Nada

De Dicionário de Poética e Pensamento

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: "Assim, o [[princípio]] “ex nihilo nihil fitâ€, “de [[nada]] não se cria [[nada]]â€, só vale para as transações do já criado. Para o élan criador no sentido estrito, vale o inverso: “ex nihilo omnia fiuntâ€. Aqui o [[princípio]] é: “é do [[nada]] que [[tudo]] se criaâ€. Por isso é que o [[mestre]] Eckhart no século XIV, o pai da [[mística]] renana, podia [[dizer]] para os criacionistas de todos os [[tempos]]: “ ''Esse est Deus et Deus est nihil'' â€. “''[[Ser]] é [[Deus]] e [[Deus]] é [[Nada]]''†(1).
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: "Assim, o [[princípio]] “ex nihilo nihil fitâ€, “de [[nada]] não se cria [[nada]]â€, só vale para as transações do já criado. Para o élan criador no sentido estrito, vale o inverso: “ex nihilo omnia fiuntâ€. Aqui o [[princípio]] é: “é do [[nada]] que [[tudo]] se criaâ€. Por isso é que o [[mestre]] Eckhart no século XIV, o pai da [[mística]] renana, podia [[dizer]] para os criacionistas de todos os [[tempos]]: “''Esse est Deus et Deus est nihil'' â€. “''[[Ser]] é [[Deus]] e [[Deus]] é [[Nada]]''†(1).
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: (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "O que significa pensar?". In: ''Revista da Academia Brasileira de Letras'', maio-junho, 2012.
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: (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "O que significa pensar?". In: '''Revista da Academia Brasileira de Letras, maio-junho, 2012'''.
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:"P - O [[vazio]] é então a mesma coisa que o [[nada]], isto é, o vigor que procuramos [[pensar]] como o outro de toda [[vigência]] e de toda [[ausência]]?  
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:"P - O [[vazio]] é então a [[mesma]] [[coisa]] que o [[nada]], isto é, o [[vigor]] que procuramos [[pensar]] como o [[outro]] de toda [[vigência]] e de toda [[ausência]]?  
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: J - De certo... Para nós, o [[vazio]] é o [[nome]] mais elevado para se designar o que o senhor quer dizer com a [[palavra]] [[ser]]" (1).
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: J - De certo... Para nós, o [[vazio]] é o [[nome]] mais elevado para se [[designar]] o que o senhor quer [[dizer]] com a [[palavra]] [[ser]]" (1).
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:(1) HEIDEGGER, Martin. "De uma conversa sobre a linguagem entre um japonês e um pensador". In: ''Ensaios e conferências''. Petrópolis: Vozes, 2003, p. 87.
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:(1) HEIDEGGER, Martin. "De uma conversa sobre a linguagem entre um japonês e um pensador". In: '''Ensaios e conferências'''. Petrópolis: Vozes, 2003, p. 87.
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: (1) LISPECTOR, Clarice. ''Uma aprendizagem ou O livro dos prazeres''. 4. e. Rio de Janeiro: José Olympio, 1974, p. 25.
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: (1) LISPECTOR, Clarice. '''Uma aprendizagem ou O livro dos prazeres'''. Rio de Janeiro: José Olympio, 1974, 4. e., p. 25.
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: O [[nada]], [[possibilidade]] das [[possibilidades]], é sempre [[doação]] de novas [[realizações]], [[tempo]] sendo, que voltam sempre ao nada que é [[tudo]].
