Realidade
De Dicionrio de Potica e Pensamento
(Diferença entre revisões)
(→7) |
(→23) |
||
(11 edições intermediárias não estão sendo exibidas.) | |||
Linha 57: | Linha 57: | ||
== 7 == | == 7 == | ||
- | : "Deixe-me lhe [[dizer]] uma [[coisa]], Anna Egerman. Na minha idade, quando nos inclinamos para a frente, às vezes, nossa [[mente]] entra em uma outra [[realidade]]. Os [[mortos]] não estão mais [[mortos]]. Os [[vivos]] parecem [[fantasmas]]. O que era óbvio um minuto atrás... tornou-se peculiar e impenetrável. Anna... ouça o [[silêncio]] aqui neste palco. Imagine toda a [[energia]] [[espiritual]], todos os [[sentimentos]] [[reais]] e [[representados]]...riso, fúria, [[paixão]] e [[Deus]] sabe mais o quê...[[Tudo]] isso permanece aqui...fechado...vivendo sua [[vida]] secreta e ininterrupta. Às vezes eu os ouço. Às vezes, não. [[Sempre]]. Às vezes acho que consigo vê-los...[[demônios]], [[anjos]]...[[fantasmas]]...[[pessoas]] comuns...cuidando atentamente de suas [[vidas]]. Fechadas. Reservadas" (1). | + | : "Deixe-me lhe [[dizer]] uma [[coisa]], Anna Egerman. Na minha idade, quando nos inclinamos para a frente, às vezes, nossa [[mente]] entra em uma outra [[realidade]]. Os [[mortos]] não estão mais [[mortos]]. Os [[vivos]] parecem [[fantasmas]]. O que era óbvio um minuto atrás... tornou-se peculiar e impenetrável. Anna... ouça o [[silêncio]] aqui neste palco. Imagine toda a [[energia]] [[espiritual]], todos os [[sentimentos]] [[reais]] e [[representados]]...riso, fúria, [[paixão]] e [[Deus]] sabe mais o quê...[[Tudo]] isso permanece aqui...fechado...vivendo sua [[vida]] secreta e ininterrupta. Às vezes [[eu]] os ouço. Às vezes, não. [[Sempre]]. Às vezes acho que consigo vê-los...[[demônios]], [[anjos]]...[[fantasmas]]...[[pessoas]] comuns...cuidando atentamente de suas [[vidas]]. Fechadas. Reservadas" (1). |
Linha 75: | Linha 75: | ||
: Referência: | : Referência: | ||
- | : (1) HEIDEGGER, Martin. "A sentença de Anaximandro". In: ''Os pré-socráticos''. Coleção ''Os pensadores''. São Paulo: Abril Cultural, 1978, p. 34. | + | : (1) HEIDEGGER, Martin. "A sentença de Anaximandro". In: '''Os pré-socráticos'''. Coleção '''Os pensadores'''. São Paulo: Abril Cultural, 1978, p. 34. |
== 9 == | == 9 == | ||
Linha 89: | Linha 89: | ||
: Referência: | : Referência: | ||
- | : (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Logos, mythos, epos". In: | + | : (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Logos, mythos, epos". In: ---. '''Filosofia grega - uma introdução'''. Teresópolis: Daimon Editora, 2010, p. 31. |
== 11 == | == 11 == | ||
: "Tomas: Existe uma [[palavra]] mágica para nós descrentes. | : "Tomas: Existe uma [[palavra]] mágica para nós descrentes. | ||
: "Jenny: O que quer [[dizer]]? | : "Jenny: O que quer [[dizer]]? | ||
- | : "Às vezes eu a sussurro para mim. | + | : "Às vezes [[eu]] a sussurro para mim. |
: "Pode me [[dizer]] qual [[é]]? | : "Pode me [[dizer]] qual [[é]]? | ||
- | : "Eu desejo ardentemente que alguém me toque para [[eu]] me tornar [[real]]. Eu repito sempre: "Permita que eu me torne [[real]]." | + | : "[[Eu]] desejo ardentemente que alguém me toque para [[eu]] me tornar [[real]]. [[Eu]] repito [[sempre]]: "Permita que [[eu]] me torne [[real]]." |
:" Jemmy: O que quer [[dizer]] com "[[real]]"? | :" Jemmy: O que quer [[dizer]] com "[[real]]"? | ||
- | :" Tomas: [[Ouvir]] uma [[voz]] [[humana]] e [[saber]] que ela vem de alguém que sente como [[eu]]. Beijar uma boca e [[saber]] de imediato que é uma boca. Não ter que repetir o momento terrível mais uma vez no qual [[experiências]] anteriores não dizem que era uma boca que beijei. Para mim [[realidade]] é quando [[alegria]] é [[verdadeira]] [[alegria]]. E [[sofrimento]] é [[verdadeiro]] [[sofrimento]]. Eu não sei. O [[real]] não é isso que eu imagino. | + | :" Tomas: [[Ouvir]] uma [[voz]] [[humana]] e [[saber]] que ela vem de alguém que sente como [[eu]]. Beijar uma boca e [[saber]] de imediato que é uma boca. Não ter que repetir o momento terrível mais uma vez no qual [[experiências]] anteriores não dizem que era uma boca que beijei. Para mim [[realidade]] é quando [[alegria]] é [[verdadeira]] [[alegria]]. E [[sofrimento]] é [[verdadeiro]] [[sofrimento]]. Eu não sei. O [[real]] não é isso que [[eu]] imagino. Não existe [[razão]] para a [[realidade]] [[existir]]. Ela não é [[nada]] mais que uma [[esperança]]" (1). |
- | : (1) BERGMAN, Ingmar. Filme ''Face a face''. Falas dos personagens: Jemmy e Tomas. | + | : (1) BERGMAN, Ingmar. Filme '''Face a face'''. Falas dos personagens: Jemmy e Tomas. |
