Sagrado

De Dicionário de Poética e Pensamento

(Diferença entre revisões)
 
(32 edições intermediárias não estão sendo exibidas.)
Linha 1: Linha 1:
__NOTOC__
__NOTOC__
== 1 ==
== 1 ==
-
: O [[sagrado]] é o [[mistério]] que constitui e possibilita a [[manifestação]] da [[realidade]]. O [[sagrado]] é a [[energia]] que, iluminando, dá vida e [[sentido]] a [[tudo]]. [[Iluminar]] é fazer [[vigorar]] a [[claridade]] e a [[escuridão]]. O [[sagrado]], [[energia]] de [[sentido]] que [[é]] e [[não é]], vigora: [[tempo]], [[memória]], [[linguagem]], [[sentido]], [[ser]]. [[Sagrado]] é a [[energia]] da [[verdade]] e do [[sentido]].  
+
: O [[sagrado]] é o [[mistério]] que constitui e possibilita a [[manifestação]] da [[realidade]]. O [[sagrado]] é a [[energia]] que, iluminando, dá [[vida]] e [[sentido]] a [[tudo]]. [[Iluminar]] é fazer [[vigorar]] a [[claridade]] e a [[escuridão]]. O [[sagrado]], [[energia]] de [[sentido]] que [[é]] e [[não é]], vigora: [[tempo]], [[memória]], [[linguagem]], [[sentido]], [[ser]]. [[Sagrado]] é a [[energia]] da [[verdade]] e do [[sentido]].  
Linha 17: Linha 17:
== 2 ==
== 2 ==
-
: "O que é o [[sagrado]] para [[Hölderlin]]? É a [[palavra]] com que ele nomeia a [[natureza]]. Esta, contudo, não deve ser tomada como a ''[[natura]]'' dos romanos, nem como [[natureza]] no [[sentido]] moderno, pois em ambos os casos é apreendida como conjunto dos [[fenômenos]] ou [[coisas]] pertencentes a um determinado setor do [[real]], ou seja, o [[mundo]] natural. [[Natureza]] para o [[poeta]] possui, antes, a ressonância da palavra-guia dos primeiros [[pensadores]] gregos – ''[[phýsis]]'' –, como o aberto, por onde as coisas brotam e desabrocham, mas também como o [[obscuro]], por onde elas se escondem e repousam" (1).  
+
: "O que é o [[sagrado]] para [[Hölderlin]]? É a [[palavra]] com que ele nomeia a [[natureza]]. Esta, contudo, não deve ser tomada como a ''[[natura]]'' dos romanos, nem como [[natureza]] no [[sentido]] [[moderno]], pois em ambos os casos é apreendida como conjunto dos [[fenômenos]] ou [[coisas]] pertencentes a um determinado setor do [[real]], ou seja, o [[mundo]] natural. [[Natureza]] para o [[poeta]] possui, antes, a ressonância da palavra-guia dos primeiros [[pensadores]] gregos – ''[[phýsis]]'' –, como o aberto, por onde as coisas brotam e desabrocham, mas também como o [[obscuro]], por onde elas se escondem e repousam" (1).  
: "[[Obscuro]]" se emprega aí no [[sentido]] do [[misterioso]] e [[velado]].
: "[[Obscuro]]" se emprega aí no [[sentido]] do [[misterioso]] e [[velado]].
Linha 33: Linha 33:
== 3 ==
== 3 ==
-
: "Quando os índios norte-americanos e certas tribos de esquimós mandam mensagens convidando os outros para um festival [[religião|religioso]], os [[mensageiro|mensageiros]] carregam bastões com penas e estas conferem ao portador a qualidade [[sacrossanta]]" (1).
+
: "Quando os índios norte-americanos e certas tribos de esquimós mandam [[mensagens]] convidando os outros para um festival [[religião|religioso]], os [[mensageiro|mensageiros]] carregam bastões com penas e estas conferem ao portador a qualidade [[sacrossanta]]" (1).
: Referência:
: Referência:
-
: (1) FRANZ, Marie Louise von. '''A interpretação dos contos de fadas'''. Rio de Janeiro: Achiamé, 1981, p. 78 (Cf. Idem, p. 88, quando fala dos motivos religiosos dos tapetes).
+
: (1) FRANZ, Marie Louise von. '''A interpretação dos contos de fadas'''. Rio de Janeiro: Achiamé, 1981, p. 78 (Cf. Idem, p. 88, quando fala dos [[motivos]] [[religiosos]] dos tapetes).
== 4 ==
== 4 ==
Linha 46: Linha 46:
: Referência:
: Referência:
-
: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Metamorfose da narrativa". In: -----. '''Tempos de metamorfose'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1994, p. 71.
+
: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Metamorfose da narrativa". In: ---. '''Tempos de metamorfose'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1994, p. 71.
== 5 ==
== 5 ==
Linha 57: Linha 57:
== 6 ==
== 6 ==
-
: "Todos sabem que do [[mar]] se originou a [[vida]] porque é no [[mar]] que o [[sagrado]] faz [[vigorar]] a sua [[presença]] constante. A [[água]] não nos [[liberta]] de nossos [[limites]] porque representa algo externo a ela, que ela [[simboliza]]. Não. A [[água]] não simboliza. Ela liberta, purificando porque é [[água]] do [[mar]], é [[energia]] irradiante. [[Purificar]] diz [[iluminar]]. O [[sagrado]] é a [[energia]] que dá [[vida]] iluminando. [[Iluminar]] é [[fazer]] [[vigorar]] o [[claro]] e [[escuro]]. O [[sagrado]] [[não é]], vigora: [[tempo]], [[memória]], mar, [[linguagem]], [[sentido]], [[ser]] " (1).
+
: "Todos sabem que do [[mar]] se originou a [[vida]] porque é no [[mar]] que o [[sagrado]] faz [[vigorar]] a sua [[presença]] constante. A [[água]] não nos [[liberta]] de nossos [[limites]] porque representa algo externo a ela, que ela [[simboliza]]. Não. A [[água]] não simboliza. Ela liberta, purificando porque é [[água]] do [[mar]], é [[energia]] irradiante. [[Purificar]] diz [[iluminar]]. O [[sagrado]] é a [[energia]] que dá [[vida]] iluminando. [[Iluminar]] é [[fazer]] [[vigorar]] o [[claro]] e o [[escuro]]. O [[sagrado]] [[não é]], [[vigora]]: [[tempo]], [[memória]], [[mar]], [[linguagem]], [[sentido]], [[ser]] " (1).
: Referência:
: Referência:
-
: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "A gota d'água e o mar". In: ------. '''Arte: o humano e o destino'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 252.
+
: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "A gota d'água e o mar". In: ---. '''Arte: o humano e o destino'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 252.
== 7 ==
== 7 ==
-
: "[[Deuses]] não são [[entidades]], mas as diferentes modalidades manifestativas do [[vigorar]] do [[sagrado]]. [[Deuses]] são forças [[misteriosas]] que constituem a [[realidade]] e o [[ser humano]] em sua [[realidade]]. Por isso, todas as [[culturas]] sempre tiveram ''[[deuses]]''" (1).
+
: "[[Deuses]] não são [[entidades]], mas as diferentes modalidades manifestativas do [[vigorar]] do [[sagrado]]. [[Deuses]] são forças [[misteriosas]] que constituem a [[realidade]] e o [[ser humano]] em sua [[realidade]]. Por isso, todas as [[culturas]] [[sempre]] tiveram ''[[deuses]]''" (1).
: Referência:
: Referência:
-
: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O mito de ''Cura'' e o ser humano". In: -------.  '''Arte: o humano e o destino'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, 222.
+
: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O mito de ''Cura'' e o ser humano". In: ---.  '''Arte: o humano e o destino'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, 222.
== 8 ==
== 8 ==
Linha 91: Linha 91:
== 10 ==
== 10 ==
-
: "O [[Sagrado]], o "intacto", escapa a qualquer [[definição]] conceitual, é mais incapturável que o próprio [[ser]], é uma derrota para a [[lógica]], paradoxal, ao mesmo tempo arquiantigo e sempre novo, próximo e inabordável, familiar e desorientador; é o que permanece em si e o que atravessa [[tudo]]. Na medida em que o [[Sagrado]] que a [[poesia]] celebra situa-se radicalmente fora de toda espécie de [[utilidade]] e de [[relação]] instrumental, o [[Sagrado]] tende a desaparecer nesta nossa [[época]], dominada pela [[técnica]]" (1).
+
: "O [[Sagrado]], o "intacto", escapa a qualquer [[definição]] [[conceitual]], é mais incapturável que o [[próprio]] [[ser]], é uma derrota para a [[lógica]], paradoxal, ao mesmo [[tempo]] arquiantigo e [[sempre]] novo, próximo e inabordável, [[familiar]] e [[desorientador]]; é o que permanece em si e o que atravessa [[tudo]]. Na medida em que o [[Sagrado]] que a [[poesia]] [[celebra]] situa-se [[radicalmente]] fora de toda [[espécie]] de [[utilidade]] e de [[relação]] instrumental, o [[Sagrado]] tende a [[desaparecer]] nesta nossa [[época]], dominada pela [[técnica]]" (1).
Linha 99: Linha 99:
== 11 ==
== 11 ==
-