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: O [[nada]], [[possibilidade]] das [[possibilidades]], é [[sempre]] [[doação]] de novas [[realizações]], [[tempo]] sendo, que voltam [[sempre]] ao [[nada]] que é [[tudo]].
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:"... em todo [[pensamento]] se dá algo que não somente não pode ser pensado como, sobretudo e em tudo que se pensa, significa [[pensar]], isto é, faz e torna possível o [[pensamento]]. Este "não pensado", que nunca poderá ser pensado, é, pois, um [[nada]]. Mas não um [[nada]] somente [[negativo]], nem um [[nada]] somente [[positivo]] e nem uma mistura, com ou sem [[dialética]], de [[negativo]] e [[positivo]]. Mas então que [[nada]] é este?  Um [[nada criativo]] somente, tanto da [[negação]] como da [[posição]] e da composição de ambos" (1).
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: "... em todo [[pensamento]] se dá algo que não somente não pode ser pensado como, sobretudo e em [[tudo]] que se pensa, significa [[pensar]], isto é, faz e torna [[possível]] o [[pensamento]]. Este "não pensado", que nunca poderá ser pensado, é, pois, um [[nada]]. Mas não um [[nada]] somente [[negativo]], nem um [[nada]] somente [[positivo]] e nem uma mistura, com ou sem [[dialética]], de [[negativo]] e [[positivo]]. Mas então que [[nada]] é este?  Um [[nada criativo]] somente, tanto da [[negação]] como da [[posição]] e da composição de ambos" (1).
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: (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Posfácio". In: HEIDEGGER, Martin. '''Ser e tempo'''. 2. e. Petrópolis: Vozes, 2006, p. 550.
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: (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Posfácio". In: HEIDEGGER, Martin. ''Ser e tempo''. 2. e. Petrópolis: Vozes, 2006, p. 550.
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: O temor e a [[angústia]] do [[Nada]] é como o [[sentir]] o [[abismo]] e sua [[proximidade]] a nossos pés, faltando-nos não só o chão como o próprio [[respirar]]. No entanto, é nele que estamos plantados. Dis-traídos pelos [[movimentos]] nos fios da [[rede]] como [[teia]] da [[vida]] nem notamos que sempre estamos pendurados no [[abismo]] dos [[vazios]] da [[rede]]. Nem notamos pela ocupação nas e com as [[funções]] em meio aos [[entes]] que só funcionamos porque o [[sistema]] parece [[configurar]] [[tudo]], inclusive, os [[vazios]] em que ele não só se estende e perdura como também se expande. Mas não é [[verdade]]. E de repente somos assaltados pela gratuidade e [[presença]] dos [[vazios]] não só da [[rede]] como também da [[possibilidade]] de a [[rede]] ser [[rede]] e [[ser]] [[rede]] em [[funcionamento]] e expansão, porque a [[rede]] é uma [[doação]] do [[vazio]], do [[silêncio]], do [[Nada]]. A [[rede]] só se constrói como [[rede]] porque o [[Nada]] que a doa se retrai e deixa a [[rede]] e as [[funções]] e o [[sistema]] se presentificarem em seu [[funcionar]]. O [[Nada]] não niilifica, estrutura, doa, presentifica.