== 12 == | == 12 == | ||
Linha 110: | Linha 110: | ||
== 13 == | == 13 == | ||
- | :"... toda [[experiência]] radical de [[pensamento]] se embrenha pelas raízes da própria [[possibilidade]] de pensar as [[realizações]] do [[real]] no e pelo [[mistério]] da realidade" (1). | + | :"... toda [[experiência]] radical de [[pensamento]] se embrenha pelas raízes da própria [[possibilidade]] de [[pensar]] as [[realizações]] do [[real]] no e pelo [[mistério]] da [[realidade]]" (1). |
: - Referência: | : - Referência: | ||
- | : (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Deus e o homem louco". | + | : (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Deus e o homem louco". Rio de Janeiro: '''Revista Tempo Brasileiro''', 188: 145-153, jan.-mar., 2012, p. 145. |
== 14 == | == 14 == | ||
- | : "Não há fala sem [[linguagem]] como não há [[realidade]] sem ''onta'' ([[sendos]]). Toda fala é uma fala da [[linguagem]] assim como todo ''[[on]]'' é um ''[[on]]'' da ''[[phýsis]]'', [[ser]], [[realidade]]. Disso decorre que a [[linguagem]] implica a [[realidade]] e a [[realidade]] implica a [[linguagem]]. Cada fala e cada ''[[on]]'' já são [[posições]] dentro da [[realidade]] e dentro da [[linguagem]]" (1). | + | : "Não há fala sem [[linguagem]] como não há [[realidade]] sem ''onta'' ([[sendos]]). Toda fala é uma fala da [[linguagem]] assim como todo ''[[on]]'' é um ''[[on]]'' da ''[[phýsis]]'', [[ser]], [[realidade]]. Disso decorre que a [[linguagem]] implica a [[realidade]] e a [[realidade]] implica a [[linguagem]]. Cada [[fala]] e cada ''[[on]]'' já são [[posições]] dentro da [[realidade]] e dentro da [[linguagem]]" (1). |
: Referência bibliográfica: | : Referência bibliográfica: | ||
- | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O próprio como possibilidades". In: | + | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O próprio como possibilidades". In: ---. '''Arte: o humano e o destino'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 129. |
== 15 == | == 15 == | ||
Linha 134: | Linha 134: | ||
== 16 == | == 16 == | ||
- | : "O que não pode ser esquecido é que o [[vocabulário]], ao nos circunscrever num determinado [[mundo]] [[real]], não quer isso dizer que tenhamos já toda a [[realidade]], ou que ela seja toda determinada por esse [[vocabulário]]. A [[realidade]] é bem mais dinâmica e nem todos os [[seres humanos]] são determinados pelo [[vocabulário]]. Há outras [[realizações]] que convivem entre si e em [[relação]] à realidade geral de uma maneira muito dinâmica, múltipla e ambígua, inovadora" (1). | + | : "O que não pode [[ser]] esquecido é que o [[vocabulário]], ao nos circunscrever num determinado [[mundo]] [[real]], não quer isso dizer que tenhamos já toda a [[realidade]], ou que ela seja toda determinada por esse [[vocabulário]]. A [[realidade]] é bem mais dinâmica e nem todos os [[seres humanos]] são determinados pelo [[vocabulário]]. Há outras [[realizações]] que convivem entre si e em [[relação]] à [[realidade]] geral de uma maneira muito dinâmica, múltipla e ambígua, inovadora" (1). |
: Referência: | : Referência: | ||
- | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Obra de arte, vocabulário e mundo". In: | + | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Obra de arte, vocabulário e mundo". In: ---. '''Leitura: questões'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2015, p. 242. |
== 17 == | == 17 == | ||
Linha 150: | Linha 150: | ||
== 19 == | == 19 == | ||
- | : "A [[realidade]] é o [[labirinto]] que exige de nós uma [[caminhada]] de [[sentido]], um [[motivo]] que nos mova em nossa [[existência]]. É para esse [[sentido]] que a [[dança]] nos conduz, se a deixarmos [[operar]] ,se tivermos a [[coragem]] de nos entregarmos a ela em sua [[vigência]]. Na [[dança]] [[poética]] somos tomados pelo que somos, pois [[ser]] é sempre uma tarefa [[poética]], onde quem vigora é o [[princípio]]: o não cessar de estar [[sendo]]" (1). | + | : "A [[realidade]] é o [[labirinto]] que exige de nós uma [[caminhada]] de [[sentido]], um [[motivo]] que nos mova em nossa [[existência]]. É para esse [[sentido]] que a [[dança]] nos conduz, se a deixarmos [[operar]],se tivermos a [[coragem]] de nos entregarmos a ela em sua [[vigência]]. Na [[dança]] [[poética]] somos tomados pelo que somos, pois [[ser]] é [[sempre]] uma tarefa [[poética]], onde quem vigora é o [[princípio]]: o não cessar de estar [[sendo]]" (1). |
: Referência: | : Referência: | ||
- | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Aprender com a dança: fluxos e diálogos poéticos”. In: TAVARES, Renata (org.). ''O que me move, de Pina Bausch'' – e outros textos sobre dança-teatro. São Paulo: LibersArs, 2017, p. 83. | + | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Aprender com a dança: fluxos e diálogos poéticos”. In: TAVARES, Renata (org.). '''O que me move, de Pina Bausch''' – e outros textos sobre dança-teatro. São Paulo: LibersArs, 2017, p. 83. |
- | + | ||
- | + | ||
== 20 == | == 20 == | ||
Linha 165: | Linha 163: | ||
: (1) Referência: | : (1) Referência: | ||
- | : Strindberg. Peça teatral "Sonhos". Passagem citada no filme de Ingmar Bergman ''Fanny e Alexander'', 1982. | + | : Strindberg. Peça teatral "Sonhos". Passagem citada no filme de Ingmar Bergman '''Fanny e Alexander''', 1982. |
- | + | ||
- | + | ||
== 21 == | == 21 == | ||
Linha 178: | Linha 174: | ||
== 22 == | == 22 == | ||
- | : O [[homem]] [[moderno]] criará a partir da [[imaginação]]. Contudo, para isto haverá uma profunda [[transformação]]. E a grande [[metáfora]] para indicar e conduzir esta [[mudança]] será o [[universo]] como um gigantesco relógio. Nesta [[mudança]] o [[Ser]] é substituído pelo [[Tempo]], mas agora um [[tempo]] que pode ser [[conhecido]], [[medido]] e até se podem efetuar [[intervenções]], [[fundamentadas]], claro, desde então, nesse novo [[conhecimento]] que passou a ser denominado [[científico]], porque [[objetivo]]. E desde então só será [[verdadeiro]] o que for [[científico]]. A prática vai levar a [[metáfora]] do relógio/[[tempo]] para todas as esferas da [[realidade]]/[[natureza]]. Temos de ficar atentos às reduções que se vão operando. A mais complexa é aí o abandono da [[preocupação]] [[ontológica]] com ''o que é'' e o foco único ''no como é'', mas não mais relacionado a ''o que é''. Agora ''o como é'' diz respeito a ''o como se conhece''. É este em última [[instância]] que determina [[tudo]], pois [[tudo]] será [[objeto]] do [[conhecimento]] que se torna o [[verdadeiro]] [[sujeito]], o [[verdadeiro]] “[[criador]]”. Um tal conhecimento é exercido pela [[razão]] [[crítica]], que se fundamenta na ''Razão Crítica'' de Kant. | + | : O [[homem]] [[moderno]] criará a partir da [[imaginação]]. Contudo, para isto haverá uma profunda [[transformação]]. E a grande [[metáfora]] para indicar e conduzir esta [[mudança]] será o [[universo]] como um gigantesco relógio. Nesta [[mudança]] o [[Ser]] é substituído pelo [[Tempo]], mas agora um [[tempo]] que pode ser [[conhecido]], [[medido]] e até se podem efetuar [[intervenções]], [[fundamentadas]], claro, desde então, nesse novo [[conhecimento]] que passou a ser denominado [[científico]], porque [[objetivo]]. E desde então só será [[verdadeiro]] o que for [[científico]]. A prática vai levar a [[metáfora]] do relógio/[[tempo]] para todas as esferas da [[realidade]]/[[natureza]]. Temos de ficar atentos às reduções que se vão operando. A mais complexa é aí o abandono da [[preocupação]] [[ontológica]] com ''o que é'' e o foco único ''no como é'', mas não mais relacionado a ''o que é''. Agora ''o como é'' diz respeito a ''o como se conhece''. É este em última [[instância]] que determina [[tudo]], pois [[tudo]] será [[objeto]] do [[conhecimento]] que se torna o [[verdadeiro]] [[sujeito]], o [[verdadeiro]] “[[criador]]”. Um tal conhecimento é exercido pela [[razão]] [[crítica]], que se fundamenta na '''Razão Crítica''' de Kant. |
Linha 192: | Linha 188: | ||
: Referência: | : Referência: | ||
- | : (1) HEIDEGGER, Martin. "A linguagem". In: ----. ''A caminho da Linguagem''. Trad. Marcia Sá Cavalcante Schuback. Petrópolis (RJ): Vozes; Bragança Paulista (SP): Editora Universitária São Francisco, 2003, p. 11. | + | : (1) HEIDEGGER, Martin. "A linguagem". In: ----. '''A caminho da Linguagem'''. Trad. Marcia Sá Cavalcante Schuback. Petrópolis (RJ): Vozes; Bragança Paulista (SP): Editora Universitária São Francisco, 2003, p. 11. |
- | + | ||
- | + | ||
== 24 == | == 24 == |
Edição de 22h03min de 17 de janeiro de 2024
1
- "O que nos diz a palavra realidade e realização? É uma palavra de origem latina, formada de res, cuja tradução comum é coisa, mas no sentido de causa, aquilo que agindo causa algo, faz eclodir numa relação de agente e paciente, onde jamais pode acontecer o amar. Pela tradição metafísica que conduziu à substantivação, todo esse sentido verbal se perdeu e vemos de imediato na palavra realidade o que está em nossas circunstâncias, expulsando-nos do tempo poético e deixando-nos aparentemente livres, porque sem sentido..." (1).
