Aprendizagem

De Dicionrio de Potica e Pensamento

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:O aprendizado, em sua forma de substantivo, formado do particípio verbal passado, já diz o resultado ou processo de algo feito, em que predomina o aspecto passivo até certo ponto. Ele indica uma certa receptividade. O aprendizado é inerente ao “como” enquanto como configurado numa estrutura, numa formatação e numa doutrinação. Daí a correlação entre docere e discere, entre docente e discente. Isso é expresso em grego pelo verbo “mantano”. Dá-se ai o “como” enquanto padrão comportamental. Ocorre que o que modula a inter-relação e interação da unidade/ente e meio é a plasticidade não de dependência, mas de uma adequação convivencial onde predomina sempre a unidade e é neste predomínio que consiste a plasticidade autopoética da unidade/ente. A essa plasticidade autopoética é que podemos chamar “aprendizagem”, mas cuja medida não vem da unidade/ente em-si. Só há aprendizagem quando a plasticidade se torna um corresponder ao apelo do sentido do logos, do ser. A plasticidade é um figurar e diz respeito ao corpo enquanto mundo e terra. A aprendizagem não é um aprender de fora, mas o apropriar-se do que é proprio. Então, em sentido próprio, só se aprende a partir do que já sabemos e somos. Esse é o sentido mais radical de "mantano". O aprendizado da [[matemática]] não nos vem pelo ensino de um outro, mas é já uma possibilidade que temos e de que devemos nos apropriar.
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: O [[aprendizado]], em sua [[forma]] de substantivo, formado do particípio verbal [[passado]], já diz o resultado ou [[processo]] de [[algo]] feito, em que predomina o aspecto passivo até certo ponto. Ele indica uma certa receptividade. O [[aprendizado]] é inerente ao "como" enquanto como configurado numa [[estrutura]], numa formatação e numa doutrinação. Daí a correlação entre ''docere'' (ensinar) e ''discere'' (aprender), isto é, [[entre]] docente, aquele que ensina, e discente, aquele que aprende. Isso é expresso em [[grego]] pelo [[verbo]] ''[[mantháno]]''. Dá-se o "como" enquanto padrão comportamental. Ocorre que o que modula a inter-relação e [[interação]] da [[unidade]]/[[ente]] e o meio é a plasticidade não de dependência, mas de uma [[adequação]] convivencial onde predomina [[sempre]] a [[unidade]]; e é neste predomínio que consiste a plasticidade autopoética da [[unidade]]/[[ente]]. A esta plasticidade autopoética é que podemos chamar "[[aprendizagem]]", mas cuja medida não vem da [[unidade]]/[[ente]] em-si. Só há [[aprendizagem]] quando a plasticidade se torna um corresponder ao apelo do [[sentido]] do ''[[lógos]]'', do [[ser]]. A plasticidade é um [[figurar]] e diz respeito ao [[corpo]] enquanto [[mundo]] e [[terra]]. A [[aprendizagem]] não é um [[aprender]] de fora, mas o [[apropriar-se]] do que é [[próprio]]. Então, em sentido próprio, só se aprende a partir do que já sabemos e somos. Este é o [[sentido]] mais radical de ''[[mantháno]]''. O [[aprendizado]] da [[matemática]] não nos vem pelo ensino de um [[outro]], mas é já uma [[possibilidade]] que temos e de que devemos nos [[apropriar]].
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: - [[Manuel Antônio de Castro]]
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*[[Matemática]]
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: *[[Sendo]]
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: *[[Desabrochar]]
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: *[[Próprio]]
