Mito
De Dicionário de Poética e Pensamento
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== 1 == | == 1 == | ||
- | : Hoje as [[ciências]] cognitivas, antigas [[ciências]] do [[espÃrito]], já se dão conta de que é [[essencial]] trazer para a [[questão]] não só a [[vida]] do [[homem]], mas também sua [[vida]] experienciada no cotidiano. Porém, do cotidiano enquanto [[ordinário]] sempre falaram as [[artes]], não para reproduzi-lo, mas para surpreendê-lo e apreendê-lo na [[dimensão]] do [[extraordinário]]. Porque entre um e outro é que se dá o [[vigor]] do [[poético]], o ditar do [[sagrado]] enquanto [[energia]] de [[sentido]] e [[linguagem]] que a tudo realiza. Por isso, o [[mito]] se dá sempre no [[entre]] [[acontecer]] dos [[ritos]] enquanto [[vigorar]] dos [[mitos]], ou seja, no [[mÃtico]]. Quando os [[ritos]] representam e esquecem os [[mitos]], começa a [[necessidade]] de criar o [[simbólico]]. As [[ciências]] cognitivas se não ouvirem o [[poder]] do [[mito]] como [[presença]] na [[experienciação]] cotidiana do [[extraordinário]] estarão ainda tolhidas e surdas para a [[fala]] e [[voz]] da [[essência]] do [[humano]]. | + | : Hoje as [[ciências]] cognitivas, antigas [[ciências]] do [[espÃrito]], já se dão conta de que é [[essencial]] trazer para a [[questão]] não só a [[vida]] do [[homem]], mas também sua [[vida]] experienciada no cotidiano. Porém, do cotidiano enquanto [[ordinário]] sempre falaram as [[artes]], não para reproduzi-lo, mas para surpreendê-lo e apreendê-lo na [[dimensão]] do [[extraordinário]]. Porque entre um e outro é que se dá o [[vigor]] do [[poético]], o ditar do [[sagrado]] enquanto [[energia]] de [[sentido]] e [[linguagem]] que a tudo realiza. Por isso, o [[mito]] se dá sempre no [[entre]] [[acontecer]] dos [[ritos]] enquanto [[vigorar]] dos [[mitos]], ou seja, no [[mÃtico]]. Quando os [[ritos]] representam e esquecem os [[mitos]], começa a [[necessidade]] de [[criar]] o [[simbólico]]. As [[ciências]] cognitivas se não ouvirem o [[poder]] do [[mito]] como [[presença]] na [[experienciação]] cotidiana do [[extraordinário]] estarão ainda tolhidas e surdas para a [[fala]] e [[voz]] da [[essência]] do [[humano]]. |
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- | : "Nesta | + | : "Nesta [[circulação]] [[poético]]-[[ontológica]], o [[homem]] é, pois, uma [[realização]] que diretamente só alcança [[realizações]] e jamais chega à [[realidade]]. Mas à s vezes produz [[realizações]] privilegiadas que parecem abolir a [[diferença]] da temporalidade, pois dão acesso, embora indireto e oblÃquo [eis os modos de a [[verdade]] se manifestar], aos [[mistérios]] da [[realidade]]. São os [[mitos]]. Em seu envio se faz a [[experiência]] de momentos intensos de uma [[temporalidade]] não apenas povoada de [[realizações]], mas sobretudo integrada pela [[realidade]]" (1). |
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- | : (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. ''Filosofia grega - uma introdução''. Teresópolis: Daimon Editora, 2010, p. 47. | + | : (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. '''Filosofia grega - uma introdução'''. Teresópolis: Daimon Editora, 2010, p. 47. |
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- | : (1) SOARES, André Marcelo Machado. "Nietzsche e Heidegger na teologia de Paul Tillich". In: ''Caderno de Letras'', nº 16. Rio de Janeiro: UFRJ, Faculdade de Letras, Departamento de Letras Anglo-Germânicas, p. 127. | + | : (1) SOARES, André Marcelo Machado. "Nietzsche e Heidegger na teologia de Paul Tillich". In: '''Caderno de Letras''', nº 16. Rio de Janeiro: UFRJ, Faculdade de Letras, Departamento de Letras Anglo-Germânicas, p. 127. |
== 6 == | == 6 == | ||
- | : "A recompensa, por se existir na ponte do [[tempo]] [[entre]] o [[silêncio]] e a [[fala]], é avançar sempre e nunca parar" (1). O [[mito]] é também o [[silêncio]] do [[rito]]. O [[rito]] é a fala do [[mito]]. | + | : "A recompensa, por se [[existir]] na ponte do [[tempo]] [[entre]] o [[silêncio]] e a [[fala]], é avançar [[sempre]] e nunca parar" (1). |
+ | : O [[mito]] é também o [[silêncio]] do [[rito]]. O [[rito]] é a [[fala]] do [[mito]]. | ||
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- | : (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. ''Aprendendo a pensar II''. Petrópolis: Vozes, 1992, p. 28. | + | : (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. '''Aprendendo a pensar II'''. Petrópolis: Vozes, 1992, p. 28. |
== 7 == | == 7 == | ||
- | : Uma [[reflexão]] da ligação do [[mito]] com a [[literatura]] e a [[arte]] está exposta na [[interpretação]] de Schuback: "Ao narrar que Ulisses [segundo Kafka] com cera nos ouvidos jamais poderia ouvir que as sereias não teriam cantado e, assim, descobrir que o [[mito]] seria [[ilusão]], Kafka mostra que a [[literatura]] é itinerário para a [[verdade]] do [[mito]]. [[Literatura]] é a [[saga]] de [[Ulisses]] de volta para o [[mito]]" (1). Não só [[Ulisses]] tapa os ouvidos com cera, mas as [[sereias]] não cantam: "Mais do que [[silêncio]], elas deixam em cena o seu não-canto e assim a [[ausência]] de [[encantamento]] que constituem 'armas ainda mais terrÃveis do que o canto'" (2). O [[canto]] cotidiano nos enche de contentamento, mas nos pode obstruir o [[caminho]] para o não-encantamento, para o [[silêncio]]. E esta pode ser a [[verdade]] do [[mito]], o supremo encantamento, a [[morte]], porque depois que o [[silêncio]] fala, qualquer [[palavra]] é excessiva, cada um achou a sua [[plenitude]]. [[Ulisses]] ao [[ouvir]] o que não pode ser ouvido só se salva porque se amarra ao [[limite]] que toda [[fala]] implica. O máximo de [[limite]] da [[fala]] frente ao ilimitado de todo [[silêncio]] está na [[palavra]] cantada, onde o encantamento advém como [[real]] e como [[possÃvel]], como desvelado e velado, como [[ordinário]] e [[extraordinário]], onde a [[ambiguidade]] se faz o [[uno]] de toda [[diversidade]]. A [[palavra]] cantada sendo sucessão de sons se faz [[sentido]] enquanto [[uno]] de toda [[realidade]]. Por isso, o [[ritmo]] é o [[real]] se dando, se manifestando em [[formas]] no [[devir]] contÃnuo da não-forma. Eis porque na pausa não há [[ritmo]], só na fala cantada do [[silêncio]]. | + | : Uma [[reflexão]] da ligação do [[mito]] com a [[literatura]] e a [[arte]] está exposta na [[interpretação]] de Schuback: "Ao narrar que Ulisses [segundo Kafka] com cera nos ouvidos jamais poderia ouvir que as sereias não teriam cantado e, assim, descobrir que o [[mito]] seria [[ilusão]], Kafka mostra que a [[literatura]] é itinerário para a [[verdade]] do [[mito]]. [[Literatura]] é a [[saga]] de [[Ulisses]] de volta para o [[mito]]" (1). |
+ | : Não só [[Ulisses]] tapa os ouvidos com cera, mas as [[sereias]] não cantam: "Mais do que [[silêncio]], elas deixam em cena o seu não-canto e assim a [[ausência]] de [[encantamento]] que constituem 'armas ainda mais terrÃveis do que o canto' " (2). O [[canto]] cotidiano nos enche de contentamento, mas nos pode obstruir o [[caminho]] para o não-encantamento, para o [[silêncio]]. E esta pode ser a [[verdade]] do [[mito]], o supremo encantamento, a [[morte]], porque depois que o [[silêncio]] fala, qualquer [[palavra]] é excessiva, cada um achou a sua [[plenitude]]. [[Ulisses]] ao [[ouvir]] o que não pode ser ouvido só se salva porque se amarra ao [[limite]] que toda [[fala]] implica. O máximo de [[limite]] da [[fala]] frente ao ilimitado de todo [[silêncio]] está na [[palavra]] cantada, onde o encantamento advém como [[real]] e como [[possÃvel]], como desvelado e velado, como [[ordinário]] e [[extraordinário]], onde a [[ambiguidade]] se faz o [[uno]] de toda [[diversidade]]. A [[palavra]] cantada sendo sucessão de sons se faz [[sentido]] enquanto [[uno]] de toda [[realidade]]. Por isso, o [[ritmo]] é o [[real]] se dando, se manifestando em [[formas]] no [[devir]] contÃnuo da não-forma. Eis porque na pausa não há [[ritmo]], só na fala cantada do [[silêncio]]. | ||
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- | : (1) SCHUBACK, Marcia Sá Cavalcante. "As cordas serenas de Ulisses". In: ------. ''Ensaios de Filosofia''. Petrópolis: Vozes, 1999, p.165. | + | : (1) SCHUBACK, Marcia Sá Cavalcante. "As cordas serenas de Ulisses". In: ------. '''Ensaios de Filosofia'''. Petrópolis: Vozes, 1999, p.165. |
: (2) Idem, p. 164. | : (2) Idem, p. 164. | ||
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: Referência: | : Referência: | ||
- | : (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "A filosofia grega hoje". In: ''Caderno de Letras | + | : (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "A filosofia grega hoje". In: '''Caderno de Letras, nº 18'''. Rio de Janeiro: UFRJ, Faculdade de Letras, Departamento de Letras Anglo-Germânicas, 2002, p. 21. |
== 9 == | == 9 == | ||
