Diálogo
De Dicionrio de Potica e Pensamento
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- | : Em geral não se leva em conta a importância do fato de que cada dialogante já se encontra, ontologicamente, numa [[posição]]. Ora, esta posição já determina a nossa [[finitude]] ontológica, pois ninguém pode assumir todas as [[posições]]. Isto se torna essencial para a própria questão da [[verdade]], em três dimensões: 1a. Cada dialogante não pode assumir todas as posições; 2a. Uma vez que a verdade da [[realidade]] se dá e retrai, jamais o não-visto e não-desvelado pode ser objeto de uma [[posição]]; 3a. Daí advém que todo [[diálogo]] já vigora na essência da [[dialética]] da [[verdade]] (''aletheia'') da [[realidade]]. Se agora nos lembrarmos que a [[palavra]] para [[posição]], em grego, é ''thesis'', significa isso que o [[ser]] de todo [[sendo]] jamais pode ser reduzido a uma [[posição]], seguido de uma antítese e finalizado numa síntese, uma vez que jamais pode haver uma síntese total, pois a [[verdade]] é a [[dobra]] dialética de [[desvelamento]] e [[velamento]]. Toda [[dialética]] é necessariamente aberta, inconclusa. Jamais podemos [[ver]] tudo que se dá a [[ver]] e muito menos [[ver]] o que nunca se dá a [[ver]]. "Não se pode estabelecer todo [[relacionamento]] numa [[posição]], a não ser aceitando a [[multiplicidade]] de [[posições]]. Na multiplicidade você se coloca, assume uma [[posição]]. Sempre há o [[outro]], o diferente, tanto o [[outro]] do [[outro]], quanto o [[outro]] de si mesmo, em cada [[posição]]. O [[outro]] é a diferença do próprio movimento de constituir uma [[diferença]], uma [[posição]]. Toda [[posição]] se mantém numa processo de diferenciação e já é em si mesma um [[outro]], e traz consigo a [[dinâmica]] de [[diferenciação]] de sua [[proveniência]]" (1). A [[questão]] da [[posição]] se torna decisiva para [[compreender]] a [[profundidade]] de uma outra [[questão]] decisiva na [[vida]] de todo [[ser humano]] e até na sucessão [[dialética]] das [[épocas]]: o [[diálogo]]. E assim o [[diálogo]] externo (com os [[outros]]) é acompanhado de ou solicitado por um [[diálogo]] interno (com o [[outro]] de si mesmo), gerando, portanto, tanto uma [[dialética]] externa quanto uma interna. Mas estas denominações espaciais não levam em conta que a própria [[dialética]] é o [[sentido]] tanto do [[tempo]] quanto do [[espaço]]. Eis o complexo [[horizonte]] tanto do [[diálogo]] quanto da [[dialética]]. | + | : Em geral não se leva em conta a [[importância]] do [[fato]] de que cada [[dialogante]] já se encontra, [[ontologicamente]], numa [[posição]]. Ora, esta [[posição]] já determina a nossa [[finitude]] [[ontológica]], pois ninguém pode assumir todas as [[posições]]. Isto se torna [[essencial]] para a própria [[questão]] da [[verdade]], em três dimensões: 1a. Cada [[dialogante]] não pode assumir todas as [[posições]]; 2a. Uma vez que a [[verdade]] da [[realidade]] se dá e retrai, jamais o não-visto e não-desvelado pode [[ser]] [[objeto]] de uma [[posição]]; 3a. Daí advém que todo [[diálogo]] já [[vigora]] na [[essência]] da [[dialética]] da [[verdade]] (''[[aletheia]]'') da [[realidade]]. Se agora nos lembrarmos de que a [[palavra]] para [[posição]], em [[grego]], é ''thesis'', significa isso que o [[ser]] de todo [[sendo]] jamais pode ser reduzido a uma [[posição]], seguido de uma [[antítese]] e finalizado numa [[síntese]], uma vez que jamais pode haver uma [[síntese]] [[total]], pois a [[verdade]] é a [[dobra]] [[dialética]] de [[desvelamento]] e [[velamento]]. Toda [[dialética]] é [[necessariamente]] [[aberta]], inconclusa. Jamais podemos [[ver]] [[tudo]] que se dá a [[ver]] e muito menos [[ver]] o que nunca se dá a [[ver]]. |
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+ | : "Não se pode estabelecer todo [[relacionamento]] numa [[posição]], a não ser aceitando a [[multiplicidade]] de [[posições]]. Na [[multiplicidade]] você se coloca, assume uma [[posição]]. Sempre há o [[outro]], o [[diferente]], tanto o [[outro]] do [[outro]], quanto o [[outro]] de si mesmo, em cada [[posição]]. O [[outro]] é a [[diferença]] do próprio [[movimento]] de [[constituir]] uma [[diferença]], uma [[posição]]. Toda [[posição]] se mantém numa [[processo]] de [[diferenciação]] e já é em si mesma um [[outro]], e traz consigo a [[dinâmica]] de [[diferenciação]] de sua [[proveniência]]" (1). | ||
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+ | : A [[questão]] da [[posição]] se torna decisiva para [[compreender]] a [[profundidade]] de uma outra [[questão]] decisiva na [[vida]] de todo [[ser humano]] e até na [[sucessão]] [[dialética]] das [[épocas]]: o [[diálogo]]. E assim o [[diálogo]] [[externo]] (com os [[outros]]) é acompanhado de ou solicitado por um [[diálogo]] [[interno]] (com o [[outro]] de si mesmo), gerando, portanto, tanto uma [[dialética]] [[externa]] quanto uma [[interna]]. Mas estas denominações [[espaciais]] não levam em conta que a própria [[dialética]] é o [[sentido]] tanto do [[tempo]] quanto do [[espaço]]. Eis o complexo [[horizonte]] tanto do [[diálogo]] quanto da [[dialética]]. | ||
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- | : (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "O caminho genealógico de Platão". In: | + | : (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "O caminho genealógico de Platão". In: ---. '''Filosofia grega: uma introdução'''. Teresópolis: Daimon Editora, 2010, p. 212. |
== 2 == | == 2 == | ||
- | : "Ninguém pode fazer [[utilidade|uso]] do que os outros são, nem mesmo uso mental" (1). | + | : "Ninguém pode [[fazer]] [[utilidade|uso]] do que os [[outros]] são, nem mesmo [[uso]] [[mental]]" (1). |
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- | : (1) LISPECTOR, Clarice. ''Uma aprendizagem ou o livro dos prazeres''. | + | : (1) LISPECTOR, Clarice. '''Uma aprendizagem ou o livro dos prazeres''', 4. e. Rio de Janeiro: José Olympio, 1974, p. 62. |
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== 3 == | == 3 == | ||
- | : Há a passagem nº III do ensaio de Heidegger: "Hölderlin e a essência da poesia", onde Heidegger discute a essência do diálogo, a partir de verso | + | : Há a passagem nº III do [[ensaio]] de [[Heidegger]]: "Hölderlin e a [[essência]] da [[poesia]]", onde [[Heidegger]] discute a [[essência]] do [[diálogo]], a partir de um [[verso]] de Hölderlin: "Desde que somos um [[diálogo]] e podemos [[ouvir]] uns aos [[outros]]" (1). Há aí o grande [[tema]] da [[escuta]] e da [[fala]] ligado ao [[diálogo]]. |