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: Toda [[pergunta]] surge do exercício do [[questionar]]. A [[pergunta]] pode exercer-se em dois [[horizontes]]: o do [[pensamento]] e o do [[conhecimento]]. Quando se pergunta para [[conhecer]], procura-se uma [[resposta]] que aumente o [[conhecimento]] e nos traga mais [[informações]] sobre o objeto da pergunta. E aí a resposta desfaz a pergunta. Tal pergunta surge quando nos dedicamos ao estudo e nos conduz a um [[aprendizado]]. Quando se pergunta para [[pensar]], a resposta, em vez de me trazer um conhecimento, reinstala a [[questão]], que originou a pergunta, em outro nível, como se desse um passo para reintalar não mais [[saber]], mas o [[não-saber]]. Esse é o exercício da [[aprendizagem]] do [[aprender]] a pensar. O aprender a pensar é aquele questionar que nos liberta para o [[desaprender]]. Nesse nível todo desaprender é em essência sempre uma [[renúncia]], onde esta não tira, dá, porque liberta para ser sem a prisão de algo que já sabemos e não somos. Ser é ser sem [[limites]] e sem [[estar]] preso a algo.
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: - [[Manuel Antônio de Castro]].
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:"Há tempo renunciamos à condição de sermos aprendizes do [[pensamento]]. Ser aprendiz do pensamento significa deixar-se recolher e acolher-se pela aprendizagem. É estar atento ao vislumbre de [[revelações]] gestadas em espera. Ser aprendiz do pensamento deve ressoar como abertura, como [[celebração]] da [[vida]]. Doação ao entreaberto de cada descoberta, ser aprendiz do pensamento é, portanto, estar além do [[conhecimento]] alcançado pela [[funcionalidade]]" (1).
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: (1) FILIPPOVNA, Veronica. O pensamento poético de Eduardo Portella. In: ''Revista Tempo Brasileiro'', Rio de Janeiro, 191: 131, out-dez., 2012.
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: Muito [[estudar]] é [[poder]] muito [[aprender]], mas não é pelo muito [[aprender]] que advém a [[aprendizagem]]. A [[aprendizagem]] é um contínuo [[aprender]] a [[aprender]], ou seja, [[aprender]] a  [[ser]] o que já se [[é]] e recebeu para [[ser]].
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: - [[Manuel Antônio de Castro]]
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: Para a [[ciência]], a [[sabedoria]] pode ser [[loucura]] e a aprendizagem algo com o qual nada se faz, isto é, [[inútil]]. Na ordem da ciência, a falta de bens e [[cultura]] pode ser indigência e na [[dimensão]] do humano a falta de cultura e bens pode ser [[renúncia]] para a aprendizagem. Porque a renúncia não tira, dá. Pois o silêncio não é a falta de [[voz]] da [[poesia]] e o som não é a falta de [[música]], mas a sua plenitude.
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: - [[Manuel Antônio de Castro]]
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: "A [[medida]] do [[entre]] tanto é a [[vida]] quanto é a [[morte]]. Na medida está o [[sentido]], no [[sentido]] está a [[medida]]. Toda [[procura]], no fundo, é sempre a [[procura]] do [[sentir]] do [[sentido]]. É justamente isso que denomino aqui [[experienciação]] e não (jamais!) [[experiência]]. Toda [[procura]] advém sempre enquanto [[experienciação]]. Todo [[conceito]] advém sempre enquanto [[experiência]]. É por isso que posso dizer que “Fulano é experiente no fazer artefatos de madeira, de barro, em dar aula etc”. Todavia, jamais posso dizer que alguém é experiente na [[experienciação]] de morrer. Das [[experiências]] surge um [[aprendizado]], passível de ser ensinado, porque é um [[saber]] baseado em [[conceitos]], por exemplo, um carpinteiro que ensina o aprendiz a [[fazer]] móveis. Das experienciações surge uma aprendizagem, algo absolutamente pessoal e impossível de ser ensinado, porque não é redutível aos [[conceitos]]. A aprendizagem é experienciação das [[questões]]" (1).
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O mito de Cura e o ser humano". In: ''Arte: o humano e o destino''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 215.
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: "Alberto Caieiro, o poeta-pensador, já o disse poeticamente:
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    "Mas isto (tristes de nós que trazemos a [[alma]] vestida!),
