Mundo

De Dicionrio de Potica e Pensamento

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:Mundo é uma [[questão]]. No entanto, num [[real]] dominado pelos conceitos metafísicos, muitos são os seus adjetivos qualificativos, sem nos darmos conta de que o [[adjetivo]] já pressupõe o mundo como vigência originária. É isto o que [[Heidegger]] quer dizer: que o ser-humano é um ser da facticidade. Vivemos, queiramos ou não, quer dizer, vivemos já desde sempre no mundo. É impossível pensar a realidade sem mundo. É aqui que podemos citar o fragmento 30 de Heráclito: "O mundo, o mesmo em todos, nenhum dos deuses, e nenhum dos homens o fez, mas sempre foi, é e será, [[fogo]] sempre vivo, acendendo segundo a medida e segundo a medida apagando" (1). Notemos que o pensador diz que o Mundo foi, é e será. Porém, o ser se dá enquanto [[verdade]] e enquanto verdade é que a [[obra]] de arte se constitui originariamente como Mundo e [[Terra]]. A dimensão Mundo da obra de arte não é qualquer mundo como adjetivo qualificativo, mas a própria vigência da realidade enquanto verdade e não-verdade, pois mundo está ligado à clareira, o retrair-se do ser para deixar o não-ser [[ser]] como [[presença]]: mundo.
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: [[Mundo]] é uma [[questão]]. No entanto, num [[real]] dominado pelos [[conceitos]] [[metafísicos]], muitos são os seus [[adjetivos]] qualificativos, sem nos darmos conta de que o [[adjetivo]] já pressupõe o [[mundo]] como [[vigência]] [[originária]]. É isto o que [[Heidegger]] quer [[dizer]]: que o [[ser-humano]] é um [[ser]] da [[facticidade]]. Vivemos, queiramos ou não, já desde [[sempre]] no [[mundo]]. É impossível [[pensar]] a [[realidade]] sem [[mundo]]. É aqui que podemos citar o fragmento 30 de [[Heráclito]]:  
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: " ''O [[mundo]], o [[mesmo]] em todos, nenhum dos [[deuses]], e nenhum dos [[homens]] o fez, mas [[sempre]] foi, é e será, [[fogo]] [[sempre]] vivo, acendendo segundo a [[medida]] e segundo a [[medida]] apagando'' " (1).
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:- [[Manuel Antônio de Castro]]
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: Notemos que o [[pensador]] diz que o [[Mundo]] foi, é e será. Porém, o [[ser]] se dá enquanto [[verdade]] e enquanto [[verdade]] é que a [[obra de arte]] se constitui originariamente como [[Mundo]] e [[Terra]]. A [[dimensão]] [[Mundo]] da [[obra de arte]] não é qualquer [[mundo]] como adjetivo qualificativo, mas a própria [[vigência]] da [[realidade]] enquanto [[verdade]] e [[não-verdade]], pois [[mundo]] está ligado à [[clareira]], o [[retrair-se]] do [[ser]] para deixar o [[não-ser]] [[ser]] como [[presença]]: [[mundo]].
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:Referência:
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: - [[Manuel Antônio de Castro]]
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:(1) HERÁCLITO. Trad. Emmanuel Carneiro Leão. In: ''Os pensadores originários''. Petrópolis: Vozes, 1991, p. 67.
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: Referência:
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: (1) HERÁCLITO. Trad. Emmanuel Carneiro Leão. In: '''Os pensadores originários'''. Petrópolis: Vozes, 1991, p. 67.
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== 2 ==
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:Mundo é uma questão complexa e fundamental para cada viver humano. Ao longo da trajetória ocidental foram sendo constituídos diversos conceitos de mundo, ligados a concepções da [[realidade]] e do [[homem]]. Heidegger faz um comentário e levantamento desses conceitos (1). Ele toma o mundo como questão e usa inicialmente a expressão alemã: ''In der Welt sein'' (Ser, estar jogado no mundo). Indica no homem a [[abertura]] essencial para o [[Ser]], a transcendência, aquilo que constitui o homem como homem. Um outro nome para mundo e [[transcendência]] é ''[[lógos]]''. É nesse [[horizonte]] que se deve ler a sentença órfica:''dzoion logon echon'' (2) (com que se define o homem na ordem da vida) e que significa: O que constitui a essência vital do homem é a transcendência, o ''lógos''.  
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: [[Mundo]] é uma [[questão]] complexa e fundamental para cada vivente [[humano]]. Ao longo da trajetória ocidental foram sendo constituídos diversos [[conceitos]] de [[mundo]], ligados a concepções da [[realidade]] e do [[homem]]. Heidegger faz um comentário e levantamento desses [[conceitos]] (1). Ele toma o mundo como [[questão]] e usa inicialmente a expressão alemã: ''In der Welt sein'' (Ser no mundo). Indica no [[homem]] a [[abertura]] essencial para o [[Ser]], a [[transcendência]], aquilo que constitui o [[homem]] como [[homem]]. Um outro nome para [[mundo]] e [[transcendência]] é ''[[lógos]]''. É nesse [[horizonte]] que se deve ler a sentença órfica: ''dzoion logon echon'' (2) (com que se define o [[homem]] na ordem da [[vida]]) e que significa: O que constitui a [[essência]] vital do [[homem]] é a [[transcendência]], o ''logos''.  
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:- [[Manuel Antônio de Castro]]
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: - [[Manuel Antônio de Castro]]
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: Referências:
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:Referências:
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: (1) Cf. HEIDEGGER, Martin. '''Da essência do fundamento'''. Lisboa: Edições 70, 1988, pp. 42-3.
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: (2) Cf. LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Uma leitura órfica de uma sentença grega". In: '''Aprendendo a pensar II'''. Petrópolis: Vozes, 1992.
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:(1) Cf. HEIDEGGER, Martin. ''Da essência do fundamento''. Lisboa: Edições 70, 1988, pp. 42-3.
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: '''Ver também:'''
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:(2) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Uma leitura órfica de uma sentença grega". In: ''Aprendendo a pensar II''. Petrópolis: Vozes, 1992.
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: * [[Ser-estar]]
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:'''Ver também:'''
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: O [[mundo]] como [[questão]] é visto por [[Heidegger]] como ''In der Welt sein'' (''[[ser]] no [[mundo]]''). Mas devemos distinguir o [[mundo]] como [[questão]] e o [[mundo]] como [[conceito]]. Destes há muitos, normalmente expressos através de um adjetivo acrescentado a [[mundo]]: mundo pessoal, [[social]], medieval etc. Por isso, [[Heidegger]] começa o levantamento dos [[conceitos]] vulgares de [[Mundo]]. Ao discutir a [[questão]] da [[essência]] do [[fundamento]], [[Heidegger]] trata profundamente o [[mundo]] como [[questão]] em seus aspectos históricos. Mas não devemos esquecer que a [[questão]] [[mundo]] é uma das mais tratadas pelo [[pensador]], desde '''Ser e tempo'''. Ela se torna a [[questão]] central, junto com a [[questão]] [[terra]], para fazer uma [[profunda]] reflexão sobre o que é a [[arte]]. A [[questão]] [[mundo]] também é central no modo como [[Heidegger]] compreende a [[coisa]].
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:*[[Ser-estar]]
 
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==3==
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: - [[Manuel Antônio de Castro]]
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:O mundo como [[questão]] é visto por Heidegger como ''In der Welt sein''. Mas devemos distinguir o mundo como questão e o mundo como [[conceito]]. Destes há muitos, normalmente expressos através de um adjetivo acrescentado a mundo: mundo pessoal, [[social]], medieval etc. Por isso, Heidegger começa o levantamento dos conceitos vulgares de Mundo. Ao discutir a questão da [[essência]] do [[fundamento]], Heidegger trata profundamente o mundo como questão em seus aspectos históricos. Mas não devemos esquecer que a questão mundo é uma das mais tratadas pelo pensador, desde ''Ser e tempo''. Ela se torna a questão central, junto com a questão [[terra]], para fazer uma profunda reflexão sobre o que é a [[arte]]. A questão mundo também é central no modo como Heidegger compreende a coisa.
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: Referências:
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:- [[Manuel Antônio de Castro]]
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: HEIDEGGER, Martin. '''A Origem da Obra de Arte'''. Trad. Idalina Azevedo da Silva e Manuel Antônio de Castro. Lisboa: Edições 70, 2010.
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: ______. "A coisa". In: '''Ensaios e conferências'''. Petrópolis: Vozes, 2002.
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: ______. '''Da essência do fundamento'''. Lisboa:  Edições 70, 1988, pp. 42-3.
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: '''Ver também:'''
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:Referências:
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: *[[Decadência]]
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:HEIDEGGER, Martin. ''A Origem da Obra de Arte''. Trad. Idalina Azevedo da Silva e Manuel Antônio de Castro. Lisboa: Edições 70, 2008.
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==4==
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:______. "A coisa". In: ''Ensaios e conferências''. Petrópolis: Vozes, 2002.
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: "[[Mundo]] é o [[acontecimento]] apropriador de [[clareira]] e [[iluminação]]" (1).
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:______. ''A essência do fundamento''. Lisboa:  Edições 70, 1988, pp. 42-3.
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:'''Ver também:'''
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: Referência:
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:*[[Decadência]]
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: HEIDEGGER, Martin. "Alétheia". In: '''Ensaios e Conferências'''. Petrópolis: Vozes, 2002, p. 244.
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==5==
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: [[Heidegger]] liga [[mundo]] ao coisificar da [[coisa]]. Mas é importante [[perceber]], como diz [[Heidegger]], que não há [[causa]] nem [[fundamento]]. A [[explicação]] aí não ocorre, porque esta pressupõe que haja [[causa]] ou [[fundamento]]. O que se entende por coisificar da [[coisa]] está tratado por [[Heidegger]] no [[ensaio]] "A coisa" (1). Ainda nesse [[sentido]] diz: "Denominamos [[mundo]] o apropriante [[jogo]] [[especular]] (''Spiegel/Spiel'') da [[simplicidade]] do [[Céu]] e da [[Terra]], dos [[Divinos]] e dos [[Mortais]]" (2).
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==4==
 
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:"Mundo é o acontecimento apropriador de [[clareira]] e [[iluminação]]" (1).
 
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: Referência:
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:Referência:
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: (1) HEIDEGGER, Martin. "A coisa". In: '''Ensaios e conferências'''. Petrópolis: Vozes, 2002.
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:HEIDEGGER, Martin. "Alétheia". In: ''Ensaios e Conferências''. Petrópolis: Vozes, 2002, p. 244.
+
: (2) HEIDEGGER, Martin. "Einblick in das was ist ''Das Ding'' ". In: ------. '''Bremer und Freiburg Vorträge'''. G.A., Bd. 79.
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==6==
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: "No fazer-se [[Linguagem]] do [[Ser]], o [[homem]] vem a si mesmo e o [[mundo]] vem ao [[homem]] para [[ser]] [[mundo]]" (1).
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:'''Ver também:'''
 
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:*[[Iluminar]]
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: Referência:
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: (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Hegel, Heidegger e o Absoluto". In: '''Aprendendo a pensar'''. Petrópolis: Vozes, 1977, p. 262.
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==5==
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== 7 ==
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:Heidegger liga mundo ao coisificar da coisa. Mas é importante perceber, como diz Heidegger, que não há [[causa]] nem [[fundamento]]. A explicação aí não ocorre, porque esta pressupõe que haja causa ou fundamento. O que se entende por coisificar da coisa está tratado por Heidegger no ensaio "A coisa" (1). Ainda nesse sentido diz: "Denominamos mundo o apropriante jogo especular (Spiegel/Spiel) da simplicidade do Céu e da Terrra, dos Divinos e dos Mortais" (2).
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: [[Mundo]] usa-se em muitos [[sentidos]]. Propriamente o falar de [[sentido]] já é falar de [[mundo]]. Como pode haver [[sentido]] sem [[mundo]] ou [[mundo]] sem [[sentido]]? Em si, [[mundo]] é uma das [[questões]] mais complexas. O seu entendimento como [[meio]] ou [[contexto]] já surge de [[teorias]] sobre o [[real]] e [[realidade]] e, claro, uma determinada [[concepção]] do que seja o [[ser humano]], o [[tempo]] e a [[história]]. Propriamente só o [[homem]] tem [[mundo]] e só ele fala de [[mundo]]. Os demais [[entes]], se têm [[mundo]] não podemos [[saber]], pois só o [[ser humano]] tem ''[[logos]]''. O que é [[mundo]]?
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: 1° [[Mundo]] cultural. Aí [[mundo]] diz que cada [[cultura]] constitui em si um [[mundo]]. Como tal daria consistência a uma [[identidade]], a daqueles que pertencem a tal [[cultura]]. As [[culturas]] constituiriam entre si [[diferença|diferenças]]. Como explicá-las? Outra [[questão]] a este respeito: Como se relaciona [[linguagem]]/[[língua]]/[[cultura]]? Ocorre que há diferentes [[conceitos]] de [[cultura]], dependendo da [[disciplina]] e das [[teorias]]. A tensão entre [[língua]] e [[cultura]] não pode ser vista a partir de um [[conceito]] linguístico de [[língua]], algo formal e [[abstrato]]. O vigor de toda [[cultura]] é o que une [[terra]], [[céu]], ser humano enquanto mundo: o [[sagrado]]. Por isso, toda [[cultura]] tem em si um [[culto]]: os [[Rito|ritos]] dos [[Mito|mitos]], pelos quais acontece o vigorar do [[sagrado]];
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 +
: 2° [[Mundo]] e [[universo]] [[real]]. É muito genérico mas ao mesmo tempo pode significar todo o [[real]] externo e também o interno, como por exemplo, na expressão: "meu [[mundo]] interior";
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:Referência:
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: 3° [[Visão]] de [[mundo]]. Aqui significa que o [[real]] é experienciado e vivenciado a partir de uma [[religião]], de uma [[teoria]] filosófica, científica, política, econômica. O que fica implícito a toda [[visão]] de [[mundo]] é a [[questão]] do [[real]]. O que é "[[real]]" aí? [[Deus]]? [[Matéria]]? [[Sociedade]]? Se pode haver diferentes [[teorias]] do [[real]] e em diferentes campos é porque o próprio [[real]] dando-se nessas [[teorias]] se retrai como [[real]]. O [[real]] diz-se e manifesta-se de muitas maneiras. A cada maneira de manifestação dá-se o [[nome]] de [[mundo]];
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:(1) HEIDEGGER, Martin. A coisa. In: ''Ensaios e conferências''. Petrópolis: Vozes, 2002.
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: 4° [[Ser]] e [[mundo]]. É o [[sentido]] [[ontologia|ontológico]]. Como tal abrange e ultrapassa todos os outros. Mas para [[ser]] e [[mundo]] ou [[ser]]/[[mundo]] comparecem: ''[[phýsis]]'' enquanto nascividade/[[ser]]; ''[[poíesis]]'' enquanto [[vigor]] [[poético]]; ''[[tékhne]]'' enquanto o [[conhecer]] que advém na e pela [[luz]]; ''[[lógos]]'' enquanto [[linguagem]]. Não pode haver [[mundo]] sem [[linguagem]]. ''[[Lógos]]''/[[linguagem]] é [[mundo]]. ''[[Alétheia]]'', ou seja, a própria [[realidade]] ou [[ser]] se ofertando enquanto [[clareira]] de [[desvelamento]] e [[velamento]], isto é, [[verdade]] e [[não-verdade]] (a [[clareira]] articula sempre um [[desvelamento]] e um [[velamento]]): quando a floresta se retrai é que podemos apreender propriamente a floresta. ''[[Éthos]]'' é a [[linguagem]] enquanto [[mundo]], onde, morando, nos apreendemos como [[seres humanos]] existindo no [[mundo]]. Daí resulta a ''[[Sophía]]''. A [[sabedoria]] é o [[ético]] [[vigorando]] como [[realidade]] [[poética]] enquanto [[mundo]]. São as [[artes]]. Devemos ter o [[cuidado]] de não confundir [[mundo]], que é uma [[questão]], com [[mundo]] seguido de um adjetivo, que se transforma simplesmente em [[conceito]]. Por exemplo: [[mundo]] [[medieval]], [[social]], [[exterior]], [[interior]], [[masculino]], [[feminino]] etc.
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:(2) HEIDEGGER, Martin. In: Einblick in das was ist "Das Ding". In: ------. ''Bremer und Freiburg Vorträge''. G.A., Bd. 79.
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==6==
 
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:"No fazer-se [[Linguagem]] do [[Ser]], o [[homem]] vem a si mesmo e o mundo vem ao homem para ser mundo" (1).
 