: O que é o [[sagrado]]? Não podemos confundir o [[sagrado]] com o [[religioso]]. Ele é mais. Ele é um [[mistério]]. Ele é o próprio [[Ser-tão]]. O [[homem]] ocidental experienciou de sete modos diferentes o [[sagrado]]: na [[arte]], no [[mito]], no [[religioso]], na [[poesia]], no [[místico]], no [[pensamento]], na [[metafísica]]. Essas seis facetas do [[sagrado]] percorrem profundamente '''Grande sertão: veredas''', a [[obra-prima]] do [[escritor]] e [[pensador]] João Guimarães [[Rosa]].  
+
: O que é o [[sagrado]]? Não podemos confundir o [[sagrado]] com o [[religioso]]. Ele é mais. Ele é um [[mistério]]. Ele é o próprio [[Ser-tão]]. O [[homem]] [[ocidental]] experienciou de sete modos [[diferentes]] o [[sagrado]]: na [[arte]], no [[mito]], no [[religioso]], na [[poesia]], no [[místico]], no [[pensamento]], na [[metafísica]]. Essas seis facetas do [[sagrado]] percorrem profundamente '''Grande sertão: veredas''', a [[obra-prima]] do [[escritor]] e [[pensador]] João Guimarães [[Rosa]].  
Linha 113: Linha 113:
== 13 ==
== 13 ==
-
: "A [[dessacralização]] que domina hoje é devida a quê? Certamente muitos são os fatores. É no âmago dessa [[questão]] que a [[arte]] como [[questão]] se faz presente. Pode-se falar em [[arte]] sem levar em consideração a [[questão]] do [[sagrado]]? Difícil. Porém, ela se faz presente de um modo muito [[simples]] e especial que se perdeu com o próprio distanciamento do [[sagrado]] acontecido na [[dinâmica]] dessas transformações [[históricas]]. Transformações essas que dizem respeito à própria [[dinâmica]] de o próprio [[sagrado]] se [[destinar]]. Mas ele, por mais que esteja esquecido, nunca se distancia e torna ausente como tal. Pelo contrário, sem sua [[presença]], sem sua [[proximidade]], tudo perderia o [[sentido]] e o próprio [[vigor]] de [[realização]] do [[real]]. E ele é próximo, tão próximo que até para sermos o que somos só podemos ser [[sendo]] essa [[proximidade]]. Porém, em tudo que fazemos temos a tendência, hoje e há muito tempo, de considerá-lo distante e inalcançável, como se ele fosse outro que não o [[vigor]] do que nos é [[próprio]]" (1).
+
: "A [[dessacralização]] que domina hoje é devida a quê? Certamente muitos são os [[fatores]]. É no âmago dessa [[questão]] que a [[arte]] como [[questão]] se faz [[presente]]. Pode-se [[falar]] em [[arte]] sem levar em consideração a [[questão]] do [[sagrado]]? Difícil. Porém, ela se faz [[presente]] de um modo muito [[simples]] e especial que se perdeu com o [[próprio]] [[distanciamento]] do [[sagrado]] acontecido na [[dinâmica]] dessas [[transformações]] [[históricas]]. [[Transformações]] essas que [[dizem]] respeito à [[própria]] [[dinâmica]] de o [[próprio]] [[sagrado]] se [[destinar]]. Mas ele, por mais que esteja esquecido, nunca se distancia e torna ausente como tal. Pelo contrário, sem sua [[presença]], sem sua [[proximidade]], tudo perderia o [[sentido]] e o próprio [[vigor]] de [[realização]] do [[real]]. E ele é próximo, tão próximo que até para sermos o que somos só podemos ser [[sendo]] essa [[proximidade]]. Porém, em tudo que fazemos temos a tendência, hoje e há muito tempo, de considerá-lo distante e inalcançável, como se ele fosse outro que não o [[vigor]] do que nos é [[próprio]]" (1).
Linha 129: Linha 129:
== 15 ==
== 15 ==
-
: "Para e no [[sagrado]] é estranha e inadmissível a distinção de superior e inferior. E é então que ele se distancia cada vez mais, um distanciamento que consiste, em verdade, no seu [[esquecimento]] e perda de [[sentido]]. O [[esquecimento]] do [[ser]], do [[sentido]] do que somos, é o [[esquecimento]] do [[sagrado]]. Que é a [[arte]] hoje senão o testemunho pungente desse [[esquecimento]]? Assim se pensa. Mas não seria a [[verdadeira]] [[arte]] o testemunho vigoroso da [[presença]] constante do [[sagrado]], pois não é a [[essência]] da [[arte]] o [[sagrado]]? Quanta [[obra de arte]] vazia, tentando, inutilmente, preencher esse [[esquecimento]] pelo [[jogo]] fútil e mirabolante das [[formas]] técnicas. Mas ainda serão essas [[obras]] [[obras de arte]]? Não serão meros [[jogos]] formais que fazem a alegria e fortuna dos donos de galerias?" (1).
+
: "Para e no [[sagrado]] é estranha e inadmissível a [[distinção]] de [[superior]] e [[inferior]]. E é então que ele se [[distancia]] cada vez mais, um [[distanciamento]] que consiste, em [[verdade]], no seu [[esquecimento]] e perda de [[sentido]]. O [[esquecimento]] do [[ser]], do [[sentido]] do que somos, é o [[esquecimento]] do [[sagrado]]. Que é a [[arte]] hoje senão o [[testemunho]] pungente desse [[esquecimento]]? Assim se pensa. Mas não seria a [[verdadeira]] [[arte]] o [[testemunho]] [[vigoroso]] da [[presença]] constante do [[sagrado]], pois não é a [[essência]] da [[arte]] o [[sagrado]]? Quanta [[obra de arte]] [[vazia]], tentando, inutilmente, [[preencher]] esse [[esquecimento]] pelo [[jogo]] fútil e mirabolante das [[formas]] [[técnicas]]. Mas ainda serão essas [[obras]] [[obras de arte]]? Não serão meros [[jogos]] [[formais]] que fazem a [[alegria]] e [[fortuna]] dos donos de galerias?" (1).
Linha 155: Linha 155:
== 18 ==
== 18 ==
-
: Hoje as [[ciências]] cognitivas, antigas [[ciências]] do [[espírito]], já se dão conta de que é essencial trazer para a [[questão]] não só a [[vida]] do [[homem]], mas também sua [[vida]] experienciada no cotidiano. Porém, do cotidiano enquanto [[ordinário]] sempre falaram as [[artes]], não para reproduzi-lo, mas para surpreendê-lo e apreendê-lo na [[dimensão]] do [[extraordinário]]. Porque entre um e outro é que se dá o [[vigor]] do [[poético]], o ditar do [[sagrado]] enquanto [[energia]] de [[sentido]] e [[linguagem]] que a [[tudo]] realiza.
+
: Hoje as [[ciências]] cognitivas, antigas [[ciências]] do [[espírito]], já se dão conta de que é [[essencial]] trazer para a [[questão]] não só a [[vida]] do [[homem]], mas também sua [[vida]] experienciada no [[cotidiano]]. Porém, do [[cotidiano]] enquanto [[ordinário]] sempre falaram as [[artes]], não para reproduzi-lo, mas para surpreendê-lo e apreendê-lo na [[dimensão]] do [[extraordinário]]. Porque [[entre]] um e outro é que se dá o [[vigor]] do [[poético]], o ditar do [[sagrado]] enquanto [[energia]] de [[sentido]] e [[linguagem]] que a [[tudo]] realiza.
Linha 169: Linha 169:
== 20 ==
== 20 ==
-
: Não há [[clareira]] sem floresta, porém a floresta aparece como floresta na [[medida]] em que se retira e se deixa [[ver]], [[perceber]], [[manifestar]], isto é, vir à [[luz]], iluminar-se, na [[clareira]]. Eis a [[verdade]] como ''[[aletheia]]'': [[revelação]], [[desvelamento]], [[manifestação]] do [[ser]]. Nisso consiste e acontece a sua [[verdade]]. Toda [[revelação]] é uma [[epifania]], pois esta [[palavra]] diz o [[aparecer]], o [[manifestar-se]] do [[divino]], do [[ser]]. Daí o caráter [[sagrado]] da [[verdade]] em grego, ou seja, [[aletheia]].
+
: Não há [[clareira]] sem [[floresta]], porém a [[floresta]] aparece como [[floresta]] na [[medida]] em que se retira e se deixa [[ver]], [[perceber]], [[manifestar]], isto é, vir à [[luz]], [[iluminar-se]], na [[clareira]]. Eis a [[verdade]] como ''[[aletheia]]'': [[revelação]], [[desvelamento]], [[manifestação]] do [[ser]]. Nisso consiste e [[acontece]] a sua [[verdade]]. Toda [[revelação]] é uma [[epifania]], pois esta [[palavra]] diz o [[aparecer]], o [[manifestar-se]] do [[divino]], do [[ser]]. Daí o caráter [[sagrado]] da [[verdade]] em [[grego]], ou seja, [[aletheia]].
Linha 181: Linha 181:
: Referência:
: Referência:
-
: (1) Ingmar Bergman. No filme ''A ilha de Bergman'', de Marie Nyreröd. Bergman escolhe essa fala de um bispo, tio Jakob, personagem do filme ''Confições privadas'', roteiro de Bergman e dirigido por Liv Ullmann, para dizer, sinteticamente, o que ele pensa a propósito dos temas religiosos de seus filmes.
+
: (1) Ingmar Bergman. No filme '''A ilha de Bergman''', de Marie Nyreröd. Bergman escolhe essa fala de um bispo, tio Jakob, personagem do filme '''Confições privadas''', roteiro de Bergman e dirigido por Liv Ullmann, para dizer, sinteticamente, o que ele pensa a propósito dos temas religiosos de seus filmes.
== 22 ==
== 22 ==
-