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- | : (1) HEIDEGGER, Martin. ''Approche de Hölderlin | + | : (1) HEIDEGGER, Martin. '''Approche de Hölderlin. Trad. Henry Corbin. Paris: Gallimard, 1973''', p. 48. |
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== 4 == | == 4 == | ||
- | : Podemos falar no diálogo de quatro instâncias: o [[eu]], o [[outro]], o ''[[logos]]'', o ''diá-''. O ''logos'' funda os três diálogos. Porém, no diálogo há algo bem mais complexo. Podemos então considerar seis instâncias: | + | : Podemos [[falar]] no [[diálogo]] de quatro [[instâncias]]: o [[eu]], o [[outro]], o ''[[logos]]'', o ''diá-''. O ''[[logos]]'' [[funda]] os três [[diálogos]]. Porém, no [[diálogo]] há algo bem mais [[complexo]]. Podemos então considerar seis [[instâncias]]: |
- | : 1ª Essência do diálogo como [[disputa]] (1); | + | : 1ª [[Essência]] do [[diálogo]] como [[disputa]] (1); |
- | : 2ª | + | : 2ª [[Essência]] da [[obra de arte]] como [[disputa]] dialógica; |
- | : 3ª Essência do [[pensamento]] como diálogo (disputa entre as diferentes [[obra|obras]] dos [[pensador|pensadores]]); | + | : 3ª [[Essência]] do [[pensamento]] como [[diálogo]] ([[disputa]] [[entre]] as [[diferentes]] [[obra|obras]] dos [[pensador|pensadores]]); |
- | : 4ª Essência do pensamento como diálogo/disputa com: a) ''[[Physis]]''/[[Ser]]; b) Ser | + | : 4ª [[Essência]] do [[pensamento]] como [[diálogo]]/[[disputa]] com: a) ''[[Physis]]''/[[Ser]]; b) [[Ser humano]]; c) [[Arte]]; |
- | : 5ª Essência da ''[[poiesis]]'' como diálogo de disputa de ''poiesis'' e pensamento, ou seja, poesia pensante e pensamento poético; | + | : 5ª [[Essência]] da ''[[poiesis]]'' como [[diálogo]] de [[disputa]] de ''[[poiesis]]'' e [[pensamento]], ou seja, [[poesia]] [[pensante]] e [[pensamento]] [[poético]]; |
- | : 6ª Essência, do ponto de vista do ser-humano: o agir dele no fazer obras ou desvelar, como diálogo/disputa. Então aqui o diálogo se dá como [[leitura]]. O [[interpretar]] é, portanto, um diálogo [[ético]], porque todo interpretar é um interpretar-se pela escuta do ''[[logos]]''. | + | : 6ª [[Essência]], do ponto de vista do [[ser-humano]]: o [[agir]] dele no [[fazer]] [[obras]] ou [[desvelar]], como [[diálogo]]/[[disputa]]. Então aqui o [[diálogo]] se dá como [[leitura]]. O [[interpretar]] é, portanto, um [[diálogo]] [[ético]], porque todo [[interpretar]] é um [[interpretar-se]] pela [[escuta]] do ''[[logos]]''. |
: - [[Manuel Antônio de Castro]] | : - [[Manuel Antônio de Castro]] | ||
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: Referências: | : Referências: | ||
- | :(1) HERÁCLITO. "Fragmento 53: De todas as coisas a guerra é pai, de todas as coisas é senhor; a uns mostrou deuses, a outros, homens; de uns fez escravos, de outros, livres". In: ANAXIMANDRO; HERÁCLITO; PARMÊNIDES. ''Os pensadores originários''. Trad. Emmanuel Carneiro Leão. Petrópolis: Vozes, 1991, p. 73. | + | : (1) HERÁCLITO. "Fragmento 53: De todas as coisas a guerra é pai, de todas as coisas é senhor; a uns mostrou deuses, a outros, homens; de uns fez escravos, de outros, livres". In: '''ANAXIMANDRO; HERÁCLITO; PARMÊNIDES'''. '''Os pensadores originários'''. Trad. Emmanuel Carneiro Leão. Petrópolis: Vozes, 1991, p. 73. |
- | Observação: O tradutor preferiu traduzir a palavra grega ''polemos'' por "guerra". Mas pode-se interpretar e traduzir também como "disputa". | + | : Observação: O tradutor preferiu traduzir a palavra grega ''polemos'' por "guerra". Mas pode-se interpretar e traduzir também como "disputa". |
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== 5 == | == 5 == | ||
- | : "De um diálogo faz parte que seu falar fale do [[mesmo]] e isso de um pertencer ao mesmo" (1). | + | : "De um [[diálogo]] faz parte que seu falar fale do [[mesmo]] e isso de um pertencer ao [[mesmo]]" (1). |
- | : "O [[pensar]], porém, é o poematizar da [[verdade]] do [[ser]] no diálogo historial dos pensadores" (2). | + | : "O [[pensar]], porém, é o poematizar da [[verdade]] do [[ser]] no [[diálogo]] historial dos [[pensadores]]" (2). |
: Referências: | : Referências: | ||
- | : (1) HEIDEGGER, Martin. "A sentença de Anaximandro". In: ''Pré-Socráticos. Coleção Os Pensadores''. São Paulo: Abril Cultural, 1978, p. 25. | + | : (1) HEIDEGGER, Martin. "A sentença de Anaximandro". In: '''Pré-Socráticos. Coleção Os Pensadores'''. São Paulo: Abril Cultural, 1978, p. 25. |
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: (2) ibidem, p. 47. | : (2) ibidem, p. 47. | ||
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== 6 == | == 6 == | ||
- | : É do diálogo que seu falar fale do [[mesmo]]. E isso a partir de um co-pertencimento ao mesmo dos dialogantes. Na palavra portuguesa diálogo, o mesmo é o próprio ''[[logos]]'', ou seja, a [[Linguagem]] enquanto [[mundo]] e [[memória]]. Só porque co-pertencemos ao ''logos'' e ele fala é que, se escutarmos, podemos dialogar, na medida em que a fala, como [[identidade]], funda as [[diferença|diferenças]] de [[eu]] e tu, de [[masculino]] e [[feminino]], de [[ser]] e [[não-ser]]. É no sentido do [[mesmo]] que a [[Linguagem]] é a mãe de todas as [[línguas]]. | + | : É do [[diálogo]] que seu falar fale do [[mesmo]]. E isso a partir de um co-pertencimento ao [[mesmo]] dos dialogantes. Na [[palavra]] portuguesa [[diálogo]], o [[mesmo]] é o próprio ''[[logos]]'', ou seja, a [[Linguagem]] enquanto [[mundo]] e [[memória]]. Só porque co-pertencemos ao ''[[logos]]'' e ele [[fala]] é que, se escutarmos, podemos [[dialogar]], na medida em que a [[fala]], como [[identidade]], funda as [[diferença|diferenças]] de [[eu]] e [[tu]], de [[masculino]] e [[feminino]], de [[ser]] e [[não-ser]]. É no [[sentido]] do [[mesmo]] que a [[Linguagem]] é a [[mãe]] de todas as [[línguas]]. |
: - [[Manuel Antônio de Castro]] | : - [[Manuel Antônio de Castro]] | ||
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- | : Em sua [[essência]], o diálogo é dramático e não uma [[questão]] formal de [[narrativa]] direta. A estrutura dramática do diálogo surge a partir da [[essência]] dramática do real-ser-humano como [[entre-ser]]. As figurações narrativas todas provêm desta [[essência]] do real-ser-humano. Por isso, o [[narrar]] está ligado ao [[conhecer]], mas este não se constitui em si pelo [[narrar]] e, sim, pela conjuntura hermenêutico-poético-ontofenomenológica. Esta se dá no [[horizonte]] da [[compreensão]] como pre- e entre-compreensão. É o que Heidegger trata em ''Ser e tempo'' como ''Vorhabe'' / o ter prévio, ''Vorsicht'' / o ver prévio e ''Vorgriff'' / o [[perceber]] prévio. Mas estes se manifestam no [[ser humano]] porque este é essencialmente um ''Da'', um [[Entre]]. | + | : Em sua [[essência]], o [[diálogo]] é [[dramático]] e não uma [[questão]] formal de [[narrativa]] direta. A estrutura dramática do [[diálogo]] surge a partir da [[essência]] dramática do real-ser-humano como [[entre-ser]]. As figurações narrativas todas provêm desta [[essência]] do real-ser-humano. Por isso, o [[narrar]] está ligado ao [[conhecer]], mas este não se constitui em si pelo [[narrar]] e, sim, pela conjuntura hermenêutico-poético-ontofenomenológica. Esta se dá no [[horizonte]] da [[compreensão]] como pre- e entre-compreensão. É o que [[Heidegger]] trata em ''[[Ser e tempo]]'' como ''Vorhabe'' / o [[ter]] prévio, ''Vorsicht'' / o [[ver]] prévio e ''Vorgriff'' / o [[perceber]] prévio. Mas estes se manifestam no [[ser humano]] porque este é essencialmente um ''Da'', um [[Entre]]. |
