Poético
De Dicionrio de Potica e Pensamento
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- | : A [[ideia]] de [[autor]] propalada desde a [[Modernidade]] é | + | : A [[ideia]] de [[autor]] propalada desde a [[Modernidade]] é falha porque não se abre para o [[acontecer]] da [[realidade]], entendendo esta como o que [[vigora]]. Se a denominamos, [[sempre]] impropriamente, de [[imaginação]], [[silêncio]], [[vazio]], [[nada criativo]], é porque como [[finitos]] temos [[sempre]] de nos mover no [[limite]]. Porém, o que nos caracteriza é justamente não ficarmos determinados pela [[finitude]]. [[Criar]] [[mesmo]] nunca criamos, não somos [[autores]] de [[nada]], mas [[acontece]] em nós o advir ao [[sentido]] a [[própria]] [[realidade]], o [[vazio]] de que nos fala o [[pensador]]. Mover-se na autoria é ainda ficar restrito à [[entificação]] [[subjetiva]]. Mas sem [[ser]] não há [[ente]]. Deve haver [[dialética]] [[entre]] [[língua]] e [[linguagem]], [[entre]] [[silêncio]] e [[fala]]. O oleiro faz a jarra com o que a [[realidade]] lhe oferece, mas quem lhe dá [[sentido]] e acolhimento é o [[vazio]]. O [[poético]] é isso e é [[essencialmente]] [[dialético]]. |
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- | : O [[poético]] é a tentativa mais [[radical]] de livrar-se da [[terminologia]] [[metafísica]] atributiva e [[libertar]] cada vivente para a [[luz]] matinal do [[instante]] [[poético]] em que nos compreendemos já vivendo. O [[poético]] é a [[paixão]] de [[Viver]] e seu [[sentido]], [[sempre]] novo, [[sempre]] [[inaugural]], [[sempre]] desafiante, para [[ser]] experienciado e jamais reduzido a mero [[jogo]] [[retórico]]- | + | : O [[poético]] é a tentativa mais [[radical]] de livrar-se da [[terminologia]] [[metafísica]] atributiva e [[libertar]] cada vivente para a [[luz]] matinal do [[instante]] [[poético]] em que nos compreendemos já vivendo. O [[poético]] é a [[paixão]] de [[Viver]] e seu [[sentido]], [[sempre]] novo, [[sempre]] [[inaugural]], [[sempre]] desafiante, para [[ser]] experienciado e jamais reduzido a mero [[jogo]] [[retórico]]-expressivo de [[palavras]] midiáticas. A [[mídia]] e seus meios expressivos são a [[metafísica]] atributiva da [[linguagem]]. Nela, [[linguagem]] se reduz a [[meio]]. Os [[lugares-comuns]] da [[língua]] e sua [[lógica]] coerente são o sepulcro [[metafísico]] da ''[[poiesis]]'', encoberto pelas camadas de cinza multi-seculares do jargão dominante da [[metafísica]] [[lógica]]. O [[poder]] [[verbal]] da [[palavra]] é a [[possibilidade]] de todo [[poético]] e o que ele implica [[sempre]] de [[inesperado]], porque ele é a [[verdade]] acontecendo enquanto [[desvelamento]] e [[velamento]], casa da [[linguagem]] e [[cuidado]] da [[concretização]] do [[humano]]. |
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- | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Eduardo Portella, o [[professor]]". In: | + | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de.''' "Eduardo Portella, o [[professor]]". In: Quatro vezes vinte - Eduardo Portella - Depoimentos. Rio de Janeiro, Academia Brasileira de Letras, 2012, p. 39.''' |
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: "Pois o '[[poético]]' parece pertencer, quanto ao seu [[valor]] [[poético]], ao reino da [[fantasia]]. O [[habitar]] [[poético]] sobrevoa fantasticamente o [[real]]. O [[poeta]] faz face a esse temor e diz, com propriedade, que o [[habitar]] [[poético]] é o [[habitar]] 'esta [[terra]]'. Assim, Hölderlin não somente protege o [[poético]] contra sua incompreensão usual corriqueira mas, acrescentando as [[palavras]] 'esta [[terra]]', remete para o [[vigor]] [[essencial]] da [[poesia]]. A [[poesia]] não sobrevoa e nem se eleva sobre a [[terra]] a fim de abandoná-la e pairar sobre ela. É a [[poesia]] que