: Não há [[clareira]] sem floresta, porém a floresta aparece como floresta na [[medida]] em que se retira e se deixa [[ver]], [[perceber]], [[manifestar]], isto é, vir à [[luz]], iluminar-se, na [[clareira]]. Eis a [[verdade]] como ''[[aletheia]]'': [[revelação]], [[desvelamento]], [[manifestação]] do [[ser]]. Nisso consiste e acontece a sua [[verdade]]. Toda [[revelação]] é uma [[epifania]], pois esta [[palavra]] diz o [[aparecer]], o [[manifestar-se]] do [[divino]], do [[ser]]. Daí o caráter [[sagrado]] da [[verdade]] em grego, ou seja, [[aletheia]].
+
: Não há [[clareira]] sem [[floresta]], porém a [[floresta]] aparece como [[floresta]] na [[medida]] em que se retira e se deixa [[ver]], [[perceber]], [[manifestar]], isto é, vir à [[luz]], [[iluminar-se]], na [[clareira]]. Eis a [[verdade]] como ''[[aletheia]]'': [[revelação]], [[desvelamento]], [[manifestação]] do [[ser]]. Nisso consiste e [[acontece]] a sua [[verdade]]. Toda [[revelação]] é uma [[epifania]], pois esta [[palavra]] diz o [[aparecer]], o [[manifestar-se]] do [[divino]], do [[ser]]. Daí o caráter [[sagrado]] da [[verdade]] em [[grego]], ou seja, [[aletheia]].
Linha 218: Linha 218:
== 26 ==
== 26 ==
: Geralmente emprega-se a [[palavra]] [[numinoso]] quando se quer [[nomear]] algo [[referente]] ao [[sagrado]]. [[Numinoso]] origina-se da [[palavra]] latina: ''Numen, numinis''. Tem diversos [[significados]]. Exemplos: [[ordem]], [[vontade]], permissão, [[vontade divina]], [[onipotência]] [[divina]], [[divindade]], [[estátua]] de uma [[divindade]], [[poder divino]], [[inspiração divina]], [[oráculo]], majestade (1).  
: Geralmente emprega-se a [[palavra]] [[numinoso]] quando se quer [[nomear]] algo [[referente]] ao [[sagrado]]. [[Numinoso]] origina-se da [[palavra]] latina: ''Numen, numinis''. Tem diversos [[significados]]. Exemplos: [[ordem]], [[vontade]], permissão, [[vontade divina]], [[onipotência]] [[divina]], [[divindade]], [[estátua]] de uma [[divindade]], [[poder divino]], [[inspiração divina]], [[oráculo]], majestade (1).  
-
: Num [[ditado]] famoso fica bem [[evidente]] o [[poder]] da [[vontade divina]]: " ''Nihil sine Dei numine geritur'': ''[[Nada]] se faz sem a [[vontade divina]]''. [[Vontade]] implica [[poder]]. Porém, não podemos confundir o [[poder]] e a [[vontade]] das forças [[divinas]] com o [[poder]] e a [[vontade]] da [[razão]] [[humana]], da [[consciência]] [[humana]]. Essa [[diferença]] é [[essencial]] para [[compreender]] todo o [[poder]] do [[Destino]] e a [[impotência]] [[humana]] diante dele. Este jamais significa uma força cega e do [[acaso]]. Acontece que o alcance do [[poder]] da [[vontade humana]] [[fundada]] na [[razão]] é [[impotente]] para alcançar o [[âmbito]] do [[poder]] e da [[vontade]] [[divinos]]. Na [[literatura]], um exemplo [[clássico]] é o [[personagem]] [[Édipo]], da [[tragédia]] de [[Sófocles]]: ''Rei Édipo''. Estas observações são importantes para compreendermos o alcance e [[limites]] da [[psicanálise]], sobretudo a [[freudiana]], que se [[fundamenta]] no [[poder]] da [[razão]] [[humana]] somente. Por isso [[Jung]], mais aberto ao [[mistério]] da [[alma]] [[humana]] ou [[psique]], criará o [[conceito]] de [[arquétipo]]. Diante disso tudo, só podemos afirmar o [[poder]] das [[obras de arte]] e o seu [[mistério]]. Qualquer [[teoria]] [[racional]] que as queira abarcar, classificando-as, se torna limitada e insuficiente. Por isso, é [[essencial]] se [[pensar]] uma [[Poética]], no lugar de uma mera [[Estética]] [[racional]] e [[conceitual]], que se mova somente nas [[questões]] e não nos [[conceitos]] [[racionais]].  
+
: Num [[ditado]] famoso fica bem [[evidente]] o [[poder]] da [[vontade divina]]: "''Nihil sine Dei numine geritur'': ''[[Nada]] se faz sem a [[vontade divina]]''".  
 +
: [[Vontade]] implica [[poder]]. Porém, não podemos confundir o [[poder]] e a [[vontade]] das forças [[divinas]] com o [[poder]] e a [[vontade]] da [[razão]] [[humana]], da [[consciência]] [[humana]]. Essa [[diferença]] é [[essencial]] para [[compreender]] todo o [[poder]] do [[Destino]] e a [[impotência]] [[humana]] diante dele. Este jamais significa uma força cega e do [[acaso]]. Acontece que o alcance do [[poder]] da [[vontade humana]] [[fundada]] na [[razão]] é [[impotente]] para alcançar o [[âmbito]] do [[poder]] e da [[vontade]] [[divinos]]. Na [[literatura]], um exemplo [[clássico]] é o [[personagem]] [[Édipo]], da [[tragédia]] de [[Sófocles]]: ''Rei Édipo''. Estas observações são importantes para compreendermos o alcance e [[limites]] da [[psicanálise]], sobretudo a [[freudiana]], que se [[fundamenta]] no [[poder]] da [[razão]] [[humana]] somente. Por isso [[Jung]], mais aberto ao [[mistério]] da [[alma]] [[humana]] ou [[psique]], criará o [[conceito]] de [[arquétipo]]. Diante disso tudo, só podemos afirmar o [[poder]] das [[obras de arte]] e o seu [[mistério]]. Qualquer [[teoria]] [[racional]] que as queira abarcar, classificando-as, se torna limitada e insuficiente. Por isso, é [[essencial]] se [[pensar]] uma [[Poética]], no lugar de uma mera [[Estética]] [[racional]] e [[conceitual]], que se mova somente nas [[questões]] e não nos [[conceitos]] [[racionais]].  
Linha 228: Linha 229:
== 27 ==
== 27 ==
-
: "O [[Qi]] é o [[vigorar]] da [[vida]] [[omnipresente]] que, no seu fluxo, anima todos os [[seres]] [[vivos]] e permeia o [[Universo]], ligando todas as [[coisas]] como um [[todo]]. Essa [[energia]] é apreendida [[universalmente]] e, [[evidente]], recebe outros [[nomes]]. Por exemplo, os índios Iroqueses americanos chamam-lhe ''Orenda''; na Ãndia, ''Prana''; nos países islâmicos, ''Baraka''; o [[cristianismo]], ''[[Espírito Santo]]'' etc. Sem o fluxo de [[Qi]] não existiria [[vida]] no [[planeta]]" (1).
+
: "O [[Qi]] é o [[vigorar]] da [[vida]] omnipresente que, no seu fluxo, anima todos os [[seres]] [[vivos]] e permeia o [[Universo]], ligando todas as [[coisas]] como um [[todo]]. Essa [[energia]] é apreendida [[universalmente]] e, [[evidente]], recebe outros [[nomes]]. Por exemplo, os índios Iroqueses americanos chamam-lhe ''Orenda''; na Ãndia, ''Prana''; nos países islâmicos, ''Baraka''; o [[cristianismo]], ''[[Espírito Santo]]'' etc. Sem o fluxo de [[Qi]] não existiria [[vida]] no [[planeta]]" (1).
:  Referência:
:  Referência:
-
:  (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Filosofia e o pensamento do corpo". In: ''Desdobramentos do corpo no século XXI''. MONTEIRO, Maria Conceição & GIUCCI, Guilhermo (orgs.). Rio de Janeiro: FAPERJ, Editora Caetés, 2016, p. 22.
+
:  (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Filosofia e o pensamento do corpo". In: '''Desdobramentos do corpo no século XXI'''. MONTEIRO, Maria Conceição & GIUCCI, Guilhermo (orgs.). Rio de Janeiro: FAPERJ, Editora Caetés, 2016, p. 22.
== 28 ==
== 28 ==
Linha 241: Linha 242:
:  Referência:  
:  Referência:  
-
:  (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "A gota d’água e o mar". In: -----. ''Arte: o humano e o destino''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 249.
+
:  (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "A gota d’água e o mar". In: ---. '''Arte: o humano e o destino'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 249.
== 29 ==
== 29 ==
Linha 249: Linha 250:
: Referência:
: Referência:
-
: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ser e estar". In:------. ''Arte: o humano e o destino''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 52.
+
: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ser e estar". In:------. '''Arte: o humano e o destino'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 52.
== 30 ==
== 30 ==
Linha 257: Linha 258:
: Referência:
: Referência:
-
: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ser e estar". In:------. ''Arte: o humano e o destino''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 52.
+
: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ser e estar". In:---. '''Arte: o humano e o destino'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 52.
== 31 ==
== 31 ==
Linha 267: Linha 268:
: (1) HEIDEGGER, Martin. "Qu'est-ce que la metaphysique". In: ''Questions I''. Paris: Gallimard, 1968, p. 83.
: (1) HEIDEGGER, Martin. "Qu'est-ce que la metaphysique". In: ''Questions I''. Paris: Gallimard, 1968, p. 83.
   