- | : Neste sentido, as tradicionais divisões dos [[gêneros]] são as figurações dos três diálogos: o diálogo comunicativo é a narração épica e a do romance. O autodiálogo é o lírico. E o dramático é o heterodiálogo, ou seja, a [[vigência]] ambígua das [[conjunturas]] na [[disputa]] de um [[eu]] e de um tu. O que vai ser comum aos três diálogos, que lhes dá [[unidade]] e [[identidade]] nas diferenças, é o ''logos''/[[linguagem]]. É claro que esta divisão é apenas indicativa e muito conceitual, pois aí se perderiam as diferenças e a originalidade de cada [[obra]]. Mas de qualquer maneira a densidade dialogal acompanha sempre as [[obras de arte]] da [[palavra]]. O que deve ser entendido agora como dramático é algo que está para além do formal narrativo. Todo diálogo se funda num [[entre]], dual e ambíguo. É neste sentido que é tomada a [[palavra]] dramático no início desta ficha. O prefixo de diá-logo, diá- significa: através de; [[entre]]. | + | : Neste sentido, as tradicionais divisões dos [[gêneros]] são as figurações dos três [[diálogos]]: o [[diálogo]] comunicativo é a narração épica e a do romance. O [[autodiálogo]] é o lírico. E o dramático é o [[heterodiálogo]], ou seja, a [[vigência]] ambígua das [[conjunturas]] na [[disputa]] de um [[eu]] e de um [[tu]]. O que vai ser comum aos três [[diálogos]], que lhes dá [[unidade]] e [[identidade]] nas diferenças, é o ''logos''/[[linguagem]]. É claro que esta divisão é apenas indicativa e muito conceitual, pois aí se perderiam as diferenças e a originalidade de cada [[obra]]. Mas de qualquer maneira a densidade dialogal acompanha sempre as [[obras de arte]] da [[palavra]]. O que deve ser entendido agora como dramático é algo que está para além do formal narrativo. Todo [[diálogo]] se funda num [[entre]], dual e ambíguo. É neste sentido que é tomada a [[palavra]] dramático no início desta ficha. O prefixo de [[diá-logo]], ''[[diá]]''- significa: através de; [[entre]]. |
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== 8 == | == 8 == | ||
- | : Ler um autor poeticamente é se apropriar do que lhe é próprio como [[pensamento]] do a-ser-pensado. Se alguém é heideggeriano, marxista, nietzscheano ou coisa semelhante, não é o que lhe é [[próprio]], é um [[simulacro]], uma [[representação]] da manifestação do que alguém é. E cada um é convidado e convocado sempre e sempre a ser o que lhe é próprio. Esse ser próprio se dá no [[diálogo]] com os outros, mas só e tão-somente na medida do ''[[logos]]'': a ''linguagem''. Por esta e nesta seremos uma co-letividade dialogante e aí o outro - Heidegger, Marx, Nietzsche, Platão, ou seja quem for, comparece como co-lega dialogante da aventura e ventura do a-ser-pensado, do ser questionado e experienciado. A um tal diálogo se chama diálogo de diferenças. Por isso, a todo diálogo precede e se faz presente um questionar. | + | : [[Ler]] um [[autor]] poeticamente é se apropriar do que lhe é [[próprio]] como [[pensamento]] do [[a-ser-pensado]]. Se alguém é heideggeriano, marxista, nietzscheano ou coisa semelhante, não é o que lhe é [[próprio]], é um [[simulacro]], uma [[representação]] da manifestação do que alguém é. E cada um é convidado e convocado [[sempre]] e [[sempre]] a [[ser]] o que lhe é [[próprio]]. Esse [[ser]] [[próprio]] se dá no [[diálogo]] com os [[outros]], mas só e tão-somente na medida do ''[[logos]]'': a ''linguagem''. Por esta e nesta seremos uma [[co-letividade]] [[dialogante]] e aí o [[outro]] - [[Heidegger]], Marx, Nietzsche, [[Platão]], ou seja quem for, comparece como co-lega [[dialogante]] da aventura e ventura do [[a-ser-pensado]], do [[ser]] questionado e experienciado. A um tal [[diálogo]] se chama [[diálogo]] de [[diferenças]]. Por isso, a todo [[diálogo]] precede e se faz presente um [[questionar]]. |
: - [[Manuel Antônio de Castro]] | : - [[Manuel Antônio de Castro]] | ||
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: '''Ver também:''' | : '''Ver também:''' | ||
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: *[[Identidade]] | : *[[Identidade]] | ||
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- | : "Não podemos discutir, aqui, de um modo aprofundado, em que extensão e por qual [[razão]] todo o diálogo e toda fala é sempre uma [[tradução]] no interior da própria [[linguagem]], precisamente, o que | + | : "Não podemos discutir, aqui, de um modo aprofundado, em que extensão e por qual [[razão]] todo o [[diálogo]] e toda [[fala]] é [[sempre]] uma [[tradução]] no interior da própria [[linguagem]], precisamente, o que signi'fica '[[traduzir]]' " (1). |
: Referência: | : Referência: | ||
- | : (1) HEIDEGGER, Martin. ''Parmênides''. Petrópolis: Vozes, 2008, p. 29. | + | : (1) HEIDEGGER, Martin. '''Parmênides'''. Petrópolis: Vozes, 2008, p. 29. |
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- | : Em geral não se leva em conta a importância do fato de que cada dialogante já se encontra, ontologicamente, numa [[posição]] | + | : Em geral não se leva em conta a importância do [[fato]] de que cada dialogante já se encontra, ontologicamente, numa [[posição]]. |
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+ | : "Não se pode estabelecer todo relacionamento numa [[posição]], a não ser aceitando a [[multiplicidade]] de [[posições]]. Na [[multiplicidade]] você se coloca, assume uma [[posição]]. Sempre há o [[outro]], o diferente, tanto o [[outro]] do [[outro]], quanto o [[outro]] de si mesmo, em cada [[posição]]. O [[outro]] é a [[diferença]] do próprio movimento de constituir uma [[diferença]], uma [[posição]]. Toda [[posição]] se mantém numa [[processo]] de diferenciação, já é em si mesma um [[outro]] e traz consigo a [[dinâmica]] de diferenciação de sua [[proveniência]]" (1). | ||
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+ | : A [[questão]] da [[posição]] se torna decisiva para [[compreender]] a [[profundidade]] de uma outra [[questão]] decisiva na [[vida]] de todo [[ser humano]] e até na sucessão [[dialética]] das [[épocas]]: o [[diálogo]]. | ||