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    Isso exige um estudo profundo,
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    Uma '''[[aprendizagem]] de [[desaprender]]''' . (Poema XXIV)
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    Procuro esquecer-me do modo de lembrar que me ensinaram,
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: Isso é [[enigmático]] porque devemos [[aprender]] para [[desaprender]], [[ter]] para [[renunciar]], porque só renunciando chegamos a [[ser]] o que temos, porque só podemos [[ter]] o  que somos e só podemos [[ser]] o que temos. Portanto, não há uma incompatibilidade [[entre]] [[ter]] e [[ser]]. Entra aí uma terceira [[dimensão]] nesse [[jogo]] dialético [[entre]] [[ter]] e [[ser]], e [[ser]] e [[ter]]: o [[desprendimento]], a [[renúncia]], porque a [[renúncia]] não tira, dá. Nesse [[jogo]] [[dialético]] se torna também claro o [[jogo]] [[entre]] [[identidade]] e [[diferença]]. A [[identidade]] nos remete para o [[horizonte]] do [[fundar]], do [[ser]], do [[nada]]. Já a [[diferença]] nos mostra em que consiste o [[próprio]], (ter), que só o [[nada]], (ser), pode [[fundar]]. Enfim, toda [[aprendizagem]] é um [[desaprender]].
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: [[Manuel Antônio de Castro]].
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: (1) PESSOA, Fernando. ''Alberto Caeiro''. S. Paulo: Cia. das Letras, 2004, p. 60, 84.
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: "A primeira [[forma]] de [[meditação]] do desenvolvimento da tranquilidade, ou [[meditação]] sentada, diminui ou aquieta o turbilhão de [[pensamentos]]. Ao final de um certo [[tempo]] de [[prática]], o [[espírito]] começa a se instalar naturalmente num estado de repouso, que nos permite ficar plenamente presentes à nossa [[vida]]. Logo que nós não somos arrastados para o [[passado]] ou o [[futuro]], nós podemos nos acalmar e começar a [[viver]] verdadeiramente o [[momento]] [[presente]].
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: A [[meditação]] nos ajuda  também a conseguir duas outras [[formas]] de [[aprendizagem]]: a [[disciplina]] e o [[conhecimento]] superior. Os três repousam sobre nossa capacidade de nos concentrarmos sobre nosso [[caminho]], e ver claramente o que estamos fazendo e a [[compreender]] porque o fazemos. Nós praticamos estas três [[aprendizagens]] em conjunto a fim de podermos nos [[libertar]] dos esquemas habituais e das falsas [[concepções]] que causam e perpetuam nosso [[sofrimento]]" (1).
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: (1) PANLOP RINPOCHÉ, Dzogehen. "Apêndice I - Instruções para a prática da meditação", p. 339. In: ------. ''Buda rebelde - sobre o caminho da libertação''.Traduzido do americano por Philippe Delamare. Marabout. Belfon, um Departamento de Place des éditeurs, 2012, para a tradução francesa. Tradução do francês para o português de Manuel Antônio de Castro.
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: "Como chamavam os gregos o movimento de [[ensinar]] e [[aprender]]? Chamavam com um só radical: ''[[mantháno]]''. Assim, ''máthesis'' é o [[ensino]] e a [[aprendizagem]], tanto no [[sentido]] do que é aprendido e ensinado como no [[sentido]] do processo de [[ensinar]] e [[aprender]]. ''Mathémata'', o que pode ser ensinado e o que pode ser aprendido; e ''mathetés'', o [[aluno]], aquele que ensina aprendendo; o [[professor]], aquele que aprende ensinando" (1).
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: (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Aprender e ensinar". In: ------. ''Aprendendo a pensar''. Petrópolis/RJ: Vozes, 1977, p. 46.
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: "Os [[conceitos]] geram um [[conhecer]] passível de [[aprendizado]]. As [[questões]], quando [[experienciadas]] por cada um, [[produzem]] um [[saber]] como [[aprendizagem]] (o que não pode ser ensinado)" (1).