traz o [[homem]] para a [[terra]], para ela, e assim o traz para um [[habitar]]" (1). | : "Pois o '[[poético]]' parece pertencer, quanto ao seu [[valor]] [[poético]], ao reino da [[fantasia]]. O [[habitar]] [[poético]] sobrevoa fantasticamente o [[real]]. O [[poeta]] faz face a esse temor e diz, com propriedade, que o [[habitar]] [[poético]] é o [[habitar]] 'esta [[terra]]'. Assim, Hölderlin não somente protege o [[poético]] contra sua incompreensão usual corriqueira mas, acrescentando as [[palavras]] 'esta [[terra]]', remete para o [[vigor]] [[essencial]] da [[poesia]]. A [[poesia]] não sobrevoa e nem se eleva sobre a [[terra]] a fim de abandoná-la e pairar sobre ela. É a [[poesia]] que traz o [[homem]] para a [[terra]], para ela, e assim o traz para um [[habitar]]" (1). | ||
- | : Esta passagem do [[pensador]] [[Heidegger]] é extremamente importante, porque desfaz completamente a [[falsa]] [[noção]] de [[ficção]], atribuída a | + | : Esta passagem do [[pensador]] [[Heidegger]] é extremamente importante, porque desfaz completamente a [[falsa]] [[noção]] de [[ficção]], atribuída a toda [[literatura]]. É [[necessário]], certamente, repensar tanto a [[noção]] corrente de [[ficção]], bem como de [[fantasia]], quanto o que se entende por [[real]] e [[realidade]]. |
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- | : (1) [[HEIDEGGER]], Martin. "...[[poeticamente]] o [[homem]] [[habita]]...". Trad. Márcia Sá Cavalcante Schuback. In: ------. | + | : (1) [[HEIDEGGER]], Martin.''' "...[[poeticamente]] o [[homem]] [[habita]]...". Trad. Márcia Sá Cavalcante Schuback. In: ------. [[Ensaios]] e conferências. Petrópolis, Vozes, 2002, p. 169.''' |
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- | : (1) [[HEIDEGGER]], Martin. "Qu'est-ce que la metaphysique". In: | + | : (1) [[HEIDEGGER]], Martin.''' "Qu'est-ce que la metaphysique". In: Questions I. Paris: Gallimard, 1968, p. 83.''' |
- | : (2) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ulisses e a Escuta do Canto das | + | : (2) CASTRO, Manuel Antônio de.''' "[[Ulisses]] e a [[Escuta]] do [[Canto]] das [[Sereias]]”. In: -----. [[Arte]]: o [[humano]] e o [[destino]]. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 155.''' |
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- | : "A [[ideia]] de [[verdade]] enquanto correção é [[moderna]]. Diga-se logo que todo grande [[escritor]] reinventa a [[língua]], pois esta é [[algo]] vivo, pulsante, em [[realização]] incessante. A [[gramática]] é a [[morte]] [[lógica]] e sistêmica da [[língua]] viva, [[poética]]. Tal ensino é muito bom para a [[comunicação]], algo [[formal]], [[funcional]], sistêmico, [[retórico]], | + | : "A [[ideia]] de [[verdade]] enquanto correção é [[moderna]]. Diga-se logo que todo grande [[escritor]] reinventa a [[língua]], pois esta é [[algo]] vivo, pulsante, em [[realização]] incessante. A [[gramática]] é a [[morte]] [[lógica]] e sistêmica da [[língua]] viva, [[poética]]. Tal ensino é muito bom para a [[comunicação]], algo [[formal]], [[funcional]], sistêmico, [[retórico]], sofístico, prático. Claro, numa [[sociedade]] [[funcional]], [[retórica]] e utilitarista como a nossa isso se torna decisivo, pois torna seu detentor eficiente, a [[palavra]] mágica para a boa instrução. Mas é aí justamente que morre e se enterra o [[poético]] por debaixo de camadas de cinza do [[falar]] empobrecedor [[comunicativo]]. Hoje a [[comunicação]] é a [[banalização]] da [[língua]] viva e [[poética]]" (1). |
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- | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "[[Leitura]] e [[Crítica]]". In: ---------. | + | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de.''' "[[Leitura]] e [[Crítica]]". In: ---------. [[Leitura]]: [[questões]]. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2015, p. 127.''' |