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: - [[Manuel Antônio de Castro]]
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:Referência:
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==  8 ==
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: "E nós olhamos: o [[mundo]] (que não foi criado uma só vez, mas tantas quantas as vezes que aparece um [[artista]] [[original]]) parece-nos totalmente transformado relativamente ao precedente, mas também inteiramente [[claro]]" (1).
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:(1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Hegel, Heidegger e o Absoluto". In: ''Aprendendo a pensar''. Petrópolis: Vozes, 1977, p. 262.
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: Em si o [[artista]] não é o que cria [[mundo]], uma [[ideia]] [[cristã]] que desfoca a [[verdadeira]] [[questão]]: quando o [[ser humano]] atua, ele só pode atuar e/ou [[agir]] a partir do que já existe e do que já lhe foi dado. [[Criar]] então significa simplesmente [[manifestar]] o que ainda não foi manifesto.
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==7==
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: - [[Manuel Antônio de Castro]]
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:Mundo usa-se em muitos sentidos. Propriamente o falar de [[sentido]] já é falar de mundo. Como pode haver sentido sem mundo ou mundo sem sentido? Em si, mundo é uma das questões mais complexas. O seu entendimento como meio ou contexto já surge de teorias sobre o [[real]]. O que é mundo?
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-
:1° Mundo cultural. Aí mundo diz que cada [[cultura]] constitui em si um mundo. Como tal daria consistência a uma [[identidade]], a daqueles que pertencem a tal cultura. As culturas constituiriam entre si [[diferença|diferenças]]. Como explicá-las? Outra questão a este respeito: Como se relaciona linguagem/língua/cultura? Ocorre que há diferentes conceitos de cultura, dependendo da [[disciplina]]. A tensão entre língua e cultura não pode ser vista a partir de um conceito linguístico de língua, algo formal e abstrato. O vigor de toda cultura é o que une [[terra]], [[céu]], ser humano enquanto mundo: o [[sagrado]]. Por isso, toda cultura tem si um [[culto]]: os [[Rito|ritos]] dos [[Mito|mitos]], pelos quais acontece o vigorar do sagrado;
+
-
:2° Mundo e universo real. É muito genérico mas ao mesmo tempo pode significar todo o real externo e também o interno, como por exemplo, na expressão: "meu mundo interior";
+
-
:3° [[Visão]] de mundo. Aqui significa que o real é experienciado e vivenciado a partir de uma religião, de uma [[teoria]] filosófica, científica, política, econômica. O que fica implícito a toda visão de mundo é a [[questão]] do [[real]]. O que é "real" aí? Deus? Matéria? Sociedade? Se pode haver diferentes teorias do real e em diferentes campos é porque o próprio real dando-se nessas teorias se retrai como real. O real diz-se e manifesta-se de muitas maneiras. A cada maneira de manifestação dá-se o nome de mundo;
+
-
:4° [[Ser]] e mundo. É o sentido [[ontologia|ontológico]]. Como tal abrange e ultrapassa todos os outros. Mas para ser/mundo comparecem: ''[[phýsis]]'' enquanto nascividade/ser; ''[[poíesis]]'' enquanto vigor poético; ''[[tékhne]]'' enquanto o conhecer que advém na e pela luz, ''[[lógos]]'' enquanto linguagem. Não pode haver mundo sem [[linguagem]]. ''Lógos''/linguagem é mundo. ''[[Alétheia]]'', ou seja, a própria realidade ou ser se ofertando enquanto [[clareira]] de [[desvelamento]], isto é, [[verdade]] e não-verdade (a clareira articula sempre um desvelamento e um velamento: quando a floresta se retrai é que podemos apreender propriamente a floresta.  ''[[Éthos]]'' é a linguagem enquanto mundo, onde, morando, nos apreendemos como seres humanos. Daí resulta a ''Sophía'', isto é, a [[sabedoria]] é o ético vigorando como realidade poética enquanto mundo. São as artes. Devemos ter o cuidado de não confundir mundo, que é uma questão, com mundo seguido de um adjetivo, que se transforma simplesmente em conceito. Por exemplo: mundo medieval, social etc.
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: Referência:
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:- [[Manuel Antônio de Castro]]
+
: (1) GRASSI, Ernesto. '''Arte e Mito'''. Lisboa: Livros do Brasil, s.d., p. 172.
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== 9 ==
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: Hoje há uma tendência, entre certos [[teólogos]], de falarem de [[mundo]] a partir das [[concepções]] da [[realidade]] oriundas da [[ciência]], como se esta constituísse a [[realidade]] básica, a partir da qual se poderiam dar [[explicações]] [[teológicas]], [[poéticas]] etc. Nota-se que falta algo e fazem afirmações problemáticas e superficiais. Emmanuel Carneiro Leão (1) encaminha o [[tema]] adequadamente ao relacionar as pesquisas e afirmações da [[ciência]] com [[mundo]]. Só porque há um [[mundo]] é que os cientistas podem [[fazer]] [[pesquisas]] físicas, biológicas etc. Eles já pressupõem o [[mundo]] constituído. Nenhuma se preocupa em [[pensar]] a própria constituição do [[mundo]] e de [[mundos]].  Por isso, [[pensar]] a [[realidade]] enquanto [[mundo]] é [[pensar]] a [[realidade]] [[originariamente]]. Mas para tanto, também é necessário [[pensar]] a [[cultura]] [[originariamente]], porque [[mundo]] e [[cultura]] se implicam. Como relacionar [[mundo]], [[linguagem]] e DNA, ou seja, o [[código]] [[genética|genético]]?
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==8==
 
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:"E nós olhamos: o mundo (que não foi criado uma só vez, mas tantas quantas as vezes que aparece um artista original) parece-nos totalmente transformado relativamente ao precedente, mas também inteiramente claro" (1).
 
-
:Em si o [[artista]] não é o que cria mundo, uma ideia cristã que desfoca a verdadeira questão: quando o ser humano atua, ele só pode atuar a partir do que já existe e do que já lhe foi dado. Criar então significa simplesmente manifestar o que ainda não foi manifesto.
 
 +
: - [[Manuel Antônio de Castro]]
-
:- [[Manuel Antônio de Castro]]
+
: Referência:
 +
: (1) Cf. LEÃO, Emmanuel Carneiro. "O pensamento de Heidegger no silêncio de hoje". In: ---. '''Aprendendo a pensar II'''. Petrópolis, Vozes, 1992, p. 192.
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:Referência:
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== 10 ==
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: Há uma [[mediação]] dos [[ente|entes]] infra-humanos com o [[homem]] e com o [[ser]]. É nessa [[mediação]] que se vai constituir [[mundo]], pois o [[homem]] é o [[ponto]] de re-ferência e [[unidade]]. Nessa [[mediação]] do [[homem]] fica claro como a [[cultura]] é [[mundo]]. Na verdade, para cada ser vivo corresponde um [[mundo]]. Se para conhecermos o [[mundo]] de cada um de nós, [[seres humanos]], já é problemático e até sempre incompleto, imagine-se o [[mundo]] de cada [[ser]] [[vivo]] ou até de [[espécies]]. É um [[mistério]]. Por isso, só podemos falar de [[mundo]] para os demais [[seres]] [[vivos]] a partir do que já, nós, [[seres humanos]], experienciamos como [[mundo]], pois já nos experienciamos vivendo e sendo enquanto e no [[mundo]].
-
:(1) GRASSI, Ernesto. ''Arte e Mito''. Lisboa: Livros do Brasil, s.d., p. 172.
 
 +
: - [[Manuel Antônio de Castro]]
-
==9==
+
: Referência:
-
:Hoje há uma tendência entre certos teólogos de falarem de mundo a partir das concepções da [[realidade]] oriundas da [[ciência]], como se esta constituísse a realidade básica, a partir da qual se poderiam dar explicações teológicas, poéticas etc. Nota-se que falta algo e fazem afirmações problemáticas e superficiais. Emmanuel Carneiro Leão (1) encaminha o tema adequadamente ao relacionar as pesquisas e afirmações da [[ciência]] com mundo. Só porque há um mundo é que os cientistas podem fazer pesquisas físicas, biológicas etc. Eles já pressupõem o mundo constituído. Nenhuma se preocupa em pensar a própria constituição do mundo e de mundos.  Por isso, pensar a realidade enquanto mundo é pensar a realidade originariamente. Mas para tanto, também é necessário pensar a [[cultura]] originariamente, porque mundo e cultura se implicam. Como relacionar mundo, [[linguagem]] e DNA, ou seja, o [[código]] [[genética|genético]]?
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 +
: (1) HUMMES, Cláudio. '''Metafísica'''. In: [http://'''travessiapoetica.blogspot.com Travessia Poética'''] pp. 118-20 e pp. 131-33.
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:- [[Manuel Antônio de Castro]]
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== 11 ==
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: Há uma estreita [[relação]] [[entre]] a instauração de [[mundo]] e a edificação de uma [[obra]]. Diz Leão: "[...] o processo de instauração do [[mundo]] comporta sempre a edificação de uma [[obra]], uma operação" (1).
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: A instauração de [[mundo]] se dá:
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:Referência:
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: a) pela [[arte]];
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: b) pela ação criadora do político, que funda um novo [[sistema]] de convivência, [[espaço]] [[essencial]] da [[cidadania]];
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: c) pelo comportamento do [[herói]], que realiza um sacrifício transcendente;
 +
: d) pela reflexão do [[pensador]], que converte em marcha de [[pensamento]] a [[verdade]] da [[existência]]. "[...] sempre qualquer processo de instauração de [[mundo]] é a edificação de uma [[obra]]. É um primeiro resultado. O segundo se refere à [[Linguagem]] como dinamismo e potência da [[obra]]" (2).
-
:(1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. ''Aprendendo a pensar II''. Petrópolis, Vozes, 1992, p. 192.
 
 +
: - [[Manuel Antônio de Castro]]
-
==10==
+
: Referência:
-
:Há uma mediação dos [[ente|entes]] infra-humanos com o [[homem]] e com o [[ser]]. É nessa mediação que se vai constituir mundo, pois o homem é o [[ponto]] de re-ferência e [[unidade]]. Nessa mediação do homem fica claro como a cultura é mundo.
+
 +
: (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Existencialismo e literatura". In: '''Aprendendo a pensar'''. Petrópolis: Vozes, 1977, p. 168.
 +
 +
: (2) Idem, p. 168.
-
:- [[Manuel Antônio de Castro]]
+
== 12 ==
 +
: "... [[mundo]] diz a matriz de [[sentido]] no interior da qual um [[ser humano]] vive sua [[vida]]. É no [[mundo]] que o [[homem]] experiencia sua mortalidade, sua desmesura, seus poderes, seus fracassos, sua sede" (1).
-
:Referência:
+
: Referência:
-
:(1) HUMMES, Cláudio. ''Metafísica''. In: [http://travessiapoetica.blogspot.com Travessia Poética] pp. 118-20 e pp. 131-33.
+
: (1) UNGER, Nancy Mangabeira. "Heidegger e a espera do inesperado". In: Rio de Janeiro: '''Revista Tempo Brasileiro - Interdisciplinaridade, dimensões poéticas''', 164, 2006, p. 182.
-
==11==
+
== 13 ==
-
:Há uma estreita relação entre a instauração de mundo e a edificação de uma [[obra]]. Diz Leão: "[...] o processo de instauração do mundo comporta sempre a edificação de uma obra, uma operação" (1). A instauração de mundo se dá:
+
: "O [[existir]] se dá, e só pode se dar no, ou num [[mundo]]. O [[ser]] é condição de [[possibilidade]] do estabelecimento de todo e qualquer [[mundo]]. O [[ser]] é [[sempre]] como [[vigência]] de uma substantividade [[essencial]] infinitiva, isto é, como condição de [[possibilidade]] de qualquer forma de [[sentido]] a ''posteriori''. A [[vigência]] do [[ser]] é que inaugura a [[possibilidade]] de [[mundo]], mas não só de [[mundo]], também de [[caos]]. [[Existir]] não. Impõe o [[mundo]] como ordenação e configuração de um [[caos]] primordial e, ao mesmo tempo, a superação dessa [[ordem]] e desse modo de configurar" (1).
-
:a) pela [[arte]];
 
-
:b) pela ação criadora do político, que funda um novo [[sistema]] de convivência;
 
-
:c) pelo comportamento do [[herói]], que realiza um sacrifício transcendente;
 
-
:d) pela reflexão do pensador, que converte em marcha de [[pensamento]] a [[verdade]] da [[existência]]. "[...] sempre qualquer processo de instauração de mundo é a edificação de uma obra. É um primeiro resultado. O segundo se refere à [[Linguagem]] como dinamismo e potência da obra" (2).
 