   
-
: (2) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ulisses e a Escuta do Canto das Sereiasâ€. In: -----. ''Arte: o humano e o destino''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 155.
+
: (2) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ulisses e a Escuta do Canto das Sereiasâ€. In: ---. '''Arte: o humano e o destino'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 155.
== 32 ==
== 32 ==
Linha 275: Linha 276:
: Referência:
: Referência:
-
:  (1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Heidegger e as questões da arteâ€. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). ''Arte em questão: as questões da arte''. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 13.
+
:  (1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Heidegger e as questões da arteâ€. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). '''Arte em questão: as questões da arte'''. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 13.
== 33 ==
== 33 ==
Linha 283: Linha 284:
: Referência:
: Referência:
-
: (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. ''Aprendendo a pensar I''. Teresópolis: Daimon, 2008, p. 216.
+
: (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. '''Aprendendo a pensar I'''. Teresópolis: Daimon, 2008, p. 216.
== 34 ==
== 34 ==
Linha 291: Linha 292:
: Referência:
: Referência:
-
: (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. ''Aprendendo a pensar I''. Teresópolis: Daimon, 2008, p. 217.
+
: (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. '''Aprendendo a pensar I'''. Teresópolis: Daimon, 2008, p. 217.
== 35 ==
== 35 ==
Linha 299: Linha 300:
: Referência:
: Referência:
-
:  (1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Heidegger e as questões da arteâ€. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). ''Arte em questão: as questões da arte''. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 35.
+
:  (1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Heidegger e as questões da arteâ€. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). '''Arte em questão: as questões da arte'''. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 35.
== 36 ==
== 36 ==
Linha 319: Linha 320:
: (1) HOOD, Juliette. '''O livro celta da vida e da morte'''. Trad. Denise de C. Rocha Delela. São Paulo: Editora Pensamento, 2011, p. 19.
: (1) HOOD, Juliette. '''O livro celta da vida e da morte'''. Trad. Denise de C. Rocha Delela. São Paulo: Editora Pensamento, 2011, p. 19.
 +
 +
== 38 ==
 +
: [[Mistério]] vem do [[verbo]] [[grego]] ''myestai'' e significa: o que se retrai no e como [[silêncio]]. Por isso, o [[sagrado]] é a [[voz]] do [[silêncio]].
 +
 +
 +
: - [[Manuel Antônio de Castro]].
 +
 +
== 39 ==
 +
: Outros [[nomes]] para [[sagrado]]:
 +
 +
: O ''Qi'' – na [[filosofia]] chinesa - é o [[vigorar]] da [[vida]] omnipresente que, no seu fluxo, anima todos os [[seres]] [[vivos]] e permeia o [[Universo]], ligando todas as [[coisas]] como um [[todo]]. Essa [[energia]] é apreendida universalmente e, [[evidente]], recebe outros [[nomes]] em outras povos e [[culturas]]. Por exemplo, os índios Iroqueses americanos chamam-lhe ''Orenda''; na Ãndia, ''Prana''; nos países islâmicos, ''Baraka''; o [[cristianismo]], [[Espírito Santo]] etc.
 +
 +
 +
: - [[Manuel Antônio de Castro]].