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- | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "[[Leitura]] e [[Crítica]]". In: ---------. | + | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de.''' "[[Leitura]] e [[Crítica]]". In: ---------. [[Leitura]]: [[questões]]. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2015, p. 131.''' |
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- | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Poético-ecologia". In: | + | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de.''' "[[Poético]]-[[ecologia]]". In: [[Arte]]: [[corpo]], [[mundo]] e [[terra]]. CASTRO, Manuel Antônio de (org.). Rio de Janeiro: 7Letras, 2009, p. 20.''' |
Edição atual tal como 20h20min de 10 de março de 2025
1
- "Admitir a polifonia é admitir visão e escuta em uma dinâmica de superposição. A textura histórica das artes, ou não, reproduz a textura do modo de se dar o real. Em qualquer dimensão, mas em especial na dimensão do poético, o decisivo é que não há superação histórica. A rigor não se pode afirmar a superação de nada no âmbito do poético. O que numa primeira instância pode aparecer como superação, pode ser na verdade uma superposição em que alguma coisa] esteja momentaneamente oculta e não superada"(1).
- Referência:
2
- O poético é a incessante reinvenção do cotidiano. Por isso o poético é a ação se fazendo linguagem, o ser se dando, sendo tempo, presenteando-se. O cotidiano não é o cronológico de um agora. É o presente do que não cessa de se inaugurar. E toda inauguração é sempre inauguração do mesmo, o que é o contrário da repetição da mesma coisa. O mesmo é o poético vigorando. É o extraordinário do ordinário, a face sempre nova da realidade na realização do instante, porque o instante é o presentificar-se do que é. O poético é. É enquanto se pensa. E pensando-se dimensiona-se o político pelo ético. O político é o ético do poético.
3
- O poético, em termos de realidade e essência do humano, é sempre o diferente, sendo o nada criativo a sua identidade. Desse modo as novas grandes obras de arte operam num círculo poético.
4
- Feitos por Cura, temos que fazer de nossas pro-curas o cuidar poético do que somos e não somos. Mas só seremos radicalmente poéticos se ao cuidar do que nos é próprio, este cuidar não for qualquer cuidar, mas um cuidar poético, onde o que o move como permanência e atualidade é o vigorar do amar. E há algo mais poético, permanente e atual que o Amar? Quando afirmamos que no princípio era a Poética queremos dizer e mostrar que no princípio era o amar: o ser humano consumando o que é.
5
- A ideia de autor propalada desde a Modernidade é falha porque não se abre para o acontecer da realidade, entendendo esta como o que vigora. Se a denominamos, sempre impropriamente, de imaginação, silêncio, vazio, nada criativo, é porque como finitos temos sempre de nos mover no limite. Porém, o que nos caracteriza é justamente não ficarmos determinados pela finitude. Criar mesmo nunca criamos, não somos autores de nada, mas acontece em nós o advir ao sentido a própria realidade, o vazio de que nos fala o pensador. Mover-se na autoria é ainda ficar restrito à entificação subjetiva. Mas sem ser não há ente. Deve haver dialética entre língua e linguagem, entre silêncio e fala. O oleiro faz a jarra com o que a realidade lhe oferece, mas quem lhe dá sentido e acolhimento é o vazio. O poético é isso e é essencialmente dialético.
6
- Então o poético consiste sempre no mergulho no que somos como projeto e destino enigmático de realização. Isso é o poético, onde o conhecer não se torna epistemológico, mas ontológico, porque o essencial não é conhecer pelo e para o estético, porém, chegar a ser o que se conhece.