 +
: Referência:
-
:- [[Manuel Antônio de Castro]]
+
: (1) JARDIM, Antonio. '''Música: vigência do pensar poético'''. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 56.
 +
== 14 ==
 +
: A [[história]] é [[sempre]] a [[história]] do [[mundo]], mas só o [[mundo]] funda a [[história]] do [[mundo]]. Então [[história]] e [[mundo]] são o ''[[mesmo]]'' sem serem a mesma [[coisa]]. Ambos [[vigoram]] no [[mesmo]] [[princípio]]. E quando percebemos esta concretude [[originária]] é que podemos nos dar conta de como é [[impossível]] separar a [[história]] do [[homem]] e o [[homem]] da [[história]], porque o [[homem]] é [[homem]] por [[ser]] [[originariamente]] a [[transcendência]] enquanto [[mundo]]. Sem [[mundo]] não há [[homem]] e sem [[homem]], em sua [[transcendência]], não há [[mundo]]. E o [[homem]] aí não pode ser de maneira alguma um [[conceito]] [[genérico]], uma [[essência]] [[conceitual]], pois é o [[mundo]] que, como [[princípio]] [[originário]], dá [[unidade]] a todos os [[seres humanos]]. E aí [[mundo]] [[cultural]] é uma expressão menor diante da [[originariedade]] do [[humano]].
-
:Referências:
 
-
:(1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Existencialismo e literatura". In: ''Aprendendo a pensar''. Petrópolis: Vozes, 1977, p. 168.
+
: - [[Manuel Antônio de Castro]]
-
:(2) Idem, p. 168.
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== 15 ==
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: O auto-diálogo é [[originário]] porque nele e só nele acontece o apropriar-se do que é [[próprio]], isto é, o que somos enquanto manifestação de [[mundo]] e [[terra]]. [[Mundo]], no fundo, é [[sempre]] o que somos enquanto [[sentido]] e [[verdade]]. O [[sentido]] e [[verdade]] do que somos, enquanto [[mundo]], nos advém no [[auto-diálogo]].
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== 12 ==
 
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:"mundo diz a matriz de [[sentido]] no interior da qual um ser humano vive sua vida. É no mundo que o homem experiencia sua mortalidade, sua desmesura, seus poderes, seus fracassos, sua sede" (1).
 
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: - [[Manuel Antônio de Castro]]
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:Referência:
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== 16 ==
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: "Eu me ultrapasso abdicando de meu [[nome]], e então sou o [[mundo]]. Sigo a [[voz]] do [[mundo]] com voz única" (1).
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:(1) UNGER, Nancy Mangabeira. "Heidegger e a espera do inesperado". In: ''Revista Tempo Brasileiro''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, nº 164, 2006, p. 182.
 