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: - [[Manuel Antônio de Castro]] | : - [[Manuel Antônio de Castro]] | ||
+ | : Referência: | ||
- | : (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "O caminho genealógico de Platão". In: | + | : (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "O caminho genealógico de Platão". In: ---. '''Filosofia grega: uma introdução'''. Teresópolis: Daimon Editora, 2010, p. 212. |
== 11 == | == 11 == | ||
- | : "Dialogar não é monologar, é exercitar a difícil [[disciplina]] da [[escuta]], onde acontecem as [[diferenças]]. Isso é [[aprender]] a [[pensar]]. Quando este se aprende, [[ler]] e escrever obtêm o seu máximo desempenho" (1). | + | : "[[Dialogar]] não é [[monologar]], é exercitar a difícil [[disciplina]] da [[escuta]], onde acontecem as [[diferenças]]. Isso é [[aprender]] a [[pensar]]. Quando este se aprende, [[ler]] e escrever obtêm o seu máximo desempenho" (1). |
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- | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O ler e suas questões". -------. ''Leitura: questões''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2015, p. 26. | + | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O ler e suas questões". -------. '''Leitura: questões'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2015, p. 26. |
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: Referência: | : Referência: | ||
- | : (1) : CASTRO, Manuel Antônio de. “O mito de Midas da morte ou do ser feliz”. In: ------. | + | : (1) : CASTRO, Manuel Antônio de. “O mito de Midas da morte ou do ser feliz”. In: ------. '''Arte: o humano e o destino'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 187. |
== 13 == | == 13 == | ||
- | : "Um novo [[caminho]] tinha que ser pensado e proposto, um [[caminho]] que reconduzisse o [[leitor]] para o [[questionamento]], a [[escuta]], a [[diversidade]] e o [[diálogo]] com as [[obras poéticas]]. Isso exige um [[leitor]] novo, onde ele-mesmo esteja implicado em seu [[sentido]], [[verdade]] e [[mundo]]. Exige um [[leitor]] num [[diálogo]] ''com'' e não mais um falar ou escrever ''sobre'' as [[obras]]. É um [[diálogo]] exigente, pois só [[escuta]] e dialoga quem ''se'' [[escuta]]. Mas a [[fala]] é da [[obra]] e não do [[autor]], uma vez que nela quem age é a ''[[poiesis]]'' e quem fala é o ''[[Logos]]'' [[originário]] e não o ''[[logos]]'' [[racional]] da [[Modernidade]]" (1). | + | : "Um novo [[caminho]] tinha que ser pensado e proposto, um [[caminho]] que reconduzisse o [[leitor]] para o [[questionamento]], a [[escuta]], a [[diversidade]] e o [[diálogo]] com as [[obras poéticas]]. Isso exige um [[leitor]] novo, onde ele-mesmo esteja implicado em seu [[sentido]], [[verdade]] e [[mundo]]. Exige um [[leitor]] num [[diálogo]] ''com'' e não mais um falar ou escrever ''sobre'' as [[obras]]. É um [[diálogo]] exigente, pois só [[escuta]] e dialoga quem ''se'' [[escuta]]. Mas a [[fala]] é da [[obra]] e não do [[autor]], uma vez que nela quem age é a ''[[poiesis]]'' e quem [[fala]] é o ''[[Logos]]'' [[originário]] e não o ''[[logos]]'' [[racional]] da [[Modernidade]]" (1). |
: Referência: | : Referência: | ||
- | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Apresentação". In: Manuel Antônio de Castro, (org.). ''Arte: corpo, mundo e terra''. Rio de Janeiro: 7Letras, 2009, p. 13. | + | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Apresentação". In: Manuel Antônio de Castro, (org.). '''Arte: corpo, mundo e terra'''. Rio de Janeiro: 7Letras, 2009, p. 13. |
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: Referência: | : Referência: | ||
- | : (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Dialética: entre o fechado e o aberto". ''Revista Tempo Brasileiro: Dialética em questão II''. Editora Tempo Brasileiro, Rio de Janeiro, jul.-set., 2013, 194, p. 9. | + | : (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Dialética: entre o fechado e o aberto". '''Revista Tempo Brasileiro: Dialética em questão II'''. Editora Tempo Brasileiro, Rio de Janeiro, jul.-set., 2013, 194, p. 9. |
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: Referência: | : Referência: | ||
- | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Dialética e diálogo: a verdade do humano". ''Revista Tempo Brasileiro: Dialética em questão I''. Editora Tempo Brasileiro, Rio de Janeiro, 192, jan.-mar., 2013, p. 12. | + | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Dialética e diálogo: a verdade do humano". '''Revista Tempo Brasileiro: Dialética em questão I'''. Editora Tempo Brasileiro, Rio de Janeiro, 192, jan.-mar., 2013, p. 12. |
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: Referência: | : Referência: | ||
- | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Interdisciplinaridade poética: o ''entre''". Revista ''Tempo Brasileiro'': Rio de Janeiro: ''Interdisciplinaridade: dimensões poéticas'', 164, jan.-mar., 2006, p. 26. | + | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Interdisciplinaridade poética: o ''entre''". Revista '''Tempo Brasileiro : Interdisciplinaridade:dimensões poéticas'''. Rio de Janeiro, 164, jan.-mar., 2006, p. 26. |
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+ | == 17 == | ||
+ | : "Um [[diálogo]] sempre se dá, acontece, “[[entre]]” um [[Eu]] E um [[Tu]]. Cotidiana e impensadamente sempre achamos que o [[diálogo]] visa [[comunicar]], tornar [[comum]] algo. São as [[informações]] e os [[conhecimentos]], ou seja, aquilo que é produzido pelas [[disciplinas]]. Estas são o “[[entre]]” [[Eu]] E [[Tu]]. Esta [[posição]], como já vimos, surge do [[conceito]] de [[interdisciplinaridade]], onde o “[[entre]]” é reduzido e se confunde com as [[disciplinas]]. Elas são o [[elemento]] [[comum]] a quem ensina e a quem aprende, ao [[emissor]] e ao [[receptor]]. [[Diálogo]] é isso, mas é também bem mais [[complexo]] e [[profundo]]" (1). Quando acontece o diálogo essencial, [[Heidegger]] o denomina também ''[[Mit-sein]]'', onde acontece concomitantemente o ''[[Dasein]]'' e o ''[[In-der-Welt-sein]]''. | ||
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+ | : - [[Manuel Antônio de Castro]]. | ||
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+ | : Referência: | ||
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+ | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Interdisciplinaridade poética: o ''entre''". Rio de Janeiro: Revista '''Tempo Brasileiro''': '''Interdisciplinaridade: dimensões poéticas''', 164, jan.-mar., 2006, p. 27. | ||
