, permanentemente. Ele é, queira ou não queira, um entre-ser, porque é um ser-do-entre. Realiza-se sempre na e a partir da liminaridade de ón / ente E einai / ser." (1)


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Interdisciplinaridade poética: o 'entre' ". In: Revista Tempo Brasileiro. Rio de Janeiro: n. 164, jan.-mar. 2006, p. 25.

2

"Deve [o leitor] deixar cada palavra vir com sua força poética e nela descobrirá algo maravilhoso: que a resposta, qualquer resposta, só é verdadeiramente resposta se recolocar a questão, pois somos radicalmente seres-do-entre, entre pergunta e resposta, entre vida e morte. Vivemos sempre em liminaridade, uma liminaridade em que vigora a essência originária, porque poética, pela qual tanto mais realizamos nossa finitude quanto mais, corajosamente, nos lançamos no não-finito" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Apresentação". In:----------- (org.). Arte: corpo, mundo e terra. Rio de Janeiro: 7Letras, 2009, p. 14.

3

O termo horizonte provém do verbo grego horidzo e significa limitar. Ele diz propriamente limite, mas toda experiência concreta de horizonte, ou seja, na nossa vida cotidiana e de acontecimentos, já nos diz mais do que o simples limite. Nos diz do homem em liminaridade, em estado de limiar, pois é impossível falar de limite sem ao mesmo tempo e tensionalmente sermos lançados no não-limite. Isso não nos diz imediatamente a palavra limite porque não nos damos conta de que só se pode traçar um limite enquanto possibilidade efetiva dada pelo não-limite, o limite é uma oferta do não-limite, na medida em que se dando e podendo ser posto e pro-posto como limite se retira e retrai como não-limite. Este retraimento é toda possibilidade do limite se afirmar como limite, de tal maneira que o que é próprio do limite é o não-limite, do qual e a partir do qual ele se pode mostrar como o que ele é. Desse modo, a liminaridade se funda tanto no limite quanto no não-limite.


- Manuel Antônio de Castro

4

"A fórmula páthei máthos fala não do aprendizado abstrato da lógica, mas da aprendizagem concreta, pela dor, da liminaridade da existência humana, lançada, em razão do devir temporal, na dança entre Vida e Morte" (1).


Referência:
FERRRAZ, Antônio Máximo. "O trágico como dança de vida e morte". In: In: FAGUNDES, Igor e OUTROS (Org.). Entre Pares - Partilhas em Dança & Outros Movimentos. Guaratinguetá/SP: Penalux, 2019, p. 87.

5

Toda questão é paradoxal. Todo conceito é racional e objetivo. A questão precisa do conceito assim como o ilimitado precisa do limite. Porém, tanto o conceito quanto o limite não subsistem sem a questão e o ilimitado. É aqui que acontece o paradoxo. Por isso ele surge da questão porque a vida do ser humano só é paradoxal porque é uma doação das questões. Eis porque temos o ser humano lançado radicalmente numa liminaridade, isto é, no paradoxo do limite e do ilimitado, da vida e da morte, do conhecer e do não-conhecer, do permanente e do passageiro, da noite e do dia, do ser e do não-ser. É nesses paradoxos que o humano do homem se entre-tece. Ele é um Entre-ser.


- Manuel Antônio de Castro.

6

Só como analogia se pode pensar o ser no âmbito dos transcendentais, pois é a questão do próprio sendo e não e jamais do ser. Por estarmos no ser é que pensamos e devemos pensar os transcendentais enquanto o sentido que nos dá sentido enquanto cada um é um próprio. Será, contudo, sempre um pensar que pensa em nossa liminaridade de seres do entre, seres metafísicos, a proximidade e a distância. Esta far-se-á presente em cada transcendental.


- Manuel Antônio de Castro.

7

"É que o horizonte de nosso agir e realização não vem do fim, mas do não-fim que nos impõe e propõe um fim, um limite. É a ambiguidade de realizar poeticamente o próprio. Por isso, não podemos confundir próprio com o acúmulo de camadas de que se constitui o eu. Tais camadas podem se tornar estranhas ao que cada um é, ao seu próprio. O próprio é nosso destino enquanto propriedade de que temos de nos apropriar. Eis a ambiguidade: apropriarmo-nos do que já nos constitui enquanto próprio: o destino. Por isso, nossa condição humana e temporal é a liminaridade" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Tempo, o poético-circular e a cronologia". Ensaio não publicado.
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