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: O temor e a [[angústia]] do [[Nada]] é como o [[sentir]] o [[abismo]] e sua [[proximidade]] a nossos pés, faltando-nos não só o chão como o próprio [[respirar]]. No entanto, é nele que estamos plantados. Dis-traídos pelos [[movimentos]] nos fios da [[rede]] como [[teia]] da [[vida]] nem notamos que sempre estamos pendurados no [[abismo]] dos [[vazios]] da [[rede]]. Nem notamos pela ocupação nas e com as [[funções]] em meio aos [[entes]] que só funcionamos porque o [[sistema]] parece [[configurar]] [[tudo]], inclusive, os [[vazios]] em que ele não só se estende e perdura como também se expande. Mas não é [[verdade]]. E de repente somos assaltados pela gratuidade e [[presença]] dos [[vazios]] não só da [[rede]] como também da [[possibilidade]] de a [[rede]] ser [[rede]] e [[ser]] [[rede]] em [[funcionamento]] e expansão, porque a [[rede]] é uma [[doação]] do [[vazio]], do [[silêncio]], do [[Nada]]. A [[rede]] só se constrói como [[rede]] porque o [[Nada]] que a doa se retrai e deixa a [[rede]] e as [[funções]] e o [[sistema]] se presentificarem em seu [[funcionar]]. O [[Nada]] não niilifica, estrutura, doa, presentifica. Em verdade é o [[nada criativo]].
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "História do sentido das artes e épocas". In: ------. ''Leitura: questões''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2015, p. 316.
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "História do sentido das artes e épocas". In: ------. '''Leitura: questões'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2015, p. 316.
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: "Mas é que também não sei que [[forma]] dar ao que me aconteceu. E sem dar uma [[forma]] , [[nada]] me existe. E - se a [[realidade]] é mesmo que [[nada]] existiu?! quem sabe nada me aconteceu? Só posso [[compreender]] o que me acontece, mas só acontece o que eu compreendo - que sei do resto? o resto não existiu. Quem sabe [[nada]] existiu" (1). Note o [[leitor]] a [[possibilidade]] de dupla [[leitura]] de algumas afirmações sobre o [[nada]], quando Clarice diz: "... é mesmo que [[nada]] existiu...". "...quem sabe [[nada]] me aconteceu?". Aqui podemos [[compreender]] que o [[sujeito]] do [[acontecer]] é o "[[nada]]", sendo o [[sujeito]] da [[ação]] o "[[nada]]" e não o "[[eu]]". Por isso é que depois ela pode [[afirmar]] - perguntando - que deve haver uma [[referência]] profunda [[entre]] "[[acontecer]]" e "[[compreender]]". Porém, então o [[sujeito]] de [[acontecer]] é o mesmo do [[acontecer]]. Isto apenas, na [[dimensão]] de [[ser]], comprova que o [[sujeito]] do [[agir]] é o [[ser]], ou seja, como Clarice coloca e desenvolve: o "[[nada]]".  
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: "Mas é que também não sei que [[forma]] dar ao que me aconteceu. E sem dar uma [[forma]], [[nada]] me existe. E - se a [[realidade]] é mesmo que [[nada]] existiu?! quem sabe [[nada]] me aconteceu? Só posso [[compreender]] o que me acontece, mas só acontece o que eu compreendo - que sei do resto? o resto não existiu. Quem sabe [[nada]] existiu" (1).  
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: Note o [[leitor]] a [[possibilidade]] de dupla [[leitura]] de algumas afirmações sobre o [[nada]], quando Clarice diz: "...é mesmo que [[nada]] existiu...". "...quem sabe [[nada]] me aconteceu?". Aqui podemos [[compreender]] que o [[sujeito]] do [[acontecer]] é o "[[nada]]", sendo o [[sujeito]] da [[ação]] o "[[nada]]" e não o "[[eu]]". Por isso é que depois ela pode [[afirmar]] - perguntando - que deve haver uma [[referência]] profunda [[entre]] "[[acontecer]]" e "[[compreender]]". Porém, então o [[sujeito]] de [[acontecer]] é o mesmo do [[acontecer]]. Isto apenas, na [[dimensão]] de [[ser]], comprova que o [[sujeito]] do [[agir]] é o [[ser]], ou seja, como Clarice coloca e desenvolve: o "[[nada]]".  
: - [[Manuel Antônio de Castro]]
: - [[Manuel Antônio de Castro]]
   
   
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: (1) LISPECTOR, Clarice. ''A paixão segundo GH'', 3. e. Rio de Janeiro: Sabiá, 1964, p. 11.
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: (1) LISPECTOR, Clarice. '''A paixão segundo GH''', 3. e. Rio de Janeiro: Sabiá, 1964, p. 11.
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: (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "O sentido do pseudônimo". In: -----. ''Aprendendo a pensar III''. Teresópolis/RJ: Daimon Editora, 2017, p. 121.
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: (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "O sentido do pseudônimo". In: -----. '''Aprendendo a pensar III'''. Teresópolis/RJ: Daimon Editora, 2017, p. 121.
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: "A [[angústia]] nos corta a [[palavra]]. Pelo [[fato]] de o [[ente]] em sua totalidade fugir e, assim, justamente, nos acossar o [[nada]], em sua [[presença]], emudece qualquer dicção do "[[é]]". O fato de nós procurarmos muitas vezes, na [[estranheza]] da [[angústia]], romper o [[vazio]] [[silêncio]] com [[palavras]] sem nexo é apenas o testemunho da [[presença]] do [[nada]]. Que a [[angústia]] revela o [[nada]] é confirmado imediatamente pelo próprio [[homem]] quando a [[angústia]] se afastou. Na posse da [[claridade]] do olhar,  a lembrança recente nos leva a [[dizer]]:  Diante de que e por que nós nos angustiamos era "propriamente" - [[nada]]. Efetivamente: o [[nada]] mesmo - enquanto tal - estava aí" (1).  
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: "A [[angústia]] nos corta a [[palavra]]. Pelo [[fato]] de o [[ente]] em sua totalidade fugir e, assim, justamente, nos acossar o [[nada]], em sua [[presença]], emudece qualquer dicção do "[[é]]". O fato de nós procurarmos muitas vezes, na [[estranheza]] da [[angústia]], romper o [[vazio]] [[silêncio]] com [[palavras]] sem nexo é apenas o testemunho da [[presença]] do [[nada]]. Que a [[angústia]] revela o [[nada]] é confirmado imediatamente pelo próprio [[homem]] quando a [[angústia]] se afastou. Na posse da [[claridade]] do olhar,  a lembrança recente nos leva a [[dizer]]:  Diante de que e por que nós nos angustiamos era "propriamente" - [[nada]]. Efetivamente: o [[nada]] mesmo - enquanto tal - estava aí" (1).
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: De alguma maneira a [[angústia]] está ligada à nossa [[condição humana]] de [[finitos]], ou seja, à nossa [[finitude]], pois nesta nos defrontamos com o [[nada]] que elimina quaisquer [[limites]] e então surge a [[angústia]] diante do [[infinito]]. É que a [[finitude]] se faz presente em todo o nosso [[caminhar]], em todo o nosso [[querer]], em todas as nossas [[ações]] em sua [[essência]]. Como fica a nossa [[liberdade]] e o nosso [[conhecer]]? Devemos seguir Sócrates quando diz que só sei que [[nada]] sei? Certamente somente o [[ser humano]] é tomado pela [[angústia]], pois só ele [[é]] [[finito]] e sabe que [[é]] [[finito]] diante do [[infinito]]. Como fica diante da [[finitude]] a nossa [[plenitude]] e [[felicidade]]?
: De alguma maneira a [[angústia]] está ligada à nossa [[condição humana]] de [[finitos]], ou seja, à nossa [[finitude]], pois nesta nos defrontamos com o [[nada]] que elimina quaisquer [[limites]] e então surge a [[angústia]] diante do [[infinito]]. É que a [[finitude]] se faz presente em todo o nosso [[caminhar]], em todo o nosso [[querer]], em todas as nossas [[ações]] em sua [[essência]]. Como fica a nossa [[liberdade]] e o nosso [[conhecer]]? Devemos seguir Sócrates quando diz que só sei que [[nada]] sei? Certamente somente o [[ser humano]] é tomado pela [[angústia]], pois só ele [[é]] [[finito]] e sabe que [[é]] [[finito]] diante do [[infinito]]. Como fica diante da [[finitude]] a nossa [[plenitude]] e [[felicidade]]?
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: (1) HEIDEGGER, Martin. "Que é metafísica?". In: ------. ''Heidegger''. Coleção ''Os pensadores''. São Paulo: Abril Cultural, 1979, p. 40.
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: (1) HEIDEGGER, Martin. "Que é metafísica?". In: ------. '''Heidegger'''. Coleção '''Os pensadores'''. São Paulo: Abril Cultural, 1979, p. 40.
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: (1) MERTON, Thomas. "A luz das estrelas e o Não-ser". In: ''A via de Chuang Tzu'', 9. e. Petrópolis/RJ: Vozes, 1999, p. 161.
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: (1) MERTON, Thomas. "A luz das estrelas e o Não-ser". In: '''A via de Chuang Tzu''', 9. e. Petrópolis/RJ: Vozes, 1999, p. 161.
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: (1) ALBERNAZ, Maria Beatriz. ''Paideia poética na cidade sitiada - um estudo de Clarice Lispector''. Rio de Janeiro: Faculdade de Letras da UFRJ, Programa de Pós-Graduação em Ciência da Literatura, Ãrea de Poética. Tese de doutorado, 2006.
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: (1) ALBERNAZ, Maria Beatriz. '''Paideia poética na cidade sitiada - um estudo de Clarice Lispector'''. Rio de Janeiro: Faculdade de Letras da UFRJ, Programa de Pós-Graduação em Ciência da Literatura, Ãrea de Poética. Tese de doutorado, 2006.
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: (1) HEIDEGGER, Martin. "De uma conversa sobre a linguagem...". In: ----. ''A caminho da Linguagem''. Trad. Marcia Sá Cavalcante Schuback. Petrópolis (RJ): Vozes. Bragança Paulista (SP): Editora Universitária São Francisco, 2003, p. 87.
: (1) HEIDEGGER, Martin. "De uma conversa sobre a linguagem...". In: ----. ''A caminho da Linguagem''. Trad. Marcia Sá Cavalcante Schuback. Petrópolis (RJ): Vozes. Bragança Paulista (SP): Editora Universitária São Francisco, 2003, p. 87.
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: "O [[nada]] é [[fonte]] de [[tudo]] que [[é]], assim como o [[silêncio]] é a [[fonte]] de toda [[fala]]. Por isso mesmo o [[nada]] nos aparece como a [[morte]]. Porém, sem esta não há [[posição]] para o [[vivente]]. [[Nada]] é [[vida]]. [[Vida]] é [[morte]]. Todo [[mal]] e [[dor]] é da nossa [[condição de humanos]] [[finitos]]. Desse modo o maior [[mal]] e a maior [[dor]] é a [[distância]] do [[Nada]]. E o maior [[bem]] e [[plenitude]] é sua [[proximidade]]" (1).
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: Referência:
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ulisses e a Escuta do Canto das Sereiasâ€. In: -----. '''Arte: o humano e o destino'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 169.
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: "Num [[movimento]] pendular e [[dialético]] de [[caminhada]] de ascensão e ao mesmo tempo de descensão, move-se numa [[procura]] do [[sentido do Ser]] a partir do [[homem]] (''[[Da-sein]]''/[[Entre-ser]]) [[concreto]] ([[presença]] ainda do [[método]] [[fenomenológico]] com seu lema: volta [[concreta]] às [[coisas]] e abandono dos [[conceitos]] prévios) e ao mesmo tempo e cada vez mais busca o [[sentido do ser]] [[humano]] a partir do [[sentido do Ser]], que como [[nada]] configura o [[homem]] e o [[real]] em seu [[mistério]] [[mito]]-[[poético]]. No pendular desse ir e vir, uma [[palavra]] [[enigmática]] constitui o pêndulo [[sempre]] [[presente]] e central da [[obra]] de [[Heidegger]]: ''[[Da-sein]]''. A [[tradução]] literal, como Ser-aí, não consegue [[apreender]] a [[dinâmica]] [[verbal]] de [[pensamento]] que ela concentra... O “Da†de ''[[Da-sein]]'', mais do que uma relação [[espacial]] ou [[temporal]], diz muito mais o “[[entre]]†da [[liminaridade]] ([[limite]] e [[não-limite]]), do [[horizonte]] e da [[clareira]], em que o [[ser]] se dá retraindo-se. '''Da''' pode ser traduzido por “[[entre]]â€, se este for pensado em toda a sua [[enigmática]] densidade. O [[ser humano]] como ''[[Da-sein]]'' é, de fato, o [[Entre-ser]] como  o ambíguo [[Ser-do-entre]]" (1).
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: Referência:
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Heidegger e as questões da arteâ€. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). '''Arte em questão: as questões da arte'''. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 33.
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: O [[Nada]] é o véu do [[Ser]]. A [[questão]] do [[humano]] é propriamente essa [[referência]]. Nela o [[ser humano]] se defronta com o [[Nada]]. Originariamente o [[ser humano]] já está lançado no [[Nada]], pois seu verdadeiro [[realizar-se]] [[é]] [[ser]] o [[não-ser]] que, paradoxalmente, ele já [[é]].
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: - Manuel Antônio de Castro.

Edição atual tal como 20h53min de 24 de março de 2024

1

"Assim, o princípio “ex nihilo nihil fitâ€, “de nada não se cria nadaâ€, só vale para as transações do já criado. Para o élan criador no sentido estrito, vale o inverso: “ex nihilo omnia fiuntâ€. Aqui o princípio é: “é do nada que tudo se criaâ€. Por isso é que o mestre Eckhart no século XIV, o pai da mística renana, podia dizer para os criacionistas de todos os tempos: “Esse est Deus et Deus est nihil â€. “Ser é Deus e Deus é Nada†(1).


Referência:
(1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "O que significa pensar?". In: Revista da Academia Brasileira de Letras, maio-junho, 2012.

2

"P - O vazio é então a mesma coisa que o nada, isto é, o vigor que procuramos pensar como o outro de toda vigência e de toda ausência?
J - De certo... Para nós, o vazio é o nome mais elevado para se designar o que o senhor quer dizer com a palavra ser" (1).


Referência:
(1) HEIDEGGER, Martin. "De uma conversa sobre a linguagem entre um japonês e um pensador". In: Ensaios e conferências. Petrópolis: Vozes, 2003, p. 87.

3

"Através de seus graves defeitos - que um dia ela talvez pudesse mencionar sem se vangloriar - é que chegara agora a poder amar. Até aquela glorificação: ela amava o Nada. A consciência de sua permanente queda humana a levava ao amor do Nada" (1).


Referência:
(1) LISPECTOR, Clarice. Uma aprendizagem ou O livro dos prazeres. Rio de Janeiro: José Olympio, 1974, 4. e., p. 25.

4

Nada não pode ser niilismo porque só pode advir ao niilismo o ente, o vivente, a oração, o discurso, o significado, o tempo linear, a lembrança, o instante.


- Manuel Antônio de Castro.

5

O nada, possibilidade das possibilidades, é sempre doação de novas realizações, tempo sendo, que voltam sempre ao nada que é tudo.


- Manuel Antônio de Castro.

6

"... em todo pensamento se dá algo que não somente não pode ser pensado como, sobretudo e em tudo que se pensa, significa pensar, isto é, faz e torna possível o pensamento. Este "não pensado", que nunca poderá ser pensado, é, pois, um nada. Mas não um nada somente negativo, nem um nada somente positivo e nem uma mistura, com ou sem dialética, de negativo e positivo. Mas então que nada é este? Um nada criativo somente, tanto da negação como da posição e da composição de ambos" (1).


Referência:
(1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Posfácio". In: HEIDEGGER, Martin. Ser e tempo. 2. e. Petrópolis: Vozes, 2006, p. 550.

7

O temor e a angústia do Nada é como o sentir o abismo e sua proximidade a nossos pés, faltando-nos não só o chão como o próprio respirar. No entanto, é nele que estamos plantados. Dis-traídos pelos movimentos nos fios da rede como teia da vida nem notamos que sempre estamos pendurados no abismo dos vazios da rede. Nem notamos pela ocupação nas e com as funções em meio aos entes que só funcionamos porque o sistema parece configurar tudo, inclusive, os vazios em que ele não só se estende e perdura como também se expande. Mas não é verdade. E de repente somos assaltados pela gratuidade e presença dos vazios não só da rede como também da possibilidade de a rede ser rede e ser rede em funcionamento e expansão, porque a rede é uma doação do vazio, do silêncio, do Nada. A rede só se constrói como rede porque o Nada que a doa se retrai e deixa a rede e as funções e o sistema se presentificarem em seu funcionar. O Nada não niilifica, estrutura, doa, presentifica. Em verdade é o nada criativo.


- Manuel Antônio de Castro

8

"O professor só ensina quando aprende. O aluno só é ensinado quando aprende a aprender a pensar. O professor ensina nada e o aluno aprende o nada em que ele já desde sempre vigora, todo ser humano vigora. Pois ambos vigoram no mesmo. Esses são os horizontes das épocas das obras de arte da arte, onde aprender e ensinar é o deixar-se tomar pelo destinar-se do ser no vigorar da época. Época, nessa leitura e horizonte, é a essência do tempo" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "História do sentido das artes e épocas". In: ------. Leitura: questões. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2015, p. 316.

9

"Mas é que também não sei que forma dar ao que me aconteceu. E sem dar uma forma, nada me existe. E - se a realidade é mesmo que nada existiu?! quem sabe nada me aconteceu? Só posso compreender o que me acontece, mas só acontece o que eu compreendo - que sei do resto? o resto não existiu. Quem sabe nada existiu" (1).
Note o leitor a possibilidade de dupla leitura de algumas afirmações sobre o nada, quando Clarice diz: "...é mesmo que nada existiu...". "...quem sabe nada me aconteceu?". Aqui podemos compreender que o sujeito do acontecer é o "nada", sendo o sujeito da ação o "nada" e não o "eu". Por isso é que depois ela pode afirmar - perguntando - que deve haver uma referência profunda entre "acontecer" e "compreender". Porém, então o sujeito de acontecer é o mesmo do acontecer. Isto apenas, na dimensão de ser, comprova que o sujeito do agir é o ser, ou seja, como Clarice coloca e desenvolve: o "nada".


- Manuel Antônio de Castro
Referência:
(1) LISPECTOR, Clarice. A paixão segundo GH, 3. e. Rio de Janeiro: Sabiá, 1964, p. 11.

10

"O homem não é só um ser simplesmente finito. O homem é o mais finito dos seres, porque, na finitude, ele sente sempre o infinito do nada, mesmo em toda pretensão, escamoteada, de ser infinito. É na finitude sem fim do nada que afirma, em tudo que faz e/ou deixa de fazer, o infinito" (1).


Referência:
(1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "O sentido do pseudônimo". In: -----. Aprendendo a pensar III. Teresópolis/RJ: Daimon Editora, 2017, p. 121.

11

"A angústia nos corta a palavra. Pelo fato de o ente em sua totalidade fugir e, assim, justamente, nos acossar o nada, em sua presença, emudece qualquer dicção do "é". O fato de nós procurarmos muitas vezes, na estranheza da angústia, romper o vazio silêncio com palavras sem nexo é apenas o testemunho da presença do nada. Que a angústia revela o nada é confirmado imediatamente pelo próprio homem quando a angústia se afastou. Na posse da claridade do olhar, a lembrança recente nos leva a dizer: Diante de que e por que nós nos angustiamos era "propriamente" - nada. Efetivamente: o nada mesmo - enquanto tal - estava aí" (1).
De alguma maneira a angústia está ligada à nossa condição humana de finitos, ou seja, à nossa finitude, pois nesta nos defrontamos com o nada que elimina quaisquer limites e então surge a angústia diante do infinito. É que a finitude se faz presente em todo o nosso caminhar, em todo o nosso querer, em todas as nossas ações em sua essência. Como fica a nossa liberdade e o nosso conhecer? Devemos seguir Sócrates quando diz que só sei que nada sei? Certamente somente o ser humano é tomado pela angústia, pois só ele é finito e sabe que é finito diante do infinito. Como fica diante da finitude a nossa plenitude e felicidade?


- Manuel Antônio de Castro
Referência:
(1) HEIDEGGER, Martin. "Que é metafísica?". In: ------. Heidegger. Coleção Os pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1979, p. 40.

12

"Posso compreender a ausência do Ser,
Mas quem pode compreender a ausência do Nada?
Se agora, acima de tudo isto, o Não-ser é,
Quem será capaz de compreendê-lo" (1).
(xxii, 8)


Referência:
(1) MERTON, Thomas. "A luz das estrelas e o Não-ser". In: A via de Chuang Tzu, 9. e. Petrópolis/RJ: Vozes, 1999, p. 161.