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:  (1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Heidegger e as questões da arte”. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). ''Arte em questão: as questões da arte''. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 15.
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: "No ''Agamêmnon'', de [[Esquilo]], há uma passagem em que o ancião, em [[diálogo]] com o coro, enuncia o modo como [[Zeus]] estipulou que se dê a [[aprendizagem]] dos [[mortais]]. Diz ele que a [[aprendizagem]] deve se dar pelo ''[[páthei máthos]]'' (verso 212), expressão que traduziríamos por "[[aprendizagem]] (''[[máthos]]'') pela [[experiência]] da [[dor]] (''[[páthei]]'')" (1).
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: FERRRAZ, Antônio Máximo. "O trágico como dança de vida e morte". In: In: FAGUNDES, Igor e OUTROS (Org.). ''Entre Pares - Partilhas em Dança & Outros Movimentos''. Guaratinguetá/SP: Penalux, 2019, p. 86.
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: "A fórmula ''[[páthei máthos]]'' fala não do [[aprendizado]] [[abstrato]] da [[lógica]], mas da [[aprendizagem]] [[concreta]], pela [[dor]], da [[liminaridade]] da [[existência]] [[humana]], lançada, em [[razão]] do [[devir]] [[temporal]], na [[dança]] [[entre]] [[Vida]] e [[Morte]]" (1).
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: FERRRAZ, Antônio Máximo. "O trágico como dança de vida e morte". In: In: FAGUNDES, Igor e OUTROS (Org.). ''Entre Pares - Partilhas em Dança & Outros Movimentos''. Guaratinguetá/SP: Penalux, 2019, p. 87.
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: "Mas, quando chegou a vez da [[invenção]] da [[escrita]], exclamou [[Thoth]]: ''Eis, oh Rei, uma [[arte]] que tornará os [[egípcios]] mais [[sábios]] e os ajudará a fortalecer a [[memória]], pois com a [[escrita]] descobri o remédio para a [[memória]]''. ''- Oh, [[Thoth]], [[mestre]] incomparável, uma coisa é  [[inventar]] uma [[arte]], outra [[julgar]] os benefícios ou prejuízos que dela advirão para os [[outros]]! Tu, neste [[momento]] e como [[inventor]] da [[escrita]], esperas dela, e com [[entusiasmo]], todo o contrário do que ela pode vir a [[fazer]]! Ela tornará os [[homens]] mais esquecidos, pois que, sabendo [[escrever]], deixarão de exercitar a [[memória]], confiando apenas nas  [[escrituras]], e só se lembrarão de um [[assunto]] por força de [[motivos]] [[exteriores]], por meio de [[sinais]], e não dos [[assuntos]] em si mesmos. Por isso, não  inventaste um [[remédio]] para a [[memória]], mas, sim, para a [[rememoração]]. Quanto à [[transmissão]] do [[ensino]], transmites aos teus [[alunos]] não a [[sabedoria]] em si mesma, mas apenas uma [[aparência]] de [[sabedoria]], pois passarão a [[receber]] uma grande soma de [[informações]] sem a  respectiva [[educação]]! Hão-de [[parecer]] [[homens]] de [[saber]], embora não passem de [[ignorantes]] em muitas [[matérias]] e tornar-se-ão, por consequência, [[sábios]] [[imaginários]], em vez de [[sábios]] [[verdadeiros]]'' " (1).
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: Referência:
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: (1) PLATÃO. ''Fedro''. 5. e. Trad. Pinharanda Gomes. Texto grego estabelecido por Léon Robin, Paris, ''Les Belles Lettres'', 1966.  Lisboa: Guimarães Editores, 1994, p. 121, 274e.
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: "Os [[conceitos]] geram um [[conhecer]] passível de [[aprendizado]]. As [[questões]], quando experienciadas por cada um, produzem um [[saber]] como [[aprendizagem]] (o que não pode ser ensinado)" (1).
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: Referência:
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:  (1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Heidegger e as questões da arte”. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). ''Arte em questão: as questões da arte''. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 15.