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+ | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Interdisciplinaridade poética: o ''entre''". Rio de Janeiro: Revista '''Tempo Brasileiro''': '''Interdisciplinaridade: dimensões poéticas''', 164, jan.-mar., 2006, p. 27. | ||
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+ | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Interdisciplinaridade poética: o ''entre''". Rio de Janeiro: Revista '''Tempo Brasileiro''': '''Interdisciplinaridade: dimensões poéticas''', 164, jan.-mar., 2006, p. 29. | ||
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+ | : Entrevista de ''Audrey Azoulay'' a Ruth de Aquino. In: '''O Globo''', sábado, 16-11-2019, p. 26. | ||
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+ | : (1) HUMMES, o.f.m. Frei Cláudio. '''Metafísica'''. Mimeo. Daltro Filho / Imigrantes, RS, 1963. Depois tornou-se Bispo e hoje é Cardeal. | ||
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+ | : "Como deixar o [[mito]] [[falar]]? É [[necessário]] pôr tudo que conhecemos em suspenso e ter a [[coragem]] de [[ouvir]] o [[mito]]. Deixemos advir o [[silêncio]] e escutemos. Façamos uma [[leitura]] de [[escuta]] do que esse [[mito]] diz. Minha [[escuta]], a seguir transcrita, não necessariamente será, e é bom que não seja, a do [[leitor]]. Vamos ter algo em comum, mas também algo [[diferente]]. Os dois [[aspectos]] são importantes porque só então pode haver [[diálogo]], pois só há [[diálogo]] onde convivem as [[diferenças]] na [[identidade]] do [[acontecer]] da [[linguagem]], [[fonte]] de todo [[sentido]]" (1). | ||
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+ | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O mito de Midas da morte ou do ser feliz". In: -------. '''Arte: o humano e o destino'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 188. | ||
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+ | : "[[Dialogar]], no [[sentido]] [[comunicativo]], para nós, é [[esperar]] uma confirmação. Quando há o desacordo ficamos um pouco desarmados e in-conformados. Dá-se uma não-forma do que já antes prevíamos como [[forma]] de [[resposta]]. Isso não é [[diálogo]], mas [[monólogo]] a dois e, em geral, decorre de que somos educados para [[sistemas]] prontos, com [[respostas]] prontas e não para o [[inesperado]] da [[vida]], do [[destino]], do [[extraordinário]] no ordinário de todo dia"(1). | ||
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+ | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O mito de Midas da morte ou do ser feliz". In: -------. '''Arte: o humano e o destino'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 196. | ||
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+ | : "[[Essencialmente]], [[diálogo]] é [[espera]] e [[escuta]]" (1). | ||
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+ | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O mito de Midas da morte ou do ser feliz". In: -------. '''Arte: o humano e o destino'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 196. | ||
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+ | : "Podemos notar que, no [[infinitivo]], [[tempo]] e [[linguagem]] coincidem e são manifestações da ''[[poiesis]]'' da ''[[physis]]''/[[ser]]. É [[necessário]] começar a [[pensar]] a [[gramática]] do ponto de vista da [[linguagem]]/[[tempo]] e não o [[tempo]]/[[linguagem]] do ponto de vista da [[gramática]]. Por outro lado, a [[tensão]] [[entre]] [[infinitivo]] e [[finitos]], o presentificado, o presentificante, o presentificável, é que é o [[horizonte]] de nossa [[identidade]]. E esta se dá como [[diá-logo]], na medida em que este implica tanto o plano do [[ente]] como o plano do [[ser]]. Porém, de novo, não é porque falamos que construímos o [[diálogo]], mas porque já somos [[diálogo]] é que podemos [[falar]]. Uma [[fala]] que não pressupõe [[ouvinte]], nem que seja como [[ausente]], é impossível" (1). É claro que não podemos [[esquecer]] o [[auto-diálogo]], onde o [[ouvinte]] somos [[nós]] [[mesmos]]. | ||
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+ | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. '''Linguagem: nosso maior bem'''. Série ''Aulas Inaugurais''. Faculdade de Letras, UFRJ, 2o. sem. / 2004, p. 23. | ||
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+ | : '' Embora haja tanto desencontro pela [[vida]]''. | ||
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+ | : '''Samba da Bênção'''. Autor: Vinicius de Moraes. | ||
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+ | : ouça com muito [[cuidado]] | ||
+ | : o que seu [[universo]] [[interno]] | ||
+ | : está tentando [[dizer]] (1) | ||
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+ | : Referência: | ||
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+ | : (1) KAUR, rupi. '''meu corpo / minha casa'''. Trad. Ana Guadalupe. São Paulo: Editora Planeta, 2020, p. 156. | ||
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+ | == 30 == | ||
+ | : "O [[diálogo]] originariamente é o [[um]] concretizado no corpo-mulher de [[Céu]] e [[Terra]] e, ao mesmo tempo, se manifestando como [[multiplicidade]], o [[fundamento]] do [[social]], o [[eu]] da [[mulher]]-corpo e o filho [[criança]] que é e não é a [[mãe]]" (1). | ||
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+ | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Poético-ecologia". In: '''Arte: corpo, mundo e terra'''. CASTRO, Manuel Antônio de (org.). Rio de Janeiro: 7Letras, 2009, p. 20. |
Edição de 22h26min de 17 de Maio de 2024
1
- Em geral não se leva em conta a importância do fato de que cada dialogante já se encontra, ontologicamente, numa posição. Ora, esta posição já determina a nossa finitude ontológica, pois ninguém pode assumir todas as posições. Isto se torna essencial para a própria questão da verdade, em três dimensões: 1a. Cada dialogante não pode assumir todas as posições; 2a. Uma vez que a verdade da realidade se dá e retrai, jamais o não-visto e não-desvelado pode ser objeto de uma posição; 3a. Daí advém que todo diálogo já vigora na essência da dialética da verdade (aletheia) da realidade. Se agora nos lembrarmos de que a palavra para posição, em grego, é thesis, significa isso que o ser de todo sendo jamais pode ser reduzido a uma posição, seguido de uma antítese e finalizado numa síntese, uma vez que jamais pode haver uma síntese total, pois a verdade é a dobra dialética de desvelamento e velamento. Toda dialética é necessariamente aberta, inconclusa. Jamais podemos ver tudo que se dá a ver e muito menos ver o que nunca se dá a ver.
- "Não se pode estabelecer todo relacionamento numa posição, a não ser aceitando a multiplicidade de posições. Na multiplicidade você se coloca, assume uma posição. Sempre há o outro, o diferente, tanto o outro do outro, quanto o outro de si mesmo, em cada posição. O outro é a diferença do próprio movimento de constituir uma diferença, uma posição. Toda posição se mantém numa processo de diferenciação e já é em si mesma um outro, e traz consigo a dinâmica de diferenciação de sua proveniência" (1).
- A questão da posição se torna decisiva para compreender a profundidade de uma outra questão decisiva na vida de todo ser humano e até na sucessão dialética das épocas: o diálogo. E assim o diálogo externo (com os outros) é acompanhado de ou solicitado por um diálogo interno (com o outro de si mesmo), gerando, portanto, tanto uma dialética externa quanto uma interna. Mas estas denominações espaciais não levam em conta que a própria dialética é o sentido tanto do tempo quanto do espaço. Eis o complexo horizonte tanto do diálogo quanto da dialética.
- Referência:
- (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "O caminho genealógico de Platão". In: ---. Filosofia grega: uma introdução. Teresópolis: Daimon Editora, 2010, p. 212.
2
- Referência:
- (1) LISPECTOR, Clarice. Uma aprendizagem ou o livro dos prazeres, 4. e. Rio de Janeiro: José Olympio, 1974, p. 62.
3
- Há a passagem nº III do ensaio de Heidegger: "Hölderlin e a essência da poesia", onde Heidegger discute a essência do diálogo, a partir de um verso de Hölderlin: "Desde que somos um diálogo e podemos ouvir uns aos outros" (1). Há aí o grande tema da escuta e da fala ligado ao diálogo.
- Referência:
- (1) HEIDEGGER, Martin. Approche de Hölderlin. Trad. Henry Corbin. Paris: Gallimard, 1973, p. 48.
4
- Podemos falar no diálogo de quatro instâncias: o eu, o outro, o logos, o diá-. O logos funda os três diálogos. Porém, no diálogo há algo bem mais complexo. Podemos então considerar seis instâncias:
- 1ª Essência do diálogo como disputa (1);
- 2ª Essência da obra de arte como disputa dialógica;
- 3ª Essência do pensamento como diálogo (disputa entre as diferentes obras dos pensadores);
- 4ª Essência do pensamento como diálogo/disputa com: a) Physis/Ser; b) Ser humano; c) Arte;
- 5ª Essência da poiesis como diálogo de disputa de poiesis e pensamento, ou seja, poesia pensante e pensamento poético;
- 6ª Essência, do ponto de vista do ser-humano: o agir dele no fazer obras ou desvelar, como diálogo/disputa. Então aqui o diálogo se dá como leitura. O interpretar é, portanto, um diálogo ético, porque todo interpretar é um interpretar-se pela escuta do logos.
- Referências:
- (1) HERÁCLITO. "Fragmento 53: De todas as coisas a guerra é pai, de todas as coisas é senhor; a uns mostrou deuses, a outros, homens; de uns fez escravos, de outros, livres". In: ANAXIMANDRO; HERÁCLITO; PARMÊNIDES. Os pensadores originários. Trad. Emmanuel Carneiro Leão. Petrópolis: Vozes, 1991, p. 73.
- Observação: O tradutor preferiu traduzir a palavra grega polemos por "guerra". Mas pode-se interpretar e traduzir também como "disputa".
5
- "De um diálogo faz parte que seu falar fale do mesmo e isso de um pertencer ao mesmo" (1).
- "O pensar, porém, é o poematizar da verdade do ser no diálogo historial dos pensadores" (2).
- Referências:
- (1) HEIDEGGER, Martin. "A sentença de Anaximandro". In: Pré-Socráticos. Coleção Os Pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1978, p. 25.
- (2) ibidem, p. 47.
6
- É do diálogo que seu falar fale do mesmo. E isso a partir de um co-pertencimento ao mesmo dos dialogantes. Na palavra portuguesa diálogo, o mesmo é o próprio logos, ou seja, a Linguagem enquanto mundo e memória. Só porque co-pertencemos ao logos e ele fala é que, se escutarmos, podemos dialogar, na medida em que a fala, como identidade, funda as diferenças de eu e tu, de masculino e feminino, de ser e não-ser. É no sentido do mesmo que a Linguagem é a mãe de todas as línguas.
- Ver também:
7
- Em sua essência, o diálogo é dramático e não uma questão formal de narrativa direta. A estrutura dramática do diálogo surge a partir da essência dramática do real-ser-humano como entre-ser. As figurações narrativas todas provêm desta essência do real-ser-humano. Por isso, o narrar está ligado ao conhecer, mas este não se constitui em si pelo narrar e, sim, pela conjuntura hermenêutico-poético-ontofenomenológica. Esta se dá no horizonte da compreensão como pre- e entre-compreensão. É o que Heidegger trata em Ser e tempo como Vorhabe / o ter prévio, Vorsicht / o ver prévio e Vorgriff / o perceber prévio. Mas estes se manifestam no ser humano porque este é essencialmente um Da, um Entre.
- Neste sentido, as tradicionais divisões dos gêneros são as figurações dos três diálogos: o diálogo comunicativo é a narração épica e a do romance. O autodiálogo é o lírico. E o dramático é o heterodiálogo, ou seja, a vigência ambígua das conjunturas na disputa de um eu e de um tu. O que vai ser comum aos três diálogos, que lhes dá unidade e identidade nas diferenças, é o logos/linguagem. É claro que esta divisão é apenas indicativa e muito conceitual, pois aí se perderiam as diferenças e a originalidade de cada obra. Mas de qualquer maneira a densidade dialogal acompanha sempre as obras de arte da palavra. O que deve ser entendido agora como dramático é algo que está para além do formal narrativo. Todo diálogo se funda num entre, dual e ambíguo. É neste sentido que é tomada a palavra dramático no início desta ficha. O prefixo de diá-logo, diá- significa: através de; entre.
8
- Ler um autor poeticamente é se apropriar do que lhe é próprio como pensamento do a-ser-pensado. Se alguém é heideggeriano, marxista, nietzscheano ou coisa semelhante, não é o que lhe é próprio, é um simulacro, uma representação da manifestação do que alguém é. E cada um é convidado e convocado sempre e sempre a ser o que lhe é próprio. Esse ser próprio se dá no diálogo com os outros, mas só e tão-somente na medida do logos: a linguagem. Por esta e nesta seremos uma co-letividade dialogante e aí o outro - Heidegger, Marx, Nietzsche, Platão, ou seja quem for, comparece como co-lega dialogante da aventura e ventura do a-ser-pensado, do ser questionado e experienciado. A um tal diálogo se chama diálogo de diferenças. Por isso, a todo diálogo precede e se faz presente um questionar.
- Ver também:
9
- "Não podemos discutir, aqui, de um modo aprofundado, em que extensão e por qual razão todo o diálogo e toda fala é sempre uma tradução no interior da própria linguagem, precisamente, o que signi'fica 'traduzir' " (1).
- Referência:
- (1) HEIDEGGER, Martin. Parmênides. Petrópolis: Vozes, 2008, p. 29.
10
- Em geral não se leva em conta a importância do fato de que cada dialogante já se encontra, ontologicamente, numa posição.
- "Não se pode estabelecer todo relacionamento numa posição, a não ser aceitando a multiplicidade de posições. Na multiplicidade você se coloca, assume uma posição. Sempre há o outro, o diferente, tanto o outro do outro, quanto o outro de si mesmo, em cada posição. O outro é a diferença do próprio movimento de constituir uma diferença, uma posição. Toda posição se mantém numa processo de diferenciação, já é em si mesma um outro e traz consigo a dinâmica de diferenciação de sua proveniência" (1).
- A questão da posição se torna decisiva para compreender a profundidade de uma outra questão decisiva na vida de todo ser humano e até na sucessão dialética das épocas: o diálogo.
- Referência:
- (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "O caminho genealógico de Platão". In: ---. Filosofia grega: uma introdução. Teresópolis: Daimon Editora, 2010, p. 212.
11
- "Dialogar não é monologar, é exercitar a difícil disciplina da escuta, onde acontecem as diferenças. Isso é aprender a pensar. Quando este se aprende, ler e escrever obtêm o seu máximo desempenho" (1).
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O ler e suas questões". -------. Leitura: questões. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2015, p. 26.
12
- "Só há diálogo onde há escuta. A comunicação é o diálogo sem escuta, portanto, um pseudo-diálogo" (1).
- Referência:
- (1) : CASTRO, Manuel Antônio de. “O mito de Midas da morte ou do ser feliz”. In: ------. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 187.
13
- "Um novo caminho tinha que ser pensado e proposto, um caminho que reconduzisse o leitor para o questionamento, a escuta, a diversidade e o diálogo com as obras poéticas. Isso exige um leitor novo, onde ele-mesmo esteja implicado em seu sentido, verdade e mundo. Exige um leitor num diálogo com e não mais um falar ou escrever sobre as obras. É um diálogo exigente, pois só escuta e dialoga quem se escuta. Mas a fala é da obra e não do autor, uma vez que nela quem age é a poiesis e quem fala é o Logos originário e não o logos racional da Modernidade" (1).
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Apresentação". In: Manuel Antônio de Castro, (org.). Arte: corpo, mundo e terra. Rio de Janeiro: 7Letras, 2009, p. 13.
14
- "Platão diz que a dialética é o diálogo que a alma, o pensamento, faz consigo. O grande problema é como se entende esse pensamento. Pensamento traduz aí psykhe. Para o pensamento medievel psykhe é o diálogo da alma consigo. E Mestre Eckart diz: Quem é esse si mesmo da alma? Quem é que entra nessa discussão, nesse debate, nesse diálogo com a alma mesma? É o que a alma tem de divino. É o que a alma tem de mistério "(1).
- Referência:
- (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Dialética: entre o fechado e o aberto". Revista Tempo Brasileiro: Dialética em questão II. Editora Tempo Brasileiro, Rio de Janeiro, jul.-set., 2013, 194, p. 9.
15
- "O diálogo.
- Este é o grande esquecido quando se trata da dialética. Prefere-se, na tradição substantiva, conceitual, representativa, para apreender as diferentes manifestações históricas da dialética, sempre verbal, adjetivar o adjetivo substantivado. E diz-se: dialética platônica, hegeliana, marxista etc. O interessante é que o grande pensador do Logos foi Heráclito e, certamente, é ele que inaugura originariamente a questão da dialética, mas pensando sempre o Logos e a Physis. Disso decorre que não podemos pensar a dialética sem pensar o diálogo e este funda-se necessariamente no Logos (1).
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Dialética e diálogo: a verdade do humano". Revista Tempo Brasileiro: Dialética em questão I. Editora Tempo Brasileiro, Rio de Janeiro, 192, jan.-mar., 2013, p. 12.
16
- "Porém, além do emissor e do receptor, deve haver uma terceira dimensão com uma faceta dupla: o quê se comunica e o como se comunica: deve haver um conhecimento e um meio. Como meio, o diálogo gera a comunicação, mas esta só ocorre quando ela veicula informações e conhecimentos, que nos advêm das disciplinas. A estrutura do ensinar e aprender é, fundamentalmente, o do diálogo: quem ensina, quem aprende e o que se ensina e se aprende" (1).
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Interdisciplinaridade poética: o entre". Revista Tempo Brasileiro : Interdisciplinaridade:dimensões poéticas. Rio de Janeiro, 164, jan.-mar., 2006, p. 26.
17
- "Um diálogo sempre se dá, acontece, “entre” um Eu E um Tu. Cotidiana e impensadamente sempre achamos que o diálogo visa comunicar, tornar comum algo. São as informações e os conhecimentos, ou seja, aquilo que é produzido pelas disciplinas. Estas são o “entre” Eu E Tu. Esta posição, como já vimos, surge do conceito de interdisciplinaridade, onde o “entre” é reduzido e se confunde com as disciplinas. Elas são o elemento comum a quem ensina e a quem aprende, ao emissor e ao receptor. Diálogo é isso, mas é também bem mais complexo e profundo" (1). Quando acontece o diálogo essencial, Heidegger o denomina também Mit-sein, onde acontece concomitantemente o Dasein e o In-der-Welt-sein.
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Interdisciplinaridade poética: o entre". Rio de Janeiro: Revista Tempo Brasileiro: Interdisciplinaridade: dimensões poéticas, 164, jan.-mar., 2006, p. 27.
18
- "A palavra diá-logo compõe-se do prefixo grego dia- que significa: dois, através de, entre. O radical da palavra diálogo, -logo, vem da misteriosa palavra grega: Logos. Formado este do verbo legein, este se move num duplo sentido ao mesmo tempo complementar e tensional: reunir e dizer. O diá- significa dois, através de e entre" (1).
