Édipo

De Dicionrio de Potica e Pensamento

1

"No dia do parto, mal o frágil vagido anuncia nova vida, Jocasta entrega o filho a um servo, ordenando que o conduza para bem longe. Laio perfura violentamente os pezinhos da criança e amarra-os com uma correia apertada. O escravo parte e Jocasta deixa-se cair prostrada sobre o leito.
Ao pé do monte Citerão, o servo encontra alguns pastores de Corinto e, apiedado, entrega-lhes o príncipe cuja herança era a desgraça. Depois empreende a viagem de volta a Tebas, onde o rei e a rainha acreditavam ter enganado o oráculo.
No poder do mundo, o Destino vê o sangue escorrer da carne inocente, mas já decidiu: aquele será Édipo, o maldito, que há de caminhar sempre para a fatalidade do sofrimento e carregar toda a infâmia dos homens nesse planeta sonâmbulo" (1).


Referência:
(1) ÉDIPO. In: Mitologia, volumes: 1, 2, 3. São Paulo: Abril Cultural, Editor Victor Civita, 1973, v. 3, p. 545.

2

" Oidipous, Édipo, segundo o mito é assim chamado porque tivera "os pés furados e atados", o que provocara "a tumefação dos mesmos, derivando-se, pois, o antropônimo do verbo oidein: "inchar"; e de pous, podos: "pé', donde o de pés inchados, conforme etimologiza Sófocles no diálogo entre o Mensageiro e Édipo (Édipo Rei, 1030-1036), cuja tradução estampamos em Mitologia Grega, Vol.III, p. 243" (1).


Referência:
(1) BRANDÃO, Junito. Dicionário Mítico-Etimológico, volume I, A - I. 4. e.; Petrópolis / RJ: Vozes, 2000, p. 303.

3

"Pensa-se que destino é o que a razão, fonte do livre agir do ser humano, não podia determinar nem controlar. Pela visão racionalista, o destino se opõe à liberdade humana. No existir o ser humano deve-se dar livremente a sua essência, o seu genos enquanto seu quinhão. Nessa visão, a existência precede e determina a essência. O existir enquanto o como é deve determinar livremente o que é. O homem não tem um destino, dá-se um destino. Esta foi a utopia moderna, esquecida dos ensinamentos do mito de Édipo" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Poético-ecologia". In: Manuel Antônio de Castro, (org.). Arte: corpo, mundo e terra. Rio de Janeiro: 7Letras, 2009, p. 26.

4

"O ser humano, desde Édipo - o mito imemorial que pensa o humano no que lhe é próprio em sua essência psíco-sócio-político-histórica - sempre teve a pretensão de ser o sujeito das suas escolhas e realizações. A Moira sorri, em silêncio, diante de tais pretensões, deixando-o iludir-se, em seu pseudo-poder racional de dar-se a existência, segundo a liberdade fundada na sua vontade. É uma ilusão que custa caro e gera o sofrimento de muitos fracassos inúteis" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Eduardo Portella, o professor". In: Quatro vezes vinte - Eduardo Portella - Depoimentos. Rio de Janeiro, Academia Brasileira de Letras, 2012, p. 40.

5

"Mas vem Édipo e, impulsionado pela procura da verdade e convicto de sua inteligência, certo de que é o mais inteligente dos homens, defronta-se com a Esfinge. Brilhando na luminosidade da inteligência e da razão, decifra os enigmas e passa a ser aclamado como o salvador de Tebas. Sem rei, pois Laio, o rei, seu pai, ele o matara. Naturalmente desposa a viúva, sua mãe. É o mais dócil e cuidadoso dos reis para com seu povo, para com seu genos. O seu corpo se confunde com o da pólis. Com o saber da razão achava que tinha resolvido os enigmas. Será que hoje o saber da razão é suficiente para resolver nossos enigmas ou apenas nossos problemas funcionais?" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Poético-ecologia". In: Manuel Antônio de Castro, (org.). Arte: corpo, mundo e terra. Rio de Janeiro: 7Letras, 2009, p. 31.