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Amar e ser". In:------. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 318.
2
- Há duas formas correntes e contraditórias de con-ceber a realidade. Pela primeira, ela é o resultado do que nossos sentidos per-cebem. Pela segunda, ela depende de alguma teoria, racional ou criacionista. Tenta-se unir num terceiro módulo estas duas, seja dialeticamente, seja cientificamente. No entanto, a verdade é muito simples: Realidade é o que não cessa de vigorar e se dá a nós como acontecer poético. A realidade nunca depende, como se crê normalmente, de uma concepção. Ela simplesmente vigora acontecendo, sendo, portanto, um incessante poietizar ou popularmente poetar dela e por ela mesma. Além dessas duas, podemos falar numa terceira que é bem mais completa e complexa: como a realidade se dá na obra de arte. É que esta se revela para o ser humano e com o ser humano como mundo, sentido e verdade.
3
- A realidade é unidade de real e ideal, de real e irreal no vir-a-ser das realizações. Como unidade a realidade é um mistério que, portanto, exclui qualquer atributo. E dessa maneira não diz respeito a limites, ou seja, a entes. Não sendo ente nenhum e nem a totalidade dos entes, que podemos denominar apropriadamente real, a realidade é nada de ente, enfim, a realidade é o nada criativo. A realidade funda o real, mas o real não é a realidade, pois a realidade é a possibilidade também de todo vir a ser, seja do que já se realizou em realizações, seja do que ainda não se realizou e é possível, portanto, ideal. Enfim, a realidade, embora origine os entes, não é nada de ente nem a soma de todos os entes. Caso contrário não comportaria também o ideal e até mesmo o irreal, pois este pode perfeitamente conter o que vigora, mas não é ente determinado e já realizado. Para esta questão de irreal é necessário levar em consideração, assim como para todas as distinções aqui feitas, a questão da verdade. Então, irreal pode se referir a algo que não é verdadeiro. Mas jamais podemos esquecer que verdadeiro implica o que se manifesta e o que se oculta, como bem o diz a palavra grega para verdade a-letheia.
4
- Numa visão do senso-comum ou do positivismo endêmico, a realidade é o que está aí e nos cerca. Porém, essa questão é bem mais complexa. Essa complexidade pode ser pensada a partir do fragmento 123 de Heráclito, quando diz: "A natureza ama retrair-se" (1), onde a realidade é a tensão no amar tanto do que se manifesta, se desvela, quanto do que se retrai, se vela. Emmanuel Carneiro Leão, a esse propósito, vai falar de totalidade do real ou natureza e tudo que de alguma maneira se desvela, já a realidade é o que se manifestando se retrai. A realização é o amor que é o agir, pelo qual se dá o manifestar-se e o retrair-se. Em suas palavras:
- "A totalidade do real, o espaço-tempo de todas as coisas, não é apenas o reino aberto das diferenças, onde tudo se distingue de tudo... A totalidade do real é também o reino misterioso da identidade, onde cada coisa não é somente ela mesma, por ser todas as outras, onde os indivíduos não são definíveis, por serem universais, onde tudo é uno: hen panta. No movimento de sua realização, a realidade é tanto o horizonte em expansão da luz de todas as singularidades como a uni-versalidade protetora da noite, onde todos os gatos são pardos" (2).
- O "hen panta" a que Leão se reporta é o núcleo do fragmento 50 de Heráclito. Por este fragmento também podemos pensar a noite como sendo o silêncio falante do lógos.
- Referências:
- (1) HERÁCLITO et alii. Os pensadores originários. Petrópolis: Vozes, 1991.
- (2) LEÃO, Emmanuel Carneiro. Aprendendo a pensar. Petrópolis: Vozes, 2000, p. 84.
5
- Realidade não é só o que se vê ou sente. Realidade é propriamente a vigência do vigente que se dando como ver, sentir, criar e crer permanentemente se retrai e vela. Mesmo do que se dá a ver e sentir, vemos e sentimos muito pouco. Por isso mesmo, a vigência do vigente é muito mais do que o consciente e do que o inconsciente. Realidade como vigência do vigente é o ser e o nada do abismal mistério: amor.
6
- "O sentido da realidade é uma questão de talento. Para a maioria das pessoas falta esse talento... e talvez seja melhor assim..." (1).