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Interdisciplinaridade poética: o entre". Rio de Janeiro: Revista Tempo Brasileiro: Interdisciplinaridade: dimensões poéticas, 164, jan.-mar., 2006, p. 27.
19
- "Dialogar essencialmente não é uniformizar, muito pelo contrário, é afirmar as diferenças, ou seja, tanto do eu como do tu. Mas só cada um afirmando-se como diferença é que eclode na sua identidade, no seu próprio. A identidade de todas as diferenças e diálogos é o entre, é o logos. Porém, no diálogo, há não apenas a comunicação, mas também o que na comunicação, o que no diálogo se comunica e dialoga. Àquilo que chamamos de informações e conhecimentos" (1).
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Interdisciplinaridade poética: o entre". Rio de Janeiro: Revista Tempo Brasileiro: Interdisciplinaridade: dimensões poéticas, 164, jan.-mar., 2006, p. 29.
20
- "O entre do diálogo é a possibilidade do diálogo como mundo, como o sentido do eu e do tu que dialogam, mas também do que no diálogo se dialoga. Esse “entre” aparece na terceira estrofe do poema Autopsicografia (de Fernando Pessoa) como entre-ter. Este, porém, surge da força que previamente nos estabelece o caminho, ao girarmos nas calhas de roda. Estas são uma imagem-questão do que chamamos de há muito e desde sempre: destino. Com ele advém o sentido profundo e ambíguo de “girar a entreter”. E aqui podemos “ler” o “entre-ter” num outro sentido mais profundo: no jogar do destino somos tidos e entre-tecidos no horizonte do “entre”: o logos abismal de todas as identidades. O que no diálogo se entretece é o que somos como mundo, não aquele em que já estamos lançados, mas o que no entretecer se tece como aprender e ensinar, ou seja, como o que devemos tecer na teia da vida, isto é, ser o que já desde sempre somos (destino)" (1).
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Interdisciplinaridade poética: o entre". Rio de Janeiro: Revista Tempo Brasileiro: Interdisciplinaridade: dimensões poéticas, 164, jan.-mar., 2006, p. 30.
21
- "No questionar e dialogar vigora não a medida da razão, mas a vigência sempre nova da memória. Porque memória não é o jogo marcado da lembrança versus esquecimento. É mais: é a vigência da unidade do que foi, é e será. Seres do tempo e no tempo, temos que assumir a sua vigência em nós como memória, dentro da qual vivemos a aventura feliz do saber e do não-saber" (1).
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Fundar e fundamentar". In: ------. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 103.
22
- " - Uma cultura livre de amarras pode fazer a diferença entre guerra e paz, democracia e ditadura?
- " - Não exatamente. Podemos ter países onde a cultura é sofisticada e rica, mas o regime político é belicista e criminoso. A cultura é uma forma de resiliência para as pessoas. Ela sobrevive nos momentos mais difíceis e trágicos da humanidade. Nesse mundo onde há um espaço global, a cultura é uma das raras formas de diálogo. Defendemos uma cultura de pluralidade e inclusão dos diversos segmentos da sociedade " (1).
- Referência:
- Entrevista de Audrey Azoulay a Ruth de Aquino. In: O Globo, sábado, 16-11-2019, p. 26.
- Observação: Audrey Azoulay é Diretora-Geral da UNESCO.
23
- "Devemos concluir que a pergunta é um exercício do perguntador como sujeito da pergunta e do outro como objeto da pergunta, enquanto ambos são exercidos no horizonte do ser ilimitado" (1).
- Deve ficar claro que as posições podem se inverter e então teremos o verdadeiro diálogo. Por isso, o ser ilimitado é a referência que funda o diálogo.
- Referência:
- (1) HUMMES, o.f.m. Frei Cláudio. Metafísica. Mimeo. Daltro Filho / Imigrantes, RS, 1963. Depois tornou-se Bispo e hoje é Cardeal.
24
- "Como deixar o mito falar? É necessário pôr tudo que conhecemos em suspenso e ter a coragem de ouvir o mito. Deixemos advir o silêncio e escutemos. Façamos uma leitura de escuta do que esse mito diz. Minha escuta, a seguir transcrita, não necessariamente será, e é bom que não seja, a do leitor. Vamos ter algo em comum, mas também algo diferente. Os dois aspectos são importantes porque só então pode haver diálogo, pois só há diálogo onde convivem as diferenças na identidade do acontecer da linguagem, fonte de todo sentido" (1).
- Referência bibliográfica:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O mito de Midas da morte ou do ser feliz". In: -------. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 188.
25
- "Dialogar, no sentido comunicativo, para nós, é esperar uma confirmação. Quando há o desacordo ficamos um pouco desarmados e in-conformados. Dá-se uma não-forma do que já antes prevíamos como forma de resposta. Isso não é diálogo, mas monólogo a dois e, em geral, decorre de que somos educados para sistemas prontos, com respostas prontas e não para o inesperado da vida, do destino, do extraordinário no ordinário de todo dia"(1).
- Referência bibliográfica:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O mito de Midas da morte ou do ser feliz". In: -------. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 196.
26
- "Essencialmente, diálogo é espera e escuta" (1).
- Referência bibliográfica:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O mito de Midas da morte ou do ser feliz". In: -------. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 196.
27
- "Podemos notar que, no infinitivo, tempo e linguagem coincidem e são manifestações da poiesis da physis/ser. É necessário começar a pensar a gramática do ponto de vista da linguagem/tempo e não o tempo/linguagem do ponto de vista da gramática. Por outro lado, a tensão entre infinitivo e finitos, o presentificado, o presentificante, o presentificável, é que é o horizonte de nossa identidade. E esta se dá como diá-logo, na medida em que este implica tanto o plano do ente como o plano do ser. Porém, de novo, não é porque falamos que construímos o diálogo, mas porque já somos diálogo é que podemos falar. Uma fala que não pressupõe ouvinte, nem que seja como ausente, é impossível" (1). É claro que não podemos esquecer o auto-diálogo, onde o ouvinte somos nós mesmos.
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. Linguagem: nosso maior bem. Série Aulas Inaugurais. Faculdade de Letras, UFRJ, 2o. sem. / 2004, p. 23.
28
- "........................
- A vida é a arte do encontro
- Embora haja tanto desencontro pela vida.
- .......................................
- Referência:
- Samba da Bênção. Autor: Vinicius de Moraes.
29
- há um diálogo
- que acontece dentro de você
- ouça com muito cuidado
- o que seu universo interno
- está tentando dizer (1)
- Referência:
- (1) KAUR, rupi. meu corpo / minha casa. Trad. Ana Guadalupe. São Paulo: Editora Planeta, 2020, p. 156.
30
- "O diálogo originariamente é o um concretizado no corpo-mulher de Céu e Terra e, ao mesmo tempo, se manifestando como multiplicidade, o fundamento do social, o eu da mulher-corpo e o filho criança que é e não é a mãe" (1).
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Poético-ecologia". In: Arte: corpo, mundo e terra. CASTRO, Manuel Antônio de (org.). Rio de Janeiro: 7Letras, 2009, p. 20.