6

Édipo, em fuga porque ouvira de um bêbado que ele mataria o pai e casaria com a mãe, foge de Corinto e vai para Tebas. Mas ele não sabia que os pais com que vivia eram adotivos. Em Tebas todos estão apavorados com a Esfinge, que propõe os Enigmas e mata quem não os resolve. Édipo resolve ir ao encontro da Esfinge, que lhe propõe os famosos enigmas. Caso os solucionasse viveria, em caso contrário, seria morto pela Esfinge. Eis os enigmas:
" - Qual é o animal que tem quatro pés de manhã, dois ao meio-dia e três ao entardecer?
E, sem hesitar, responde: O Homem que, na infância, arrasta-se sobre os pés e as mãos;
na idade adulta mantém-se sobre os dois pés; e na velhice precisa usar um bastão para
andar. A Esfinge, aflita com aquela inteligência clara e rápida, recobra o fôlego e
propõe novo enigma: - São duas irmãs. Uma gera a outra. E a segunda, por seu turno, é
gerada pela primeira. Quem são elas? A Luz e a Escuridão, responde Édipo. A luz do dia,
clareira aberta no céu, gera a escuridão da noite, que, por sua vez, precede a luz do
dia" (1).
Os cidadãos de Tebas lhe dão o trono que estava vazio, pois seu rei tinha sido morto numa estrada. Fora justamente Édipo que o matara.


- Manuel Antônio de Castro.
(1) MITOLOGIA. São Paulo: Abril Cultural, 1973, Volume III, p. 554.

7

"Por isso, Édipo, exilado e cego, acompanhado apenas por Antígona, sua filha, perde-se em Colona, no bosque sagrado das Eumênides. Lá poderá descansar na felicidade dos bons. Já atravessou os limites da "vida inconstante": perdeu o trono, a esposa, tudo. Os sofrimentos mostraram-lhe que a vontade consciente de nada vale contra os desígnios divinos, a ordem cósmica que regula o mundo dos mortais" (1).


Referência:
(1) ÉDIPO. In: Mitologia, volumes: 1, 2, 3. São Paulo: Abril Cultural, Editor Victor Civita, 1973, v. 3, p. 548.

8

"Que culpa tinha, efetivamente, Édipo? Matara Laio sem saber que era seu pai. Casara com Jocasta sem saber que era sua mãe. Arriscando a própria vida, livrara Tebas da voracidade da Esfinge. Se, para ter culpa, é necessário aderir conscientemente à prática do mal, Édipo não era culpado. Mas a concepção dos antigos gregos não era essa: para eles, a culpa era como uma doença, que se adquire sem o concurso da vontade individual" (1).


Referência:
(1) ÉDIPO. In: Mitologia, volumes: 1, 2, 3. São Paulo: Abril Cultural, Editor Victor Civita, 1973, v. 3, p. 547.

9

"Édipo é, justamente, o anti-herói que, ao afirmar-se destrói-se; ao vencer, perde. E, ao lutar pela justiça, pela paz e pelo bem-estar, é derrubado pelos horrores da realidade cotidiana, cheia de malícias e dores imprevisíveis" (1).
Sem dúvida nenhuma, Édipo é o grande exemplo do aparente poder da vontade do homem, que, perante o destino é impotente e cheia de aparências. A principal diz respeito ao poder da razão humana diante do poder verdadeiro que é o do destino. Em Édipo temos o jogo profundo entre aparência e a verdade da realidade, entre aparência e verdade. Ele só na aparência decifrou os enigmas. O grande enigma continua sendo o homem. Nele temos o embate maior entre consciência e inconsciente. Entre profano e sagrado, manifestado no mito de Édipo tanto pela Esfinge quanto pelo destino, a Moira, diziam os gregos. Até hoje o maior enigma da realidade é o ser humano.