Edição atual tal como 22h26min de 15 de Outubro de 2022

1

O aprendizado, em sua forma de substantivo, formado do particípio verbal passado, já diz o resultado ou processo de algo feito, em que predomina o aspecto passivo até certo ponto. Ele indica uma certa receptividade. O aprendizado é inerente ao "como" enquanto como configurado numa estrutura, numa formatação e numa doutrinação. Daí a correlação entre docere (ensinar) e discere (aprender), isto é, entre docente, aquele que ensina, e discente, aquele que aprende. Isso é expresso em grego pelo verbo mantháno. Dá-se aí o "como" enquanto padrão comportamental. Ocorre que o que modula a inter-relação e interação da unidade/ente e o meio é a plasticidade não de dependência, mas de uma adequação convivencial onde predomina sempre a unidade; e é neste predomínio que consiste a plasticidade autopoética da unidade/ente. A esta plasticidade autopoética é que podemos chamar "aprendizagem", mas cuja medida não vem da unidade/ente em-si. Só há aprendizagem quando a plasticidade se torna um corresponder ao apelo do sentido do lógos, do ser. A plasticidade é um figurar e diz respeito ao corpo enquanto mundo e terra. A aprendizagem não é um aprender de fora, mas o apropriar-se do que é próprio. Então, em sentido próprio, só se aprende a partir do que já sabemos e somos. Este é o sentido mais radical de mantháno. O aprendizado da matemática não nos vem pelo ensino de um outro, mas é já uma possibilidade que temos e de que devemos nos apropriar.


- Manuel Antônio de Castro


Ver também:
*Sendo
*Desabrochar
*Próprio

2

Toda pergunta surge do exercício do questionar. A pergunta pode exercer-se em dois horizontes: o do pensamento e o do conhecimento. Quando se pergunta para conhecer, procura-se uma resposta que aumente o conhecimento e nos traga mais informações sobre o objeto da pergunta. E aí a resposta desfaz a pergunta. Tal pergunta surge quando nos dedicamos ao estudo e nos conduz a um aprendizado. Quando se pergunta para pensar, a resposta, em vez de me trazer um conhecimento, reinstala a questão, que originou a pergunta, em outro nível, como se desse um passo para reintalar não mais saber, mas o não-saber. Esse é o exercício da aprendizagem do aprender a pensar. O aprender a pensar é aquele questionar que nos liberta para o desaprender. Nesse nível todo desaprender é em essência sempre uma renúncia, onde esta não tira, dá, porque liberta para ser sem a prisão de algo que já sabemos e não somos. Ser é ser sem limites e sem estar preso a algo.


- Manuel Antônio de Castro.

3

"Há tempo renunciamos à condição de sermos aprendizes do pensamento. Ser aprendiz do pensamento significa deixar-se recolher e acolher-se pela aprendizagem. É estar atento ao vislumbre de revelações gestadas em espera. Ser aprendiz do pensamento deve ressoar como abertura, como celebração da vida. Doação ao entreaberto de cada descoberta, ser aprendiz do pensamento é, portanto, estar além do conhecimento alcançado pela funcionalidade" (1).
Referência:
(1) FILIPPOVNA, Veronica. O pensamento poético de Eduardo Portella. In: Revista Tempo Brasileiro, Rio de Janeiro, 191: 131, out-dez., 2012.


4

Muito estudar é poder muito aprender, mas não é pelo muito aprender que advém a aprendizagem. A aprendizagem é um contínuo aprender a aprender, ou seja, aprender a ser o que já se é e recebeu para ser.