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: Referência:
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== 13 ==
+
: (1) LISPECTOR, Clarice. '''Água viva'''. Rio de Janeiro: Artenova, 1973, p. 57.
-
:"O [[existir]] se dá, e só pode se dar no, ou num, mundo. O ser é condição de possibilidade do estabelecimento de todo e qualquer mundo. O [[ser]] é sempre como vigência de uma substantividade essencial infinitiva, isto é, como condição de possibilidade de qualquer forma de [[sentido]] a posteriori. A vigência do ser é que inaugura a possibilidade de mundo, mas não de mundo, também de [[caos]]. Existir não. Impõe o mundo como ordenação e configuração de um caos primordial, e ao mesmo tempo a superação dessa [[ordem]] e desse modo de configurar" (1).
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== 17 ==
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: "[[Mundo]] não é a mera [[reunião]] das [[coisas]] existentes, contáveis ou incontáveis, conhecidas ou desconhecidas. [[Mundo]] também não é uma moldura apenas imaginada e representada em relação à soma do existente. O [[mundo]] mundifica, sendo mais do que o que se pega e percebe, em que nos acreditamos confiantes. [[Mundo]] nunca é um [[objeto]] que está diante de nós e pode ser visto. [[Mundo]] é o [[sempre]] inobjetivável, ao qual estamos subordinados enquanto as vias de [[nascimento]] e [[morte]], bênção e maldição nos mantiverem arrebatados pelo [[ser]] (a). Onde acontecem as [[decisões]] mais essenciais de nossa [[história]], que por nós são aceitas ou rejeitadas, não compreendidas e de novo questionadas, aí o [[mundo]] mundifica" (1).
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: Referência:
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: (1) HEIDEGGER, Martin. '''A origem da obra de arte'''. Trad. Idalina Azevedo da Silva e Manuel Antônio de Castro. São Paulo: Edições 70, 2010, p. 109.
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== 18 ==
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:"Nenhuma [[realidade]] se desenvolve plenamente como [[real]], nem chega à [[plenitude]] de surgir e realizar-se por si mesma num [[mundo]], sem a [[vigência]] da [[arte]] nas [[obras]]" (1).
:Referência:
:Referência:
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:(1) JARDIM, Antonio. ''Música: vigência do pensar poético''. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 56.
+
: (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Arte e realidade". In: ---------. '''Aprendendo a pensar I'''. Petrópolis: Vozes, 1992, p. 248.
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== 19 ==
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: Mundo é uma [[palavra]]-[[questão]]. Ela diz respeito ao [[acontecer]] da [[realidade]] em seu eclodir como [[verdade]] e [[sentido]] nas realizações. Seria o [[originar-se]] do [[cosmos]] a partir do [[caos]], do [[nada]]. E nesse [[sentido]] usamos frequentemente [[mundo]] no lugar de [[real]] e de [[universo]].
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== 14 ==
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:A [[história]] é sempre a história do mundo, mas só o mundo funda a história do mundo. Então história e mundo são o [[''mesmo'']] sem serem a mesma coisa. Ambos vigoram no mesmo [[princípio]]. E quando percebemos esta concretude originária é que podemos nos dar conta de como é impossível separar a história do homem e o homem da história, porque o homem é homem por ser originariamente a [[transcendência]] enquanto mundo. Sem mundo não há homem e sem homem, em sua transcendência, não há mundo. E o homem aí não pode ser de maneira alguma um conceito genêrico, uma [[essência]] conceitual, pois é o mundo que, como princípio originário, [[unidade]] a todos os seres humanos. E aí mundo cultural é uma expressão menor diante da originariedade do [[humano]].
+
: - [[Manuel Antônio de Castro]]
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== 20 ==
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: "Nós só podemos usar a mesma [[palavra]], para dizer tanto um [[fenômeno]] externo, a [[luz]] do [[sol]], como para um [[fenômeno]] interno, a [[luz]] da [[razão]], porque nem o [[sol]] está somente fora de nós, nem a [[razão]] está exclusivamente dentro de nós e sim porque sempre e necessariamente existimos como [[ser-no-mundo]]" (1).
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: Referência:
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: (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Apresentação". In: HEIDEGGER, Martin. '''Ser e tempo'''. Parte I, 2. e. Petrópolis: Vozes, 1988, p. 19.
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== 21 ==
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:Não são as [[coisas]], plantas e animais do meio, nem a apreensão objetiva dos fatos contextuais da [[sincronia]] e [[diacronia]] que formam o mundo.  Se assim fosse, eu ainda não teria como superar o fosso entre [[objetividade]] e [[subjetividade]] e sua cadeia de [[representações]].  Se assim fosse, eu ainda não teria como poder ordenar os [[fatos]] num todo e estes deveriam necessariamente me aparecer como uma soma desconexa.  Se assim fosse, o homem seria algo que está-aí ao lado das coisas que estão-aí e jamais poderia falar em [[conjuntura]]. Só o [[homem]] tem mundo e então mundo significa a constitutiva [[abertura]] do homem ao [[sentido]] do [[Ser]], através da qual o homem revela o sentido do que está-, revelando-se a ele mesmo como ex-sistência,  integrando tudo na totalidade de um mundo. Mas o ser humano não é o [[sujeito]] do mundo. Este não advém por seu [[fazer]]. Mundo é o destinar-se do sentido do ser no homem. Somente o [[agir]] de tal sentido no homem lhe possibilita fazer e compreender mundo. Noutras palavras: só o ser humano (masculino ou feminino) pensa porque nele opera, age, o sentido do ser: mundo. O mundo manifesto no [[dizer]] do sentido é a [[linguagem]]. E é isso a [[arte]].
: - [[Manuel Antônio de Castro]]
: - [[Manuel Antônio de Castro]]
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== 22 ==
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: [[Mundo]] não é uma [[visão]] do [[real]] a partir de uma ou outra [[teoria]]. [[Mundo]] é a [[vigência]] do [[ser]] acontecendo tanto nos sujeitos como nos predicados enquanto [[presença]] e [[sentido]]. Ou seja, [[Mundo]] é [[Linguagem]] constituindo [[línguas]] enquanto estas operam [[discursos]] e [[proposições]] e seus [[significados]]. Por isso, prévia aos [[discursos]] e às [[proposições]], há uma [[sintaxe]], isto é, [[Mundo]], porque [[mundo]] implica sempre [[sentido]] e [[ordem]]. Nesse horizonte de [[pensamento]], [[mundo]] implica sempre [[sentido]] e [[linguagem]]. Embora não seja propriamente uma [[visão]], é no [[horizonte]] do que se nos dá a [[ver]] e se oculta que para cada um se dá [[mundo]]. Há uma ligação profunda entre [[mundo]] e [[ideia]]. O alcance das [[ideias]] de cada [[ser humano]] é o mesmo do [[horizonte]] para cada um. Só aparentemente vemos, numa [[posição]], as mesmas [[coisas]] que os [[outros]]. Elas serão sempre lidas no e pelo alcance do [[mundo]] de cada um, que não significa [[subjetividade]], porque não é esta que constitui o [[horizonte]] e, portanto, não constitui o [[mundo]]. 
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: - [[Manuel Antônio de Castro]]
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== 23 ==
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: "Mas não acredito mais que o [[mundo]] marcha necessariamente numa direção inexorável, como um trem preso aos trilhos. O [[mundo]] é um maloqueiro drogado, a ziguezaguear trôpego por aí. Como disse um político brasileiro, a gente vive esperando pelo inevitável e o que nos chega é sempre o [[inesperado]]" (1). Cabe aqui lembrar o fragmento 18 de Heráclito: "Se não se espera, não se encontra o [[inesperado]], sendo sem [[caminho]] de encontro nem [[vias]] de acesso" (2). Todo esforço do [[sujeito]] [[humano]] em enquadrar o [[acontecer]] da [[realidade]] como [[mundo]] está destinada ao fracasso, pois o [[ser humano]] não é [[sujeito]] de [[nada]] no que tange ao [[essencial]]. Esse [[essencial]] é a própria eclosão de [[mundo]] na medida em que este é o próprio [[sentido]] do [[Ser]] em seu [[destinar-se]].
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: - [[Manuel Antônio de Castro]]
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: (1) DIEGUES, Cacá. "Manifesto septuagenário". In: ''O Globo'', 19-10-2013, p. 20.
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: (2) HERÁCLITO. In: ''Os pensadores originários - Anaximandro, Parmênides, Heráclito''. Petrópolis: Vozes, 1991, p. 63.
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== 24 ==
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: "Sentia que àquela hora atingiria a derradeira [[perfeição]] na [[arte]] de [[escutar]]. Quantas vezes não ouvira todos aqueles rumores, a [[multiplicidade]] das [[vozes]] que vinham do [[rio]], mas naquele [[dia]] lhe pareciam novas. Já não era capaz de identificá-las. Não conseguia [[distinguir]] as [[vozes]] jubilosas das choronas, as infantis das másculas. Todas elas formavam uma só, a [[lamentação]] da [[nostalgia]], a risada do [[ceticismo]], o [[grito]] da cólera e o estertor a [[agonia]]. [[Tudo]] era uma e a [[mesma]] [[coisa]], [[tudo]] se entretecia, enredava-se, emaranhava-se mil vezes. E todo aquele [[conjunto]] , a soma das [[vozes]], a [[totalidade]] das [[metas]], das [[ânsias]], dos [[sofrimentos]], das delícias, [[todo]] o [[Bem]] e [[todo]] o [[Mal]], esse [[conjunto]] era o [[mundo]]. Esse [[conjunto]] era o [[rio]] dos [[destinos]], era [[música]] da [[vida]]" (1).
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: Referência:
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: (1) HESSE, Hermann. ''Sidarta''. Trad. Herbert Caro. Rio de Janeiro: O Globo, 2003, p. 112.
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== 25 ==
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:"Nós também: estamos sempre a inventar [[regras]] na [[esperança]] de domar o que não se pode domar. O que, provavelmente, não se deve domar. A [[verdade]] insuportável, que a doce Alice nos obriga a encarar, é que vivemos em um mundo no qual existem muito mais [[enigmas]] do que respostas. Um mundo inconstante, cheio de [[coisas]] que servem para outras coisas - e não para aquelas que imaginamos a que estejam destinadas" (1). O autor está falando de Alice, a personagem paradoxal da obra de Lewis Carroll ''Alice no país das maravilhas''.
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: [[Manuel Antônio de Castro]].
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: (1) CASTELLO, José. "Por que ler 'Alice'?. In: ''O Globo'', Caderno "Prosa e verso", 23-05-2015, p. 5.
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== 26 ==
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: No verso de Pessoa em “Autopsicografia”: “O poeta é um fingidor”, tanto o [[sujeito]] como o predicado são doações e passíveis de [[vigência]] na vigência do [[ser]], isto é, da [[arché]] ou [[verbo]] ou [[essência]] originária. No verso citado, é o ser, o verbo “é” que dá vigência ao [[poeta]] e ao fingidor. Sem o [[horizonte]] do ser não há nem poeta nem fingidor, o que significa que não há, sem ele, [[sentido]], [[verdade]], isto é, mundo. Mundo não é, portanto, uma [[visão]] do [[real]] a partir de um ou outra [[teoria]]. Mundo é a vigência do ser acontecendo tanto nos sujeitos como nos predicados. Ou seja, Mundo é [[Linguagem]] constituindo [[línguas]] enquanto estas operam [[discursos]] e proposições. Por isso, prévia aos discursos e às proposições há uma [[sintaxe]], isto é, Mundo. Nas línguas da Linguagem patenteia-se Mundo.
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: - [[Manuel Antônio de Castro]]
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== 27 ==
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: Só o [[homem]] tem [[mundo]] e então [[mundo]] significa a constitutiva [[abertura]] do [[homem]] ao [[sentido]] do [[Ser]], através da qual o [[homem]] revela o [[sentido]] do que está-aí, revelando-se a ele mesmo como [[ex-sistência]],  integrando tudo na totalidade de um [[mundo]]. Isto só pode [[acontecer]], porque o ''[[Dasein]]'', por sua [[abertura]] constitutiva ao [[sentido]] do [[Ser]], por sua condição de ''Mitsein'' (Ser-com), no [[sentido]] de convivência poético-político-ontológica, pode [[integrar]] [[tudo]] e todos  como [[mundo]]. [[Tudo]] [[isto]] não poderia ocorrer se o [[mundo]] e a [[compreensão]] não fossem [[dimensões]] inseparáveis da constituição [[ontológica]]  do [[homem]].
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: - [[Manuel Antônio de Castro]]
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== 28 ==
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: "E o [[mundo]] [[nada]] mais é do que essa mesma [[realidade]] eclodindo em sua [[verdade]] e [[sentido]], que é o [[sentido]] do que nos é [[próprio]], do que somos. E o que nos ensinam é [[sempre]] um [[mundo]] já realizado e configurado num [[atributo acidental]], é o [[mundo]] adjetivado. Nesse [[horizonte]] o [[mundo]], como desafio de [[sentido]] a [[ser]] realizado, passa para segundo plano porque já está pronto, apenas há a variação infindável dos [[atributos acidentais]]: [[mundo]] atual, [[mundo]] [[antigo]], [[mundo]] [[social]], [[mundo]] [[psíquico]], enfim, isto e aquilo. Por que somos [[mundo]] sem [[atributos]] acidentais? Porque somos [[próprio]]" (1).
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: Referência
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 +
: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O próprio como possibilidades". In: ---. '''Arte: o humano e o destino'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 126.
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== 29 ==
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: "A [[obra]], enquanto [[verdade]] de [[desvelamento]], eclosão de [[vida]], produz em nós a nossa eclosão como [[mundo]]. É que todo [[desvelamento]] já é em-si [[mundo]]. Então o [[real]] nos advém como [[verdade]]. E o [[sentido]] de nossa [[vida]], como [[corpo]]-[[mundo]]-[[erótico]], se realiza como [[sabedoria]]: é a [[experienciação]] [[ética]] da [[vida]]. Sendo [[corpo]]-[[mundo]]-[[eros]], o [[homem]], que somos, se torna [[homem]] [[humano]], isto é, essencializamo-nos em nossa [[humanidade]]. É que as [[possibilidades]] do [[humano]] são as [[possibilidades]] da [[semente]]-[[obra-de-arte]]. Nesse [[horizonte]], o [[humano]] é o ''[[logos]]'', reunindo em torno de si todos os [[seres]] do [[real]] enquanto [[tempo]]-[[memória]], ou seja, [[mundo]].  É nesse [[sentido]] que o [[homem]] é [[homem]] enquanto ''[[logos]]'' (1).
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: Referência:
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Obra de arte, vocabulário e mundo". In: ---. '''Leitura: questões'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2015, p. 251.
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== 30 ==
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: "Por detrás de, com e em todo [[vocabulário]] há não só uma [[realidade]]-[[mundo]], mas também, concomitantemente, um [[caminho]] e uma [[caminhada]]. Na [[caminhada]] de cada [[vocabulário]] há o desenho de uma [[realidade]], ou seja, a cada [[vocabulário]] corresponde um [[mundo]]. Nesse [[sentido]], igualmente se entende por [[mundo]] uma determinada [[época]]. Por isso, podemos [[falar]] em [[vocabulário]] quando o seu [[conjunto]] de [[nomes]] nos apresenta uma [[realidade]] entendida enquanto determinado [[mundo]]" (1).
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: Referência:
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Obra de arte, vocabulário e mundo". In: ---. '''Leitura: questões'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2015, p. 242.
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== 31 ==
 +
: "- Quais são os [[limites]] da [[realidade virtual]]?"
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: - O que me surpreende todo santo dia são as [[possibilidades]] daquilo que podemos fazer com ela. Posso botar pessoas debaixo da água num [[mundo]] fantástico, ou em Marte, ou em outro planeta qualquer. São [[possibilidades]] [[infinitas]] de [[criação]] de [[mundo]], e isso é incrível. Não criamos [[histórias]], mas [[mundos]] para o observador ficar imerso naquele ambiente." (1)
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: Referência:
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 +
: BERFORD, Bruna - profissional de animação. In: '''O Globo''', pag. 2, Sexta-feira, 6.4.2018.
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== 32 ==
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: "Há uma [[proximidade]] entre [[mundo]] e [[funcionalidade]], mas não são a mesma [[coisa]], porque sem [[mundo]], sem [[sentido]], sem [[linguagem]], é impossível qualquer [[sistema]] funcional" (1).
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: Referência:
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. “A menina e a bicicleta: arte e confiabilidade”. In: ------. ''Arte: o humano e o destino''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 282.
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== 33 ==
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: "Por isso, o [[tempo]] é a quarta [[dimensão]] do [[espaço]], como afirmam os físicos. Porém, tal [[tempo]] não é o [[tempo]] tripartido (somente cronológico), porque o [[tempo]] tem também uma quarta [[dimensão]]: é a [[linguagem]]" (1). Esta é o [[tempo]] [[poético]]. E pensá-lo é a [[Poética]]. Se o [[tempo]] é a quarta [[dimensão]] do [[espaço]] e a [[linguagem]] a quarta [[dimensão]] do [[tempo]], a [[linguagem]] é o [[fundar]] de [[tempo]] e [[espaço]]. Esse [[fundar]] é o [[fundamentar]] o [[lugar]]. [[Lugar]] ou ''campo'' é [[mundo]]. A [[linguagem]] é [[mundo]] e [[sentido]], porque o [[mundo]] é a quarta [[dimensão]] da [[linguagem]]. Como o [[leitor]] percebe, torna-se imprescindível a [[leitura]] do [[ensaio]] de Heidegger abaixo indicado, onde apreendemos estas [[ideias]].
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: - [[Manuel Antônio de Castro]]
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: Referência:
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: 1) Cf. HEIDEGGER, Martin. "Tempo e ser". In: ______. '''Os pensadores'''. São Paulo: Abril Cultural, 1979, pp. 255-72.
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== 34 ==
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: "Digo ao senhor: e foi [[menino]] nascendo. Com as lágrimas nos olhos, aquela [[mulher]] rebeijou minha mão...Alto eu disse, no me despedir: - "Minha Senhora Dona: um [[menino]] nasceu - o [[mundo]] tornou a [[começar]]!" (1).
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: - Referência:
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: (1) ROSA, João Guimarães. '''Grande sertão: veredas'''. Rio de Janeiro: José Olympio, 6. e., 1968, 353.
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== 35 ==
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: "Os druidas, e outros como eles, acreditam que as [[almas]] são [[imortais]], que o [[mundo]] o é igualmente. Mas que um dia, porém, somente o [[fogo]] e a [[água]] reinarão sobre o [[universo]]" (1).
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: Referência:
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 +
: (1) Estrabon, '''Geografia''' (1e. século antes de Cristo). Textos apresentados por Jean Markale. Paris: Albin Michel, '''Cadernos de Sabedoria''', 2004, p. 47. Tradução do francês: Manuel Antônio de Castro.
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== 36 ==
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: "O [[tema]] central dos escritos de [[Chuang Tzu]] gira em torno da [[liberdade]]. Não a [[liberdade]] específica que conhecemos hoje, mas uma [[liberdade]] [[originária]]. Sua [[questão]] básica era averiguar como pode o [[homem]] [[viver]] em um [[mundo]] consubstanciado pelo [[caos]], pelo [[sofrimento]] e pelo [[absurdo]], isto é, o non-sense, o [[sem-sentido]], o [[ilógico]], alógico, metalógico. E a [[resposta]] do [[sábio]] é com outra [[questão]]: para libertar-se do [[sofrimento]], da [[dor]], do [[desconcerto do mundo]], da incoerência do planeta liberte-se do [[mundo]]. Mas como se libertar do [[mundo]] estando inserido no [[mundo]]? Como se libertar do planeta e continuar vivo sobre a face da [[Terra]]? A [[libertação]] aqui é a [[libertação]] dos [[conceitos]], dos condicionamentos, das [[dicotomias]]" (1).
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:  Referência:
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 +
:  (1) ROCHA, Antônio Carlos Pereira Borba. "Diálogo com Chuang Tzu, hoje". In: '''Revista Tempo Brasileiro''', 171 - '''Permanência e atualidade da Poética'''. Rio de Janeiro, out.-dez., 2007, p. 167.
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== 37 ==
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: "No entanto, aquilo que é verdadeiramente inquietante não é o [[fato]] de o [[mundo]] se tornar cada vez mais [[técnico]]. Muito mais inquietante é o [[fato]] de o [[Homem]] não estar preparado para esta [[transformação]] do [[mundo]], é o [[fato]] de nós ainda não conseguirmos, através do [[pensamento que medita]], lidar adequadamente com aquilo que, nesta [[era]],  está realmente a emergir" (1).
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: Referência:
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: (1)  HEIDEGGER, Martin. '''Serenidade'''. Lisboa: Instituto Piaget. Trad. Maria Madalena Andrade e Olga Santos, s/d., p. 21.
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== 38 ==
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: "Sendo o [[ser humano]] o [[sujeito]] e não mais o ''[[logos]]'' que reúne, a [[razão]] fundamenta os [[conhecimentos]] e a [[linguagem]] os comunica [[funcionalmente]].
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: Porém, como só há [[comunicação]] quando há um [[código]], a [[linguagem]] ficou reduzida ao [[código]] [[língua]]. O [[mundo]] que o ''[[logos]]'' funda como [[reunião]] de [[diferenças]] ficou prisioneiro ou do conjunto de [[significados]] articulados pelo [[código]] ou então dependente do [[mundo]] [[social]], enquanto [[conjunto]] [[funcional]] da [[estrutura]] [[social]].  Tal [[estrutura]] [[funcional]] é o [[conjunto]] ou [[rede]] de [[conhecimentos]] e [[informações]]. São estas o que constituem o [[mundo]] das [[diferentes]] [[culturas]]. É o que se procura hoje [[estudar]] sob o [[nome]] de [[inter-culturalidade]], onde o [[entre]] só diz respeito ao [[entre]] de cada [[cultura]], à [[identidade]] de cada [[cultura]], sem se voltarem para o ''[[logos]]'' de [[Heráclito]], no qual e a partir do qual: “[[tudo]] é [[um]]”"(1).
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: Referência:
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 +
: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Interdisciplinaridade poética: o ''entre''". Revista '''Tempo Brasileiro''': Rio de Janeiro: '''Interdisciplinaridade: dimensões poéticas''', 164, jan.-mar., 2006, p. 30.
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== 39 ==
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: "[[Heidegger]] referindo-se ao mesmo “[[entre]]” nas três [[dimensões]] (acima citadas), assim caracteriza a terceira: “Devemos [[saber]] que ... este “[[entre]]” não se estende, como uma corda, [[entre]] a [[coisa]] e o [[homem]], mas que este “[[entre]]”, como captação prévia, capta para além da [[coisa]] e, ao mesmo tempo, por detrás de nós” ([[Heidegger]], 1992: 231) (2). Tão importante como a [[intuição]] [[originária]] é nossa [[facticidade]]. Esta diz da nossa [[condição]] de estarmos lançados no [[mundo]]. Não é uma [[escolha]] nossa. Isto diz algo muito [[simples]]: o que é [[mundo]] não nos  é dado pela [[consciência]]. O seu [[sentido]] é prévio a todo [[ato]] [[racional]]. Nesse [[sentido]], o [[mundo]] é a própria [[intuição]] [[originária]]" (1).
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: Referência:
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Interdisciplinaridade poética: o ''entre''". Revista '''Tempo Brasileiro''': Rio de Janeiro: '''Interdisciplinaridade: dimensões poéticas''', 164, jan.-mar., 2006, p. 31.
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 +
: (2) HEIDEGGER, Martin. '''Que é uma coisa?''' Lisboa: Edições 70, 1992.
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== 40 ==
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: "O “[[entre]]” é uma captação prévia, ou seja, é a [[intuição]] [[originária]], é o próprio ''[[logos]]'', de que falamos no item anterior. Então ''[[logos]]'' é [[mundo]] enquanto [[sentido]] e [[verdade]]. E, portanto, o [[mundo]] é o “[[entre]]” do ''[[Dasein]]'', ou seja, do [[Entre-ser]] e do [[ser-com]] ou ''[[Mit-sein]]''. A [[facticidade]] é então a nossa [[condição]] [[humana]] de sermos [[Entre-ser]] e [[Ser-com]]. À [[facticidade]] [[Heidegger]] chamou de [[transcendência]] ou [[mundo]]" (1).
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: Referência:
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 +
: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Interdisciplinaridade poética: o ''entre''". Revista ''Tempo Brasileiro'': Rio de Janeiro: ''Interdisciplinaridade: dimensões poéticas'', 164, jan.-mar., 2006, p. 31.
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== 41 ==
 +
: "As [[artes]], enquanto [[musas]], são as filhas da [[memória]]. Por isso, toda [[obra de arte]] opera o [[entre]] enquanto [[memória]] e [[tempo]], [[linguagem]] e ''[[poiesis]]'', onde o [[operar]] não é da [[obra]], mas da [[verdade]], ou seja, o [[entre]] enquanto [[desvelar-se]] e [[velar-se]].  Tal [[entre]] é o [[originário]] de [[mundo]]" (1).
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: Referência:
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 +
: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Interdisciplinaridade poética: o ''entre''". Revista ''Tempo Brasileiro'': Rio de Janeiro: ''Interdisciplinaridade: dimensões poéticas'', 164, jan.-mar., 2006, p. 34.
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== 42 ==
 +
: "O que no [[diálogo]] se entretece é o que somos como [[mundo]]. Mas há o [[mundo]] do [[orgânico]] e o [[mundo]] do [[corpo]]. Ao [[organismo]] corresponde o [[mundo]] já dado e manifestado enquanto [[rede]] de [[relações]] e [[funções]]. É o [[mundo]] das [[disciplinas]], da [[língua]] como [[código]], da [[linguagem]] como [[meio]]. Ao [[corpo]] corresponde o [[mundo]] [[inaugural]], [[poético]]" (1).
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: Referência:
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 +
: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Interdisciplinaridade poética: o ''entre''". Revista ''Tempo Brasileiro'': Rio de Janeiro: ''Interdisciplinaridade: dimensões poéticas'', 164, jan.-mar., 2006, p. 34.
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== 43 ==
 +
: "O [[corpo]] é o [[mundo]]. Como [[corpo]], o [[mundo]] se dá na [[disputa]] com a [[Terra]]. Uma tal [[disputa]] é o “[[entre]]” de [[Terra]] E [[Mundo]] [[acontecendo]]. Quanto mais o [[mundo]] se manifesta tanto mais a [[Terra]] se retrai e [[vela]]. Na [[disputa]], na [[obra de arte]], na ''[[poiesis]]'', a [[Terra]] se dá no que ela [[é]], aparecendo em sua riqueza e [[beleza]], [[integração]] e [[plenitude]]: é o [[mundo]]. O [[mundo]] não é uma [[totalidade]] de [[conhecimentos]], é a incessante [[doação]] da [[Terra]] enquanto ''[[poiesis]]'' E [[linguagem]]" (1).
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: Referência:
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 +
: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Interdisciplinaridade poética: o ''entre''". Revista ''Tempo Brasileiro'': Rio de Janeiro: ''Interdisciplinaridade: dimensões poéticas'', 164, jan.-mar., 2006, p. 34.
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== 44 ==
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: "O [[mundo]], amigo Govinda, não é [[imperfeito]] e não se encaminha lentamente à [[perfeição]]. Não! A cada [[instante]] é [[perfeito]]. Todo e qualquer [[pecado]] já traz em si a [[graça]]. Em todas as criancinhas já existe o ancião. Nos lactentes já se esconde a [[morte]], como em todos os moribundos há [[vida]] [[eterna]]. A [[homem]] algum é dado [[perceber]] até que ponto o seu [[próximo]] já avançou na [[senda]] que lhe coube" (1).
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: Referência:
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: (1) HESSE, Hermann. ''Sidarta''. Trad. Herbert Caro. Rio de Janeiro: O Globo, 2003, p. 118.
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== 45 ==
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: "A [[linguagem]] fala. O que acontece com essa [[fala]]? Onde encontramos a [[fala]] da [[linguagem]]? Sobremaneira no que se diz. No dito, a [[fala]] se consuma, mas não acaba. No dito, a [[fala]] se resguarda. No dito, a [[fala]] recolhe e reúne tanto os modos em que ela perdura como o que pela [[fala]] perdura - seu [[perdurar]], seu [[vigorar]], sua [[essência]]. Contudo, na maior parte das vezes e com frequência, o dito nos vem ao encontro como uma [[fala]] que passou" (1).
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: Não podemos esquecer que o [[vigorar]] da [[linguagem]] é o [[sentido]] e a [[verdade]] que orientam nossas [[ações]], nosso, enfim, [[agir]]. Daí o seu perdurar. E é nesse [[perdurar]] que o [[tempo]] [[é]] e acontece em seu [[desdobrar-se]] em [[épocas]]. A cada [[desdobramento]], a cada [[manifestação]] do [[vigorar]] do [[sentido]] e da [[verdade]] corresponde [[mundo]], de modo que o [[perdurar]] evidencia o [[vigorar]] do [[sentido]], da [[verdade]] e do [[mundo]] que se manifesta e é [[horizonte]] de nosso [[viver]], de nosso [[realizar-se]]. [[Mundo]] e [[sentido]] e [[verdade]] são para nós a [[realidade]]: [[vigorar]] da [[linguagem]].
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: - [[Manuel Antônio de Castro]].
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: Referência:
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: (1) HEIDEGGER, Martin. "A linguagem". In: ----. ''A caminho da Linguagem''. Trad. Marcia Sá Cavalcante Schuback. Petrópolis (RJ): Vozes; Bragança Paulista (SP): Editora Universitária São Francisco, 2003, p. 11.
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== 46 ==
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: ''Os [[olhos]] são a janela da [[alma]]''.
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: ''Cada um olha o [[mundo]] da sua janela''.
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: ''O [[mundo]] não é o que cada um olha''.
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: ''É o [[sentido]] do que [[acontece]]'' (1).
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: Referência:
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Leitura: compreender e interpretar". In: ----. ''Leitura: Questões''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2015, p. 87.
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== 47 ==
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: "[[Energia]] [[Cósmica]]. É difícil [[apreender]] toda [[importância]] desta [[energia]] pela [[densidade]] e [[amplitude]] de sua [[atuação]] e [[presença]]. Aí [[cósmica]] não diz uma noção [[científica]] e [[astronômica]], [[espacial]]. Não se trata de [[meio ambiente]] no [[sentido]] [[espacial]]. Propriamente diz [[habitação]], [[morada]], onde, além de entrar em [[harmonia]] com [[tudo]] e [[todos]], também vigora aí a [[energia]] [[cósmica]] como [[mundo]] e [[sentido]] de [[tudo]]. [[Habitar]] é o difícil [[exercício]] [[existencial]] de [[harmonizar]] essa [[tensão]] [[diferenciadora]] [[entre]] o que [[sou]] e o [[lugar]] do [[habitar]], pois este não determina, mas influi ou para ''[[Yin]]'' ou para ''[[Yan]]''. Isso [[é]] [[ser]] [[corpo]]" (1).
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:  Referência:
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:  (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Filosofia e o pensamento do corpo". In: ''Desdobramentos do corpo no século XXI''. MONTEIRO, Maria Conceição & GIUCCI, Guilhermo (orgs.). Rio de Janeiro: FAPERJ, Editora Caetés, 2016, p. 24.
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== 48 ==
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: "Seu [[ciúme]] não se parecia com o que conhecera na [[juventude]], quando a [[imaginação]] estimulava nele uma torturante [[fantasia]] [[erótica]]; dessa vez, ele era menos [[doloroso]], porém, mais destrutivo; lenta e mansamente, transformava uma [[mulher]] [[amada]] em [[simulacro]] de [[mulher]] [[amada]]. E,  como ela não era mais um [[ser]] seguro para ele, não havia mais nenhum ponto de estabilidade no [[caos]] sem [[valores]] que é o [[mundo]]" (1).
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: Referência:
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: (1) KUNDERA, Milan. ''A identidade'', trad. Teresa Bulhões Carvalho da Fonseca. São Paulo: Companhia de Bolso, 2009, p. 74.
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== 49 ==
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: "O [[mundo]] como o conhecemos - desde a menor [[partícula]] até o maior [[planeta]] -, é mantido em [[equilíbrio]] por uma [[lei]] baseada na [[natureza]] [[dualista]] equilibrada de [[todas]] as [[coisas]]. Sem o [[equilíbrio]] [[entre]] as duas [[forças]] [[opostas]] não haveria a [[criação]], isto é, não existiria o [[Universo]]. Por exemplo, as galáxias basicamente estão [[sujeitas]] a duas [[forças]] [[opostas]]: 1) as [[forças]] de expulsão - resultantes dos efeitos do ''Big Bang'', através das quais [[todas]] as galáxias movem-se para longe de nós - e 2) as [[forças]] gravitacionais, que puxam as galáxias umas contra as [[outras]]" (1). Essas duas [[forças]] ou [[energias]] não [[constituem]] também o [[princípio]] [[vital]], [[fundado]] pelo [[masculino]] e pelo [[feminino]]? Penso que sim.
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: - [[Manuel Antônio de Castro]].
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: Referência:
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: (1) GADALLA, Moustafa. "O mais religioso". In: ------. ''Cosmologia egípcia - o universo animado''. Trad. Fernanda Rossi. São Paulo: Madras Editora, 2003, p. 87.
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== 50 ==
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: "'''MUNDO ON-LINE'''.
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: A [[internet]] se tornou [[onipresente]] nas [[sociedades]] [[modernas]]. Teve um impacto [[decisivo]] no ganho de [[produtividade]] das [[economias]] e favoreceu o [[surgimento]] de empresas gigantes de [[tecnologia]]. Chega ser [[difícil]] [[pensar]] em alguma [[atividade]] que seja completamente '''off-line'''. Pelas [[previsões]] de Kleinrock, a tendência é que a [[rede]] se aprofunde ainda mais no cotidiano das [[pessoas]], até o ponto de se tornar ''invisível'', como a eletricidade" (1).
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: Eu acrescentaria aqui o [[surgimento]] da ''[[Internet 5G]]'' que realiza isso e muito mais. É uma [[revolução]] de [[transformações]]  [[impossíveis]] de [[prever]].
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: - [[Manuel Antônio de Castro]].
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: Referência:
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: (1) MATSUURA, Sérgio. Entrevista: "O pequeno ato de um grande passo: a criação da internet". In: '''O Globo''', domingo, 27-10-2019, "Economia", p. 39.
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== 51 ==
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: "A ''[[questão]]'' sobre o que ''há depois  da [[morte]]'' apenas terá [[sentido]], [[razão]] e segurança [[metodológica]], caso se conceba a [[morte]] em [[toda]] a sua [[essência]] [[ontológica]]. Aqui não se poderá tampouco [[decidir]] se essa [[questão]] apresenta uma [[questão]] [[teórica]] [[possível]]. A [[interpretação]] [[ontológica]] da [[morte]] ligada a este [[mundo]] precede toda [[especulação]] [[ôntica]] referida ao [[outro]] [[mundo]]" (1).
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: Referência:
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: (1) HEIDEGGER, Martin. ''Ser e tempo''. Tradução revisada de Marcia Sá Cavalcante Schuback. Petrópolis/RJ: Vozes / Editora Universitária São Francisco, 2006, p. 323.
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== 52 ==
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: "É difícil [[dizer]] se o [[mundo]] em que vivemos é uma [[realidade]] ou um [[sonho]]" (1).
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: Referência:
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: (1) Kim Ki Duk. Filme: ''A casa vazia''.
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== 53 ==
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: "A [[realidade]], enquanto [[linguagem]] e [[sentido]], é o que denominamos: [[mundo]]" (1).
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: Referência:
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Amar e Ser". In:------. ''Arte: o humano e o destino''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 317.
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== 54 ==
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: "Toda a [[cultura]] significa lançar a [[luz]] do [[ser]] que brilha em nós sobre o [[mundo]], em que estamos encarnados para arrancá-lo de suas trevas e glorificar nele o [[ser]] também.  Por isto, devemos concluir: o [[mundo]] por si só não é vestígio nenhum do [[ser]], de [[Deus]], mas somente quando nós sobre ele lançarmos a [[luz]] do [[ser]] que brilha em nós: as [[coisas]] do [[mundo]] podem tornar um [[caminho]] para o [[ser]], quando o reflexo da [[luz]] do [[ser]], que lanço sobre eles, faz com que neles eu possa [[descobrir]] e [[reconhecer]] o [[ser]]" (1).
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:  Referência:
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:  (1) HUMMES, o.f.m. Frei Cláudio. ''Metafísica''. Mimeo. Daltro Filho / Imigrantes, RS, 1963. Depois tornou-se Bispo e hoje é Cardeal.
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== 55 ==
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: "[[Verdade]] não é nenhuma afirmação de [[adequação]] [[entre]] aquilo de que se fala e o que dele  se fala. Isso é derivado, é [[representação]]. A [[verdade]] fundadora é o próprio [[ser]] eclodindo, [[desvelando-se]] enquanto [[linguagem]], [[sentido]] e [[mundo]]. O [[mundo]] em que cada um vive e se experiencia já é uma consequência de [[ser]] sempre [[sendo]] do [[ser]]" (1).
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: Referência:
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ser e estar". In:------. ''Arte: o humano e o destino''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 51.
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== 56 ==
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: "Toda [[posição]] é [[posição]] em [[mudança]]. Esta não se resolve numa [[sucessividade]] justaposta. A [[justaposição]] de dez mil tijolos ainda não é uma [[casa]]. Esta implica mais do que as suas [[posições]]. Exige em primeiro [[lugar]] o [[vazio]], onde eles poderão ocupar uma [[posição]]. Sem [[vazio]] não há [[posição]]. Sem [[silêncio]] não há [[fala]] nem [[canto]]. Portanto, a [[posição]] exige sempre algo prévio que possibilite [[fazer]] de dez mil tijolos não uma [[reunião]] confusa, mas uma [[casa]]: o prévio é o [[sentido]] e o [[mundo]]" (1).
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: Referência:
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O próprio como possibilidades". In:---. '''Arte: o humano e o destino'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 130.
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== 57 ==
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: "Mas a [[fala]] do [[silêncio]] é mais do que [[relação]] e [[comunicação]]. São, portanto, [[linguagem]], [[sentido]] e [[mundo]] que possibilitam as [[posições]] como [[posições]], isto é, são as [[possibilidades]] de [[tempo]] e [[mundo]] e suas [[circunstâncias]]. Sem [[ser]] não há [[linguagem]], [[sentido]] e [[mundo]]" (1).
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: Referência:
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O próprio como possibilidades". In:---. '''Arte: o humano e o destino'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 130.
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== 58 ==
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: "A ''[[physis]]'' / [[ser]] é o maior de todos os [[mistérios]]. Ao se [[destinar]] e [[doar]] na riqueza impensável dos [[entes]] [[sendo]] como [[linguagem]] e ''[[poiesis]]'', ela se faz [[mundo]]. O [[mundo]] é da ''[[physis]]''/[[linguagem]]/''[[poiesis]]'' não do [[homem]]. Quando o [[ser humano]] produz [[algo]], ele o faz a partir da ''[[physis]]'', que lhe dá a [[possibilidade]] de [[agir]] e de [[produzir]] isto e aquilo, em que um tal [[agir]] se efetiva, realiza, e assim se constitui [[mundo]] como ''[[linguagem]] / [[ethos]]''. O [[mundo]] é uma [[doação]] da [[linguagem]]" (1).
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: Referência:
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. '''Linguagem: nosso maior bem'''. Série Aulas Inaugurais. Faculdade de Letras, UFRJ, 2o. sem. / 2004, p. 29.
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== 59 ==
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: "Digo ao [[senhor]]: e foi [[menino]] nascendo. Com as lágrimas nos [[olhos]], aquela [[mulher]] rebeijou minha mão... Alto eu disse, no me despedir: - "Minha [[Senhora]] Dona: um [[menino]] nasceu - o [[mundo]] tornou a [[começar]]! ... " (1).
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: Referência:
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: ROSA, João Guimarães. '''Grande sertão: veredas'''. 6. e. Rio de Janeiro: Livraria José Olympio Editora, 1968, p. 353.
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== 60 ==
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: o [[mundo]] está mudando
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: será que [[você]] o sente
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: se despindo e depois vestindo
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: uma roupa desconfortável
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: e mais justa
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: ''- mudanças''    (1)
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: Referência:
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:  (1) KAUR, rupi. '''meu corpo / minha casa'''. Trad. Ana Guadalupe. São Paulo: Editora Planeta, 2020, p. 151.
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== 61 ==
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: "O [[ano]] [[celta]] não tem começo nem fim. Ele segue o [[ritmo]] da [[natureza]] em seu [[ciclo]] contínuo. As marcações no calendário são apenas as [[mudanças]] mais [[evidentes]] na [[natureza]]. A cada nova [[estação]], ocorre uma [[festividade]] que [[celebra]] seu [[significado]] para a agricultura. Durante essas [[festividades]], as [[fronteiras]] [[entre]] os [[mundos]] [[material]] e [[sobrenatural]] desaparecem, e as [[entidades]] [[espirituais]] do [[Outro Mundo]] rompem o véu que as separa do [[reino]] dos [[vivos]]" (1).
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: Referência:
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: (1) HOOD, Juliette. '''O livro celta da vida e da morte'''. Trad. Denise de C. Rocha Delela. São Paulo: Editora Pensamento, 2011, p. 23.
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== 62 ==
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: ... pois [[mundo]] [[nada]] mais [[é]] do que a [[realidade]]/''[[physis]]'' eclodindo em [[sentido]], isto é, [[mundo]]. E aí vem o [[desdobramento]]: a [[realidade]] eclodindo em [[mundo]] enquanto o seu [[próprio]] [[sentido]], é a [[realidade]] [[eclodindo]] como [[verdade]], ''[[a-letheia]]''. Daí a ligação antiquíssima [[entre]] [[caos]] e [[mundo]] (''[[kosmos]]''). Ora, onde a [[terra]] eclode em [[mundo]] é na [[obra de arte]]. Por isso é no deixar [[vigorar]] a [[obra de arte]] que passamos a [[ver]] o [[sentido]] e a [[verdade]] da [[realidade]]. Daí a [[verdade]] e o [[sentido]] serem indissociáveis.
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: - [[Manuel Antônio de Castro]].
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== 63 ==
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: [[Realização]] é o vir a ser da [[realidade]] no seu manifestar-se em [[real]], ou seja, a [[totalidade]] dos [[entes]] (''ta onta''), dos [[fenômenos]]. Como tal, todo [[fenômeno]] é uma [[realização]] da [[realidade]]  constituindo o [[real]]. Toda [[realização]] é oblíqua e dissimulada porque nela a [[realidade]] se dá e retrai, se manifesta e vela. Toda [[realização]] é uma [[doação]] do [[ser]]. Daí podermos falar de [[real]] e [[irreal]], de [[ideal]] e [[real]], porque este, em verdade, é a [[vigência]] do [[vigor]] da [[realidade]] pondo-se e depondo-se nas [[realizações]]. O [[Ser]] é [[doação]] enquanto [[tempo]], [[presença]], [[mundo]], [[sentido]] e [[realização]].
 +
 +
 +
: - [[Manuel Antônio de Castro]]
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== 64 ==
 +
: "No entanto, aquilo que é verdadeiramente inquietante não é o [[fato]] de o [[mundo]] se tornar cada vez mais [[técnico]]. Muito mais inquietante é o [[fato]] de o [[Homem]] não [[estar]] preparado para esta [[transformação]] do [[mundo]], é o [[fato]] de nós ainda não conseguirmos, através do [[pensamento que medita]], lidar adequadamente com aquilo que, nesta [[era]] está [[realmente]] a [[emergir]]" (1).
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: Referência:
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 +
: (1)  HEIDEGGER, Martin. '''Serenidade'''. Lisboa: Instituto Piaget. Trad. Maria Madalena Andrade e Olga Santos, s/d., p. 21.

Edição atual tal como 21h56min de 21 de janeiro de 2024

1

Mundo é uma questão. No entanto, num real dominado pelos conceitos metafísicos, muitos são os seus adjetivos qualificativos, sem nos darmos conta de que o adjetivo já pressupõe o mundo como vigência originária. É isto o que Heidegger quer dizer: que o ser-humano é um ser da facticidade. Vivemos, queiramos ou não, já desde sempre no mundo. É impossível pensar a realidade sem mundo. É aqui que podemos citar o fragmento 30 de Heráclito:
" O mundo, o mesmo em todos, nenhum dos deuses, e nenhum dos homens o fez, mas sempre foi, é e será, fogo sempre vivo, acendendo segundo a medida e segundo a medida apagando " (1).
Notemos que o pensador diz que o Mundo foi, é e será. Porém, o ser se dá enquanto verdade e enquanto verdade é que a obra de arte se constitui originariamente como Mundo e Terra. A dimensão Mundo da obra de arte não é qualquer mundo como adjetivo qualificativo, mas a própria vigência da realidade enquanto verdade e não-verdade, pois mundo está ligado à clareira, o retrair-se do ser para deixar o não-ser ser como presença: mundo.


- Manuel Antônio de Castro
Referência:
(1) HERÁCLITO. Trad. Emmanuel Carneiro Leão. In: Os pensadores originários. Petrópolis: Vozes, 1991, p. 67.

2

Mundo é uma questão complexa e fundamental para cada vivente humano. Ao longo da trajetória ocidental foram sendo constituídos diversos conceitos de mundo, ligados a concepções da realidade e do homem. Heidegger faz um comentário e levantamento desses conceitos (1). Ele toma o mundo como questão e usa inicialmente a expressão alemã: In der Welt sein (Ser no mundo). Indica no homem a abertura essencial para o Ser, a transcendência, aquilo que constitui o homem como homem. Um outro nome para mundo e transcendência é lógos. É nesse horizonte que se deve ler a sentença órfica: dzoion logon echon (2) (com que se define o homem na ordem da vida) e que significa: O que constitui a essência vital do homem é a transcendência, o logos.


- Manuel Antônio de Castro
Referências:
(1) Cf. HEIDEGGER, Martin. Da essência do fundamento. Lisboa: Edições 70, 1988, pp. 42-3.
(2) Cf. LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Uma leitura órfica de uma sentença grega". In: Aprendendo a pensar II. Petrópolis: Vozes, 1992.
Ver também:
* Ser-estar

3

O mundo como questão é visto por Heidegger como In der Welt sein (ser no mundo). Mas devemos distinguir o mundo como questão e o mundo como conceito. Destes há muitos, normalmente expressos através de um adjetivo acrescentado a mundo: mundo pessoal, social, medieval etc. Por isso, Heidegger começa o levantamento dos conceitos vulgares de Mundo. Ao discutir a questão da essência do fundamento, Heidegger trata profundamente o mundo como questão em seus aspectos históricos. Mas não devemos esquecer que a questão mundo é uma das mais tratadas pelo pensador, desde Ser e tempo. Ela se torna a questão central, junto com a questão terra, para fazer uma profunda reflexão sobre o que é a arte. A questão mundo também é central no modo como Heidegger compreende a coisa.


- Manuel Antônio de Castro
Referências:
HEIDEGGER, Martin. A Origem da Obra de Arte. Trad. Idalina Azevedo da Silva e Manuel Antônio de Castro. Lisboa: Edições 70, 2010.
______. "A coisa". In: Ensaios e conferências. Petrópolis: Vozes, 2002.
______. Da essência do fundamento. Lisboa: Edições 70, 1988, pp. 42-3.
Ver também:
*Decadência

4

"Mundo é o acontecimento apropriador de clareira e iluminação" (1).


Referência:
HEIDEGGER, Martin. "Alétheia". In: Ensaios e Conferências. Petrópolis: Vozes, 2002, p. 244.

5

Heidegger liga mundo ao coisificar da coisa. Mas é importante perceber, como diz Heidegger, que não há causa nem fundamento. A explicação aí não ocorre, porque esta pressupõe que haja causa ou fundamento. O que se entende por coisificar da coisa está tratado por Heidegger no ensaio "A coisa" (1). Ainda nesse sentido diz: "Denominamos mundo o apropriante jogo especular (Spiegel/Spiel) da simplicidade do Céu e da Terra, dos Divinos e dos Mortais" (2).


Referência:
(1) HEIDEGGER, Martin. "A coisa". In: Ensaios e conferências. Petrópolis: Vozes, 2002.
(2) HEIDEGGER, Martin. "Einblick in das was ist Das Ding ". In: ------. Bremer und Freiburg Vorträge. G.A., Bd. 79.

6

"No fazer-se Linguagem do Ser, o homem vem a si mesmo e o mundo vem ao homem para ser mundo" (1).


Referência:
(1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Hegel, Heidegger e o Absoluto". In: Aprendendo a pensar. Petrópolis: Vozes, 1977, p. 262.

7

Mundo usa-se em muitos sentidos. Propriamente o falar de sentido já é falar de mundo. Como pode haver sentido sem mundo ou mundo sem sentido? Em si, mundo é uma das questões mais complexas. O seu entendimento como meio ou contexto já surge de teorias sobre o real e realidade e, claro, uma determinada concepção do que seja o ser humano, o tempo e a história. Propriamente só o homem tem mundo e só ele fala de mundo. Os demais entes, se têm mundo não podemos saber, pois só o ser humano tem logos. O que é mundo?
Mundo cultural. Aí mundo diz que cada cultura constitui em si um mundo. Como tal daria consistência a uma identidade, a daqueles que pertencem a tal cultura. As culturas constituiriam entre si diferenças. Como explicá-las? Outra questão a este respeito: Como se relaciona linguagem/língua/cultura? Ocorre que há diferentes conceitos de cultura, dependendo da disciplina e das teorias. A tensão entre língua e cultura não pode ser vista a partir de um conceito linguístico de língua, algo formal e abstrato. O vigor de toda cultura é o que une terra, céu, ser humano enquanto mundo: o sagrado. Por isso, toda cultura tem em si um culto: os ritos dos mitos, pelos quais acontece o vigorar do sagrado;
Mundo e universo real. É muito genérico mas ao mesmo tempo pode significar todo o real externo e também o interno, como por exemplo, na expressão: "meu mundo interior";
Visão de mundo. Aqui significa que o real é experienciado e vivenciado a partir de uma religião, de uma teoria filosófica, científica, política, econômica. O que fica implícito a toda visão de mundo é a questão do real. O que é "real" aí? Deus? Matéria? Sociedade? Se pode haver diferentes teorias do real e em diferentes campos é porque o próprio real dando-se nessas teorias se retrai como real. O real diz-se e manifesta-se de muitas maneiras. A cada maneira de manifestação dá-se o nome de mundo;
Ser e mundo. É o sentido ontológico. Como tal abrange e ultrapassa todos os outros. Mas para ser e mundo ou ser/mundo comparecem: phýsis enquanto nascividade/ser; poíesis enquanto vigor poético; tékhne enquanto o conhecer que advém na e pela luz; lógos enquanto linguagem. Não pode haver mundo sem linguagem. Lógos/linguagem é mundo. Alétheia, ou seja, a própria realidade ou ser se ofertando enquanto clareira de desvelamento e velamento, isto é, verdade e não-verdade (a clareira articula sempre um desvelamento e um velamento): quando a floresta se retrai é que podemos apreender propriamente a floresta. Éthos é a linguagem enquanto mundo, onde, morando, nos apreendemos como seres humanos existindo no mundo. Daí resulta a Sophía. A sabedoria é o ético vigorando como realidade poética enquanto mundo. São as artes. Devemos ter o cuidado de não confundir mundo, que é uma questão, com mundo seguido de um adjetivo, que se transforma simplesmente em conceito. Por exemplo: mundo medieval, social, exterior, interior, masculino, feminino etc.


- Manuel Antônio de Castro

8

"E nós olhamos: o mundo (que não foi criado uma só vez, mas tantas quantas as vezes que aparece um artista original) parece-nos totalmente transformado relativamente ao precedente, mas também inteiramente claro" (1).
Em si o artista não é o que cria mundo, uma ideia cristã que desfoca a verdadeira questão: quando o ser humano atua, ele só pode atuar e/ou agir a partir do que já existe e do que já lhe foi dado. Criar então significa simplesmente manifestar o que ainda não foi manifesto.


- Manuel Antônio de Castro
Referência:
(1) GRASSI, Ernesto. Arte e Mito. Lisboa: Livros do Brasil, s.d., p. 172.

9

Hoje há uma tendência, entre certos teólogos, de falarem de mundo a partir das concepções da realidade oriundas da ciência, como se esta constituísse a realidade básica, a partir da qual se poderiam dar explicações teológicas, poéticas etc. Nota-se que falta algo e fazem afirmações problemáticas e superficiais. Emmanuel Carneiro Leão (1) encaminha o tema adequadamente ao relacionar as pesquisas e afirmações da ciência com mundo. Só porque há um mundo é que os cientistas podem fazer pesquisas físicas, biológicas etc. Eles já pressupõem o mundo constituído. Nenhuma se preocupa em pensar a própria constituição do mundo e de mundos. Por isso, pensar a realidade enquanto mundo é pensar a realidade originariamente. Mas para tanto, também é necessário pensar a cultura originariamente, porque mundo e cultura se implicam. Como relacionar mundo, linguagem e DNA, ou seja, o código genético?


- Manuel Antônio de Castro
Referência:
(1) Cf. LEÃO, Emmanuel Carneiro. "O pensamento de Heidegger no silêncio de hoje". In: ---. Aprendendo a pensar II. Petrópolis, Vozes, 1992, p. 192.

10

Há uma mediação dos entes infra-humanos com o homem e com o ser. É nessa mediação que se vai constituir mundo, pois o homem é o ponto de re-ferência e unidade. Nessa mediação do homem fica claro como a cultura é mundo. Na verdade, para cada ser vivo corresponde um mundo. Se para conhecermos o mundo de cada um de nós, seres humanos, já é problemático e até sempre incompleto, imagine-se o mundo de cada ser vivo ou até de espécies. É um mistério. Por isso, só podemos falar de mundo para os demais seres vivos a partir do que já, nós, seres humanos, experienciamos como mundo, pois já nos experienciamos vivendo e sendo enquanto e no mundo.


- Manuel Antônio de Castro
Referência:
(1) HUMMES, Cláudio. Metafísica. In: [http://travessiapoetica.blogspot.com Travessia Poética] pp. 118-20 e pp. 131-33.

11

Há uma estreita relação entre a instauração de mundo e a edificação de uma obra. Diz Leão: "[...] o processo de instauração do mundo comporta sempre a edificação de uma obra, uma operação" (1).
A instauração de mundo se dá:
a) pela arte;
b) pela ação criadora do político, que funda um novo sistema de convivência, espaço essencial da cidadania;
c) pelo comportamento do herói, que realiza um sacrifício transcendente;
d) pela reflexão do pensador, que converte em marcha de pensamento a verdade da existência. "[...] sempre qualquer processo de instauração de mundo é a edificação de uma obra. É um primeiro resultado. O segundo se refere à Linguagem como dinamismo e potência da obra" (2).


- Manuel Antônio de Castro
Referência:
(1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Existencialismo e literatura". In: Aprendendo a pensar. Petrópolis: Vozes, 1977, p. 168.
(2) Idem, p. 168.

12

"... mundo diz a matriz de sentido no interior da qual um ser humano vive sua vida. É no mundo que o homem experiencia sua mortalidade, sua desmesura, seus poderes, seus fracassos, sua sede" (1).


Referência:
(1) UNGER, Nancy Mangabeira. "Heidegger e a espera do inesperado". In: Rio de Janeiro: Revista Tempo Brasileiro - Interdisciplinaridade, dimensões poéticas, 164, 2006, p. 182.

13

"O existir se dá, e só pode se dar no, ou num mundo. O ser é condição de possibilidade do estabelecimento de todo e qualquer mundo. O ser é sempre como vigência de uma substantividade essencial infinitiva, isto é, como condição de possibilidade de qualquer forma de sentido a posteriori. A vigência do ser é que inaugura a possibilidade de mundo, mas não só de mundo, também de caos. Existir não. Impõe o mundo como ordenação e configuração de um caos primordial e, ao mesmo tempo, a superação dessa ordem e desse modo de configurar" (1).


Referência:
(1) JARDIM, Antonio. Música: vigência do pensar poético. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 56.

14

A história é sempre a história do mundo, mas só o mundo funda a história do mundo. Então história e mundo são o mesmo sem serem a mesma coisa. Ambos vigoram no mesmo princípio. E quando percebemos esta concretude originária é que podemos nos dar conta de como é impossível separar a história do homem e o homem da história, porque o homem é homem por ser originariamente a transcendência enquanto mundo. Sem mundo não há homem e sem homem, em sua transcendência, não há mundo. E o homem aí não pode ser de maneira alguma um conceito genérico, uma essência conceitual, pois é o mundo que, como princípio originário, dá unidade a todos os seres humanos. E aí mundo cultural é uma expressão menor diante da originariedade do humano.


- Manuel Antônio de Castro

15

O auto-diálogo é originário porque nele e só nele acontece o apropriar-se do que é próprio, isto é, o que somos enquanto manifestação de mundo e terra. Mundo, no fundo, é sempre o que somos enquanto sentido e verdade. O sentido e verdade do que somos, enquanto mundo, nos advém no auto-diálogo.


- Manuel Antônio de Castro

16

"Eu me ultrapasso abdicando de meu nome, e então sou o mundo. Sigo a voz do mundo com voz única" (1).


Referência:
(1) LISPECTOR, Clarice. Água viva. Rio de Janeiro: Artenova, 1973, p. 57.

17

"Mundo não é a mera reunião das coisas existentes, contáveis ou incontáveis, conhecidas ou desconhecidas. Mundo também não é uma moldura apenas imaginada e representada em relação à soma do existente. O mundo mundifica, sendo mais do que o que se pega e percebe, em que nos acreditamos confiantes. Mundo nunca é um objeto que está diante de nós e pode ser visto. Mundo é o sempre inobjetivável, ao qual estamos subordinados enquanto as vias de nascimento e morte, bênção e maldição nos mantiverem arrebatados pelo ser (a). Onde acontecem as decisões mais essenciais de nossa história, que por nós são aceitas ou rejeitadas, não compreendidas e de novo questionadas, aí o mundo mundifica" (1).