- Manuel Antônio de Castro.
Referência:
(1) ÉDIPO. In: Mitologia, volumes: 1, 2, 3. São Paulo: Abril Cultural, Editor Victor Civita, 1973, v. 3, p. 547.

10

No ensaio "... poeticamente habita o homem..." (1), há um poema de Hölderlin que Heidegger interpreta, fazendo referência ao terceiro olho de Édipo. A fim de aprofundar a questão, confira o ensaio "Diana e Heráclito" (2), de Emmanuel Carneiro Leão.


- Manuel Antônio de Castro
Referências:
(1) HEIDEGGER, Martin. "... poeticamente habita o homem...". In:______. Ensaios e conferências. Petrópolis: Vozes, 2002.
(2) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Diana e Heráclito". In: Aprendendo a pensar. Petrópolis: Vozes, 1977, pp. 187-8.
Ver também:
* Aparência
* Olhar
* Édipo Rei, de Sófocles

11

O mito do homem é a estrutura fundamental da cultura ocidental, daí a vigência do humanismo. A questão fundamental metafísica é o Humanismo. A poíesis (o vigor poético) não é metafísica nem humanista, mas defende a realização do humano do homem. E o maior exemplo é Édipo. Édipo realiza o humano do homem, porque toda a sua vida se funda numa disputa com o destino, para no final deixar que este o tome e dê o sentido da sua vida, quando então ele faz do humano do homem a liberdade como libertação, dimensionando-se pelo destino enquanto sabedoria. Arrancar os olhos é um ato livre de negação do saber e de se deixar tomar pela sabedoria.


- Manuel Antônio de Castro

12

"A questão fundamental do itinerário ocidental: o mito do homem e seu destino. Examinemos aquele mito-poético grego onde o mito do homem encontra a sua mais rica formulação: Édipo. Pleno de imagens-questões, a obra de Sófocles e o mito com que a tece, narrativamente entre-tece em suas entre-linhas narrativo-poéticas as questões que desde sempre angustiam e desafiam todo ser humano" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Heidegger e as questões da arte”. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). Arte em questão: as questões da arte. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 21.

13

"Laio observa o ventre crescido de Jocasta e a angústia apodera-se de sua alma, como se antevisse toda a desgraça. Aflito, conturbado, segue até o templo de Apolo, em Delfos. Através do oráculo quer saber do deus qual será o destino da criatura que está por nascer. O oráculo nem por um momento o omite: o ser que Jocasta amorosamente carrega em seu corpo matará o próprio pai e levará a ruína ao palácio de Tebas. No poder do Mundo, o Destino já decidiu: aquele será Édipo, o amaldiçoado, que há de caminhar sempre para a fatalidade do sofrimento e carregar consigo toda a infinita miséria dos homens neste planeta sonâmbulo" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Heidegger e as questões da arte”. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). Arte em questão: as questões da arte. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 21.

14

"Os mitos, como todas as obras poéticas, propõem imagens-questões ou questões-figuras. Édipo é uma imagem-questão. Que questões Édipo figura? Como a questão é sempre ambígua, pois vige a partir do “entre”, Édipo é, talvez, a imagem-questão mais ambígua e radical que o mito-arte criou, porque ele simplesmente é, como questão, o mito do homem, numa expressão ao mesmo tempo subjetiva e objetiva" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Heidegger e as questões da arte”. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). Arte em questão: as questões da arte. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 22.