- | : Apontam-se as três construções do [[real]]: [[filosofia]], [[teologia]], [[ciência]]. Mas elas não estão separadas, pois a ciência fragmenta a construção do homem e do real numa série de disciplinas. E cada uma de acordo com o seu objeto e método, nos propõe um entendimento do mito: antropologia, etnografia (ou etnologia), psicologia, psiquiatria, psicanálise, história. E dentro de cada [[disciplina]] ainda há as correntes. Isso numa primeira instância pulveriza o entendimento do mito, afastando-nos do seu vigor manifestativo e construtivo. Por outro lado, afirmando-se o mito um núcleo impenetrável, só ocasiona uma possibilidade de abertura para o sentido do mito no que o mito é: manifestação originária do [[real]]. Pensadas não as interpretações mas este núcleo indecifrável, | + | : Apontam-se as três [[construções]] do [[real]]: [[filosofia]], [[teologia]], [[ciência]]. Mas elas não estão separadas, pois a ciência fragmenta a construção do homem e do real numa série de disciplinas. E cada uma de acordo com o seu [[objeto]] e [[método]], nos propõe um [[entendimento]] do [[mito]]: [[antropologia]], etnografia (ou etnologia), [[psicologia]], [[psiquiatria]], [[psicanálise]], [[história]]. E dentro de cada [[disciplina]] ainda há as [[correntes]]. Isso numa primeira instância pulveriza o [[entendimento]] do [[mito]], afastando-nos do seu [[vigor]] [[manifestativo]] e construtivo. Por outro lado, afirmando-se o [[mito]] um núcleo [[impenetrável]], só ocasiona uma [[possibilidade]] de [[abertura]] para o [[sentido]] do [[mito]] no que o [[mito]] [[é]]: [[manifestação]] [[originária]] do [[real]]. Pensadas não as [[interpretações]], mas este núcleo [[indecifrável]], abre-se para nós a [[essência]] do [[mito]], que é, no fundo, a [[essência]] da [[linguagem]] ou do [[real]] como [[totalidade]] [[cósmica]]. O que seja isto é o que o [[mito]] nos leva a [[pensar]]. E aqui se dá a diferença [[entre]] o [[mito]] como [[conhecimento]] e o [[mito]] como uma experiência de pensamento mÃtica. O [[mito]] em seu núcleo duro [[é]] [[sempre]] uma experiência de [[pensamento]] e não a formulação de um [[conhecimento]]. Quando se pensa a [[arte]] essencialmente se chega à [[questão]] do [[mito]] como [[experiência]] de [[pensamento]], ou seja, à experiência de [[pensamento]] do [[sagrado]]. É o que [[Platão]], no ''Ãon'', fala sobre a [[inspiração]] dos [[poetas]] pelas [[Musas]]. |
- | :- [[Manuel Antônio de Castro]] | + | : - [[Manuel Antônio de Castro]] |
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- | : No [[mito]] deve ser considerado fundamentalmente o [[rito]], porque o [[rito]] é o [[mito]] vigorando como [[tempo]] [[originário]]. O [[mito]] nos advém no [[rito]], que com o [[tempo]] e no [[tempo]] se tornaram [[narrativas]] [[poéticas]]. Mas quando consideramos o [[rito]], constatamos que ele não é um [[conceito]], nem, evidentemente, uma [[representação]]. Por isso, o [[rito]] se constitui na essência de sua [[poética]] mÃtica, pois toda poética já desde sempre vigora no tempo e ser. Não temos só poética quando o mito nos dá a ritualização da própria [[linguagem]], como no [[mito]] de [[Hermes]]. Todo [[rito]] pressupõe uma [[poética]], pois todo [[rito]] reúne momentos de [[música]], [[poesia]], [[dança]], [[pintura]], [[escultura]]... O [[rito]] reúne as [[linguagens]] [[poéticas]] no [[mito]] como [[linguagem]]. A [[poética]] do [[mito]] se dá na consideração da tensão [[entre]] [[mito]] e [[rito]], enquanto [[tempo]]. | + | : No [[mito]] deve ser considerado fundamentalmente o [[rito]], porque o [[rito]] é o [[mito]] [[vigorando]] como [[tempo]] [[originário]]. O [[mito]] nos advém no [[rito]], que com o [[tempo]] e no [[tempo]] se tornaram [[narrativas]] [[poéticas]]. Mas quando consideramos o [[rito]], constatamos que ele não é um [[conceito]], nem, evidentemente, uma [[representação]]. Por isso, o [[rito]] se constitui na [[essência]] de sua [[poética]] [[mÃtica]], pois [[toda]] [[poética]] já desde [[sempre]] [[vigora]] no [[tempo]] e [[ser]]. Não temos só [[poética]] quando o [[mito]] nos dá a [[ritualização]] da [[própria]] [[linguagem]], como no [[mito]] de [[Hermes]]. Todo [[rito]] pressupõe uma [[poética]], pois [[todo]] [[rito]] reúne momentos de [[música]], [[poesia]], [[dança]], [[pintura]], [[escultura]]... O [[rito]] reúne as [[linguagens]] [[poéticas]] no [[mito]] como [[linguagem]]. A [[poética]] do [[mito]] se dá na consideração da [[tensão]] [[entre]] [[mito]] e [[rito]], enquanto [[tempo]]. |
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== 11 == | == 11 == | ||
- | : "O [[mito]] tem a força da [[verdade]], a manifestação do real. O mito como palavra coloca a [[linguagem]] como a manifestação do ser. Nesse sentido, a linguagem também é mito. Ela restitui a essência ao ser. É a manifestação pela qual o real eclode em sua essência. Em grego, ''mýthos'' originou-se do verbo ''mytheomai'', que significa: desocultar pela palavra. Palavra essa, organizada na forma de discurso sagrado. Tem o sentido de palavra divina, através do canto poético aquecido como uma fonte referente ao sentido do ser e às formas divinas do mundo. Assim, dizemos que o [[mito]] aparece como o próprio [[real]]. O [[real]] a se doar, a eclodir como [[Linguagem]]" (1). | + | : "O [[mito]] tem a força da [[verdade]], a manifestação do [[real]]. O [[mito]] como [[palavra]] coloca a [[linguagem]] como a [[manifestação]] do [[ser]]. Nesse sentido, a [[linguagem]] também é [[mito]]. Ela restitui a [[essência]] ao [[ser]]. É a [[manifestação]] pela qual o [[real]] eclode em sua [[essência]]. Em [[grego]], ''mýthos'' originou-se do verbo ''mytheomai'', que significa: desocultar pela [[palavra]]. [[Palavra]] essa, organizada na forma de [[discurso]] [[sagrado]]. Tem o [[sentido]] de [[palavra]] [[divina]], através do [[canto]] [[poético]] aquecido como uma [[fonte]] referente ao [[sentido]] do [[ser]] e às [[formas]] [[divinas]] do [[mundo]]. Assim, dizemos que o [[mito]] aparece como o próprio [[real]]. O [[real]] a se doar, a eclodir como [[Linguagem]]" (1). |
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- | : (1) GROETAERS, Elenice. ''A poética da noite em Vinicius de Moraes''. São Paulo: Scortecci, 2007, pp. 58-9. | + | : (1) GROETAERS, Elenice. '''A poética da noite em Vinicius de Moraes'''. São Paulo: Scortecci, 2007, pp. 58-9. |
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- | : "''Mýthos'' já diz o manifestar-se do [[real]] em sua [[essência]] [[originária]], em ser o próprio [[extraordinário]] em seu [[vigor]] atuante, em sua concreticidade, pois o [[concreto]] é a [[vigência]] do vigente na [[pergunta]] que a [[questão]] nos põe. Todo [[mito]] é uma [[pergunta]] gerada pelas [[questões]]. [[Dialogar]] com e [[interpretar]] os [[mitos]] é sempre [[experienciar]] como [[rito]] a [[resposta]] à [[pergunta]] que o [[mito]] sempre e permanentemente coloca" (1). | + | : "''[[Mýthos]]'' já diz o manifestar-se do [[real]] em sua [[essência]] [[originária]], em [[ser]] o [[próprio]] [[extraordinário]] em seu [[vigor]] atuante, em sua concreticidade, pois o [[concreto]] é a [[vigência]] do [[vigente]] na [[pergunta]] que a [[questão]] nos põe. Todo [[mito]] é uma [[pergunta]] gerada pelas [[questões]]. [[Dialogar]] com e [[interpretar]] os [[mitos]] é [[sempre]] [[experienciar]] como [[rito]] a [[resposta]] à [[pergunta]] que o [[mito]] [[sempre]] e permanentemente coloca" (1). |
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- | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Permanência e atualidade da Poética". In: ''Revista Tempo Brasileiro | + | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Permanência e atualidade da Poética". In: '''Revista Tempo Brasileiro, nº 171'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2007, p. 11. |
== 13 == | == 13 == | ||
- | : "O [[mito]], em seu [[vigor]] imperante, está [[presença|presente]], como não podia deixar de ser, em todos os momentos e acontecimentos do [[homem]], [[Poesia]] que [[é]]" (1). | + | : "O [[mito]], em seu [[vigor]] imperante, está [[presença|presente]], como não podia deixar de [[ser]], em todos os [[momentos]] e [[acontecimentos]] do [[homem]], [[Poesia]] que [[é]]" (1). |
: Referência: | : Referência: | ||
- | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. ''O acontecer poético - a história literária''. Rio de Janeiro: Antares, 1982, p. 39. | + | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. '''O acontecer poético - a história literária'''. Rio de Janeiro: Antares, 1982, p. 39. |
== 14 == | == 14 == | ||
- | :"O mito se dá como a instauração originária de [[mundo]] em vigor telúrico, como reunião de [[compreensão]] em que a plenitude do [[horizonte]] se abre à criação encerrando-se na [[tradição]], em que cada [[corpo]] é acolhido dentro de um corpo da [[famÃlia]], do grupo, um corpo social e [[sagrado]] que por sua vez é recolhido em sua totalidade, em cada um dos corpos de seus membros. Desta feita o mito, dispondo cada coisa em seu lugar, em que não são meras coisas, porquanto referenciadas no [[sentido]], instaura mundo ao modo de uma [[corporeidade]] que acolhe corpos ao mesmo tempo que liberta diferentes corporeidades (1). | + | : "O [[mito]] se dá como a [[instauração]] [[originária]] de [[mundo]] em vigor telúrico, como [[reunião]] de [[compreensão]] em que a [[plenitude]] do [[horizonte]] se abre à [[criação]] encerrando-se na [[tradição]], em que cada [[corpo]] é acolhido dentro de um [[corpo]] da [[famÃlia]], do grupo, um [[corpo]] [[social]] e [[sagrado]] que por sua vez é recolhido em sua [[totalidade]], em cada um dos [[corpos]] de seus [[membros]]. Desta feita o [[mito]], dispondo cada coisa em seu [[lugar]], em que não são meras [[coisas]], porquanto referenciadas no [[sentido]], [[instaura]] [[mundo]] ao modo de uma [[corporeidade]] que acolhe [[corpos]] ao [[mesmo]] [[tempo]] que liberta [[diferentes]] [[corporeidades]]" (1). |
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- | :(1) BRAGA, Diego. "A terceira margem do mito: hermenêutica da corporeidade". In: Revista ''Terceira margem''. Revista do Programa de Pós-graduação em Ciência da Literatura da UFRJ. Ano XIV, 22, jan.-jun, 2010, p. 55. | + | : (1) BRAGA, Diego. "A terceira margem do mito: hermenêutica da corporeidade". In: Revista '''Terceira margem'''. Revista do Programa de Pós-graduação em Ciência da Literatura da UFRJ. Ano XIV, 22, jan.-jun, 2010, p. 55. |
== 15 == | == 15 == | ||