7
- O poético é a tentativa mais radical de livrar-se da terminologia metafísica atributiva e libertar cada vivente para a luz matinal do instante poético em que nos compreendemos já vivendo. O poético é a paixão de Viver e seu sentido, sempre novo, sempre inaugural, sempre desafiante, para ser experienciado e jamais reduzido a mero jogo retórico-expressivo de palavras midiáticas. A mídia e seus meios expressivos são a metafísica atributiva da linguagem. Nela, linguagem se reduz a meio. Os lugares-comuns da língua e sua lógica coerente são o sepulcro metafísico da poiesis, encoberto pelas camadas de cinza multi-seculares do jargão dominante da metafísica lógica. O poder verbal da palavra é a possibilidade de todo poético e o que ele implica sempre de inesperado, porque ele é a verdade acontecendo enquanto desvelamento e velamento, casa da linguagem e cuidado da concretização do humano.
8
- "O poético diz sempre a essência do agir, não mecânico, funcional, mas realização no e pelo sentido da compreensão e compreensão do sentido. Por isso, poiesis diz a energia de sentido e compreensão" (1) .
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Época e tempo poético". In: ---------. Leitura: questões. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2015, p. 279.
9
- "E Eduardo Portella pensa em tempo integral para poder levar todo ser humano a pensar, fazendo do educar um permanente ensaio de aprendizagem do pensar, tarefa hoje cada vez mais difícil e rara, porque o midiático monta uma cena obscena, onde predomina o dispersivo, o circunstancial, o ralo e passageiro da estesia da espetáculo estético. Nessa encenação virtual, o estético é mais importante do que o poético, com a evidente perda do ético. Só o poético, num permanente ensaio de acerto e erro, de risco de perda e ganho, se funda no ético" (1).
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Eduardo Portella, o professor". In: Quatro vezes vinte - Eduardo Portella - Depoimentos. Rio de Janeiro, Academia Brasileira de Letras, 2012, p. 39.
10
- "Com isso, deixamos de lado a representação corriqueira do que seja habitar. De acordo com essa representação, habitar continua sendo simplesmente um modo do comportamento humano, dentre tantos outros. Trabalhamos na cidade e habitamos fora. Empreendemos uma viagem e habitamos ora aqui, ora ali. Nesse sentido, habitar é sempre apenas a posse de um domicílio. Quando Hölderlin fala do habitar, ele vislumbra o traço fundamental da presença humana. Ele vê o "poético" a partir da relação com esse habitar, compreendido nesse modo vigoroso e essencial" (1).
- Referência:
- (1) HEIDEGGER, Martin. "...poeticamente o homem habita...". Trad. Marcia Sá Cavalcante Schuback. In: -----. Ensaios e conferências. Tradução de Emmanuel Carneiro Leão, Gilvan Fogel, Marcia Sá Cavalcante Schuback. Petrópolis R/J: Vozes, 2001, p. 161.
11
- "Pois o 'poético' parece pertencer, quanto ao seu valor poético, ao reino da fantasia. O habitar poético sobrevoa fantasticamente o real. O poeta faz face a esse temor e diz, com propriedade, que o habitar poético é o habitar 'esta terra'. Assim, Hölderlin não somente protege o poético contra sua incompreensão usual corriqueira mas, acrescentando as palavras 'esta terra', remete para o vigor essencial da poesia. A poesia não sobrevoa e nem se eleva sobre a terra a fim de abandoná-la e pairar sobre ela. É a poesia que traz o homem para a terra, para ela, e assim o traz para um habitar" (1).
- Esta passagem do pensador Heidegger é extremamente importante, porque desfaz completamente a falsa noção de ficção, atribuída a toda literatura. É necessário, certamente, repensar tanto a noção corrente de ficção, bem como de fantasia, quanto o que se entende por real e realidade.
- Referência:
- (1) HEIDEGGER, Martin. "...poeticamente o homem habita...". Trad. Márcia Sá Cavalcante Schuback. In: ------. Ensaios e conferências. Petrópolis, Vozes, 2002, p. 169.
12
- "Na vida, entretanto, não basta sentir, é necessário ser o que se sente. Ao contrário, a poética é um enigma que se dá em uma dobra. O seu desdobrar-se é mais que estético, algo somente preso às sensações ou percepções, é poético. Só o poético vigora no e a partir da essência do agir. Eis aí a diferença radical entre estética e poética. A essência do agir vigora a partir do sentido do ser e acontece em nós quando nos abrimos para o operar do pensar" (1).