15

"Édipo é o próprio ser humano como questão. Ele não tem ascendência divina, não é um deus. No entanto, nele comparecem todas as questões essenciais em que todo ser humano se vê envolvido. Mas não é um ser humano abstrato, uma essência que está não se sabe onde. Não. A concreticidade de sua realidade está no agir constante e ambíguo pelo qual busca o sentido do que ele é em meio ao enigma do real, do qual ele é participante indissolúvel. Quanto mais Édipo (todo ser humano) procura fugir do destino mais ele o realiza. Ele está sempreentre” o agir da sua vontade e inteligência, e o agir da vontade e saber da Moira (destino). Todo agir essencial do ser humano é ambíguo. Ele é sempre um ser-do-entre" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Heidegger e as questões da arte”. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). Arte em questão: as questões da arte. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 22.

16

"O ser humano como doação do real é uma doação ambígua. Por isso, quando a esfinge propõe o primeiro enigma e Édipo responde: o homem, este é e não é a resposta, por um motivo muito simples. Toda questão tem e não tem resposta; Édipo, pensando que tinha resolvido o enigma, deixou de ver o mistério que sua resposta colocara diante de si. Na realidade, o “homem” é o mistério, que “Édipo não percebe” (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Heidegger e as questões da arte”. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). Arte em questão: as questões da arte. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 22.

17

"Tentando afirmar sua vontade e razão como “subjetividadelivre, Édipo, como todo ser humano, tenta evitar o destino. Cada um vive dessa e nessa ambiguidade. É que queremos e não queremos o destino, sabemos e não sabemos o destino. Por isso, o destino é uma questão. É que somos e não-somos. Nisso, esse “e” misterioso se torna o “lugar” que faz do homem um ser-do-entre (Da-sein)" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Heidegger e as questões da arte”. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). Arte em questão: as questões da arte. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 23.

18

"O sentido da ação: O embate, o agon, o polemós entre o mito do real e o mito do homem coloca duas questões essenciais para Édipo, para todo ser humano, para a arte: o alcance, o sentido e a essência do agir. A esta os gregos denominaram poiesis. O agir abre caminhos externos e internos, e desvela o que o homem é, ou seja, o seu destino. A este caminho ambíguo se chama metá-hodós, ou seja, o caminho do “entre”. Por isso, Édipo se chama “Oedipus”, o de pés inchados, porque nos pés, como metá-fora (o que é levado pelo “entre”) do que Édipo será como caminhante incessante, se concentra toda a sua trajetória, o seu andar. Os pés não são aí algo físico, mas o per-curso de vida ambíguo e doloroso, a procura incessante do que é enquanto plena e livre realização. Eis porque tem os pés amarrados e inchados. Amarrados ao destino e inchados pela fuga desse mesmo destino e procura de si mesmo" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Heidegger e as questões da arte”. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). Arte em questão: as questões da arte. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 23.

19

"A imagem-questão Édipo se centraliza, como mito, toda ela na ambígua multiplicidade dos pés e no andar. Ele, em seu caminhar de encruzilhada em encruzilhada, desvelará o encontro e desencontro do mito do homem e do mito do real (a esfinge). A complexidade e essencialidade dessa luta e entre-laçamento é desvelada e velada por outra imagem-questão mítico-poética: Hermes. Este rege a inter-pretação enquanto verbo e sentido do agir. Hermes é o mensageiro e a própria mensagem, a linguagem, a palavra, o nome e o verbo, é o próprio desvelamento e velamento do ser humano e do real" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Heidegger e as questões da arte”. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). Arte em questão: as questões da arte. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 24.

20

"No fundo, o mito de Édipo, como mito do homem, também coloca a questão fundamental da “Polis” e do exercício do poder. Sófocles desenvolve essa questão tematizando a tensão entre o poder em Édipo Basileus (Rei) e o poder do não-poder em Édipo em Colona. O mito e a arte de Sófocles nos trazem a mais profunda reflexão sobre a questão sempre atual da essência da “Polis” e do exercício do poder, que ela necessariamente implica" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Heidegger e as questões da arte”. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). Arte em questão: as questões da arte. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 24.

21

"Ação e não-ação. O mito do homem acha seu sentido no mito do real na medida em que o mito do homem se liberta no e pelo mito do real para o sagrado do mito, ou seja, como a plenitude (hólos, em grego) da procura do agir como não-agir, não-ver, não-saber e não-verdade. É o que nos diz a imagem-questão de “furar” os olhos que Édipo faz ao final da tragédia. É um furo que leva a ver mais fundo: o essencial, o silêncio e o vazio. É um furo que, vazando, deixa saber e ver o não-ver e o não-saber. Isso é narrado dramática e poeticamente por Sófocles na tragédia Édipo em Colono" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Heidegger e as questões da arte”. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). Arte em questão: as questões da arte. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 25.

22

"Édipo decifrou o enigma? Noutras palavras: Algum de nós já decifrou o enigma? Não. O mito do homem não é a resposta para o mito do real. Até é, mas só na medida em que recoloca sempre o mito do real, pois o real como questão é que nos tem e dimensiona. Toda resposta a qualquer questão será sempre ambígua. Toda questão se articula sempre em torno de duas dimensões: 1ª. o querer como vontade; 2ª. o querer como saber. O sujeito do querer como destino não é o ser humano. O sujeito é o real, o próprio enigma, e não o homem (como Édipo afirma equivocadamente em sua resposta)" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Heidegger e as questões da arte”. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). Arte em questão: as questões da arte. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 27.

23

"Normalmente só se fala desse enigma (sobre o Homem), mas há um outro. E diz:
A esfinge, aflita com aquela inteligência clara e rápida (aparentemente) recobra o fôlego e propõe novo enigma: São duas irmãs. Uma gera a outra. E a segunda, por seu turno, é gerada pela primeira. Quem são elas? A luz e a escuridão, responde Édipo. A luz do dia, clareira aberta no Céu, gera a escuridão da noite, que, por seu turno, precede a luz do dia ”.
O que este enigma nos quer propor? Qual a sua ligação com o anterior? As duas irmãs são, evidentemente, imagens-questões. Do quê? É clara a ligação entre os dois enigmas. A resposta ao primeiro enigma parece ser a certa e verdadeira, desfazendo então o enigma. Ao propor o segundo enigma, este mostra a ambiguidade da primeira resposta" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Heidegger e as questões da arte”. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). Arte em questão: as questões da arte. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 27.

24

"O surgimento das duas irmãs se dá do mesmo modo: o suceder e preceder pressupõem o tempo/poiesis/linguagem. Estes aqui mostram duas coisas: um desvelamento e velamento. A estes chamou o mito Aletheia, ou seja, verdade. Mas este desvelamento e velamento constitui evidentemente a vida e a morte. Verdade, vida, morte, luz, trevas não será este o itinerário e travessia poética de Édipo, do homem? Não será este o nosso itinerário, a nossa travessia? Mas até onde ela será poética? Ou seja, até onde fazemos do viver uma experienciação de ser?" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Heidegger e as questões da arte”. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). Arte em questão: as questões da arte. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 27.

25

"Édipo, o ser humano, procura sempre a verdade, pois esta constitui o real do que ele é. Édipo em sua resposta não percebeu imediatamente, como em geral não percebemos, que a verdade se constitui de duas irmãs. O percurso poético de Édipo será o percurso do dia, da razão, da inteligência, da percepção, do conhecimento à chegada da noite, à não-luz (cega-se), ao não-conhecimento, à não-ação, ao não-poder, ao silêncio, à sabedoria, à morte. Vida e luz, noite e morte" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Heidegger e as questões da arte”. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). Arte em questão: as questões da arte. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 28.