Edição atual tal como 22h35min de 12 de março de 2024

1

O sagrado é o mistério que constitui e possibilita a manifestação da realidade. O sagrado é a energia que, iluminando, dá vida e sentido a tudo. Iluminar é fazer vigorar a claridade e a escuridão. O sagrado, energia de sentido que é e não é, vigora: tempo, memória, linguagem, sentido, ser. Sagrado é a energia da verdade e do sentido.


- Manuel Antônio de Castro
Ver também
* Deus
* Religião
* Mito
* Divino

2

"O que é o sagrado para Hölderlin? É a palavra com que ele nomeia a natureza. Esta, contudo, não deve ser tomada como a natura dos romanos, nem como natureza no sentido moderno, pois em ambos os casos é apreendida como conjunto dos fenômenos ou coisas pertencentes a um determinado setor do real, ou seja, o mundo natural. Natureza para o poeta possui, antes, a ressonância da palavra-guia dos primeiros pensadores gregos – phýsis –, como o aberto, por onde as coisas brotam e desabrocham, mas também como o obscuro, por onde elas se escondem e repousam" (1).
"Obscuro" se emprega aí no sentido do misterioso e velado.


Manuel Antônio de Castro
Referência:
(1) MICHELAZZO, José Carlos. Do um como princípio ao dois como unidade. São Paulo: Annablume, 1999, p. 144.
Ver também:
*Festa

3

"Quando os índios norte-americanos e certas tribos de esquimós mandam mensagens convidando os outros para um festival religioso, os mensageiros carregam bastões com penas e estas conferem ao portador a qualidade sacrossanta" (1).


Referência:
(1) FRANZ, Marie Louise von. A interpretação dos contos de fadas. Rio de Janeiro: Achiamé, 1981, p. 78 (Cf. Idem, p. 88, quando fala dos motivos religiosos dos tapetes).

4

"Em que consiste o sagrado? Este, se formos à etimologia, mostrará uma outra realidade diferente daquela apreendida pelo religioso. O sintoma maior desta outra realidade está na não separação, no âmbito do sagrado, entre mal e bem. O sagrado diz do lugar de abertura da realidade, onde tal separação e divisão não existe. O criminoso, por exemplo, que entrasse num templo, passava a fazer parte de um lugar onde não mais poderia ser perseguido nem punido. O âmbito do sagrado não comporta as dicotomias metafísicas" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Metamorfose da narrativa". In: ---. Tempos de metamorfose. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1994, p. 71.

5

"O canto sagrado não é outra coisa que a própria divindade se manifestando na música das palavras" (1).


Referência:
(1) BRAGA, Diego. "A terceira margem do mito: hermenêutica da corporeidade". In: Revista Terceira margem. Revista do Programa de Pós-graduação em Ciência da Literatura da UFRJ. Ano XIV, 22, jan.-jun, 2010, p. 57.

6

"Todos sabem que do mar se originou a vida porque é no mar que o sagrado faz vigorar a sua presença constante. A água não nos liberta de nossos limites porque representa algo externo a ela, que ela simboliza. Não. A água não simboliza. Ela liberta, purificando porque é água do mar, é energia irradiante. Purificar diz iluminar. O sagrado é a energia que dá vida iluminando. Iluminar é fazer vigorar o claro e o escuro. O sagrado não é, vigora: tempo, memória, mar, linguagem, sentido, ser " (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "A gota d'água e o mar". In: ---. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 252.

7

"Deuses não são entidades, mas as diferentes modalidades manifestativas do vigorar do sagrado. Deuses são forças misteriosas que constituem a realidade e o ser humano em sua realidade. Por isso, todas as culturas sempre tiveram deuses" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O mito de Cura e o ser humano". In: ---. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, 222.