- Não só a realidade de cada um é uma questão de dávida da vida, também a dávida do sentido da realidade é um dom, que se recebeu ou não. Cabe a cada um com simplicidade acolher esse dom e não exigir dos outros o que não recebeu, porque o sentido da realidade não é algo que se consiga pelo uso da razão. Alguém pode ser muito erudito e racional e não ter o dom do sentido da realidade. Porque isso é assim é um mistério. Os antigos diziam que esse sentido da realidade é uma questão de destino, assim como ser um Beethoven, um Bach, um Sófocles, um Guimarães Rosa, é uma questão de destino. Friedrich Hölderlin, para assinalar esse destino nele, afirmou num momento de grande lucidez e loucura: "Apolo me feriu". Àquele que foi ferido pelo sentido não cabe deixar de cumprir o destino, que não pode ser confundido com "radicalismo" conceitual e doutrinal. Se então há radicalismo, é o radicalismo das questões. E estas é que nos têm, como o destino. O sentido da realidade é o originário da realidade se manifestando. Sentido da realidade é o saber da realidade. Em Grande sertão: veredas, João Guimarães Rosa também se refere a esta questão do sentido da realidade, que ele denomina, ser-tão, dizendo: "Sendo isto. Ao doido doideiras digo...Vou lhe falar. Lhe falo do sertão. Do que não sei...Ninguém ainda não sabe. Só umas raríssimas pessoas - e só essas poucas veredas, veredazinhas" (2). Por que para a maioria das pessoas falta o sentido da realidade não cabe a nós indagar. Em princípio todos o recebem, mas tornar-se um dom no sentido de um destino específico para algo, isso já é uma questão de talento, como muito bem afirma Bergman, embora como ser humanos todos estejam abertos para essa possibilidade.
- Referências:
- (1) BERGMAN, Ingmar. No filme Sonata de outono.
- (2) ROSA, João Guimarães. Grande sertão: veredas, 6. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1968, p. 79.
7
- "Deixe-me lhe dizer uma coisa, Anna Egerman. Na minha idade, quando nos inclinamos para a frente, às vezes, nossa mente entra em uma outra realidade. Os mortos não estão mais mortos. Os vivos parecem fantasmas. O que era óbvio um minuto atrás... tornou-se peculiar e impenetrável. Anna... ouça o silêncio aqui neste palco. Imagine toda a energia espiritual, todos os sentimentos reais e representados...riso, fúria, paixão e Deus sabe mais o quê...Tudo isso permanece aqui...fechado...vivendo sua vida secreta e ininterrupta. Às vezes eu os ouço. Às vezes, não. Sempre. Às vezes acho que consigo vê-los...demônios, anjos...fantasmas...pessoas comuns...cuidando atentamente de suas vidas. Fechadas. Reservadas" (1).
- Referência:
- (1) BERGMAN, Ingmar. Fala do personagem Henrik Vogler, no filme Depois do ensaio.
8
- "O vidente é aquele que já tem visto a totalidade das coisas que se apresenta na presença: em latim vidit; em alemão er steht in Wissen (ele está a par). Ter visto é a ausência do saber. No ter visto já há sempre outra coisa em jogo que a simples realização de um processo ótico. No ter visto a relação com aquilo que se apresenta já retrocedeu para trás de toda a espécie de percepção sensível e não-sensível. A partir daí, o ter visto está relacionado com a presença que se clarifica.
- O ver não se determina a partir do olho, mas a partir da clareira do ser. A in-sistência nela constitui a articulação de todos os sentidos humanos. A essência do ver enquanto ter visto é o saber. Este contém a visão. Ele permanece na lembrança da presença. O saber é a lembrança do ser. É por isso que Mnemosýne é a mãe das musas. Saber não é a ciência no sentido moderno. Saber é salvaguarda pensante da guarda do ser" (1).
- Na medida em que todo ver pressupõe o já ter visto de alguma maneira é que dá origem ao vidente e à evidência. Esta não precisa de mediação, por ela a realidade se mostra no que ela é e em-si. Por isso, dizemos frequentemente: isso é evidente, ou seja, não precisa de uma explicação, de uma mediação. Em sua essência, todo ser humano é um vidente, embora poucos consigam quebrar o hábito do ver banal e cotidiano. Todo artista, especialmente o poeta e pintor, se deixa tomar em seu ver e dizer pela evidência. Na dança, o meio de manifestar o evidente é o gesto. Todo gesto na dança manifesta a realidade acontecendo, dando-se a ver.
- Referência:
- (1) HEIDEGGER, Martin. "A sentença de Anaximandro". In: Os pré-socráticos. Coleção Os pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1978, p. 34.
9
- A Realidade é mistério em contínua realização, produzindo os reais (on, onta, em grego) como seu modo de se desvelar. Daí a variedade de reais ou mundos, enquanto conjunto de coisas ou entes com sentido de totalidades parciais. Real diz o que é, o próprio da Realidade, como o poético é o próprio da Poética e o humano é o próprio da Humanidade. À realidade, à Poética, à Humanidade não temos acesso, porque nenhuma língua pode dizê-las, embora toda língua seja língua de Linguagem como todo humano é humano da Humanidade e todo real é real da Realidade. Nesta tensão constante e dialética acontecem as realizações.
10
- "A realidade se dá na medida e enquanto se retrai nas realizações" (1).
- Referência:
- (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Logos, mythos, epos". In: ---. Filosofia grega - uma introdução. Teresópolis: Daimon Editora, 2010, p. 31.
11
- "Tomas: Existe uma palavra mágica para nós descrentes.
- "Jenny: O que quer dizer?
- "Às vezes eu a sussurro para mim.
- "Pode me dizer qual é?
- "Eu desejo ardentemente que alguém me toque para eu me tornar real. Eu repito sempre: "Permita que eu me torne real."
- " Jemmy: O que quer dizer com "real"?