Referência:
(1) HEIDEGGER, Martin. A origem da obra de arte. Trad. Idalina Azevedo da Silva e Manuel Antônio de Castro. São Paulo: Edições 70, 2010, p. 109.

18

"Nenhuma realidade se desenvolve plenamente como real, nem chega à plenitude de surgir e realizar-se por si mesma num mundo, sem a vigência da arte nas obras" (1).


Referência:
(1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Arte e realidade". In: ---------. Aprendendo a pensar I. Petrópolis: Vozes, 1992, p. 248.

19

Mundo é uma palavra-questão. Ela diz respeito ao acontecer da realidade em seu eclodir como verdade e sentido nas realizações. Seria o originar-se do cosmos a partir do caos, do nada. E nesse sentido usamos frequentemente mundo no lugar de real e de universo.


- Manuel Antônio de Castro

20

"Nós só podemos usar a mesma palavra, para dizer tanto um fenômeno externo, a luz do sol, como para um fenômeno interno, a luz da razão, porque nem o sol está somente fora de nós, nem a razão está exclusivamente dentro de nós e sim porque sempre e necessariamente existimos como ser-no-mundo" (1).


Referência:
(1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Apresentação". In: HEIDEGGER, Martin. Ser e tempo. Parte I, 2. e. Petrópolis: Vozes, 1988, p. 19.

21

Não são as coisas, plantas e animais do meio, nem a apreensão objetiva dos fatos contextuais da sincronia e diacronia que formam o mundo. Se assim fosse, eu ainda não teria como superar o fosso entre objetividade e subjetividade e sua cadeia de representações. Se assim fosse, eu ainda não teria como poder ordenar os fatos num todo e estes deveriam necessariamente me aparecer como uma soma desconexa. Se assim fosse, o homem seria algo que está-aí ao lado das coisas que estão-aí e jamais poderia falar em conjuntura. Só o homem tem mundo e então mundo significa a constitutiva abertura do homem ao sentido do Ser, através da qual o homem revela o sentido do que está-aí, revelando-se a ele mesmo como ex-sistência, integrando tudo na totalidade de um mundo. Mas o ser humano não é o sujeito do mundo. Este não advém por seu fazer. Mundo é o destinar-se do sentido do ser no homem. Somente o agir de tal sentido no homem lhe possibilita fazer e compreender mundo. Noutras palavras: só o ser humano (masculino ou feminino) pensa porque nele opera, age, o sentido do ser: mundo. O mundo manifesto no dizer do sentido é a linguagem. E é isso a arte.


- Manuel Antônio de Castro


22

Mundo não é uma visão do real a partir de uma ou outra teoria. Mundo é a vigência do ser acontecendo tanto nos sujeitos como nos predicados enquanto presença e sentido. Ou seja, Mundo é Linguagem constituindo línguas enquanto estas operam discursos e proposições e seus significados. Por isso, prévia aos discursos e às proposições, há uma sintaxe, isto é, Mundo, porque mundo implica sempre sentido e ordem. Nesse horizonte de pensamento, mundo implica sempre sentido e linguagem. Embora não seja propriamente uma visão, é no horizonte do que se nos dá a ver e se oculta que para cada um se dá mundo. Há uma ligação profunda entre mundo e ideia. O alcance das ideias de cada ser humano é o mesmo do horizonte para cada um. Só aparentemente vemos, numa posição, as mesmas coisas que os outros. Elas serão sempre lidas no e pelo alcance do mundo de cada um, que não significa subjetividade, porque não é esta que constitui o horizonte e, portanto, não constitui o mundo.


- Manuel Antônio de Castro

23

"Mas não acredito mais que o mundo marcha necessariamente numa direção inexorável, como um trem preso aos trilhos. O mundo é um maloqueiro drogado, a ziguezaguear trôpego por aí. Como disse um político brasileiro, a gente vive esperando pelo inevitável e o que nos chega é sempre o inesperado" (1). Cabe aqui lembrar o fragmento 18 de Heráclito: "Se não se espera, não se encontra o inesperado, sendo sem caminho de encontro nem vias de acesso" (2). Todo esforço do sujeito humano em enquadrar o acontecer da realidade como mundo está destinada ao fracasso, pois o ser humano não é sujeito de nada no que tange ao essencial. Esse essencial é a própria eclosão de mundo na medida em que este é o próprio sentido do Ser em seu destinar-se.


- Manuel Antônio de Castro
(1) DIEGUES, Cacá. "Manifesto septuagenário". In: O Globo, 19-10-2013, p. 20.
(2) HERÁCLITO. In: Os pensadores originários - Anaximandro, Parmênides, Heráclito. Petrópolis: Vozes, 1991, p. 63.

24

"Sentia que àquela hora atingiria a derradeira perfeição na arte de escutar. Quantas vezes não ouvira todos aqueles rumores, a multiplicidade das vozes que vinham do rio, mas naquele dia lhe pareciam novas. Já não era capaz de identificá-las. Não conseguia distinguir as vozes jubilosas das choronas, as infantis das másculas. Todas elas formavam uma só, a lamentação da nostalgia, a risada do ceticismo, o grito da cólera e o estertor a agonia. Tudo era uma e a mesma coisa, tudo se entretecia, enredava-se, emaranhava-se mil vezes. E todo aquele conjunto , a soma das vozes, a totalidade das metas, das ânsias, dos sofrimentos, das delícias, todo o Bem e todo o Mal, esse conjunto era o mundo. Esse conjunto era o rio dos destinos, era música da vida" (1).


Referência:
(1) HESSE, Hermann. Sidarta. Trad. Herbert Caro. Rio de Janeiro: O Globo, 2003, p. 112.

25

"Nós também: estamos sempre a inventar regras na esperança de domar o que não se pode domar. O que, provavelmente, não se deve domar. A verdade insuportável, que a doce Alice nos obriga a encarar, é que vivemos em um mundo no qual existem muito mais enigmas do que respostas. Um mundo inconstante, cheio de coisas que servem para outras coisas - e não para aquelas que imaginamos a que estejam destinadas" (1). O autor está falando de Alice, a personagem paradoxal da obra de Lewis Carroll Alice no país das maravilhas.


Manuel Antônio de Castro.
(1) CASTELLO, José. "Por que ler 'Alice'?. In: O Globo, Caderno "Prosa e verso", 23-05-2015, p. 5.


26

No verso de Pessoa em “Autopsicografia”: “O poeta é um fingidor”, tanto o sujeito como o predicado são doações e passíveis de vigência na vigência do ser, isto é, da arché ou verbo ou essência originária. No verso citado, é o ser, o verbo “é” que dá vigência ao poeta e ao fingidor. Sem o horizonte do ser não há nem poeta nem fingidor, o que significa que não há, sem ele, sentido, verdade, isto é, mundo. Mundo não é, portanto, uma visão do real a partir de um ou outra teoria. Mundo é a vigência do ser acontecendo tanto nos sujeitos como nos predicados. Ou seja, Mundo é Linguagem constituindo línguas enquanto estas operam discursos e proposições. Por isso, prévia aos discursos e às proposições há uma sintaxe, isto é, Mundo. Nas línguas da Linguagem patenteia-se Mundo.


- Manuel Antônio de Castro


27

Só o homem tem mundo e então mundo significa a constitutiva abertura do homem ao sentido do Ser, através da qual o homem revela o sentido do que está-aí, revelando-se a ele mesmo como ex-sistência, integrando tudo na totalidade de um mundo. Isto só pode acontecer, porque o Dasein, por sua abertura constitutiva ao sentido do Ser, por sua condição de Mitsein (Ser-com), no sentido de convivência poético-político-ontológica, pode integrar tudo e todos como mundo. Tudo isto não poderia ocorrer se o mundo e a compreensão não fossem dimensões inseparáveis da constituição ontológica do homem.


- Manuel Antônio de Castro

28

"E o mundo nada mais é do que essa mesma realidade eclodindo em sua verdade e sentido, que é o sentido do que nos é próprio, do que somos. E o que nos ensinam é sempre um mundo já realizado e configurado num atributo acidental, é o mundo adjetivado. Nesse horizonte o mundo, como desafio de sentido a ser realizado, passa para segundo plano porque já está pronto, apenas há a variação infindável dos atributos acidentais: mundo atual, mundo antigo, mundo social, mundo psíquico, enfim, isto e aquilo. Por que somos mundo sem atributos acidentais? Porque somos próprio" (1).


Referência
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O próprio como possibilidades". In: ---. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 126.

29

"A obra, enquanto verdade de desvelamento, eclosão de vida, produz em nós a nossa eclosão como mundo. É que todo desvelamento já é em-si mundo. Então o real nos advém como verdade. E o sentido de nossa vida, como corpo-mundo-erótico, se realiza como sabedoria: é a experienciação ética da vida. Sendo corpo-mundo-eros, o homem, que somos, se torna homem humano, isto é, essencializamo-nos em nossa humanidade. É que as possibilidades do humano são as possibilidades da semente-obra-de-arte. Nesse horizonte, o humano é o logos, reunindo em torno de si todos os seres do real enquanto tempo-memória, ou seja, mundo. É nesse sentido que o homem é homem enquanto logos (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Obra de arte, vocabulário e mundo". In: ---. Leitura: questões. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2015, p. 251.

30

"Por detrás de, com e em todo vocabulário há não só uma realidade-mundo, mas também, concomitantemente, um caminho e uma caminhada. Na caminhada de cada vocabulário há o desenho de uma realidade, ou seja, a cada vocabulário corresponde um mundo. Nesse sentido, igualmente se entende por mundo uma determinada época. Por isso, podemos falar em vocabulário quando o seu conjunto de nomes nos apresenta uma realidade entendida enquanto determinado mundo" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Obra de arte, vocabulário e mundo". In: ---. Leitura: questões. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2015, p. 242.

31

"- Quais são os limites da realidade virtual?"
- O que me surpreende todo santo dia são as possibilidades daquilo que podemos fazer com ela. Posso botar pessoas debaixo da água num mundo fantástico, ou em Marte, ou em outro planeta qualquer. São possibilidades infinitas de criação de mundo, e isso é incrível. Não criamos histórias, mas mundos para o observador ficar imerso naquele ambiente." (1)


Referência:
BERFORD, Bruna - profissional de animação. In: O Globo, pag. 2, Sexta-feira, 6.4.2018.

32

"Há uma proximidade entre mundo e funcionalidade, mas não são a mesma coisa, porque sem mundo, sem sentido, sem linguagem, é impossível qualquer sistema funcional" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. “A menina e a bicicleta: arte e confiabilidade”. In: ------. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 282.

33

"Por isso, o tempo é a quarta dimensão do espaço, como afirmam os físicos. Porém, tal tempo não é o tempo tripartido (somente cronológico), porque o tempo tem também uma quarta dimensão: é a linguagem" (1). Esta é o tempo poético. E pensá-lo é a Poética. Se o tempo é a quarta dimensão do espaço e a linguagem a quarta dimensão do tempo, a linguagem é o fundar de tempo e espaço. Esse fundar é o fundamentar o lugar. Lugar ou campo é mundo. A linguagem é mundo e sentido, porque o mundo é a quarta dimensão da linguagem. Como o leitor percebe, torna-se imprescindível a leitura do ensaio de Heidegger abaixo indicado, onde apreendemos estas ideias.


- Manuel Antônio de Castro
Referência:
1) Cf. HEIDEGGER, Martin. "Tempo e ser". In: ______. Os pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1979, pp. 255-72.

34

"Digo ao senhor: e foi menino nascendo. Com as lágrimas nos olhos, aquela mulher rebeijou minha mão...Alto eu disse, no me despedir: - "Minha Senhora Dona: um menino nasceu - o mundo tornou a começar!" (1).


- Referência:
(1) ROSA, João Guimarães. Grande sertão: veredas. Rio de Janeiro: José Olympio, 6. e., 1968, 353.

35

"Os druidas, e outros como eles, acreditam que as almas são imortais, que o mundo o é igualmente. Mas que um dia, porém, somente o fogo e a água reinarão sobre o universo" (1).


Referência:
(1) Estrabon, Geografia (1e. século antes de Cristo). Textos apresentados por Jean Markale. Paris: Albin Michel, Cadernos de Sabedoria, 2004, p. 47. Tradução do francês: Manuel Antônio de Castro.

36

"O tema central dos escritos de Chuang Tzu gira em torno da liberdade. Não a liberdade específica que conhecemos hoje, mas uma liberdade originária. Sua questão básica era averiguar como pode o homem viver em um mundo consubstanciado pelo caos, pelo sofrimento e pelo absurdo, isto é, o non-sense, o sem-sentido, o ilógico, alógico, metalógico. E a resposta do sábio é com outra questão: para libertar-se do sofrimento, da dor, do desconcerto do mundo, da incoerência do planeta liberte-se do mundo. Mas como se libertar do mundo estando inserido no mundo? Como se libertar do planeta e continuar vivo sobre a face da Terra? A libertação aqui é a libertação dos conceitos, dos condicionamentos, das dicotomias" (1).


Referência:
(1) ROCHA, Antônio Carlos Pereira Borba. "Diálogo com Chuang Tzu, hoje". In: Revista Tempo Brasileiro, 171 - Permanência e atualidade da Poética. Rio de Janeiro, out.-dez., 2007, p. 167.

37

"No entanto, aquilo que é verdadeiramente inquietante não é o fato de o mundo se tornar cada vez mais técnico. Muito mais inquietante é o fato de o Homem não estar preparado para esta transformação do mundo, é o fato de nós ainda não conseguirmos, através do pensamento que medita, lidar adequadamente com aquilo que, nesta era, está realmente a emergir" (1).


Referência:
(1) HEIDEGGER, Martin. Serenidade. Lisboa: Instituto Piaget. Trad. Maria Madalena Andrade e Olga Santos, s/d., p. 21.

38

"Sendo o ser humano o sujeito e não mais o logos que reúne, a razão fundamenta os conhecimentos e a linguagem os comunica funcionalmente.
Porém, como só há comunicação quando há um código, a linguagem ficou reduzida ao código língua. O mundo que o logos funda como reunião de diferenças ficou prisioneiro ou do conjunto de significados articulados pelo código ou então dependente do mundo social, enquanto conjunto funcional da estrutura social. Tal estrutura funcional é o conjunto ou rede de conhecimentos e informações. São estas o que constituem o mundo das diferentes culturas. É o que se procura hoje estudar sob o nome de inter-culturalidade, onde o entre só diz respeito ao entre de cada cultura, à identidade de cada cultura, sem se voltarem para o logos de Heráclito, no qual e a partir do qual: “tudo é um”"(1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Interdisciplinaridade poética: o entre". Revista Tempo Brasileiro: Rio de Janeiro: Interdisciplinaridade: dimensões poéticas, 164, jan.-mar., 2006, p. 30.

39

"Heidegger referindo-se ao mesmo “entre” nas três dimensões (acima citadas), assim caracteriza a terceira: “Devemos saber que ... este “entre” não se estende, como uma corda, entre a coisa e o homem, mas que este “entre”, como captação prévia, capta para além da coisa e, ao mesmo tempo, por detrás de nós” (Heidegger, 1992: 231) (2). Tão importante como a intuição originária é nossa facticidade. Esta diz da nossa condição de estarmos lançados no mundo. Não é uma escolha nossa. Isto diz algo muito simples: o que é mundo não nos é dado pela consciência. O seu sentido é prévio a todo ato racional. Nesse sentido, o mundo é a própria intuição originária" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Interdisciplinaridade poética: o entre". Revista Tempo Brasileiro: Rio de Janeiro: Interdisciplinaridade: dimensões poéticas, 164, jan.-mar., 2006, p. 31.
(2) HEIDEGGER, Martin. Que é uma coisa? Lisboa: Edições 70, 1992.

40

"O “entre” é uma captação prévia, ou seja, é a intuição originária, é o próprio logos, de que falamos no item anterior. Então logos é mundo enquanto sentido e verdade. E, portanto, o mundo é o “entre” do Dasein, ou seja, do Entre-ser e do ser-com ou Mit-sein. A facticidade é então a nossa condição humana de sermos Entre-ser e Ser-com. À facticidade Heidegger chamou de transcendência ou mundo" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Interdisciplinaridade poética: o entre". Revista Tempo Brasileiro: Rio de Janeiro: Interdisciplinaridade: dimensões poéticas, 164, jan.-mar., 2006, p. 31.

41

"As artes, enquanto musas, são as filhas da memória. Por isso, toda obra de arte opera o entre enquanto memória e tempo, linguagem e poiesis, onde o operar não é da obra, mas da verdade, ou seja, o entre enquanto desvelar-se e velar-se. Tal entre é o originário de mundo" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Interdisciplinaridade poética: o entre". Revista Tempo Brasileiro: Rio de Janeiro: Interdisciplinaridade: dimensões poéticas, 164, jan.-mar., 2006, p. 34.

42

"O que no diálogo se entretece é o que somos como mundo. Mas há o mundo do orgânico e o mundo do corpo. Ao organismo corresponde o mundo já dado e manifestado enquanto rede de relações e funções. É o mundo das disciplinas, da língua como código, da linguagem como meio. Ao corpo corresponde o mundo inaugural, poético" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Interdisciplinaridade poética: o entre". Revista Tempo Brasileiro: Rio de Janeiro: Interdisciplinaridade: dimensões poéticas, 164, jan.-mar., 2006, p. 34.

43

"O corpo é o mundo. Como corpo, o mundo se dá na disputa com a Terra. Uma tal disputa é o “entre” de Terra E Mundo acontecendo. Quanto mais o mundo se manifesta tanto mais a Terra se retrai e vela. Na disputa, na obra de arte, na poiesis, a Terra se dá no que ela é, aparecendo em sua riqueza e beleza, integração e plenitude: é o mundo. O mundo não é uma totalidade de conhecimentos, é a incessante doação da Terra enquanto poiesis E linguagem" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Interdisciplinaridade poética: o entre". Revista Tempo Brasileiro: Rio de Janeiro: Interdisciplinaridade: dimensões poéticas, 164, jan.-mar., 2006, p. 34.

44

"O mundo, amigo Govinda, não é imperfeito e não se encaminha lentamente à perfeição. Não! A cada instante é perfeito. Todo e qualquer pecado já traz em si a graça. Em todas as criancinhas já existe o ancião. Nos lactentes já se esconde a morte, como em todos os moribundos há vida eterna. A homem algum é dado perceber até que ponto o seu próximo já avançou na senda que lhe coube" (1).


Referência:
(1) HESSE, Hermann. Sidarta. Trad. Herbert Caro. Rio de Janeiro: O Globo, 2003, p. 118.

45

"A linguagem fala. O que acontece com essa fala? Onde encontramos a fala da linguagem? Sobremaneira no que se diz. No dito, a fala se consuma, mas não acaba. No dito, a fala se resguarda. No dito, a fala recolhe e reúne tanto os modos em que ela perdura como o que pela fala perdura - seu perdurar, seu vigorar, sua essência. Contudo, na maior parte das vezes e com frequência, o dito nos vem ao encontro como uma fala que passou" (1).
Não podemos esquecer que o vigorar da linguagem é o sentido e a verdade que orientam nossas ações, nosso, enfim, agir. Daí o seu perdurar. E é nesse perdurar que o tempo é e acontece em seu desdobrar-se em épocas. A cada desdobramento, a cada manifestação do vigorar do sentido e da verdade corresponde mundo, de modo que o perdurar evidencia o vigorar do sentido, da verdade e do mundo que se manifesta e é horizonte de nosso viver, de nosso realizar-se. Mundo e sentido e verdade são para nós a realidade: vigorar da linguagem.


- Manuel Antônio de Castro.
Referência:
(1) HEIDEGGER, Martin. "A linguagem". In: ----. A caminho da Linguagem. Trad. Marcia Sá Cavalcante Schuback. Petrópolis (RJ): Vozes; Bragança Paulista (SP): Editora Universitária São Francisco, 2003, p. 11.

46

Os olhos são a janela da alma.
Cada um olha o mundo da sua janela.
O mundo não é o que cada um olha.
É o sentido do que acontece (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Leitura: compreender e interpretar". In: ----. Leitura: Questões. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2015, p. 87.

47

"Energia Cósmica. É difícil apreender toda importância desta energia pela densidade e amplitude de sua atuação e presença. Aí cósmica não diz uma noção científica e astronômica, espacial. Não se trata de meio ambiente no sentido espacial. Propriamente diz habitação, morada, onde, além de entrar em harmonia com tudo e todos, também vigora aí a energia cósmica como mundo e sentido de tudo. Habitar é o difícil exercício existencial de harmonizar essa tensão diferenciadora entre o que sou e o lugar do habitar, pois este não determina, mas influi ou para Yin ou para Yan. Isso é ser corpo" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Filosofia e o pensamento do corpo". In: Desdobramentos do corpo no século XXI. MONTEIRO, Maria Conceição & GIUCCI, Guilhermo (orgs.). Rio de Janeiro: FAPERJ, Editora Caetés, 2016, p. 24.

48

"Seu ciúme não se parecia com o que conhecera na juventude, quando a imaginação estimulava nele uma torturante fantasia erótica; dessa vez, ele era menos doloroso, porém, mais destrutivo; lenta e mansamente, transformava uma mulher amada em simulacro de mulher amada. E, como ela não era mais um ser seguro para ele, não havia mais nenhum ponto de estabilidade no caos sem valores que é o mundo" (1).


Referência:
(1) KUNDERA, Milan. A identidade, trad. Teresa Bulhões Carvalho da Fonseca. São Paulo: Companhia de Bolso, 2009, p. 74.

49

"O mundo como o conhecemos - desde a menor partícula até o maior planeta -, é mantido em equilíbrio por uma lei baseada na natureza dualista equilibrada de todas as coisas. Sem o equilíbrio entre as duas forças opostas não haveria a criação, isto é, não existiria o Universo. Por exemplo, as galáxias basicamente estão sujeitas a duas forças opostas: 1) as forças de expulsão - resultantes dos efeitos do Big Bang, através das quais todas as galáxias movem-se para longe de nós - e 2) as forças gravitacionais, que puxam as galáxias umas contra as outras" (1). Essas duas forças ou energias não constituem também o princípio vital, fundado pelo masculino e pelo feminino? Penso que sim.


- Manuel Antônio de Castro.
Referência:
(1) GADALLA, Moustafa. "O mais religioso". In: ------. Cosmologia egípcia - o universo animado. Trad. Fernanda Rossi. São Paulo: Madras Editora, 2003, p. 87.

50

"MUNDO ON-LINE.
A internet se tornou onipresente nas sociedades modernas. Teve um impacto decisivo no ganho de produtividade das economias e favoreceu o surgimento de empresas gigantes de tecnologia. Chega ser difícil pensar em alguma atividade que seja completamente off-line. Pelas previsões de Kleinrock, a tendência é que a rede se aprofunde ainda mais no cotidiano das pessoas, até o ponto de se tornar invisível, como a eletricidade" (1).
Eu acrescentaria aqui o surgimento da Internet 5G que realiza isso e muito mais. É uma revolução de transformações impossíveis de prever.


- Manuel Antônio de Castro.
Referência:
(1) MATSUURA, Sérgio. Entrevista: "O pequeno ato de um grande passo: a criação da internet". In: O Globo, domingo, 27-10-2019, "Economia", p. 39.

51

"A questão sobre o que há depois da morte apenas terá sentido, razão e segurança metodológica, caso se conceba a morte em toda a sua essência ontológica. Aqui não se poderá tampouco decidir se essa questão apresenta uma questão teórica possível. A interpretação ontológica da morte ligada a este mundo precede toda especulação ôntica referida ao outro mundo" (1).


Referência:
(1) HEIDEGGER, Martin. Ser e tempo. Tradução revisada de Marcia Sá Cavalcante Schuback. Petrópolis/RJ: Vozes / Editora Universitária São Francisco, 2006, p. 323.

52

"É difícil dizer se o mundo em que vivemos é uma realidade ou um sonho" (1).


Referência:
(1) Kim Ki Duk. Filme: A casa vazia.

53

"A realidade, enquanto linguagem e sentido, é o que denominamos: mundo" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Amar e Ser". In:------. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 317.

54

"Toda a cultura significa lançar a luz do ser que brilha em nós sobre o mundo, em que estamos encarnados para arrancá-lo de suas trevas e glorificar nele o ser também. Por isto, devemos concluir: o mundo por si só não é vestígio nenhum do ser, de Deus, mas somente quando nós sobre ele lançarmos a luz do ser que brilha em nós: as coisas do mundo podem tornar um caminho para o ser, quando o reflexo da luz do ser, que lanço sobre eles, faz com que neles eu possa descobrir e reconhecer o ser" (1).


Referência:
(1) HUMMES, o.f.m. Frei Cláudio. Metafísica. Mimeo. Daltro Filho / Imigrantes, RS, 1963. Depois tornou-se Bispo e hoje é Cardeal.

55

"Verdade não é nenhuma afirmação de adequação entre aquilo de que se fala e o que dele se fala. Isso é derivado, é representação. A verdade fundadora é o próprio ser eclodindo, desvelando-se enquanto linguagem, sentido e mundo. O mundo em que cada um vive e se experiencia já é uma consequência de ser sempre sendo do ser" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ser e estar". In:------. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 51.

56

"Toda posição é posição em mudança. Esta não se resolve numa sucessividade justaposta. A justaposição de dez mil tijolos ainda não é uma casa. Esta implica mais do que as suas posições. Exige em primeiro lugar o vazio, onde eles poderão ocupar uma posição. Sem vazio não há posição. Sem silêncio não há fala nem canto. Portanto, a posição exige sempre algo prévio que possibilite fazer de dez mil tijolos não uma reunião confusa, mas uma casa: o prévio é o sentido e o mundo" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O próprio como possibilidades". In:---. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 130.

57

"Mas a fala do silêncio é mais do que relação e comunicação. São, portanto, linguagem, sentido e mundo que possibilitam as posições como posições, isto é, são as possibilidades de tempo e mundo e suas circunstâncias. Sem ser não há linguagem, sentido e mundo" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O próprio como possibilidades". In:---. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 130.

58

"A physis / ser é o maior de todos os mistérios. Ao se destinar e doar na riqueza impensável dos entes sendo como linguagem e poiesis, ela se faz mundo. O mundo é da physis/linguagem/poiesis não do homem. Quando o ser humano produz algo, ele o faz a partir da physis, que lhe dá a possibilidade de agir e de produzir isto e aquilo, em que um tal agir se efetiva, realiza, e assim se constitui mundo como linguagem / ethos. O mundo é uma doação da linguagem" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. Linguagem: nosso maior bem. Série Aulas Inaugurais. Faculdade de Letras, UFRJ, 2o. sem. / 2004, p. 29.

59

"Digo ao senhor: e foi menino nascendo. Com as lágrimas nos olhos, aquela mulher rebeijou minha mão... Alto eu disse, no me despedir: - "Minha Senhora Dona: um menino nasceu - o mundo tornou a começar! ... " (1).


Referência:
ROSA, João Guimarães. Grande sertão: veredas. 6. e. Rio de Janeiro: Livraria José Olympio Editora, 1968, p. 353.

60

o mundo está mudando
será que você o sente
se despindo e depois vestindo
uma roupa desconfortável
e mais justa
- mudanças (1)


Referência:
(1) KAUR, rupi. meu corpo / minha casa. Trad. Ana Guadalupe. São Paulo: Editora Planeta, 2020, p. 151.

61

"O ano celta não tem começo nem fim. Ele segue o ritmo da natureza em seu ciclo contínuo. As marcações no calendário são apenas as mudanças mais evidentes na natureza. A cada nova estação, ocorre uma festividade que celebra seu significado para a agricultura. Durante essas festividades, as fronteiras entre os mundos material e sobrenatural desaparecem, e as entidades espirituais do Outro Mundo rompem o véu que as separa do reino dos vivos" (1).


Referência:
(1) HOOD, Juliette. O livro celta da vida e da morte. Trad. Denise de C. Rocha Delela. São Paulo: Editora Pensamento, 2011, p. 23.

62

... pois mundo nada mais é do que a realidade/physis eclodindo em sentido, isto é, mundo. E aí vem o desdobramento: a realidade eclodindo em mundo enquanto o seu próprio sentido, é a realidade eclodindo como verdade, a-letheia. Daí a ligação antiquíssima entre caos e mundo (kosmos). Ora, onde a terra eclode em mundo é na obra de arte. Por isso é no deixar vigorar a obra de arte que passamos a ver o sentido e a verdade da realidade. Daí a verdade e o sentido serem indissociáveis.


- Manuel Antônio de Castro.

63

Realização é o vir a ser da realidade no seu manifestar-se em real, ou seja, a totalidade dos entes (ta onta), dos fenômenos. Como tal, todo fenômeno é uma realização da realidade constituindo o real. Toda realização é oblíqua e dissimulada porque nela a realidade se dá e retrai, se manifesta e vela. Toda realização é uma doação do ser. Daí podermos falar de real e irreal, de ideal e real, porque este, em verdade, é a vigência do vigor da realidade pondo-se e depondo-se nas realizações. O Ser é doação enquanto tempo, presença, mundo, sentido e realização.


- Manuel Antônio de Castro

64

"No entanto, aquilo que é verdadeiramente inquietante não é o fato de o mundo se tornar cada vez mais técnico. Muito mais inquietante é o fato de o Homem não estar preparado para esta transformação do mundo, é o fato de nós ainda não conseguirmos, através do pensamento que medita, lidar adequadamente com aquilo que, nesta era está realmente a emergir" (1).


Referência:
(1) HEIDEGGER, Martin. Serenidade. Lisboa: Instituto Piaget. Trad. Maria Madalena Andrade e Olga Santos, s/d., p. 21.