8

No poético, as línguas são o rito da Linguagem. O mito narrado não é o mito, mas o rito e a língua da Linguagem. Por isso o poético, toda arte, tem origem mítica. E tanto o mito como a arte radicam no sagrado. Martin Heidegger afirma: "O pensador diz o ser, o poeta nomeia o sagrado" (1) (2).


(1) HEIDEGGER, Martin. "Que é metafísica? - Posfácio (1943)". In: Heidegger - Os Pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1979, p. 51.
(2) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ulisses e a Escuta do canto das Sereias". In: -----. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 155.

9

"Porque na narrativa da Escritura, três dentre eles dependem de um Primus que é sua origem e também, ao mesmo tempo, seu centro. No lugar de estar em primeiro lugar ou de ser a primazia o divino, Heidegger nomeia, portanto, a quaternidade ou uma Uno-quaternidade do qual o centro não é nenhum dos quatro... Mas qual é então o nome de um tal centro? Heidegger o nomeia: das Heilige, que podemos provisoriamente traduzir por o sagrado" (1). O autor está se referindo à quaternidade composta por: Mortais (homens) e Imortais (deuses), Céu e Terra.


- Manuel Antônio de Castro
Referência:
(1) BEAUFRET, Jean. "Heidegger e a teologia". In: Heidegger e a questão de Deus. KEARNEY, Richard e O'LEAREY, Joseph Stephen (org). Paris: Bernard Grasset, 1980, p. 28.

10

"O Sagrado, o "intacto", escapa a qualquer definição conceitual, é mais incapturável que o próprio ser, é uma derrota para a lógica, paradoxal, ao mesmo tempo arquiantigo e sempre novo, próximo e inabordável, familiar e desorientador; é o que permanece em si e o que atravessa tudo. Na medida em que o Sagrado que a poesia celebra situa-se radicalmente fora de toda espécie de utilidade e de relação instrumental, o Sagrado tende a desaparecer nesta nossa época, dominada pela técnica" (1).


Referência:
(1) HAAR, Michel. "A 'elaboração' da verdade". In: -----. A obra de arte. Trad. Maria Helena Kühner. Rio de Janeiro: Difel, 2.000, p. 95.

11

O que é o sagrado? Não podemos confundir o sagrado com o religioso. Ele é mais. Ele é um mistério. Ele é o próprio Ser-tão. O homem ocidental experienciou de sete modos diferentes o sagrado: na arte, no mito, no religioso, na poesia, no místico, no pensamento, na metafísica. Essas seis facetas do sagrado percorrem profundamente Grande sertão: veredas, a obra-prima do escritor e pensador João Guimarães Rosa.


- Manuel Antônio de Castro.

12

"O sagrado não gira apenas nas religiões: talvez, nelas já nem possa girar, uma vez tornado objeto dos sujeitos, fechado em um sistema " (1).


Referência:
(1) FAGUNDES, Igor. "Globalização como poética e incorporação". Revista Tempo Brasileiro - Globalização pensamento e arte. Rio de Janeiro: 201-202, abr-set., 2013, p. 30.

13

"A dessacralização que domina hoje é devida a quê? Certamente muitos são os fatores. É no âmago dessa questão que a arte como questão se faz presente. Pode-se falar em arte sem levar em consideração a questão do sagrado? Difícil. Porém, ela se faz presente de um modo muito simples e especial que se perdeu com o próprio distanciamento do sagrado acontecido na dinâmica dessas transformações históricas. Transformações essas que dizem respeito à própria dinâmica de o próprio sagrado se destinar. Mas ele, por mais que esteja esquecido, nunca se distancia e torna ausente como tal. Pelo contrário, sem sua presença, sem sua proximidade, tudo perderia o sentido e o próprio vigor de realização do real. E ele é próximo, tão próximo que até para sermos o que somos só podemos ser sendo essa proximidade. Porém, em tudo que fazemos temos a tendência, hoje e há muito tempo, de considerá-lo distante e inalcançável, como se ele fosse outro que não o vigor do que nos é próprio" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "A presença constante do sagrado". In: https://travessiapoetica.blogspot.com.br/, postado em 23 de fevereiro de 2017.

14

"Palavra, canto, música, dança e, rodando, rodando, o jovem sem religião, cansado de ciência, se atreve a chamar o desconhecido em cultivo, em culto, em cultura, de: poesia – o milagre do imenso imediatamente em corpo, a saber-se quando ainda não, já não mais. Sem um lugar segundo, na verdade primeiro, que o fundamente abstratamente, se toda localidade é que primeiramente por ele, pelo aberto, imenso, vazio – chamemos: sagrado – se funda como possível pátria" (1).


Referência:
(1) FAGUNDES, Igor. "Globalização como poética e incorporação". Revista Tempo Brasileiro - Globalização pensamento e arte. Rio de Janeiro: 201-202, abr-set., 2013, p. 31.

15

"Para e no sagrado é estranha e inadmissível a distinção de superior e inferior. E é então que ele se distancia cada vez mais, um distanciamento que consiste, em verdade, no seu esquecimento e perda de sentido. O esquecimento do ser, do sentido do que somos, é o esquecimento do sagrado. Que é a arte hoje senão o testemunho pungente desse esquecimento? Assim se pensa. Mas não seria a verdadeira arte o testemunho vigoroso da presença constante do sagrado, pois não é a essência da arte o sagrado? Quanta obra de arte vazia, tentando, inutilmente, preencher esse esquecimento pelo jogo fútil e mirabolante das formas técnicas. Mas ainda serão essas obras obras de arte? Não serão meros jogos formais que fazem a alegria e fortuna dos donos de galerias?" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "A presença constante do sagrado". In: https://travessiapoetica.blogspot.com.br/, postado em 23 de fevereiro de 2017.

16

" ... no Egito, todas as ações das forças que governam e atuam nos céus foram transferidas para a terra... mas deve-se dizer que todo o Cosmos habita no [Egito] como em seu santuário" .
Todas as ações, não importa quão mundanas, de alguma forma correspondiam a um ato cósmico: a aragem, o plantio, a colheita, a fabricação da cerveja, o tamanho de um copo de cerveja, o formato de uma pirâmide, a construção de navios, os combates, os jogos - todas eram vistas como símbolos terrenos das atividades divinas" (1).


Referência:
(1) GADALLA, Moustafa. "O mais religioso". In: ------. Cosmologia egípcia - o universo animado. Trad. Fernanda Rossi. São Paulo: Madras Editora, 2003, p. 21.

17

"No Egito, o que hoje chamamos de religião, era tão amplamente reconhecido que nem mesmo necessitava de um nome. Para eles, não havia diferenças palpáveis entre o sagrado e o mundano. Todo o seu conhecimento, baseado na consciência cósmica, estava implantado em suas práticas diárias, que se tornaram tradições" (1).


Referência:
(1) GADALLA, Moustafa. "O mais religioso". -----. Cosmologia egípcia - o universo animado. Trad. Fernanda Rossi. São Paulo: Madras Editora, 2003, p. 22.

18

Hoje as ciências cognitivas, antigas ciências do espírito, já se dão conta de que é essencial trazer para a questão não só a vida do homem, mas também sua vida experienciada no cotidiano. Porém, do cotidiano enquanto ordinário sempre falaram as artes, não para reproduzi-lo, mas para surpreendê-lo e apreendê-lo na dimensão do extraordinário. Porque entre um e outro é que se dá o vigor do poético, o ditar do sagrado enquanto energia de sentido e linguagem que a tudo realiza.


- Manuel Antônio de Castro.

19

"Dioniso foi educado por Hermes, a palavra-medida do sentido da vida e da morte. Só há sabedoria onde houver medida. Hermes é o mensageiro da medida não é a medida. Esta é o vigorar do sagrado, por isso Hermes é o mensageiro dos deuses, da divindade, isto é, do sagrado" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O mito de Midas da morte ou do ser feliz". In: -----. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 190.

20

Não há clareira sem floresta, porém a floresta aparece como floresta na medida em que se retira e se deixa ver, perceber, manifestar, isto é, vir à luz, iluminar-se, na clareira. Eis a verdade como aletheia: revelação, desvelamento, manifestação do ser. Nisso consiste e acontece a sua verdade. Toda revelação é uma epifania, pois esta palavra diz o aparecer, o manifestar-se do divino, do ser. Daí o caráter sagrado da verdade em grego, ou seja, aletheia.


- Manuel Antônio de Castro.

21

- "Acredita em Deus, tio Jakob? Um Pai do Céu, um Deus do Amor? Um Deus com mãos, um coração e olhar vigilante?"
- "Não use a palavra "Deus". Diga "Santidade". Há santidade em todas as pessoas. Santidade humana. Todo o resto são atributos, disfarce, manifestação e truque. Não se pode decifrar ou capturar a santidade humana. Ao mesmo tempo... é algo que podemos pegar. Algo tangível que dura até a morte. O que acontece depois é escondido de nós. Apenas os poetas, músicos e santos... é que podem descrever aquilo que podemos apenas discernir: o inconcebível. Eles viram, conheceram, compreenderam... não totalmente, mas de modo fragmentado. Para mim é um conforto pensar na santidade humana" (1).


Referência:
(1) Ingmar Bergman. No filme A ilha de Bergman, de Marie Nyreröd. Bergman escolhe essa fala de um bispo, tio Jakob, personagem do filme Confições privadas, roteiro de Bergman e dirigido por Liv Ullmann, para dizer, sinteticamente, o que ele pensa a propósito dos temas religiosos de seus filmes.

22

Não há clareira sem floresta, porém a floresta aparece como floresta na medida em que se retira e se deixa ver, perceber, manifestar, isto é, vir à luz, iluminar-se, na clareira. Eis a verdade como aletheia: revelação, desvelamento, manifestação do ser. Nisso consiste e acontece a sua verdade. Toda revelação é uma epifania, pois esta palavra diz o aparecer, o manifestar-se do divino, do ser. Daí o caráter sagrado da verdade em grego, ou seja, aletheia.


- Manuel Antônio de Castro.

23

"... o sagrado é energia de sentido, sem a qual nada pode-se realizar" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "A presença constante do sagrado". In: https://travessiapoetica.blogspot.com.br/ postado em 23 de fevereiro de 2017.

24

"A ação do entre do interlúdio que destina o homem a ser livre pode e deve ser considerada divina, sagrada, como sagrado é o que não tem origem no homem, mas que a ele foi doado para que cuide: o existir" (1).
Referência:
(1) FERRAZ, Antônio Máximo. "O homem e a interpretação: da escuta do destino à liberdade". In: CASTRO, Manuel Antônio de e Outros (Org.). O educar poético. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2014, p. 105.

25

"O que é o Ser para a experiência grega, mítica, arcaica? O Ser se “manifesta como numinoso e na qual [experiência grega arcaica] o universo não é senão um conjunto não-enumerável de teofanias†(Torrano, 1992: 74) (1). Tudo sendo teofania numinosa é importante entender que tanto “‘faculdades mentais’†de Zeus como os atributos constitutivos da natureza mesma de Zeus [...] são Divindades com esfera de existência e de atribuições própria†(Torrano: 1992, 76). A experiência filosófica de Ser, sobretudo a partir de Platão e Aristóteles, e mais tarde com o platonismo e aristotelismo, empobrece a riqueza do pensamento mítico.
"Na verdade, o pensamento mítico, servindo-se de figuras não-conceituais, de imagens concretas e ideações plásticas, servindo-se de relatos e de fábulas (i.é, disto em que se constituem propriamente os mythoi e os hieroi lógoi, os “mitos†e os “relatos sagradosâ€), coloca em seus próprios termos [...] o problema da relação entre a Alteridade e a Ipseidade. Zeus é ele-Mesmo e o Outro; o Outro é tanto o Outro quanto é o Mesmo [...] A Alteridade coincide com a Ipseidade tanto quanto dela difere: o Outro é o Mesmo (coincide com o Mesmo) tanto quanto é – na referência ao Mesmo – o Outro (difere de si Mesmo) (Torrano: 1992, 77)" (2) "(3).


Referências:
(1) TORRANO, Jaa. O sentido de Zeus. São Paulo: Iluminuras, 1996.
(2) TORRANO, Jaa. O sentido de Zeus. São Paulo: Iluminuras, 1996.

26

Geralmente emprega-se a palavra numinoso quando se quer nomear algo referente ao sagrado. Numinoso origina-se da palavra latina: Numen, numinis. Tem diversos significados. Exemplos: ordem, vontade, permissão, vontade divina, onipotência divina, divindade, estátua de uma divindade, poder divino, inspiração divina, oráculo, majestade (1).
Num ditado famoso fica bem evidente o poder da vontade divina: "Nihil sine Dei numine geritur: Nada se faz sem a vontade divina".
Vontade implica poder. Porém, não podemos confundir o poder e a vontade das forças divinas com o poder e a vontade da razão humana, da consciência humana. Essa diferença é essencial para compreender todo o poder do Destino e a impotência humana diante dele. Este jamais significa uma força cega e do acaso. Acontece que o alcance do poder da vontade humana fundada na razão é impotente para alcançar o âmbito do poder e da vontade divinos. Na literatura, um exemplo clássico é o personagem Édipo, da tragédia de Sófocles: Rei Édipo. Estas observações são importantes para compreendermos o alcance e limites da psicanálise, sobretudo a freudiana, que se fundamenta no poder da razão humana somente. Por isso Jung, mais aberto ao mistério da alma humana ou psique, criará o conceito de arquétipo. Diante disso tudo, só podemos afirmar o poder das obras de arte e o seu mistério. Qualquer teoria racional que as queira abarcar, classificando-as, se torna limitada e insuficiente. Por isso, é essencial se pensar uma Poética, no lugar de uma mera Estética racional e conceitual, que se mova somente nas questões e não nos conceitos racionais.


- Manuel Antônio de Castro.
Referência:
(1) KOEHLER, Pe. H., S.J. Dicionário Escolar Latino - Português. Porto Alegre, Editora Globo, 1957, p. 543.