- " Tomas: Ouvir uma voz humana e saber que ela vem de alguém que sente como eu. Beijar uma boca e saber de imediato que é uma boca. Não ter que repetir o momento terrível mais uma vez no qual experiências anteriores não dizem que era uma boca que beijei. Para mim realidade é quando alegria é verdadeira alegria. E sofrimento é verdadeiro sofrimento. Eu não sei. O real não é isso que eu imagino. Não existe razão para a realidade existir. Ela não é nada mais que uma esperança" (1).
- (1) BERGMAN, Ingmar. Filme Face a face. Falas dos personagens: Jemmy e Tomas.
12
- Quem diz sentido o faz já no horizonte do vigorar da realidade em linguagem, sentido, verdade e mundo. Realidade é acontecer nas realizações do real. Não há realização do real sem abertura de verdade e mundo, pois todo acontecer da realidade manifesta e vela.
13
- "... toda experiência radical de pensamento se embrenha pelas raízes da própria possibilidade de pensar as realizações do real no e pelo mistério da realidade" (1).
- - Referência:
- (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Deus e o homem louco". Rio de Janeiro: Revista Tempo Brasileiro, 188: 145-153, jan.-mar., 2012, p. 145.
14
- "Não há fala sem linguagem como não há realidade sem onta (sendos). Toda fala é uma fala da linguagem assim como todo on é um on da phýsis, ser, realidade. Disso decorre que a linguagem implica a realidade e a realidade implica a linguagem. Cada fala e cada on já são posições dentro da realidade e dentro da linguagem" (1).
- Referência bibliográfica:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O próprio como possibilidades". In: ---. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 129.
15
- "Em 1950, o matemático americano Norbert Wiener publicava o livro The human use of human beings – cybernetics and society, em que propunha o campo da cibernética como o conhecimento em torno de sistemas de controle, comunicação e transmissão de informações. Tal conhecimento poderia automatizar muitos aspectos da vida humana, tornando-a mais livre e menos dependente do trabalho manual" (1).
- Referência:
- (1) LIRA, André. "O ciborgue frente ao real". In: Revista Tempo Brasileiro: globalização, pensamento e arte, 201/202, abr.-set.,2015, p. 78.
16
- "O que não pode ser esquecido é que o vocabulário, ao nos circunscrever num determinado mundo real, não quer isso dizer que tenhamos já toda a realidade, ou que ela seja toda determinada por esse vocabulário. A realidade é bem mais dinâmica e nem todos os seres humanos são determinados pelo vocabulário. Há outras realizações que convivem entre si e em relação à realidade geral de uma maneira muito dinâmica, múltipla e ambígua, inovadora" (1).
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Obra de arte, vocabulário e mundo". In: ---. Leitura: questões. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2015, p. 242.
17
- "Entenda-se por realidade não apenas o âmbito do já feito e realizado, o real. Realidade é desde sempre mistério. Em geral, pensamos falar de realidade ou real quando, na verdade, falamos das suas diferentes manifestações históricas, que podemos adequadamente denominar: mundos (1).
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "A história do sentido das artes e as épocas". In: ---------. Leitura: questões. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2015, p. 287.
19
- "A realidade é o labirinto que exige de nós uma caminhada de sentido, um motivo que nos mova em nossa existência. É para esse sentido que a dança nos conduz, se a deixarmos operar,se tivermos a coragem de nos entregarmos a ela em sua vigência. Na dança poética somos tomados pelo que somos, pois ser é sempre uma tarefa poética, onde quem vigora é o princípio: o não cessar de estar sendo" (1).
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Aprender com a dança: fluxos e diálogos poéticos”. In: TAVARES, Renata (org.). O que me move, de Pina Bausch – e outros textos sobre dança-teatro. São Paulo: LibersArs, 2017, p. 83.
20
- "Mentira e realidade são uma coisa só. Tudo pode acontecer. Tudo é sonho e verdade. Tempo e espaço não existem. Sobre a frágil base da realidade, a imaginação tece sua teia e desenha novas formas, novos destinos" (1).
- (1) Referência:
- Strindberg. Peça teatral "Sonhos". Passagem citada no filme de Ingmar Bergman Fanny e Alexander, 1982.
21
- "Seu método de reflexão filosófica é exclusivamente o método dialético triádico: tese, antítese e síntese, ou melhor, segundo a terminologia hegeliana: afirmação (Tese), negação (Antítese) e negação da negação e afirmação da afirmação (Síntese). Por este método Hegel pretende mostrar como se classificam racionalmente e como se encadeiam racionalmente, e com necessidade, todos os aspectos mais importantes da realidade, a partir dos mais abstratos como: o ser em geral, o vir-a-ser, a qualidade, a quantidade etc., até os mais concretos como os diversos tipos de civilizações e de filosofias. Estes vários aspectos da realidade são as tais “essências” que, segundo Hegel, estão logicamente e realmente tão encadeadas que a existência de uma implica necessariamente a existência de todas as demais. Todo o “sistema” da realidade é absolutamente necessário e absolutamente lógico" (1).
- Referência:
- HUMMES ofm, Cardeal Dom Cláudio. História da Filosofia. Curso dado em 1963, em Daltro Filho, hoje cidade de Imigrantes, RS. Anotações distribuídas em sala de aula.
22
- O homem moderno criará a partir da imaginação. Contudo, para isto haverá uma profunda transformação. E a grande metáfora para indicar e conduzir esta mudança será o universo como um gigantesco relógio. Nesta mudança o Ser é substituído pelo Tempo, mas agora um tempo que pode ser conhecido, medido e até se podem efetuar intervenções, fundamentadas, claro, desde então, nesse novo conhecimento que passou a ser denominado científico, porque objetivo. E desde então só será verdadeiro o que for científico. A prática vai levar a metáfora do relógio/tempo para todas as esferas da realidade/natureza. Temos de ficar atentos às reduções que se vão operando. A mais complexa é aí o abandono da preocupação ontológica com o que é e o foco único no como é, mas não mais relacionado a o que é. Agora o como é diz respeito a o como se conhece. É este em última instância que determina tudo, pois tudo será objeto do conhecimento que se torna o verdadeiro sujeito, o verdadeiro “criador”. Um tal conhecimento é exercido pela razão crítica, que se fundamenta na Razão Crítica de Kant.
23
- "A linguagem fala. O que acontece com essa fala? Onde encontramos a fala da linguagem? Sobremaneira no que se diz. No dito, a fala se consuma, mas não acaba. No dito, a fala se resguarda. No dito, a fala recolhe e reúne tanto os modos em que ela perdura como o que pela fala perdura - seu perdurar, seu vigorar, sua essência. Contudo, na maior parte das vezes e com frequência, o dito nos vem ao encontro como uma fala que passou" (1).
- Não podemos esquecer que o vigorar da linguagem é o sentido e a verdade que orientam nossas ações, nosso, enfim, agir. Daí o seu perdurar. E é nesse perdurar que o tempo é e acontece em seu desdobrar-se em épocas. A cada desdobramento, a cada manifestação do vigorar do sentido e da verdade corresponde mundo, de modo que o perdurar evidencia o vigorar do sentido, da verdade e do mundo que se manifesta e é horizonte de nosso viver, de nosso realizar-se. Mundo e sentido e verdade são para nós a realidade: vigorar da linguagem.
- Referência:
- (1) HEIDEGGER, Martin. "A linguagem". In: ----. A caminho da Linguagem. Trad. Marcia Sá Cavalcante Schuback. Petrópolis (RJ): Vozes; Bragança Paulista (SP): Editora Universitária São Francisco, 2003, p. 11.
24
- "O inanimado tem daimon, isto é, tem uma dinâmica que nunca se deixa controlar totalmente. Não quer dizer que a técnica e a ciência não devam controlar o homem, mas devam controlar o mineral, o vegetal, o animal. Não. A técnica e a ciência não podem controlar nenhuma realização e nenhuma realidade. E é essa inacessibilidade ao controle de qualquer realidade que, no homem, se chama daimon, mas Aristóteles diz que se chama genos timeotaton: o gênero mais elevado, isto é, o modo de ser a estrutura mais elevada do real" (1).
- Referência:
- (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "O corpo, a terra e o pensamento". In: Arte: corpo, mundo e terra. CASTRO, Manuel Antônio de (org.). Rio de Janeiro: 7Letras, 2009, p. 71.
25
- A linguagem é um enigma porque a realidade é um enigma. A angústia social com os excluídos e com a sobrevivência tende a encobrir que a própria sobrevivência não se deve colocar como o objetivo que está para além da própria realidade, nem fazer desta um simples meio para esse objetivo. É preciso pensar tanto a sobrevivência como a convivência, no âmbito maior da realidade/linguagem. Mas jamais devemos deixar de fazer tudo para que todos os seres humanos tenham assegurada a sobrevivência. "Pois será mesmo possível transformar a realidade em meio para um fim?... Ao pretender decidir como deve ser a realidade, a necessidade de sobrevivência já bitola de antemão todo esforço, na vã ilusão de impedir que a realidade se mostre e revele como é em si mesma. É que um objetivo não nos descobre, antes nos encobre, a necessidade essencial: abrir-se e expor-se à originalidade do real assim como é em sua originalidade, e não assim como aparece no que agora julgamos necessitar!" (1).
- Referência:
- (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Heidegger e a modernidade: a correlação de sujeito e objeto". -----. In: Aprendendo a pensar II. Petrópolis: Vozes, 1992, p. 167.
26
- A realidade e o ser humano são muito, mas muito mais do que finalidades funcionais dentro de sistemas de relações, sejam elas quais forem. É que a linguagem, fundamentalmente, não é funcional nem relacional. A linguagem é a unidade do incessante eclodir da realidade em sua verdade e sentido.
27
- "A palavra realização nos engana porque vamos lê-la no plano dos entes, quando ela só pode ser o que é porque é o vigorar do ser. Vejamos. Realização é todo crescer, é todo agir, é todo levar à manifestação, à transformação, ao aparecimento de algo que ainda não é. Há realização incessante e não apenas quando se vê o resultado de uma ação humana ou da natureza. Toda a realidade é contínua e permanente realização, musicalidade, onde não há apenas aparecimento, e, sim, um vigorar no sentido do ser. Realização é um contínuo e incessante agir, crescer, acontecer do sentido. Tudo está em permanente mutação, eclosão, como nos diz o verbo grego légein: pôr, depor, compor, dispor, propor. Acontece que nesse por, a realidade se dá enquanto seu sentido pelo vigorar na linguagem" (1).