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Liberdade, vontade e uso de drogas”. In: -----. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 269.
13
- "Não é o eu ou o tu que funda o entre ou o logos, porque o logos, essencialmente, é entre-poético-ontológico. Também não há precedência de um sobre o outro, mas uma tensão concreta e poética vigorando no entre, esse entre de ser-humano (“on”) E ser (“einai”)" (1).
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Interdisciplinaridade poética: o entre". Revista Tempo Brasileiro: Rio de Janeiro: Interdisciplinaridade: dimensões poéticas, 164, jan.-mar., 2006, p. 29.
14
- "O poético diz sempre a essência do agir, não mecânico, funcional, mas realização no e pelo sentido da compreensão e compreensão do sentido. Por isso, poiesis diz a energia de sentido e compreensão" (1).
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Época e tempo poético". In: ---------. Leitura: questões. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2015, p. 279.
15
- "Só na dobra vigorante em todo ato, o sentido do ser, como sentido da linguagem, torna-se tanto mais poético quanto mais ético. Sendo o poético-ético o vigorar do ser ao dar-se como linguagem" (1).
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Liberdade, vontade e uso de drogas". In: ----. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 276.
16
- O poético diz o ditar-doar do sagrado enquanto poiesis, isto é, doar instaurador e inaugural porque originário, o narrar inerente a toda saga. Sendo instaurador-originário é energia poética, isto é, o ser-se-dando como doar. O ser-se-dando enquanto doar é tempo e silêncio e memória e linguagem e realidade.
17
- "No poético, as línguas são o rito da Linguagem. O mito narrado não é o mito, mas o rito e a língua da Linguagem. Por isso, o poético, toda arte, tem origem mítica. E tanto o mito como a arte radicam no sagrado. Martin Heidegger afirma: “O pensador diz o ser, o poeta nomeia o sagrado” (1). Nomear o sagrado eis o vigorar da palavra cantada" (2).
- Referência:
- (1) HEIDEGGER, Martin. "Qu'est-ce que la metaphysique". In: Questions I. Paris: Gallimard, 1968, p. 83.
- (2) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ulisses e a Escuta do Canto das Sereias”. In: -----. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 155.
16
- "A ideia de verdade enquanto correção é moderna. Diga-se logo que todo grande escritor reinventa a língua, pois esta é algo vivo, pulsante, em realização incessante. A gramática é a morte lógica e sistêmica da língua viva, poética. Tal ensino é muito bom para a comunicação, algo formal, funcional, sistêmico, retórico, sofístico, prático. Claro, numa sociedade funcional, retórica e utilitarista como a nossa isso se torna decisivo, pois torna seu detentor eficiente, a palavra mágica para a boa instrução. Mas é aí justamente que morre e se enterra o poético por debaixo de camadas de cinza do falar empobrecedor comunicativo. Hoje a comunicação é a banalização da língua viva e poética" (1).
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Leitura e Crítica". In: ---------. Leitura: questões. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2015, p. 127.
17
- "Qual é a essência da sabedoria? Ela estará radicalmente ligada ao poético e ético do humano. E este não pode ser ensinado, só experienciado. E isso as análises das obras de arte nunca podem conseguir. Nelas, destrói-se o poético e ético para se criar um conhecimento crítico objetivo-científico, resultante da análise crítica. A medida do real para a ciência tornou-se o calculável. O cálculo racional é a medida da tecno-ciência. O humano é sem medida calculável. A sua medida é outra. A sua medida é o poético" (1).
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Leitura e Crítica". In: ---------. Leitura: questões. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2015, p. 131.
18
- "... a ecologia como a casa da linguagem exige radicalmente o corpo Terra-Céu-Mundo originário de Eros. Isso é o poético. Eros é o poético. O poético, sendo Eros, é a energia que cinde, é a dor paixão. Por isso, a obra de arte é mundo porque é Eros e é Eros porque é mundo. Não podemos reduzir de modo algum a obra de arte a formas de linguagem. Obra de arte é corpo-mundo enquanto reunião das diferenças de Céu e Terra, de Homem e Mulher" (1).
- Referência: