Sintaxe

De Dicionário de Poética e Pensamento

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O que se entende por sintaxe esconde normalmente a verdadeira questão. É que sintaxe está relacionada ao lógos, nos três sentidos fundamentais: a) o de reunir; b) o de dizer; c) de narrar ou enumerar, levando para o pôr, propor e dispor. Ocorre que isso acontece unido à poíesis, a éthos e a alétheia. Temos então a sintaxe poética. Já na retórica, o verbo perde seu vigor, deslocando-se para o sujeito. Desta forma, o logos, fundando a pro-posição, passa a ser entendido como o que reúne, mas absolutamente como ideia. Por isso, vamos ter uma sintaxe lógica. E aí se fala de código, discurso e significado. Pois o logos é reduzido à razão e não pode fundar sentido nem linguagem, só um código, uma semiologia. A sintaxe lógico-gramatical nunca funda uma verdade como tensão de desvelamento e velamento, de fala e silêncio.


- Manuel Antônio de Castro


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Além das diferentes sintaxes, é necessário correlacioná-las com outras palavras como: a) sistema de energias; b) organismo mecanicista de parte e todo; c) organismo sistêmico de relações; d) o fenômeno da auto-organização; e) o sistema imunológico; f) o corpo como mônada; g) padrão de organização. A sintaxe sistêmica se dá em torno de três dimensões: conexidade, relações e contexto. Porém, podemos distinguir duas sintaxes fundamentais: a) a sistêmica, acima vista, ou seja, é a sintaxe de um código que tende a ser confundida com a linguagem. Por outro lado, a sintaxe da linguagem ou poética incorpora o vazio e o silêncio, porque é a própria poíesis. A sintaxe se torna então questão: Como pode haver sintaxe do silêncio, sintaxe da não-verdade, do insólito, do Nada? Nem por isso eles deixam de ser, pois não se reduzem a relações e conexões.


- Manuel Antônio de Castro
Ver também:
*Arte
*Estruturalismo

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A sintaxe é semelhante à tensão da aletheia. Ela precisa ser vista em diversos níveis. O fragmento 123 de Heráclito "Phýsis krýptesthai phileî", que pode ser entendido de diversas maneiras, contém em si uma sintaxe tensional. Kaos e Kosmos míticos também contém. A sintaxe gramatical é vista como coordenação e subordinação. Isto pode pressupor na coordenação a não linearidade causal se vista não como proposição, mas como discurso. E a linearidade causal, se vista como subordinação, também no discurso. Ocorre que como, na alétheia, o radical, o núcleo e o a-pêiron que se dá e se vela no pêiron, assim como lethei é a não-verdade da verdade. Por isso, a teoria da AUTO-ORGANIZAÇÃO tendo como base a "teoria das estruturas dissipativas" de Prigogine, pode-se dar aparentemente nessa sintaxe da alétheia. Daí, dizer Capra: "Desse modo, a amplificação da realimentação que gera em aumento disparado, e sempre foi olhada como destrutiva na cibernética, aparece como uma fonte de nova ordem e complexidade na teoria das estruturas dissipativas" (1). Aí a questão nunca fala porque não se a escuta. Quando se fala em "estrutura dissipativa", o dissipativo é um atributo da estrutura. E esta é lida conceitualmente e determina o alcance da dissipação, desfazendo o vigor da questão. Nesse sentido, a questão que se coloca é a seguinte: Qual a coesão e a coerência, qual é a estrutura do silêncio? A sintaxe do silêncio é sempre ético-poética. É um acontecer poético. O conceito e a obra aberta e a estrutura ausente sofre da mesma contradição. O vigor da sintaxe poética está na palavra poética, porque o que é para ser são as palavras.


- Manuel Antônio de Castro


Referência:
(1) CAPRA, Fritjof. A teia da vida. São Paulo: Cultrix, 1996, p. 86.


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4

Distingo duas sintaxes: a retórico-gramatical, onde ocorrem abstrações e se move no âmbito dos conceitos, do paradigma, do código. E há a sintaxe poética que advém do próprio núcleo de Hermes como verbo. O exemplo que posso dar é o da sintaxe que consiste na Ciranda das quatro a que Heidegger se reporta no ensaio "A coisa" (1). A excessividade do ser produz a sintaxe poética. Ora, tal excessividade se origina de um combate e de um repouso, ou seja, só há excessividade do ser ou multiplicidade porque existe o vazio de excessividade, ou seja, a unidade. Por tal unidade se entende o repouso ou não-ação como máximo da ação, silêncio como o máximo de fala. Só por esta excessividade o silêncio fala e até pode ser ruidoso. A excessividade da sintaxe retórica-gramatical responde e corresponde aos conceitos e abstrações, produzindo as reproduções, a produção em cadeia, as simulações, a oferta em larga escala. É o sistema da reprodução como reprodução do sistema, como vigência da representação. O que está em jogo nas duas sintaxes é o caráter metafísico do ente como algo substantivo e objetual e o sendo como Ciranda, onde não há subjetividade na medida em que o sendo é verbal. E é verbal porque o ser é verbal.


- Manuel Antônio de Castro


Referência:
(1) HEIDEGGER, Martin. "A coisa". In: ______. Ensaios e conferências. Petrópolis: Vozes, 2002.


Ver também:
*Coisa

5

"Sem sentido não há sintaxe. Não se trata de um ordenamento lógico, mas de uma sintaxe que se funda no sentido, porque aí sentido é linguagem e a linguagem é a casa do ser" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Obra de arte, vocabulário e mundo". In: ------------. Leitura: questões. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2015, p. 249.

6

A sintaxe gramatical dilui o vigor da palavra, em geral, na proposição. A sintaxe poética concentra seu vigor na palavra. Na palavra poética e de pensamento, estão concentradas as forças centrífugas e centrípetas. No centro dessa tensão, há o mistério do "entre". É no "entre" que a sintaxe tem sua origem. Mas para a gramática a ordem vem das relações entre as palavras na proposição, determinando o sentido e o valor estrutural das palavras. Há, portanto, uma inversão. O operar da obra poética se concentra na sintaxe poética, pois esta institui e constitui o sentido ético-poético da verdade da realidade.
Já a gramática se origina da verdade metafísica, ou seja, aquela verdade que se fundamenta na adequação. Ao passo que a verdade poética se funda no desvelar e velar incessante da realidade. Diziam os poetas e pensadores gregos: aletheia.


- Manuel Antônio de Castro.

7

a poesia está ligada à ação-verbo-Hermes, mas enquanto poíesis, isto é, o vigor poético ou a ação enquanto sentido do ser e de ser, o ético. Por isso, a música e a linguagem, o mesmo, estão ligados à poíesis ou vigor poético como sintaxe: o ordenamento da realidade em mundo. Linguagem é sintaxe poética, é mundo, é éthos (morada). A música cria sintaxe poética, daí ser linguagem. O mesmo ocorre com a dança e outras artes. Notemos que normalmente se liga sintaxe à gramática. Porém, esta sintaxe se restringe a apreender e analisar o ordenamento lógico. Mas este já depende de uma redução do vigorar do logos.


- Manuel Antônio de Castro

8

"Paradigma é formado da preposição grega para'-, que significa: ao lado de; e do verbo deiknymi, que diz: fazer algo aparecer, mostrar. Já o conceito sintagma é composto da preposição: syn: com; e -tagma, do verbo: tasso, que significa: assinalar um lugar, daí que sintaxe quer dizer: ordenar um conjunto. Notamos que paradigma e sintagma não se excluem: os elementos do sintagma adquirem seu sentido na ordenação, enquanto manifestação do todo, isto é, do paradigma. O eixo vertical manifesta e põe em ordem os elementos do deiknymi, enquanto ações ocorridas e paralelas, mas ordenadas (tasso) umas às outras (syn), daí sintaxe. Os fatos percebidos horizontalmente são manifestações do eixo vertical. Os dados que aparecem são percebidos horizontalmente, daí a sensação linear de história, de mera sucessão de fatos" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Paradigma e identidade". In: ------. Tempos de Metamorfose. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1994, p. 189.
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