- Manuel Antônio de Castro

5

Para a ciência, a sabedoria pode ser loucura e a aprendizagem algo com o qual nada se faz, isto é, inútil. Na ordem da ciência, a falta de bens e cultura pode ser indigência e na dimensão do humano a falta de cultura e bens pode ser renúncia para a aprendizagem. Porque a renúncia não tira, dá. Pois o silêncio não é a falta de voz da poesia e o som não é a falta de música, mas a sua plenitude.


- Manuel Antônio de Castro


6

"A medida do entre tanto é a vida quanto é a morte. Na medida está o sentido, no sentido está a medida. Toda procura, no fundo, é sempre a procura do sentir do sentido. É justamente isso que denomino aqui experienciação e não (jamais!) experiência. Toda procura advém sempre enquanto experienciação. Todo conceito advém sempre enquanto experiência. É por isso que posso dizer que “Fulano é experiente no fazer artefatos de madeira, de barro, em dar aula etc”. Todavia, jamais posso dizer que alguém é experiente na experienciação de morrer. Das experiências surge um aprendizado, passível de ser ensinado, porque é um saber baseado em conceitos, por exemplo, um carpinteiro que ensina o aprendiz a fazer móveis. Das experienciações surge uma aprendizagem, algo absolutamente pessoal e impossível de ser ensinado, porque não é redutível aos conceitos. A aprendizagem é experienciação das questões" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O mito de Cura e o ser humano". In: Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 215.


7

"Alberto Caieiro, o poeta-pensador, já o disse poeticamente:
    "Mas isto (tristes de nós que trazemos a alma vestida!),
    Isso exige um estudo profundo,
    Uma aprendizagem de desaprender . (Poema XXIV)
    Procuro despir-me do que aprendi,:
    Procuro esquecer-me do modo de lembrar que me ensinaram,
    E raspar a tinta com que me pintaram os sentidos ... (Poema XLVI)" (1)

´

Isso é enigmático porque devemos aprender para desaprender, ter para renunciar, porque só renunciando chegamos a ser o que temos, porque só podemos ter o que somos e só podemos ser o que temos. Portanto, não há uma incompatibilidade entre ter e ser. Entra aí uma terceira dimensão nesse jogo dialético entre ter e ser, e ser e ter: o desprendimento, a renúncia, porque a renúncia não tira, dá. Nesse jogo dialético se torna também claro o jogo entre identidade e diferença. A identidade nos remete para o horizonte do fundar, do ser, do nada. Já a diferença nos mostra em que consiste o próprio, (ter), que só o nada, (ser), pode fundar. Enfim, toda aprendizagem é um desaprender.
Manuel Antônio de Castro.


Referência:
(1) PESSOA, Fernando. Alberto Caeiro. S. Paulo: Cia. das Letras, 2004, p. 60, 84.


8

"A primeira forma de meditação do desenvolvimento da tranquilidade, ou meditação sentada, diminui ou aquieta o turbilhão de pensamentos. Ao final de um certo tempo de prática, o espírito começa a se instalar naturalmente num estado de repouso, que nos permite ficar plenamente presentes à nossa vida. Logo que nós não somos arrastados para o passado ou o futuro, nós podemos nos acalmar e começar a viver verdadeiramente o momento presente.
A meditação nos ajuda também a conseguir duas outras formas de aprendizagem: a disciplina e o conhecimento superior. Os três repousam sobre nossa capacidade de nos concentrarmos sobre nosso caminho, e ver claramente o que estamos fazendo e a compreender porque o fazemos. Nós praticamos estas três aprendizagens em conjunto a fim de podermos nos libertar dos esquemas habituais e das falsas concepções que causam e perpetuam nosso sofrimento" (1).


Referência:
(1) PANLOP RINPOCHÉ, Dzogehen. "Apêndice I - Instruções para a prática da meditação", p. 339. In: ------. Buda rebelde - sobre o caminho da libertação.Traduzido do americano por Philippe Delamare. Marabout. Belfon, um Departamento de Place des éditeurs, 2012, para a tradução francesa. Tradução do francês para o português de Manuel Antônio de Castro.


9

"Como chamavam os gregos o movimento de ensinar e aprender? Chamavam com um só radical: mantháno. Assim, máthesis é o ensino e a aprendizagem, tanto no sentido do que é aprendido e ensinado como no sentido do processo de ensinar e aprender. Mathémata, o que pode ser ensinado e o que pode ser aprendido; e mathetés, o aluno, aquele que ensina aprendendo; o professor, aquele que aprende ensinando" (1).


Referência:
(1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Aprender e ensinar". In: ------. Aprendendo a pensar. Petrópolis/RJ: Vozes, 1977, p. 46.


10

"Os conceitos geram um conhecer passível de aprendizado. As questões, quando experienciadas por cada um, produzem um saber como aprendizagem (o que não pode ser ensinado)" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Heidegger e as questões da arte”. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). Arte em questão: as questões da arte. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 15.


11

"No Agamêmnon, de Esquilo, há uma passagem em que o ancião, em diálogo com o coro, enuncia o modo como Zeus estipulou que se dê a aprendizagem dos mortais. Diz ele que a aprendizagem deve se dar pelo páthei máthos (verso 212), expressão que traduziríamos por "aprendizagem (máthos) pela experiência da dor (páthei)" (1).


Referência:
FERRRAZ, Antônio Máximo. "O trágico como dança de vida e morte". In: In: FAGUNDES, Igor e OUTROS (Org.). Entre Pares - Partilhas em Dança & Outros Movimentos. Guaratinguetá/SP: Penalux, 2019, p. 86.


12

"A fórmula páthei máthos fala não do aprendizado abstrato da lógica, mas da aprendizagem concreta, pela dor, da liminaridade da existência humana, lançada, em razão do devir temporal, na dança entre Vida e Morte" (1).


Referência:
FERRRAZ, Antônio Máximo. "O trágico como dança de vida e morte". In: In: FAGUNDES, Igor e OUTROS (Org.). Entre Pares - Partilhas em Dança & Outros Movimentos. Guaratinguetá/SP: Penalux, 2019, p. 87.

13

"Mas, quando chegou a vez da invenção da escrita, exclamou Thoth: Eis, oh Rei, uma arte que tornará os egípcios mais sábios e os ajudará a fortalecer a memória, pois com a escrita descobri o remédio para a memória. - Oh, Thoth, mestre incomparável, uma coisa é inventar uma arte, outra julgar os benefícios ou prejuízos que dela advirão para os outros! Tu, neste momento e como inventor da escrita, esperas dela, e com entusiasmo, todo o contrário do que ela pode vir a fazer! Ela tornará os homens mais esquecidos, pois que, sabendo escrever, deixarão de exercitar a memória, confiando apenas nas escrituras, e só se lembrarão de um assunto por força de motivos exteriores, por meio de sinais, e não dos assuntos em si mesmos. Por isso, não inventaste um remédio para a memória, mas, sim, para a rememoração. Quanto à transmissão do ensino, transmites aos teus alunos não a sabedoria em si mesma, mas apenas uma aparência de sabedoria, pois passarão a receber uma grande soma de informações sem a respectiva educação! Hão-de parecer homens de saber, embora não passem de ignorantes em muitas matérias e tornar-se-ão, por consequência, sábios imaginários, em vez de sábios verdadeiros " (1).


Referência:
(1) PLATÃO. Fedro. 5. e. Trad. Pinharanda Gomes. Texto grego estabelecido por Léon Robin, Paris, Les Belles Lettres, 1966. Lisboa: Guimarães Editores, 1994, p. 121, 274e.

14

"Os conceitos geram um conhecer passível de aprendizado. As questões, quando experienciadas por cada um, produzem um saber como aprendizagem (o que não pode ser ensinado)" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Heidegger e as questões da arte”. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). Arte em questão: as questões da arte. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 15.
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