- | : "No longo percurso do [[ocidente]], o [[mito]] foi uma das [[produções]] poéticas mais denegridas e desprezadas e, talvez, a que mais sofreu preconceitos. Estes vieram da [[filosofia]], da [[teologia]] e da [[ciência]]. E, na [[dimensão]] da [[linguagem]], da retórica funcional e instrumental. É uma carga muito pesada e destruidora. E isso impede que escutemos o [[mito]] no que ele é como [[mito]], isto é, o que sempre perdura como [[mÃtico]]. O nome-verbo grego ''[[mythos]]'', de onde se formou [[mito]], diz o [[manifestar]] pela [[linguagem]]. Ocorre que do mesmo radical de ''[[mythos]]'' se formou outro nome-verbo essencial: [[mistério]]. O radical de ambos assinala, por isso, uma [[tensão]] de [[desvelamento]] e [[velamento]]. Nesse sentido, todo [[mito]] figura (''fingit'', verbo latino), enquanto [[lÃngua]], “[[imagens-questões]]†e “[[personagens-questões]]â€. Por isso é que a tais [[personagens-questões]] se denominou na [[modernidade]] [[personagens]] ficcionais, algo que em si não existe, que é inventado. Esse modo de julgar acaba escondendo o [[poder]] de [[verdade]] de tais [[criações]]. Se a [[personagem]] não existe, é [[ficcional]], as [[questões]] que elas colocam, ao contrário, são muito [[reais]] e de maneira alguma são invenções ou [[ficções]]. Não nos devemos [[perguntar]] se tal [[personagem]] existe ou existiu historicamente, mas sim qual a [[questão]] que nela e com ela nos advém, se fez e faz presente? [[É]] como [[questões]] e como “[[imagens-questões]]†que devemos ler | + | : "No longo percurso do [[ocidente]], o [[mito]] foi uma das [[produções]] poéticas mais denegridas e desprezadas e, talvez, a que mais sofreu preconceitos. Estes vieram da [[filosofia]], da [[teologia]] e da [[ciência]]. E, na [[dimensão]] da [[linguagem]], da [[retórica]] [[funcional]] e [[instrumental]]. É uma carga muito pesada e destruidora. E isso impede que escutemos o [[mito]] no que ele é como [[mito]], isto é, o que [[sempre]] perdura como [[mÃtico]]. O nome-verbo [[grego]] ''[[mythos]]'', de onde se formou [[mito]], diz o [[manifestar]] pela [[linguagem]]. Ocorre que do [[mesmo]] [[radical]] de ''[[mythos]]'' se formou outro nome-verbo [[essencial]]: [[mistério]]. O [[radical]] de ambos assinala, por isso, uma [[tensão]] de [[desvelamento]] e [[velamento]]. Nesse sentido, [[todo]] [[mito]] [[figura]] (''fingit'', verbo latino), enquanto [[lÃngua]], “[[imagens-questões]]†e “[[personagens-questões]]â€. Por isso é que a tais [[personagens-questões]] se denominou na [[modernidade]] [[personagens]] ficcionais, algo que em si não existe, que é inventado. Esse modo de [[julgar]] acaba escondendo o [[poder]] de [[verdade]] de tais [[criações]]. Se a [[personagem]] não existe, é [[ficcional]], as [[questões]] que elas colocam, ao contrário, são muito [[reais]] e de maneira alguma são invenções ou [[ficções]]. Não nos devemos [[perguntar]] se tal [[personagem]] existe ou existiu [[historicamente]], mas, sim, qual a [[questão]] que nela e com ela nos advém, se fez e faz [[presente]]? [[É]] como [[questões]] e como “[[imagens-questões]]†que devemos [[ler]] e [[escutar]] [[todo]] [[mito]], especialmente o [[mito]] de ''[[Cura]]'', que é um [[mito]] que nos [[fala]] do [[originário]] do [[homem]], da sua constituição e [[humanização]], da sua [[finitude]]" (1). |
: Referência: | : Referência: | ||
- | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O mito de ''Cura'' e o ser humano". In: --------. ''Arte: o humano e o destino''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 221. | + | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O mito de '''Cura''' e o ser humano". In: --------. '''Arte: o humano e o destino'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 221. |
== 16 == | == 16 == | ||
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- | : O ser humano se desdobra em diversas faces, mas a razão tende a tudo querer abarcar. No mito isso não acontece e não há a separação dessas faces, que seriam: | + | : O [[ser humano]] se desdobra em diversas faces, mas a [[razão]] tende a [[tudo]] [[querer]] abarcar. No [[mito]] isso não acontece e não há a separação dessas faces, que seriam: |
- | : Conhecer | + | : [[Conhecer]] |
- | : Pensar ______________ RAZÃO | + | : [[Pensar]] ______________ [[RAZÃO]] |
- | : Compreender | + | : [[Compreender]] |
- | : Querer | + | : [[Querer]] |
- | : Desejar ______________ VONTADE | + | : [[Desejar]] ______________ [[VONTADE]] |
: [[Questionar]] | : [[Questionar]] | ||
- | : Imaginar | + | : [[Imaginar]] |
- | : | + | : [[Sonhar]]________________ [[IMAGINAÇÃO]] |
- | : Inventar | + | : [[Inventar]] |
- | : Crer | + | : [[Crer]] __________________ [[FÉ]] |
- | : Sentir | + | : [[Sentir]] |
- | : Apaixonar ____________ AFETIVIDADE / EMOÇÃO | + | : [[Apaixonar-se]] ____________ [[AFETIVIDADE]] / [[EMOÇÃO]] |
: Sensibilizar | : Sensibilizar | ||
- | : A [[ciência]] dividiu essa realidade complexa em três campos: | + | : A [[ciência]] dividiu essa [[realidade]] complexa em três campos: |
: 1- [[Racional]] | : 1- [[Racional]] | ||
: 2- Volitivo | : 2- Volitivo | ||
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: 2-Indutivo-experimental - observacional - estatÃstico | : 2-Indutivo-experimental - observacional - estatÃstico | ||
- | : Nenhum destes métodos dá conta do vigorar do mito, porque este é um caminhar no cÃrculo poético de manifestação (rito) e velamento (mito). Essas divisões cientÃficas ajudam, mas não dão conta da complexidade do que é o ser humano, porque ele se manifesta no horizonte do que é, ou seja, no pensar-se enquanto se pensa no sentido do Ser. | + | : Nenhum destes [[métodos]] dá conta do [[vigorar]] do [[mito]], porque este é um [[caminhar]] no cÃrculo [[poético]] de manifestação ([[rito]]) e [[velamento]] ([[mito]]). Essas divisões cientÃficas ajudam, mas não dão conta da complexidade do que é o [[ser humano]], porque ele se manifesta no [[horizonte]] do que [[é]], ou seja, no pensar-se enquanto se pensa no [[sentido do Ser]]. |
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+ | : - [[Manuel Antônio de Castro]]. | ||
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- | : A palavra ''mythos'' vem do verbo grego ''mytheomai'' e diz o advir da [[realidade]] à [[palavra]], à [[voz]]. Do mesmo radical deste verbo se formou o verbo grego ''myein'', que diz, silenciar. Temos em português a palavra mudo, o que não fala, originada desse radical. Eclodir na palavra quer dizer advir à [[linguagem]]. Mas devemos notar que o radical desses dois verbos se dá numa [[dobra]] originária: voz e mudez provêm do mesmo fundo: o [[silêncio]]. Portanto, os [[mitos]] nada mais são do que a eclosão da realidade nas múltiplas tonalidades e visualizações da linguagem. A ligação aqui das obras poéticas com os [[mitos]] é evidente. A questão das Musas está ligada à questão da linguagem. | + | : A [[palavra]] ''[[mythos]]'' vem do [[verbo]] [[grego]] ''mytheomai'' e diz o advir da [[realidade]] à [[palavra]], à [[voz]]. Do mesmo [[radical]] deste [[verbo]] se formou o [[verbo]] [[grego]] ''myein'', que diz, [[silenciar]]. Temos em [[português]] a [[palavra]] mudo, o que não fala, originada desse [[radical]]. Eclodir na [[palavra]] quer [[dizer]] advir à [[linguagem]]. Mas devemos notar que o [[radical]] desses dois verbos se dá numa [[dobra]] [[originária]]: [[voz]] e mudez provêm do mesmo fundo: o [[silêncio]]. Portanto, os [[mitos]] nada mais são do que a eclosão da [[realidade]] nas múltiplas tonalidades e visualizações da [[linguagem]]. A ligação aqui das [[obras poéticas]] com os [[mitos]] é [[evidente]]. A [[questão]] das [[Musas]] está ligada à [[questão]] da [[linguagem]]. |
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- | : "Cada conjunto de mitos em todas as [[culturas]] já são modos diferentes de se defrontarem com as mesmas [[questões]]. Em nenhuma [[cultura]] [[mito]] quer ser [[explicação]] de algo. A redução dos [[mitos]] a [[explicações]] já é uma [[visão]] fundamentada na [[metafÃsica]] do [[fundamento]], da [[causalidade]]. O [[mito]] manifesta a [[questão]] e estabelece a [[referência]] de [[ser]] e [[essência]] do [[ser humano]]. Todo [[mito]] é uma [[referência]] onde se manifesta a [[questão]]. Todo [[rito]] é uma [[narração]] não de uma [[história]] de [[vida]] ou vidas, mas da [[manifestação]] da [[questão]]. A [[questão]] é prévia a todo [[mito]] e [[rito]]. Porém, ela nunca é [[atemporal]], nem a-espacial e nem a-histórica. Onde houver [[acontecer]] de [[tempo]] e [[espaço]] aà se fará presente sempre a [[história]]. Os [[mitos]] já fazem presente aquilo que vigora em toda a [[realidade]] e está para além de toda [[resposta]]. As [[respostas]] variam, isso é fundamental [[perceber]], mas a [[questão]] dá [[origem]] a todas e nenhuma [[resposta]] a extingue" (1). | + | : "Cada conjunto de [[mitos]] em todas as [[culturas]] já são modos diferentes de se defrontarem com as mesmas [[questões]]. Em nenhuma [[cultura]] [[mito]] quer ser [[explicação]] de algo. A redução dos [[mitos]] a [[explicações]] já é uma [[visão]] fundamentada na [[metafÃsica]] do [[fundamento]], da [[causalidade]]. O [[mito]] manifesta a [[questão]] e estabelece a [[referência]] de [[ser]] e [[essência]] do [[ser humano]]. Todo [[mito]] é uma [[referência]] onde se manifesta a [[questão]]. Todo [[rito]] é uma [[narração]] não de uma [[história]] de [[vida]] ou vidas, mas da [[manifestação]] da [[questão]]. A [[questão]] é prévia a todo [[mito]] e [[rito]]. Porém, ela nunca é [[atemporal]], nem a-espacial e nem a-histórica. Onde houver [[acontecer]] de [[tempo]] e [[espaço]] aà se fará presente sempre a [[história]]. Os [[mitos]] já fazem presente aquilo que vigora em toda a [[realidade]] e está para além de toda [[resposta]]. As [[respostas]] variam, isso é fundamental [[perceber]], mas a [[questão]] dá [[origem]] a todas e nenhuma [[resposta]] a extingue" (1). |
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- | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O próprio como possibilidades". In: | + | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O próprio como possibilidades". In: ---. '''Arte: o humano e o destino'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 128. |
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- | : "O [[mito]] é julgado e descartado a partir do ''[[logos]]'', reduzido à [[razão]]. E o [[mito]] sempre falou do [[ser humano]] como pertencente a um ''[[genos]]'' (de onde se forma a [[palavra]] moderna [[genética]]). Indicava uma [[famÃlia]], um [[gênero]] (formada também de ''[[genos]]''), uma etnia. Como [[famÃlia]] tinha algo em [[comum]], o ''[[genos]]'', mas cada um dentro desse ''[[genos]]'' recebia um [[quinhão]], a sua “cota†no ''[[genos]]'' da [[famÃlia]]. O [[nome]] para esse [[quinhão]] foi e é: ''[[Moira]]''. A [[tradução]] mais tradicional não é [[quinhão]], mas [[destino]]" (1). | + | : "O [[mito]] é julgado e descartado a partir do ''[[logos]]'', reduzido à [[razão]]. E o [[mito]] [[sempre]] falou do [[ser humano]] como pertencente a um ''[[genos]]'' (de onde se forma a [[palavra]] moderna [[genética]]). Indicava uma [[famÃlia]], um [[gênero]] (formada também de ''[[genos]]''), uma [[etnia]]. Como [[famÃlia]] tinha algo em [[comum]], o ''[[genos]]'', mas cada um dentro desse ''[[genos]]'' recebia um [[quinhão]], a sua “cota†no ''[[genos]]'' da [[famÃlia]]. O [[nome]] para esse [[quinhão]] foi e é: ''[[Moira]]''. A [[tradução]] mais tradicional não é [[quinhão]], mas [[destino]]" (1). |
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- | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Poético-ecologia". In: Manuel Antônio de Castro, (org.). ''Arte: corpo, mundo e terra | + | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Poético-ecologia". In: Manuel Antônio de Castro, (org.). '''[[Arte]]: [[corpo]], [[mundo]] e [[terra]]. Rio de Janeiro: 7Letras, 2009''', p. 26. |
== 27 == | == 27 == | ||
- | : "O [[mito]] não reproduz nada nem é [[sÃmbolo]] de nada. É uma [[narração]] onde aparecem [[personagens]]-[[questões]] e [[imagens-questões]]. O importante não são os [[personagens]], e sim as [[questões]] que o [[mito]] concretamente nos quer fazer [[pensar]]" (1). | + | : "O [[mito]] não reproduz [[nada]] nem é [[sÃmbolo]] de [[nada]]. É uma [[narração]] onde aparecem [[personagens]]-[[questões]] e [[imagens-questões]]. O importante não são os [[personagens]], e, sim, as [[questões]] que o [[mito]] concretamente nos quer fazer [[pensar]]" (1). |
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- | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O mito de Midas da morte ou do ser feliz". In: -------. ''Arte: o humano e o destino | + | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O [[mito]] de Midas da [[morte]] ou do [[ser]] [[feliz]]". In: -------. '''Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011''', p. 189. |
== 28 == | == 28 == | ||
- | : "Todo o [[mito]] (toda [[travessia]] [[humana]]) gira em torno da ''[[fala]]'' e da ''[[escuta]]''" (1). Todo [[mito]] é uma [[experienciação]] [[poética]] da [[travessia]] [[humana]], pois todo [[mito]] se tece e entretece em torno da alguma [[questão]] ou algumas [[questões]]. É nestas que todo [[ser humano]] realiza a sua [[travessia]]. | + | : "[[Todo]] o [[mito]] ([[toda]] [[travessia]] [[humana]]) gira em torno da ''[[fala]]'' e da ''[[escuta]]''" (1). [[Todo]] [[mito]] é uma [[experienciação]] [[poética]] da [[travessia]] [[humana]], pois [[todo]] [[mito]] se tece e entretece em torno da alguma [[questão]] ou algumas [[questões]]. É nestas que [[todo]] [[ser humano]] [[realiza]] a sua [[travessia]]. |
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- | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ulisses e a Escuta do Canto das Sereiasâ€. In: -----. ''Arte: o humano e o destino | + | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ulisses e a Escuta do Canto das Sereiasâ€. In: -----. '''Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011''', p. 157. |
== 29 == | == 29 == | ||
- | : "A pretensa superação do [[mito]] pela [[historiografia]] não passou despercebida a um [[pensador]] do porte de | + | : "A pretensa [[superação]] do [[mito]] pela [[historiografia]] não passou despercebida a um [[pensador]] do porte de Aristóteles. SensÃvel à força [[originária]] do [[mito]], em outras [[palavras]], à [[Poesia]], declara (1): |
: "''Com efeito, o [[historiador]] e o [[poeta]] não se diferenciam por dizerem as | : "''Com efeito, o [[historiador]] e o [[poeta]] não se diferenciam por dizerem as | ||
- | : ''[[coisas]] em [[verso]] ou em [[prosa]] (pois seria possÃvel versificar as [[obras]] | + | : ''[[coisas]] em [[verso]] ou em [[prosa]] (pois seria [[possÃvel]] versificar as [[obras]] |
: '' de Heródoto, e não seriam menos [[história]] em [[verso]] que em [[prosa]]); | : '' de Heródoto, e não seriam menos [[história]] em [[verso]] que em [[prosa]]); | ||
: '' a [[diferença]] está em que um diz o que sucedeu, e o outro, o que poderia suceder. | : '' a [[diferença]] está em que um diz o que sucedeu, e o outro, o que poderia suceder. | ||
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: Referências: | : Referências: | ||
- | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O fenômeno histórico". In: ----. ''O acontecer poético - a história literária | + | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O fenômeno histórico". In: ----. '''O acontecer poético - a história literária. Rio de Janeiro: Antares, 1982''', p. 39. |
- | : (2) ARISTÓTELES. ' | + | : (2) ARISTÓTELES. '''Poética. Ed. trilÃngue por Valentin Garcia Yebra. Madrid: Gredos, 1974''', p. 157. |
== 30 == | == 30 == | ||
- | : "''[[Mythos]]'' se formou do verbo ''mytheomai'', que significa: [[desocultar]] pela [[palavra]]. “... ''[[mythos]]'' tem o [[sentido]] de [[palavra]] [[divina]] que se apresenta em [[forma]] de [[palavra]] [[humana]] e que por assim [[apresentar]] [[revela]] o [[canto]] como [[fonte]] de [[conhecimentos]] relativos ao [[sentido do ser]] e à s [[formas]] [[divinas]] do [[mundo]]... ''[[mythos]]'' [[significa]] as [[palavras]] das ‘[[Musas]] [[OlÃmpicas]], filhas de [[Zeus]] egÃfero’ †(1). O [[mito]] aparece como o [[próprio]] [[real]] se [[doando]] como [[Linguagem]] na [[palavra]]" (2). | + | : "''[[Mythos]]'' se formou do verbo ''mytheomai'', que significa: [[desocultar]] pela [[palavra]]. “... ''[[mythos]]'' tem o [[sentido]] de [[palavra]] [[divina]] que se apresenta em [[forma]] de [[palavra]] [[humana]] e que por assim [[apresentar]] [[revela]] o [[canto]] como [[fonte]] de [[conhecimentos]] relativos ao [[sentido do ser]] e à s [[formas]] [[divinas]] do [[mundo]]... ''[[mythos]]'' [[significa]] as [[palavras]] das ‘[[Musas]] [[OlÃmpicas]], filhas de [[Zeus]] egÃfero’ †(1). "O [[mito]] aparece como o [[próprio]] [[real]] se [[doando]] como [[Linguagem]] na [[palavra]]" (2). |
- | : | + | : Referências: |
- | : (1) TORRANO, Jaa. ''O sentido de Zeus - o mito do mundo e o modo mÃtico de ser no mundo | + | : (1) TORRANO, Jaa. '''O [[sentido]] de Zeus - o [[mito]] do [[mundo]] e o modo mÃtico de [[ser]] no [[mundo]]. S. Paulo, Iluminuras, 1996''', p. 26. |
- | : (2) CASTRO. Manuel Antônio de. ''Poética e ''poiesis'': a questão da interpretação''. Rio de Janeiro: Faculdade de Letras da UFRJ. '''Série Conferências''', v. 5, 2000, p. 9. | + | : (2) CASTRO. Manuel Antônio de. ''Poética e ''poiesis'': a [[questão]] da [[interpretação]]''. Rio de Janeiro: Faculdade de Letras da UFRJ. '''Série Conferências''', v. 5, 2000, p. 9. |
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: Referência: | : Referência: | ||
- | : (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Hermenêutica do mito". In: ''Cadernos de Letras | + | : (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "[[Hermenêutica]] do [[mito]]". In: '''Cadernos de Letras, 11. Faculdade de Letras da UFRJ. Depto. de Letras Anglo-Germânicas, 1995''', p. 19. |
== 32 == | == 32 == | ||
- | : "Para a [[escrita]], os [[mitos]] são [[narrativas]] de [[fatos]] da [[natureza]], [[estórias]] de [[divindades]] ou de [[personagens]]. O [[mito]] como [[questão]] foi esquecido. Sem [[questão]] o [[mito]] não é [[mito]]. Não é sem [[sentido]] que a [[escrita]], o [[verbo]], tanto no judaÃsmo, quanto no islamismo passou a ser identificado com o próprio [[Deus]]. O [[sagrado]] torna-se [[suporte]], [[fundamento]], [[escrita]], [[escritura]]. Num e noutro caso fala-se sempre das [[sagradas]] [[escrituras]]. Onde há muito mais [[suporte]] escrito do que [[sagrado]], pois eles se dispersam nas [[versões]] das [[traduções]] e das [[interpretações]]. Toda [[tradução]] já é uma [[interpretação]]. Esses [[fatos]] têm também um [[lugar]] importante na [[questão]] [[essencial]] do [[próprio]] e dos [[atributos]]. A [[escrita]], ao [[representar]], entifica" (1). | + | : "Para a [[escrita]], os [[mitos]] são [[narrativas]] de [[fatos]] da [[natureza]], [[estórias]] de [[divindades]] ou de [[personagens]]. O [[mito]] como [[questão]] foi esquecido. Sem [[questão]] o [[mito]] não é [[mito]]. Não é sem [[sentido]] que a [[escrita]], o [[verbo]], tanto no judaÃsmo, quanto no islamismo passou a ser identificado com o próprio [[Deus]]. O [[sagrado]] torna-se [[suporte]], [[fundamento]], [[escrita]], [[escritura]]. Num e noutro caso fala-se [[sempre]] das [[sagradas]] [[escrituras]]. Onde há muito mais [[suporte]] escrito do que [[sagrado]], pois eles se dispersam nas [[versões]] das [[traduções]] e das [[interpretações]]. [[Toda]] [[tradução]] já é uma [[interpretação]]. Esses [[fatos]] têm também um [[lugar]] importante na [[questão]] [[essencial]] do [[próprio]] e dos [[atributos]]. A [[escrita]], ao [[representar]], entifica" (1). |
: Referência: | : Referência: | ||
- | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O próprio como possibilidades". In:------. ''Arte: o humano e o destino | + | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O [[próprio]] como [[possibilidades]]". In:------. '''Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011''', p. 133. |
== 33 == | == 33 == | ||
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- | : (1) PESSOA, Fernando. ''Obra poética | + | : (1) PESSOA, Fernando. '''Obra poética. Rio de Janeiro: Aguilar, 1965''', p. 72. |
== 35 == | == 35 == | ||
- | : "O [[mito]] tem sido muito silenciado na [[cultura]] [[ocidental]]. Com a expansão [[planetária]] desta, os [[mitos]] de outros [[povos]] acabaram sendo apreendidos e lidos a partir desse [[silenciamento]]. Este consiste em um [[jogo]] muito sutil e violento: não deixá-lo se manifestar e [[falar]] o [[tempo]] todo por ele e sobre ele. Por tal [[violência]] deu-se a fuga dos [[deuses]] e a perda do [[sagrado]]" (1). | + | : "O [[mito]] tem sido muito silenciado na [[cultura]] [[ocidental]]. Com a expansão [[planetária]] desta, os [[mitos]] de outros [[povos]] acabaram sendo apreendidos e lidos a partir desse [[silenciamento]]. Este consiste em um [[jogo]] muito sutil e violento: não deixá-lo se manifestar e [[falar]] o [[tempo]] todo por ele e sobre ele. Por tal [[violência]] deu-se a [[fuga]] dos [[deuses]] e a perda do [[sagrado]]" (1). |
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- | : (1) : CASTRO, Manuel Antônio de. “O mito de Midas da morte ou do ser | + | : (1) : CASTRO, Manuel Antônio de. “O [[mito]] de Midas da [[morte]] ou do [[ser]] [[feliz]]â€. In: ------. '''Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011''', p. 187. |
== 36 == | == 36 == | ||
- | : "Porém, se os [[mitos]] foram expulsos de nosso [[horizonte]], eles continuam [[presentes]] e fortes, porque eles não são [[invenções]] [[ficcionais]] nem [[irreais]]. Também não são [[explicações]] [[causais]] para os [[fenômenos]] [[naturais]] ou [[psÃquicos]], como uma [[mitologia]] de base [[cientÃfica]] nos quer fazer acreditar. Nossas [[mentes]] e [[lÃnguas]], poluÃdas por [[saberes]] [[metafÃsicos]], [[retóricos]] e [[cientÃficos]], sentem uma [[real]] dificuldade de se abrir para o [[saber]] dos [[mitos]]. Eles são a [[dimensão]] mais profunda do que em nós é e teima em [[ser]]. Foram-se os [[mitos]], mas continua com sua força onipresente: o [[mÃtico]]. Ele se faz [[presente]] e irrompe principalmente nas [[obras poéticas]]. O [[vigorar]] das [[obras artÃsticas]] se manifestando é o [[mÃtico]] irrompendo em nossas [[vidas]]. O [[mÃtico]] é o [[vigorar]] das [[questões]]" (1). | + | : "Porém, se os [[mitos]] foram expulsos de nosso [[horizonte]], eles continuam [[presentes]] e fortes, porque eles não são [[invenções]] [[ficcionais]] nem [[irreais]]. Também não são [[explicações]] [[causais]] para os [[fenômenos]] [[naturais]] ou [[psÃquicos]], como uma [[mitologia]] de base [[cientÃfica]] nos quer fazer [[acreditar]]. Nossas [[mentes]] e [[lÃnguas]], poluÃdas por [[saberes]] [[metafÃsicos]], [[retóricos]] e [[cientÃficos]], sentem uma [[real]] dificuldade de se [[abrir]] para o [[saber]] dos [[mitos]]. Eles são a [[dimensão]] mais [[profunda]] do que em nós é e teima em [[ser]]. Foram-se os [[mitos]], mas continua com sua força [[onipresente]]: o [[mÃtico]]. Ele se faz [[presente]] e irrompe principalmente nas [[obras poéticas]]. O [[vigorar]] das [[obras artÃsticas]] se manifestando é o [[mÃtico]], irrompendo em nossas [[vidas]]. O [[mÃtico]] é o [[vigorar]] das [[questões]]" (1). |
: Referência: | : Referência: | ||
- | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ulisses e a Escuta do Canto das | + | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ulisses e a [[Escuta]] do [[Canto]] das [[Sereias]]â€. In: -----. '''Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo |
- | Brasileiro, 2011, p. 152. | + | Brasileiro, 2011''', p. 152. |
== 37 == | == 37 == | ||
- | : "Ora, a [[palavra]] ''[[mythos]]'' forma-se do [[verbo]] [[grego]] ''mytheomai'', que significa: abrir, [[manifestar]] pela [[palavra]]. Por isso, toda ''[[poÃÄ“sis]]'' é radicalmente [[mÃtica]]. A [[questão]] fundamental do [[mito]] e da ''[[poÃÄ“sis]]'', da [[harmonia]] Cósmica e, nela, do [[humano]] do [[ser humano]], é o [[destino]] enquanto [[Ser]] e [[Não-ser]]" (1). | + | : "Ora, a [[palavra]] ''[[mythos]]'' forma-se do [[verbo]] [[grego]] ''[[mytheomai]]'', que significa: abrir, [[manifestar]] pela [[palavra]]. Por isso, [[toda]] ''[[poÃÄ“sis]]'' é radicalmente [[mÃtica]]. A [[questão]] [[fundamental]] do [[mito]] e da ''[[poÃÄ“sis]]'', da [[harmonia]] Cósmica e, nela, do [[humano]] do [[ser humano]], é o [[destino]] enquanto [[Ser]] e [[Não-ser]]" (1). |
: Referência: | : Referência: | ||
- | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ulisses e a Escuta do Canto das | + | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ulisses e a [[Escuta]] do [[Canto]] das [[Sereias]]â€. In: -----. '''Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011''', p. 171. |
== 38 == | == 38 == | ||
- | : "Como deixar o [[mito]] [[falar]]? É [[necessário]] pôr tudo que conhecemos em suspenso e ter a [[coragem]] de [[ouvir]] o [[mito]]. Deixemos advir o [[silêncio]] e escutemos. Façamos uma [[leitura]] de [[escuta]] do que esse [[mito]] diz. Minha [[escuta]], a seguir transcrita, não necessariamente será, e é bom que não seja, a do [[leitor]]. Vamos ter algo em comum, mas também algo [[diferente]]. Os dois [[aspectos]] são importantes porque só então pode haver [[diálogo]], pois só há [[diálogo]] onde convivem as [[diferenças]] na [[identidade]] do [[acontecer]] da [[linguagem]], [[fonte]] de todo [[sentido]]" (1). | + | : "Como deixar o [[mito]] [[falar]]? É [[necessário]] pôr [[tudo]] que conhecemos em suspenso e ter a [[coragem]] de [[ouvir]] o [[mito]]. Deixemos advir o [[silêncio]] e escutemos. Façamos uma [[leitura]] de [[escuta]] do que esse [[mito]] diz. Minha [[escuta]], a seguir transcrita, não [[necessariamente]] será, e é bom que não seja, a do [[leitor]]. Vamos ter [[algo]] em comum, mas também [[algo]] [[diferente]]. Os dois [[aspectos]] são [[importantes]] porque só então pode haver [[diálogo]], pois só há [[diálogo]] onde convivem as [[diferenças]] na [[identidade]] do [[acontecer]] da [[linguagem]], [[fonte]] de [[todo]] [[sentido]]" (1). |
: Referência bibliográfica: | : Referência bibliográfica: | ||
- | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O mito de Midas da morte ou do ser feliz". In: -------. ''Arte: o humano e o destino | + | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O [[mito]] de Midas da [[morte]] ou do [[ser]] [[feliz]]". In: -------. '''Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011''', p. 188. |
== 39 == | == 39 == | ||
- | : "O [[mito]] não explica nada. Nunca explica nada. Na [[simplicidade]] e [[dinâmica]] das [[imagens]] nos lança no cerne das [[questões]], pedindo, exigindo de nós um salto [[mortal]] para o [[abismo]] sem [[fundamento]] e no [[abismo]] em que já desde sempre nos movemos" (1). | + | : "O [[mito]] não explica [[nada]]. Nunca explica [[nada]]. Na [[simplicidade]] e [[dinâmica]] das [[imagens]] nos lança no [[cerne]] das [[questões]], pedindo, exigindo de nós um salto [[mortal]] para o [[abismo]] sem [[fundamento]] e no [[abismo]] em que já desde [[sempre]] nos movemos" (1). |
: Referência bibliográfica: | : Referência bibliográfica: | ||
- | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O mito de Midas da morte ou do ser feliz". In: -------. ''Arte: o humano e o destino | + | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O [[mito]] de Midas da [[morte]] ou do [[ser]] [[feliz]]". In: -------. '''Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011''', p. 196. |
== 40 == | == 40 == | ||
- | : "O [[mito]], [[origem]] da ''[[poiesis]]'', só trabalha com [[imagens]], não [[retóricas]], porém, [[questões]]: são as [[imagens-questões]]. ''[[Mnemósine]]'' é a [[memória]], a [[mãe]] de todas as [[Musas]]. [[Verdade]] é a [[deusa]] ''[[Aletheia]]''. [[Sabedoria]] é ''[[Métis]]''. E assim por diante. São [[imagens-questões]]. Quando entendermos a [[linguagem]] [[poética]] dos [[mitos]] como [[imagens-questões]], deixaremos que eles voltem a ter o seu [[vigor]] [[originário]]. As [[imagens-questões]] nos [[mitos]] [[concretizam]] o [[real]] se realizando em [[realizações]] incessantes" (1). | + | : "O [[mito]], [[origem]] da ''[[poiesis]]'', só trabalha com [[imagens]], não [[retóricas]], porém, [[questões]]: são as [[imagens-questões]]. ''[[Mnemósine]]'' é a [[memória]], a [[mãe]] de [[todas]] as [[Musas]]. [[Verdade]] é a [[deusa]] ''[[Aletheia]]''. [[Sabedoria]] é ''[[Métis]]''. E assim por diante. São [[imagens-questões]]. Quando entendermos a [[linguagem]] [[poética]] dos [[mitos]] como [[imagens-questões]], deixaremos que eles voltem a ter o seu [[vigor]] [[originário]]. As [[imagens-questões]] nos [[mitos]] [[concretizam]] o [[real]] se realizando em [[realizações]] incessantes" (1). |
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+ | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. “[[Heidegger]] e as [[questões]] da [[arte]]â€. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). '''Arte em questão: as questões da arte'''. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 19. | ||
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+ | == 41 == | ||
+ | : "Os [[mitos]], como [[todas]] as [[obras poéticas]], propõem [[imagens-questões]] ou [[questões-figuras]]. [[Édipo]] é uma [[imagem-questão]]. Que [[questões]] [[Édipo]] figura? Como a [[questão]] é [[sempre]] ambÃgua, pois vige a partir do “[[entre]]â€, [[Édipo]] é, talvez, a [[imagem-questão]] mais ambÃgua e [[radical]] que o [[mito]]-[[arte]] criou, porque ele simplesmente é, como [[questão]], o [[mito do homem]], numa expressão ao mesmo tempo [[subjetiva]] e [[objetiva]]" (1). | ||
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+ | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. “[[Heidegger]] e as [[questões]] da [[arte]]â€. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). '''Arte em questão: as questões da arte'''. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 22. | ||
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+ | == 42 == | ||
+ | : "... passa a [[estudar]] metodicamente a [[obra]] [[poética]] de [[Hölderlin]]. Nos passos e [[passagens]] da [[obra]] deste [[poeta]], que ele considera como o [[poeta]] e [[pensador]], incorpora ao [[pensamento]] e [[repensa]] o “[[lugar]]†([[mundo]]) do [[mito]] em seu [[vigor]] [[inaugural]], na medida em que os [[mitos]] são [[imagens-questões]]" (1). | ||
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+ | : Referência: | ||
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+ | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. “[[Heidegger]] e as [[questões]] da [[arte]]â€. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). '''Arte em questão: as questões da arte'''. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 32. | ||
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+ | == 43 == | ||
+ | : "Que quer [[dizer]] a [[palavra]] [[mito]]? ''[[Mythos]]'' se origina do [[verbo]] ''mytheomai'', que significa simplesmente o eclodir, o se abrir como [[palavra]], [[linguagem]]. O [[mito]] não é, por isso, um [[discurso]] [[narrativo]] sobre [[algo]]. O [[mito]] é a [[narração]], o [[narrado]] e a ''[[alétheia]]'' ([[verdade]]) da [[narração]] e do [[narrado]]. Em [[grego]], portanto, ''[[mythos]]'' é ''[[aletheia]]''. São esses “os [[princÃpios]]†de [[tudo]]. Só que no ''[[mythos]]'' não há [[princÃpio]]" (1). | ||
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+ | : Referência: | ||
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+ | : (1) "Mythos e genos". In: ---. '''www.travessiapoetica.blogspot.com''' | ||
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+ | == 44 == | ||
+ | : "Temos de [[acolher]] a [[palavra]] [[sagrada]] do [[mito]] que se faz [[estória]] que, incorporada, já somos [[nós]] [[mesmos]], viajantes, [[intérpretes]], em [[travessia]]" (1). | ||
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+ | : (1) CARVALHO, TaÃs Salbé. "João Guimarães Rosa e a criação poética". In: ---. '''Viajar e existir em ''Primeiras Estórias'', de João Guimarães Rosa'''. São Carlos - SP: Editores Pedro & João, 2022, p. 96. | ||
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- | : | + | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Poético-ecologia". In: '''Arte: corpo, mundo e terra'''. CASTRO, Manuel Antônio de (org.). Rio de Janeiro: 7Letras, 2009, p. 19. |
Edição atual tal como 22h08min de 23 de Maio de 2024
1
- Hoje as ciências cognitivas, antigas ciências do espÃrito, já se dão conta de que é essencial trazer para a questão não só a vida do homem, mas também sua vida experienciada no cotidiano. Porém, do cotidiano enquanto ordinário sempre falaram as artes, não para reproduzi-lo, mas para surpreendê-lo e apreendê-lo na dimensão do extraordinário. Porque entre um e outro é que se dá o vigor do poético, o ditar do sagrado enquanto energia de sentido e linguagem que a tudo realiza. Por isso, o mito se dá sempre no entre acontecer dos ritos enquanto vigorar dos mitos, ou seja, no mÃtico. Quando os ritos representam e esquecem os mitos, começa a necessidade de criar o simbólico. As ciências cognitivas se não ouvirem o poder do mito como presença na experienciação cotidiana do extraordinário estarão ainda tolhidas e surdas para a fala e voz da essência do humano.
- Ver também:
- * Divino
- * Sagrado
- * Deus
2
- "Nesta circulação poético-ontológica, o homem é, pois, uma realização que diretamente só alcança realizações e jamais chega à realidade. Mas à s vezes produz realizações privilegiadas que parecem abolir a diferença da temporalidade, pois dão acesso, embora indireto e oblÃquo [eis os modos de a verdade se manifestar], aos mistérios da realidade. São os mitos. Em seu envio se faz a experiência de momentos intensos de uma temporalidade não apenas povoada de realizações, mas sobretudo integrada pela realidade" (1).
- Referência:
- (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. Filosofia grega - uma introdução. Teresópolis: Daimon Editora, 2010, p. 47.
3
- O mito é a lÃngua do sagrado. A linguagem é o sagrado se manifestando na lÃngua do mito. Por isso, o mito é a linguagem de toda lÃngua. Porém, devemos distinguir mito e rito. O rito é o mito concretizado nos gestos dos rituais, na medida em que o mito, nesse sentido, é a narração do sagrado. Dessa maneira, na medida em que se constitui como gestos, não podemos reduzir o rito do mito a um discurso nem a uma escritura, pois a estes falta a densidade do sentido do mito. E é mais, é o logos do sagrado enquanto o silêncio do nada criativo.
4
- Na poesia, o que se revela memória do mito é o apelo do lógos para dizê-lo. Por isso, mais no silêncio e no vazio do que nas palavras, sons, gestos e cores, está presente o mito enquanto memória do silêncio da poesia. O rito é o lógos se fazendo palavras, música, dança e pintura do mito.
5
- Os mitos no sentido moderno são: "[...] progresso, liberdade, igualdade e tantos outros criados pela razão moderna" (1). Ora estes mitos constituem a paideia da Bildung, que é a paideia moderna, fundamentada na razão. Dela se afasta a paideia da poÃesis, fundada no ser.
- Referência:
- (1) SOARES, André Marcelo Machado. "Nietzsche e Heidegger na teologia de Paul Tillich". In: Caderno de Letras, nº 16. Rio de Janeiro: UFRJ, Faculdade de Letras, Departamento de Letras Anglo-Germânicas, p. 127.
6
- "A recompensa, por se existir na ponte do tempo entre o silêncio e a fala, é avançar sempre e nunca parar" (1).
- O mito é também o silêncio do rito. O rito é a fala do mito.
- Referência:
- (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. Aprendendo a pensar II. Petrópolis: Vozes, 1992, p. 28.
7
- Uma reflexão da ligação do mito com a literatura e a arte está exposta na interpretação de Schuback: "Ao narrar que Ulisses [segundo Kafka] com cera nos ouvidos jamais poderia ouvir que as sereias não teriam cantado e, assim, descobrir que o mito seria ilusão, Kafka mostra que a literatura é itinerário para a verdade do mito. Literatura é a saga de Ulisses de volta para o mito" (1).
- Não só Ulisses tapa os ouvidos com cera, mas as sereias não cantam: "Mais do que silêncio, elas deixam em cena o seu não-canto e assim a ausência de encantamento que constituem 'armas ainda mais terrÃveis do que o canto' " (2). O canto cotidiano nos enche de contentamento, mas nos pode obstruir o caminho para o não-encantamento, para o silêncio. E esta pode ser a verdade do mito, o supremo encantamento, a morte, porque depois que o silêncio fala, qualquer palavra é excessiva, cada um achou a sua plenitude. Ulisses ao ouvir o que não pode ser ouvido só se salva porque se amarra ao limite que toda fala implica. O máximo de limite da fala frente ao ilimitado de todo silêncio está na palavra cantada, onde o encantamento advém como real e como possÃvel, como desvelado e velado, como ordinário e extraordinário, onde a ambiguidade se faz o uno de toda diversidade. A palavra cantada sendo sucessão de sons se faz sentido enquanto uno de toda realidade. Por isso, o ritmo é o real se dando, se manifestando em formas no devir contÃnuo da não-forma. Eis porque na pausa não há ritmo, só na fala cantada do silêncio.
- Referências:
- (1) SCHUBACK, Marcia Sá Cavalcante. "As cordas serenas de Ulisses". In: ------. Ensaios de Filosofia. Petrópolis: Vozes, 1999, p.165.
- (2) Idem, p. 164.
8
- Emmanuel Carneiro Leão diz que a filosofia, mais que um conhecimento ou uma ideologia ou uma visão de mundo, é uma experiência de pensamento. "Mas essa experiência de pensamento que nós não sabemos ainda o que é precisamente não é a única experiência grega, nem a única experiência grega de pensamento. Outra experiência de pensamento é o mito, a mÃstica. Outras são os deuses e o extraordinário. Ainda há uma outra, a poesia e a arte. Uma outra experiência de pensamento é a pólis e a politéia, isto é, a organização, a ordem polÃtica da cidadania... uma outra... a primeira experiência grega de pensamento é a vida e a morte, Eros kai Thanatos" (1). Penso que por essa riqueza de experiência de pensamento é que se dá a complexidade da linguagem (mito, lógos, épos), a própria experiência de ser e não-ser.
- Referência:
- (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "A filosofia grega hoje". In: Caderno de Letras, nº 18. Rio de Janeiro: UFRJ, Faculdade de Letras, Departamento de Letras Anglo-Germânicas, 2002, p. 21.
9
- Apontam-se as três construções do real: filosofia, teologia, ciência. Mas elas não estão separadas, pois a ciência fragmenta a construção do homem e do real numa série de disciplinas. E cada uma de acordo com o seu objeto e método, nos propõe um entendimento do mito: antropologia, etnografia (ou etnologia), psicologia, psiquiatria, psicanálise, história. E dentro de cada disciplina ainda há as correntes. Isso numa primeira instância pulveriza o entendimento do mito, afastando-nos do seu vigor manifestativo e construtivo. Por outro lado, afirmando-se o mito um núcleo impenetrável, só ocasiona uma possibilidade de abertura para o sentido do mito no que o mito é: manifestação originária do real. Pensadas não as interpretações, mas este núcleo indecifrável, abre-se para nós a essência do mito, que é, no fundo, a essência da linguagem ou do real como totalidade cósmica. O que seja isto é o que o mito nos leva a pensar. E aqui se dá a diferença entre o mito como conhecimento e o mito como uma experiência de pensamento mÃtica. O mito em seu núcleo duro é sempre uma experiência de pensamento e não a formulação de um conhecimento. Quando se pensa a arte essencialmente se chega à questão do mito como experiência de pensamento, ou seja, à experiência de pensamento do sagrado. É o que Platão, no Ãon, fala sobre a inspiração dos poetas pelas Musas.
10
- No mito deve ser considerado fundamentalmente o rito, porque o rito é o mito vigorando como tempo originário. O mito nos advém no rito, que com o tempo e no tempo se tornaram narrativas poéticas. Mas quando consideramos o rito, constatamos que ele não é um conceito, nem, evidentemente, uma representação. Por isso, o rito se constitui na essência de sua poética mÃtica, pois toda poética já desde sempre vigora no tempo e ser. Não temos só poética quando o mito nos dá a ritualização da própria linguagem, como no mito de Hermes. Todo rito pressupõe uma poética, pois todo rito reúne momentos de música, poesia, dança, pintura, escultura... O rito reúne as linguagens poéticas no mito como linguagem. A poética do mito se dá na consideração da tensão entre mito e rito, enquanto tempo.
11
- "O mito tem a força da verdade, a manifestação do real. O mito como palavra coloca a linguagem como a manifestação do ser. Nesse sentido, a linguagem também é mito. Ela restitui a essência ao ser. É a manifestação pela qual o real eclode em sua essência. Em grego, mýthos originou-se do verbo mytheomai, que significa: desocultar pela palavra. Palavra essa, organizada na forma de discurso sagrado. Tem o sentido de palavra divina, através do canto poético aquecido como uma fonte referente ao sentido do ser e às formas divinas do mundo. Assim, dizemos que o mito aparece como o próprio real. O real a se doar, a eclodir como Linguagem" (1).
- Referência:
- (1) GROETAERS, Elenice. A poética da noite em Vinicius de Moraes. São Paulo: Scortecci, 2007, pp. 58-9.
12
- "Mýthos já diz o manifestar-se do real em sua essência originária, em ser o próprio extraordinário em seu vigor atuante, em sua concreticidade, pois o concreto é a vigência do vigente na pergunta que a questão nos põe. Todo mito é uma pergunta gerada pelas questões. Dialogar com e interpretar os mitos é sempre experienciar como rito a resposta à pergunta que o mito sempre e permanentemente coloca" (1).
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Permanência e atualidade da Poética". In: Revista Tempo Brasileiro, nº 171. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2007, p. 11.
13
- "O mito, em seu vigor imperante, está presente, como não podia deixar de ser, em todos os momentos e acontecimentos do homem, Poesia que é" (1).
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. O acontecer poético - a história literária. Rio de Janeiro: Antares, 1982, p. 39.
14
- "O mito se dá como a instauração originária de mundo em vigor telúrico, como reunião de compreensão em que a plenitude do horizonte se abre à criação encerrando-se na tradição, em que cada corpo é acolhido dentro de um corpo da famÃlia, do grupo, um corpo social e sagrado que por sua vez é recolhido em sua totalidade, em cada um dos corpos de seus membros. Desta feita o mito, dispondo cada coisa em seu lugar, em que não são meras coisas, porquanto referenciadas no sentido, instaura mundo ao modo de uma corporeidade que acolhe corpos ao mesmo tempo que liberta diferentes corporeidades" (1).
- Referência:
- (1) BRAGA, Diego. "A terceira margem do mito: hermenêutica da corporeidade". In: Revista Terceira margem. Revista do Programa de Pós-graduação em Ciência da Literatura da UFRJ. Ano XIV, 22, jan.-jun, 2010, p. 55.
15
- "No longo percurso do ocidente, o mito foi uma das produções poéticas mais denegridas e desprezadas e, talvez, a que mais sofreu preconceitos. Estes vieram da filosofia, da teologia e da ciência. E, na dimensão da linguagem, da retórica funcional e instrumental. É uma carga muito pesada e destruidora. E isso impede que escutemos o mito no que ele é como mito, isto é, o que sempre perdura como mÃtico. O nome-verbo grego mythos, de onde se formou mito, diz o manifestar pela linguagem. Ocorre que do mesmo radical de mythos se formou outro nome-verbo essencial: mistério. O radical de ambos assinala, por isso, uma tensão de desvelamento e velamento. Nesse sentido, todo mito figura (fingit, verbo latino), enquanto lÃngua, “imagens-questões†e “personagens-questõesâ€. Por isso é que a tais personagens-questões se denominou na modernidade personagens ficcionais, algo que em si não existe, que é inventado. Esse modo de julgar acaba escondendo o poder de verdade de tais criações. Se a personagem não existe, é ficcional, as questões que elas colocam, ao contrário, são muito reais e de maneira alguma são invenções ou ficções. Não nos devemos perguntar se tal personagem existe ou existiu historicamente, mas, sim, qual a questão que nela e com ela nos advém, se fez e faz presente? É como questões e como “imagens-questões†que devemos ler e escutar todo mito, especialmente o mito de Cura, que é um mito que nos fala do originário do homem, da sua constituição e humanização, da sua finitude" (1).
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O mito de Cura e o ser humano". In: --------. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 221.
16
- Todo mito é uma narração de perguntas, de colocação de questões. Cabe a nós nos abrirmos para a escuta dessas questões e perguntas. Dar-lhe formas narrativas é transformá-las em obras de arte.
17
- O ser humano se desdobra em diversas faces, mas a razão tende a tudo querer abarcar. No mito isso não acontece e não há a separação dessas faces, que seriam:
- Conhecer
- Pensar ______________ RAZÃO
- Compreender
- Querer
- Desejar ______________ VONTADE
- Questionar
- Imaginar
- Sonhar________________ IMAGINAÇÃO
- Inventar
- Sentir
- Apaixonar-se ____________ AFETIVIDADE / EMOÇÃO
- Sensibilizar
- E em dois métodos:
- 1-Dedutivo-racional
- 2-Indutivo-experimental - observacional - estatÃstico
- Nenhum destes métodos dá conta do vigorar do mito, porque este é um caminhar no cÃrculo poético de manifestação (rito) e velamento (mito). Essas divisões cientÃficas ajudam, mas não dão conta da complexidade do que é o ser humano, porque ele se manifesta no horizonte do que é, ou seja, no pensar-se enquanto se pensa no sentido do Ser.
18
- Seria necessário pensar a referência/relação mito/escrita. Até onde a escrita abole o rito e deixa o mito entregue ao rito da escrita, gerando assim uma "perda" entre o rito do mito e o rito da escrita, que se refletiria na própria relação/referência linguagem/lÃngua/narração. Sugerimos a leitura do ensaio "Teoria literária: representação e ética" (1) para contribuir com a discussão.
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Teoria literária: representação e ética". DisponÃvel em [http://acd.ufrj.br/~travessiapoetic/textos.htm Travessia Poética.
- Ver também:
19
- "Provindo do mistério temporal da realidade, os mitos remetem para fontes inesgotáveis de inconsciência e consciência históricas. São criações da experiência humana com os movimentos de seu próprio princÃpio e os gestos de suas transformações. Pelo mito, a sobrevivência se recolhe à densidade do verbo, em que se concentra toda a autoridade da história, a força criadora da Linguagem. Para o Mito converge a diversidade essencial das experiências do homem com a realidade. Do mito corre hoje o sangue de ontem para um novo amanhã: possibilidades de vida e condições de herança para o advento de uma história sempre já vigente e sempre ainda por vir. Com o mito nos chega “o amor ainda não aprendido, a dor não conhecidaâ€, sabor deste mistério insondável da realidade na vida-morte. Sem o Mito nem a música da história ressoa nas festas nem a dança da capoeira ginga nas celebrações dos projetos" (1).
- Referência:
- (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. Filosofia grega - uma introdução. Teresópolis: Daimon Editora, 2010, p. 43.
20
- "O mito inaugural é, assim, o vigor de todo vigente no espetáculo de sua vigência. Por isso, todo mito se torna um apelo que nos chega e nos atravessa com a força de um princÃpio de transformação" (1). Esse pricÃpio de tranformação é o que podemos denominar, segundo a linguagem em seu vigorar, verbal.
- (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "O esquecimento da memória". In: Revista Tempo Brasileiro, Rio de Janeiro, 153, abr.-jun., 2003, p. 145.
21
- A palavra mythos vem do verbo grego mytheomai e diz o advir da realidade à palavra, à voz. Do mesmo radical deste verbo se formou o verbo grego myein, que diz, silenciar. Temos em português a palavra mudo, o que não fala, originada desse radical. Eclodir na palavra quer dizer advir à linguagem. Mas devemos notar que o radical desses dois verbos se dá numa dobra originária: voz e mudez provêm do mesmo fundo: o silêncio. Portanto, os mitos nada mais são do que a eclosão da realidade nas múltiplas tonalidades e visualizações da linguagem. A ligação aqui das obras poéticas com os mitos é evidente. A questão das Musas está ligada à questão da linguagem.
22
- O mito não termina porque não começa. Está sempre principiando e na espera de desvelo dos que o ritualizem, dos que leiam, ouçam e vejam as obras de arte enquanto operar da verdade que as faz obras da verdade da realidade. O mito se consuma porque no ritualizar só se ritualiza porque está sempre principiando, isto é, principia o principiar do princÃpio, ou seja, é o verbo em seu vigor originário. Principiar é sempre poietizar na medida em que todo poietizar é sempre principiar e não e jamais começar, porque não é e jamais poderá ser reduzido ao tempo cronológico da metafÃsica funcional, estrutural e sistêmica, enfim, causal e funcional.
23
- "Cada conjunto de mitos em todas as culturas já são modos diferentes de se defrontarem com as mesmas questões. Em nenhuma cultura mito quer ser explicação de algo. A redução dos mitos a explicações já é uma visão fundamentada na metafÃsica do fundamento, da causalidade. O mito manifesta a questão e estabelece a referência de ser e essência do ser humano. Todo mito é uma referência onde se manifesta a questão. Todo rito é uma narração não de uma história de vida ou vidas, mas da manifestação da questão. A questão é prévia a todo mito e rito. Porém, ela nunca é atemporal, nem a-espacial e nem a-histórica. Onde houver acontecer de tempo e espaço aà se fará presente sempre a história. Os mitos já fazem presente aquilo que vigora em toda a realidade e está para além de toda resposta. As respostas variam, isso é fundamental perceber, mas a questão dá origem a todas e nenhuma resposta a extingue" (1).
- Referência bibliográfica:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O próprio como possibilidades". In: ---. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 128.
24
- Lei é destino. Tudo, absolutamente tudo, ou seja, o universo e os seres humanos, até hoje, são regido por leis, que já trazem em si o seu poder de vigência. Porém, as leis, dependendo do que regem, têm origem e instâncias bem diferentes. Daà a diferença de seu poder e modo de vigorar. E tudo, absolutamente tudo, está submetido a tais leis. Em si, todo mito é a manifestação de diferentes leis da realidade. Os mitos são a sua memória operando concretamente nos ritos. Evidentemente que se coloca então para o ser humano a questão da essência da liberdade, se tudo é regido por leis que não dependem dele. Mas não se pode confundir tal essência da liberdade com a liberdade concebida como decorrente da vontade humana. Como fica tal vontade diante do destino e suas leis? O mito que tematiza todas estas questões é, sem dúvida, o mito de Édipo.
25
- "O mito que se apoderou de São Paulo fez dele algo muito maior que um mero artesão.
- Um mito assim, no entanto, consiste de sÃmbolos que não foram conscientemente inventados. Aconteceram. Não foi o homem Jesus que criou o mito do homem-deus: este já existia muitos séculos antes do seu nascimento. E ele mesmo foi dominado por esta ideia simbólica que, segundo São Marcos, o elevou para muito além da obscura vida de um carpinteiro de Nazaré" (1).
- Referência:
- (1) JUNG, Carl G. "A alma do homem". In: JUNG, Carl G e Outros. O homem e seus sÃmbolos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, Tradução Maria Lúcia Pinho, s/d, p. 89.
26
- "O mito é julgado e descartado a partir do logos, reduzido à razão. E o mito sempre falou do ser humano como pertencente a um genos (de onde se forma a palavra moderna genética). Indicava uma famÃlia, um gênero (formada também de genos), uma etnia. Como famÃlia tinha algo em comum, o genos, mas cada um dentro desse genos recebia um quinhão, a sua “cota†no genos da famÃlia. O nome para esse quinhão foi e é: Moira. A tradução mais tradicional não é quinhão, mas destino" (1).
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Poético-ecologia". In: Manuel Antônio de Castro, (org.). Arte: corpo, mundo e terra. Rio de Janeiro: 7Letras, 2009, p. 26.
27
- "O mito não reproduz nada nem é sÃmbolo de nada. É uma narração onde aparecem personagens-questões e imagens-questões. O importante não são os personagens, e, sim, as questões que o mito concretamente nos quer fazer pensar" (1).
- Referência bibliográfica:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O mito de Midas da morte ou do ser feliz". In: -------. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 189.
28
- "Todo o mito (toda travessia humana) gira em torno da fala e da escuta" (1). Todo mito é uma experienciação poética da travessia humana, pois todo mito se tece e entretece em torno da alguma questão ou algumas questões. É nestas que todo ser humano realiza a sua travessia.
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ulisses e a Escuta do Canto das Sereiasâ€. In: -----. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 157.
29
- "A pretensa superação do mito pela historiografia não passou despercebida a um pensador do porte de Aristóteles. SensÃvel à força originária do mito, em outras palavras, à Poesia, declara (1):
- "Com efeito, o historiador e o poeta não se diferenciam por dizerem as
- coisas em verso ou em prosa (pois seria possÃvel versificar as obras
- de Heródoto, e não seriam menos história em verso que em prosa);
- a diferença está em que um diz o que sucedeu, e o outro, o que poderia suceder.
- Por isso também a poesia é mais filosófica e elevada que a história; pois
- a poesia diz melhor o geral, e a história, o particular" (2).
- Referências:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O fenômeno histórico". In: ----. O acontecer poético - a história literária. Rio de Janeiro: Antares, 1982, p. 39.
- (2) ARISTÓTELES. Poética. Ed. trilÃngue por Valentin Garcia Yebra. Madrid: Gredos, 1974, p. 157.
30
- "Mythos se formou do verbo mytheomai, que significa: desocultar pela palavra. “... mythos tem o sentido de palavra divina que se apresenta em forma de palavra humana e que por assim apresentar revela o canto como fonte de conhecimentos relativos ao sentido do ser e à s formas divinas do mundo... mythos significa as palavras das ‘Musas OlÃmpicas, filhas de Zeus egÃfero’ †(1). "O mito aparece como o próprio real se doando como Linguagem na palavra" (2).
- Referências:
- (1) TORRANO, Jaa. O sentido de Zeus - o mito do mundo e o modo mÃtico de ser no mundo. S. Paulo, Iluminuras, 1996, p. 26.
- (2) CASTRO. Manuel Antônio de. Poética e poiesis: a questão da interpretação. Rio de Janeiro: Faculdade de Letras da UFRJ. Série Conferências, v. 5, 2000, p. 9.
31
- "Portanto, um mito não visa passar ou explicar fatos, ou ensinar padrões de comportamento. Não é esse o sentido do mito. O mito funciona e se apresenta como a força instauradora de uma ordem" (1).
- Referência:
- (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Hermenêutica do mito". In: Cadernos de Letras, 11. Faculdade de Letras da UFRJ. Depto. de Letras Anglo-Germânicas, 1995, p. 19.
32
- "Para a escrita, os mitos são narrativas de fatos da natureza, estórias de divindades ou de personagens. O mito como questão foi esquecido. Sem questão o mito não é mito. Não é sem sentido que a escrita, o verbo, tanto no judaÃsmo, quanto no islamismo passou a ser identificado com o próprio Deus. O sagrado torna-se suporte, fundamento, escrita, escritura. Num e noutro caso fala-se sempre das sagradas escrituras. Onde há muito mais suporte escrito do que sagrado, pois eles se dispersam nas versões das traduções e das interpretações. Toda tradução já é uma interpretação. Esses fatos têm também um lugar importante na questão essencial do próprio e dos atributos. A escrita, ao representar, entifica" (1).
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O próprio como possibilidades". In:------. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 133.
33
- "Para o mito ao sagrado correspondia toda a realidade. Esta não era vista como a criação dele, porque não havia a ideia de criação e criador. Esta ideia tornou-se dominante posteriormente. O sagrado como tal, em meio aos múltiplos mitos, jamais foi identificado com alguma figura ou causa. Era uma força que se fazia presente e operava em toda a realidade" (1).
- Referência:
- (1) www.travessiapoetica.blogspot.com>2010/10/as-musas-e-essencia-da-criacao-html
34
- Referência:
- (1) PESSOA, Fernando. Obra poética. Rio de Janeiro: Aguilar, 1965, p. 72.
35
- "O mito tem sido muito silenciado na cultura ocidental. Com a expansão planetária desta, os mitos de outros povos acabaram sendo apreendidos e lidos a partir desse silenciamento. Este consiste em um jogo muito sutil e violento: não deixá-lo se manifestar e falar o tempo todo por ele e sobre ele. Por tal violência deu-se a fuga dos deuses e a perda do sagrado" (1).
- Referência:
- (1) : CASTRO, Manuel Antônio de. “O mito de Midas da morte ou do ser felizâ€. In: ------. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 187.
36
- "Porém, se os mitos foram expulsos de nosso horizonte, eles continuam presentes e fortes, porque eles não são invenções ficcionais nem irreais. Também não são explicações causais para os fenômenos naturais ou psÃquicos, como uma mitologia de base cientÃfica nos quer fazer acreditar. Nossas mentes e lÃnguas, poluÃdas por saberes metafÃsicos, retóricos e cientÃficos, sentem uma real dificuldade de se abrir para o saber dos mitos. Eles são a dimensão mais profunda do que em nós é e teima em ser. Foram-se os mitos, mas continua com sua força onipresente: o mÃtico. Ele se faz presente e irrompe principalmente nas obras poéticas. O vigorar das obras artÃsticas se manifestando é o mÃtico, irrompendo em nossas vidas. O mÃtico é o vigorar das questões" (1).
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ulisses e a Escuta do Canto das Sereiasâ€. In: -----. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo
Brasileiro, 2011, p. 152.
37
- "Ora, a palavra mythos forma-se do verbo grego mytheomai, que significa: abrir, manifestar pela palavra. Por isso, toda poÃÄ“sis é radicalmente mÃtica. A questão fundamental do mito e da poÃÄ“sis, da harmonia Cósmica e, nela, do humano do ser humano, é o destino enquanto Ser e Não-ser" (1).
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ulisses e a Escuta do Canto das Sereiasâ€. In: -----. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 171.
38
- "Como deixar o mito falar? É necessário pôr tudo que conhecemos em suspenso e ter a coragem de ouvir o mito. Deixemos advir o silêncio e escutemos. Façamos uma leitura de escuta do que esse mito diz. Minha escuta, a seguir transcrita, não necessariamente será, e é bom que não seja, a do leitor. Vamos ter algo em comum, mas também algo diferente. Os dois aspectos são importantes porque só então pode haver diálogo, pois só há diálogo onde convivem as diferenças na identidade do acontecer da linguagem, fonte de todo sentido" (1).
- Referência bibliográfica:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O mito de Midas da morte ou do ser feliz". In: -------. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 188.
39
- "O mito não explica nada. Nunca explica nada. Na simplicidade e dinâmica das imagens nos lança no cerne das questões, pedindo, exigindo de nós um salto mortal para o abismo sem fundamento e no abismo em que já desde sempre nos movemos" (1).
- Referência bibliográfica:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O mito de Midas da morte ou do ser feliz". In: -------. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 196.
40
- "O mito, origem da poiesis, só trabalha com imagens, não retóricas, porém, questões: são as imagens-questões. Mnemósine é a memória, a mãe de todas as Musas. Verdade é a deusa Aletheia. Sabedoria é Métis. E assim por diante. São imagens-questões. Quando entendermos a linguagem poética dos mitos como imagens-questões, deixaremos que eles voltem a ter o seu vigor originário. As imagens-questões nos mitos concretizam o real se realizando em realizações incessantes" (1).
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Heidegger e as questões da arteâ€. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). Arte em questão: as questões da arte. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 19.
41
- "Os mitos, como todas as obras poéticas, propõem imagens-questões ou questões-figuras. Édipo é uma imagem-questão. Que questões Édipo figura? Como a questão é sempre ambÃgua, pois vige a partir do “entreâ€, Édipo é, talvez, a imagem-questão mais ambÃgua e radical que o mito-arte criou, porque ele simplesmente é, como questão, o mito do homem, numa expressão ao mesmo tempo subjetiva e objetiva" (1).
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Heidegger e as questões da arteâ€. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). Arte em questão: as questões da arte. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 22.
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- "... passa a estudar metodicamente a obra poética de Hölderlin. Nos passos e passagens da obra deste poeta, que ele considera como o poeta e pensador, incorpora ao pensamento e repensa o “lugar†(mundo) do mito em seu vigor inaugural, na medida em que os mitos são imagens-questões" (1).
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Heidegger e as questões da arteâ€. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). Arte em questão: as questões da arte. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 32.
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- "Que quer dizer a palavra mito? Mythos se origina do verbo mytheomai, que significa simplesmente o eclodir, o se abrir como palavra, linguagem. O mito não é, por isso, um discurso narrativo sobre algo. O mito é a narração, o narrado e a alétheia (verdade) da narração e do narrado. Em grego, portanto, mythos é aletheia. São esses “os princÃpios†de tudo. Só que no mythos não há princÃpio" (1).
- Referência:
- (1) "Mythos e genos". In: ---. www.travessiapoetica.blogspot.com
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- "Temos de acolher a palavra sagrada do mito que se faz estória que, incorporada, já somos nós mesmos, viajantes, intérpretes, em travessia" (1).
- Referência:
- (1) CARVALHO, TaÃs Salbé. "João Guimarães Rosa e a criação poética". In: ---. Viajar e existir em Primeiras Estórias, de João Guimarães Rosa. São Carlos - SP: Editores Pedro & João, 2022, p. 96.
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- "Todo mito é a oferta das questões em imagens-questões e figuras. Os mitos têm muitas versões porque o real se manisfesta de muitas maneiras. Até a FÃsica chegou à conclusão de que só pode ser FÃsica da complexidade. Claro, a physis, ou natureza, é e será sempre questão. A Physis é mais do que a FÃsica" (1).
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Poético-ecologia". In: Arte: corpo, mundo e terra. CASTRO, Manuel Antônio de (org.). Rio de Janeiro: 7Letras, 2009, p. 19.