13

"O poeta, em seu canto, próximo à Terra Natal, desfia a alegria a troco de Nada. Isso é contradizer-se, jogar no Vazio ou meditar extra-vagâncias? Devagar, vagando se descobre a falta-que-faz, o fazer-que-falta: cercando o eixo das rodas com raios, se descobre que a utilidade da roda consiste no seu Nada; escavando-se a argila para modelar vasos, descobre-se que a utilidade dos vasos está no seu Nada; abrindo-se portas e janelas para que haja um quarto, descobre-se que a utilidade do quarto está no seu Nada. Por isso, parafraseando Lao-Tzu, em seu fragmento XI, do Tao Te King, pode-se dizer que enquanto nos aproximamos do fazer, o que não é feito se aproxima de nós" (1).


Referência:
(1) ALBERNAZ, Maria Beatriz. Paideia poética na cidade sitiada - um estudo de Clarice Lispector. Rio de Janeiro: Faculdade de Letras da UFRJ, Programa de Pós-Graduação em Ciência da Literatura, Ãrea de Poética. Tese de doutorado, 2006.

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"P - O vazio é então a mesma coisa que o nada, isto é, o vigor que procuramos pensar como o outro de toda vigência e de toda ausência?
J - De certo. É por isso que no Japão logo entendemos a conferência O que é metafísica? que nos chegou em 1930, numa tradução feita por um estudante japonês, seu ouvinte. Ainda hoje estranhamos que os europeus pudessem ter caído na armadilha de interpretar niilisticamente o nada discutido na conferência. Para nós, o vazio é o nome mais elevado para se designar o que o senhor quer dizer com a palavra ser..." (1).


Referência:
(1) HEIDEGGER, Martin. "De uma conversa sobre a linguagem...". In: ----. A caminho da Linguagem. Trad. Marcia Sá Cavalcante Schuback. Petrópolis (RJ): Vozes. Bragança Paulista (SP): Editora Universitária São Francisco, 2003, p. 87.

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"O nada é fonte de tudo que é, assim como o silêncio é a fonte de toda fala. Por isso mesmo o nada nos aparece como a morte. Porém, sem esta não há posição para o vivente. Nada é vida. Vida é morte. Todo mal e dor é da nossa condição de humanos finitos. Desse modo o maior mal e a maior dor é a distância do Nada. E o maior bem e plenitude é sua proximidade" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ulisses e a Escuta do Canto das Sereiasâ€. In: -----. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 169.

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"Num movimento pendular e dialético de caminhada de ascensão e ao mesmo tempo de descensão, move-se numa procura do sentido do Ser a partir do homem (Da-sein/Entre-ser) concreto (presença ainda do método fenomenológico com seu lema: volta concreta às coisas e abandono dos conceitos prévios) e ao mesmo tempo e cada vez mais busca o sentido do ser humano a partir do sentido do Ser, que como nada configura o homem e o real em seu mistério mito-poético. No pendular desse ir e vir, uma palavra enigmática constitui o pêndulo sempre presente e central da obra de Heidegger: Da-sein. A tradução literal, como Ser-aí, não consegue apreender a dinâmica verbal de pensamento que ela concentra... O “Da†de Da-sein, mais do que uma relação espacial ou temporal, diz muito mais o “entre†da liminaridade (limite e não-limite), do horizonte e da clareira, em que o ser se dá retraindo-se. Da pode ser traduzido por “entreâ€, se este for pensado em toda a sua enigmática densidade. O ser humano como Da-sein é, de fato, o Entre-ser como o ambíguo Ser-do-entre" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Heidegger e as questões da arteâ€. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). Arte em questão: as questões da arte. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 33.

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O Nada é o véu do Ser. A questão do humano é propriamente essa referência. Nela o ser humano se defronta com o Nada. Originariamente o ser humano já está lançado no Nada, pois seu verdadeiro realizar-se é ser o não-ser que, paradoxalmente, ele já é.


- Manuel Antônio de Castro.
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