26

"Todos sabemos que o mito de Édipo se configura numa amplitude maior: o do genos de Édipo. Seu destino, em princípio, está ligado ao próprio destino do genos. Por isso, enquanto genos, o mito nos lança no sentido essencial em que se reúne e ultrapassa qualquer dicotomia entre pessoal e social. Para além de Cura da dor, da Cura amorosa, com Édipo temos a Cura da Polis. Por isso a poético-ecologia se dá na harmonia dos três cuidados em relação a três corpos: o de Édipo enquanto Édipo, o de Édipo enquanto lugar do corpo social, ou seja, a Polis, o de Édipo enquanto genos de Eros, Terra, Céu e Mundo. A poético-ecologia deve necessariamente ser tomada e impulsionada pelos três corpos. Não há separação. Hoje, com a globalização, o corpo social são todos os seres humanos e o genos são todos os seres humanos, o Céu, a Terra-mãe-Gaia e o Mundo" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Poético-ecologia". In: Arte: corpo, mundo e terra. CASTRO, Manuel Antônio de (org.). Rio de Janeiro: 7Letras, 2009, p. 30.

27

"Corpo genético. Édipo tem um telos genético. Ele é criado pelos reis de Corinto como filho. Cresce em agilidade e valentia física e em agilidade e agudeza intelectual. Até o dia em que escuta por um bêbado numa festa que ele é filho adotivo. Parte para Delfos em consulta ao oráculo para saber quem são seus pais. Na decisão desta partida e procura já se mostra o que orientará Édipo em toda a sua caminhada de vida: a procura da verdade" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Poético-ecologia". In: Arte: corpo, mundo e terra. CASTRO, Manuel Antônio de (org.). Rio de Janeiro: 7Letras, 2009, p. 30.

28

"Só o homem pode escravizar o homem. A poético-ecologia tem que se centralizar na verdade do homem. Mas qual é a verdade do homem? Édipo, o homem, não solucionou os enigmas. O homem não é a resposta para os enigmas das questões. As questões são maiores do que o homem. A poético-ecologia é o deixar-se tomar pelas questões. E o que faz Édipo? Será que nós temos a mesma coragem para fazer o que ele fez? Ele deixou-se tomar pela questão" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Poético-ecologia". In: Arte: corpo, mundo e terra. CASTRO, Manuel Antônio de (org.). Rio de Janeiro: 7Letras, 2009, p. 31.

29

"O grito de dor de Édipo, arrancando os olhos, tem mais sentido do que mil tratados de psicologia e filosofia. É algo muito mais profundo do que as classificações de dor físico-psicológicas ou sentimentais, alógicas ou fonéticas. A voz, no grito de dor de Édipo, é o pathos abissal da linguagem abissal" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Poético-ecologia". In: Arte: corpo, mundo e terra. CASTRO, Manuel Antônio de (org.). Rio de Janeiro: 7Letras, 2009, p. 32.

30

"No grito de dor de Édipo dá-se o salto mortal no abismo sem fundo do silêncio pleno" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Poético-ecologia". In: Arte: corpo, mundo e terra. CASTRO, Manuel Antônio de (org.). Rio de Janeiro: 7Letras, 2009, p. 33.

31

"O grito de dor de Édipo, arrancando os olhos, leva à plenitude de sentido, porque o leva à Cura de todas as procuras de afirmação da negação do que lhe fora destinado" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Poético-ecologia". In: Arte: corpo, mundo e terra. CASTRO, Manuel Antônio de (org.). Rio de Janeiro: 7Letras, 2009, p. 33.

32

"No grito de dor de Édipo de furar os olhos, dá-se o último passo de uma caminhada de vida, nas três sendas do parecer aparecendo, do ser sendo e do não-ser no mergulho da excessividade do Nada" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Poético-ecologia". In: Arte: corpo, mundo e terra. CASTRO, Manuel Antônio de (org.). Rio de Janeiro: 7Letras, 2009, p. 33.

33

"No grito de dor de Édipo, anuncia-se a proximidade da morte como plenitude de sentido da vida" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Poético-ecologia". In: Arte: corpo, mundo e terra. CASTRO, Manuel Antônio de (org.). Rio de Janeiro: 7Letras, 2009, p. 34.
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