27

"O Qi é o vigorar da vida omnipresente que, no seu fluxo, anima todos os seres vivos e permeia o Universo, ligando todas as coisas como um todo. Essa energia é apreendida universalmente e, evidente, recebe outros nomes. Por exemplo, os índios Iroqueses americanos chamam-lhe Orenda; na Ãndia, Prana; nos países islâmicos, Baraka; o cristianismo, Espírito Santo etc. Sem o fluxo de Qi não existiria vida no planeta" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Filosofia e o pensamento do corpo". In: Desdobramentos do corpo no século XXI. MONTEIRO, Maria Conceição & GIUCCI, Guilhermo (orgs.). Rio de Janeiro: FAPERJ, Editora Caetés, 2016, p. 22.

28

"A importância fundamental disto está em nos descobrirmos no futuro como a vigência permanente do passado, que, por ser memória, não passa. Vigora. É o vigorar do sagrado. O culto da memória foi o núcleo central de toda atividade em torno do sagrado. E nesse núcleo a família, entendida como genos, sempre congregou toda a casa. É nesse sentido que a casa é a morada, pois nela se fazem presentes todos os que constituem a família. Isso é o genos. Justamente por isso, a casa, a morada, está ligada à linguagem, porque, enfim, a morada não são as quatro paredes, mas o vazio que acolhe no vazio, delimitado pelas quatro paredes, a todos, na delimitação das quatro paredes e de quantos cômodos compõem cada casa. É nesse sentido que nosso corpo é nossa casa, porque nela habita o que somos" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "A gota d’água e o mar". In: ---. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 249.

29

"Ser está ligado, sem dúvida nenhuma, ao poder do sagrado, de onde provém o ius. O sagrado é a lei, que a sedes outorga ao juiz proferir, aplicar, exercitar com poder de realização. Quem tinha o poder de realizar pela palavra senão o sagrado? Mostrando esse contraste, ainda hoje, quando o réu vai receber a sentença ele se aproxima do juiz e fica em pé, mas o juiz fica sentado" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ser e estar". In:------. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 52.

30

"Um ritual acaba quando o que o dirige se levanta e sai. O rei sempre exercia publicamente seu poder sentado em uma cadeira / trono. É também sentado que o áugure recebe os oráculos e os dita. Mas não é ele, áugure, que os dita, os doa, é o sagrado que os manifesta na figura do áugure. O ser humano se torna a habitação do sagrado. É o caso do sacerdote católico e do pai de santo, a título de exemplos" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ser e estar". In:---. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 52.

31

"No poético, as línguas são o rito da Linguagem. O mito narrado não é o mito, mas o rito e a língua da Linguagem. Por isso, o poético, toda arte, tem origem mítica. E tanto o mito como a arte radicam no sagrado. Martin Heidegger afirma: “O pensador diz o ser, o poeta nomeia o sagrado†(1). Nomear o sagrado eis o vigorar da palavra cantada" (2).


Referência:
(1) HEIDEGGER, Martin. "Qu'est-ce que la metaphysique". In: Questions I. Paris: Gallimard, 1968, p. 83.
(2) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ulisses e a Escuta do Canto das Sereiasâ€. In: ---. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 155.

32

"A emergência do homem e o âmbito de sua atuação e de seu lugar dentro do real – e o enigma do seu destino – são as questões que perpassam todas as culturas em todos os tempos e suas obras de arte. Note-se que a arte, na maioria das culturas, sempre esteve ligada ao sagrado e que seria, por isso mesmo, estranha aos respectivos contextos qualquer ligação com processos econômico-comerciais. E do enigma que é o sagrado lhe advêm todas as grandes questões" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Heidegger e as questões da arteâ€. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). Arte em questão: as questões da arte. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 13.

33

"Aquém de todo antropomorfismo e de todo antropocentrismo, aquém de todo politeísmo e de todo monoteísmo, aquém de todo materialismo e de todo ateísmo, o que se impõe e importa pensar hoje é a referência originária do homem à divindade. É o sentido cairológico das diferentes figuras históricas de que ela se cobriu tanto nas religiões da Natureza como nas religiões do Espírito, tanto nas religiões da Substância como nas religiões do Sujeito, tanto nas religiões do Absoluto como nas religiões do Absurdo. E dentro desta perspectiva é possível perguntar se a precipitação do Divino na representação metafísica de um só Deus não afundou ainda mais o mundo no esquecimento do Ser e do Sagrado" (1).


Referência:
(1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. Aprendendo a pensar I. Teresópolis: Daimon, 2008, p. 216.

34

"A passagem que conduz do Deus impessoal dos filósofos ao Deus pessoal do cristianismo, esta passagem considerada à luz da verdade esquecida do Sagrado é tão ilusória como a passagem que leva do humanismo da substância ao humanismo do sujeito. Heidegger lembra que a categoria de pessoa não é menos carregada das potências metafísicas de dessacralização e desumanização do que as categorias de objeto e de coisa" (1).


Referência:
(1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. Aprendendo a pensar I. Teresópolis: Daimon, 2008, p. 217.

35

"Tanto o pensamento como a arte têm sua origem sempre no sagrado. Este é o mais profundo dos mistérios. A mais antiga manifestação do sagrado que conhecemos são os mitos como imagens-questões e as obras vivas dos ritos. Mas eles têm muitas dimensões de manifestação, por isso, dos mitos originaram-se as manifestações religiosas, poéticas e de pensamento" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Heidegger e as questões da arteâ€. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). Arte em questão: as questões da arte. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 35.

36

sua beleza é inegável
mas o que você tem de ancestral e sagrado
é ainda mais incrível (1)


Referência:
(1) KAUR, rupi. meu corpo / minha casa. Trad. Ana Guadalupe. São Paulo: Editora Planeta, 2020, p. 184.

37

"Segundo a tradição celta, as formas mais sagradas de sabedoria provêm do reino dos ancestrais - o mundo dos mortos. Isso explica por que até o Sol brilhante faz seu trajeto descendente, à noite, até o reino sombrio de Donn. O Sol é a fonte de toda a vida, e seu movimento entre o mundo dos vivos, durante o dia , e o mundo dos mortos, durante a noite, determina o ritmo do tempo" (1).


Referência:
(1) HOOD, Juliette. O livro celta da vida e da morte. Trad. Denise de C. Rocha Delela. São Paulo: Editora Pensamento, 2011, p. 19.

38

Mistério vem do verbo grego myestai e significa: o que se retrai no e como silêncio. Por isso, o sagrado é a voz do silêncio.


- Manuel Antônio de Castro.

39

Outros nomes para sagrado:
O Qi – na filosofia chinesa - é o vigorar da vida omnipresente que, no seu fluxo, anima todos os seres vivos e permeia o Universo, ligando todas as coisas como um todo. Essa energia é apreendida universalmente e, evidente, recebe outros nomes em outras povos e culturas. Por exemplo, os índios Iroqueses americanos chamam-lhe Orenda; na Ãndia, Prana; nos países islâmicos, Baraka; o cristianismo, Espírito Santo etc.


- Manuel Antônio de Castro.