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Amar e ser". In:------. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 317.
28
- "A unidade é o ponto inicial de qualquer desencadear da realidade. Toda realidade é unidade de identidade e diferença. Na medida em que toda unidade é a vigência do mais simples e do mais complexo, toda unidade é sem dobras, e ao mesmo tempo a exigência de dobramento" (1).
- Referência:
- (1) JARDIM, Antonio. Música: vigência do pensar poético. Rio de Janeiro: 7letras, 2005, p. 53.
- Ver também:
29
- "Também melhor se entende a ficcionalidade se atentarmos para o terceiro significado do verbo latino fingere: imaginar. O imaginar é o contraponto do formar. O contraponto indica a presença da tensão do limite e do ilimitado, da diferença e da identidade, da língua e da Linguagem. O formar sem o imaginar origina os formalismos, provocando equívocos sobre o fazer literário. Já o literário se realiza quando o imaginário irrompe em produções. É isto o que caracteriza fundamentalmente a literatura infantil: uma presença marcante e irrefreável do imaginário. Porque a criança é mais sensível ao imaginário. Nela, o sonho é realidade e a realidade é sonho. Nela, o imaginário é realidade e a realidade é imaginário. Ainda não sofreu o processo de formação que a deforma para o real-imaginário e a deseduca para a humanização. Pelo imaginar, o homem consuma a sua humanização, na medida em que manifesta o sentido do que ele é. Isso se chama libertação. Na realidade ficcional-literária o imaginar é o real vigorando" (1).
- Referência:
- CASTRO, Manuel Antônio de. "Ficção e literatura infantil". In: ------------. Tempos de Metamorfose. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1994, p. 134.
30
- "Hoje, a realidade é concebida de maneiras diferentes: pelo sistema científico, pelos sistemas religiosos e pelo tradicional senso comum. Apesar desses diferentes sistemas de realidade há também a presença incontrolável e gratuita do imaginário, do extra-ordinário e da possibilidade do tempo poético em cada um: é quando a arte atua" (1).
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ulisses e a Escuta do Canto das Sereias”. In: -----. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 150.
31
- "Sileno é conhecido por ser o detentor da sabedoria. Não se trata de qualquer sábio e, certamente, está longe da sabedoria que os filósofos profissionais procuram, porque a sabedoria tem muitos caminhos. A riqueza cultural grega está na possibilidade dos diferentes caminhos que ela empreende em busca desse saber radical, que é a questão do mito: a procura radical pela felicidade, girando em torno da experienciação da realidade como Eros e Thánatos, que é a experienciação de todas as experienciações, porque implica nossos limites ilimitados" (1).
- Referência bibliográfica:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O mito de Midas da morte ou do ser feliz". In: -------. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 189.
32
- "Toda a realidade continua crítica, agora no sentido de ser criticamente sistematizada, controlada e anestesiada pela estética do consumo. A esta nada escapa. O grande aliado são os recursos técnicos, cada vez mais amplos e potentes. E quem os promove são as universidades e os centros de pesquisa. Tudo hoje é objeto de pesquisa, se teórica, terá sempre em vista algo prático, até porque a pesquisa só produz saber prático, funcional, jamais o seu saber se transformará numa sabedoria ética, até porque a sabedoria, desde a lição de Platão no diálogo Menon, não pode ser ensinada" (1).
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Leitura e Crítica". In: ---------. Leitura: questões. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2015, p. 131.
33
- "Para mim o ser humano é uma tremenda criação, um pensamento inconcebível. No ser humano existe tudo, do mais elevado até o mais baixo. O homem é a imagem de Deus e Deus existe em tudo. E assim o ser humano foi criado, mas também os demônios, os santos, os profetas, os artistas e os iconoclastas. Tudo existe lado a lado. É como se fossem desenhos gigantes mudando o tempo inteiro. Da mesma maneira devem existir inúmeras realidades. Não apenas a realidade que percebemos com nossas obtusas sensibilidades, mas um tumulto de realidades arqueando-se uma em cima da outra, por dentro e por fora. É só o medo e o puritanismo que nos levam a acreditar em limites. Não existem limites. Nem para pensamentos nem para sentimentos. A ansiedade é que estabelece os limites" (1).
- Referência:
- BERGMAN, Ingmar. Fala da personagem "Eva", em relação à morte do filho de quatro anos, no filme: Sonata de outono.
34
- "Enquanto formos capazes de imaginar realidades alternativas seremos capazes de criar alternativas à realidade" (1).
- Referência:
- (1) AGUALUSA, José Eduardo. "A noite dos reis". Crônica in: O Globo, Segundo Caderno, p. 6, 4-09-2021.
35
- "A energia poética é a essência de todo agir e o sentido de todo fazer e até do não agir e do não fazer, do ser e do não-ser. Enfim, é a realidade de todas as realizações" (1).
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Poético-ecologia". In: Manuel Antônio de Castro (org.). Arte: corpo, mundo e terra. Rio de Janeiro: 7Letras, 2009, p. 17.
36
- "A vida não é real. Vida é fascínio, êxtase, elevação. A realidade tem a respiração curta, anda rente às calçadas" (1).
- Referência:
- (1) MEDEIROS, Martha. "Silêncio em movimento", Crônica. In: Ela, publicação de O Globo, 10-04-2022, p. 10.