Clareira

De Dicionrio de Potica e Pensamento

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:"O [[destino]] se apropria como a clareira do ser, que é, enquanto clareira. É a clareira que outorga a [[proximidade]] do ser. Nessa proximidade, na clareira do ''Da'' [[lugar]], mora o homem como ex-sistente, sem que ele já possa hoje experimentar e assumir esse morar" (1).  
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: "O [[destino]] se apropria como a [[clareira]] do [[ser]], que é, enquanto [[clareira]]. É a [[clareira]] que outorga a [[proximidade]] do [[ser]]. Nessa [[proximidade]], na [[clareira]] do ''[[Da]]'' [[lugar]], mora o [[homem]] como ex-sistente, sem que ele já possa hoje experimentar e assumir esse [[morar]]" (1).  
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:(1) HEIDEGGER, Martin. ''Carta sobre o humanismo''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1967, p. 61.
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: (1) HEIDEGGER, Martin. '''Carta sobre o humanismo'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1967, p. 61.
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:Heidegger dedica uma atenção profunda e ampla à questão da [[verdade]], pois é nela que se decide e constrói o projeto do pensamento metafísico ocidental. Porém, Heidegger se centraliza na palavra grega ''[[alétheia]]'', traduzida normalmente como verdade. O pensador prefere traduzi-la por [[desvelamento]]. Desvelamento é, inicialmente, o ''[[ón]]'' vindo à sua presença. Porém, se ficasse só no desvelamento ainda estaria se limitando à predominância do pensamento metafísico, que se constrói em cima da [[presença]] e da [[luz]], sintetizado na questão motriz para Platão: ''[[Eîdos]]'', que originou a palavra portuguesa ideia. Não podemos esquecer que para os gregos a grande e permanente questão é o [[permanência|permanecer]]. Então, Heidegger vai refletir sobre a possibilidade do ''ón'' aparecer como o que aparecendo se faz presente. E assim surge a questão da clareira. Ela não foi pensada pela filosofia e, por isso, quando a filosofia chega ao fim e é substituída pela ciência, a questão da clareira passa a ser a questão da filosofia. Mas aí a filosofia se torna um questionar enquanto pensar. E a questão não é mais simplesmente o ''ón'' enquanto o que se faz presente, mas a clareira, ou seja, o livre [[abertura|aberto]]. Como possibilidade de aparecimento, a presença do ''ón'', ou seja, da clareira, como o lugar tanto do desvelar como do velar. Diz Heidegger: "o claro, no sentido do livre aberto, não possui nada de comum, nem sob o ponto de vista linguístico, nem no atinente à coisa que é expressa com o adjetivo 'luminoso', que significa 'claro'" (1).  
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: [[Heidegger]] dedica uma atenção profunda e ampla à [[questão]] da [[verdade]], pois é nela que se decide e constrói o projeto do [[pensamento]] [[metafísico]] [[ocidental]]. Porém, [[Heidegger]] se centraliza na [[palavra]] [[grega]] ''[[alétheia]]'', traduzida normalmente como [[verdade]]. O [[pensador]] prefere traduzi-la por [[desvelamento]]. [[Desvelamento]] é, inicialmente, o ''[[ón]]'' vindo à sua [[presença]]. Porém, se ficasse só no [[desvelamento]] ainda estaria se limitando à predominância do [[pensamento]] [[metafísico]], que se constrói em cima da [[presença]] e da [[luz]], sintetizado na questão motriz para [[Platão]]: ''[[Eîdos]]'', que originou a [[palavra]] [[portuguesa]] [[ideia]]. Não podemos esquecer que para os [[gregos]] a grande e permanente [[questão]] é o [[permanência|permanecer]]. Então, [[Heidegger]] vai refletir sobre a [[possibilidade]] do ''[[ón]]'' aparecer como o que aparecendo se faz [[presente]]. E assim surge a [[questão]] da [[clareira]]. Ela não foi pensada pela [[filosofia]] e, por isso, quando a [[filosofia]] chega ao [[fim]] e é substituída pela [[ciência]], a [[questão]] da [[clareira]] passa a [[ser]] a [[questão]] da [[filosofia]]. Mas aí a [[filosofia]] se torna um [[questionar]] enquanto [[pensar]]. E a [[questão]] não é mais simplesmente o ''[[ón]]'' enquanto o que se faz [[presente]], mas a [[clareira]], ou seja, o [[livre aberto]]. Como [[possibilidade]] de aparecimento, a [[presença]] do ''[[ón]]'', ou seja, da [[clareira]], como o [[lugar]] tanto do [[desvelar]] como do [[velar]].  
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: Diz [[Heidegger]]: "... o claro, no sentido do [[livre aberto]], não possui [[nada]] de comum, nem sob o ponto de vista linguístico, nem no atinente à [[coisa]] que é expressa com o [[adjetivo]] 'luminoso', que significa 'claro'" (1).
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:- [[Manuel Antônio de Castro]]
 
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: - [[Manuel Antônio de Castro]]
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:(1) HEIDEGGER, Martin. "O fim da filosofia e a tarefa do pensamento". In: ''Os pensadores''. São Paulo: Abril Cultural, 1979, p. 79.
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: (1) HEIDEGGER, Martin. "O fim da filosofia e a tarefa do pensamento". In: '''Os pensadores'''. São Paulo: Abril Cultural, 1979, p. 79.
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:"Porque na clareira e só na clareira a [[luz]] da [[visão]] pode aparecer como luz e como visão. A luz não é a clareira. Pressupõe-na. Na clareira não há só luz, há também [[sombra|sombras]]. O raio que risca brilhando só o pode fazer porque brilha no aberto livre da clareira. Não vemos a partir da visão, vemos com a visão a partir do aberto [[liberdade|livre]] da clareira" (1).
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: "Porque na [[clareira]] e só na [[clareira]] a [[luz]] da [[visão]] pode aparecer como [[luz]] e como [[visão]]. A [[luz]] não é a [[clareira]]. Pressupõe-na. Na [[clareira]] não há só [[luz]], há também [[sombra|sombras]]. O raio que risca brilhando só o pode fazer porque brilha no aberto [[livre]] da [[clareira]]. Não vemos a partir da [[visão]], vemos com a [[visão]] a partir do aberto [[liberdade|livre]] da [[clareira]]" (1).
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:(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Poíesis, sujeito e metafísica". In: CASTRO, Manuel Antônio de (org.). ''A construção poética do real''. Rio de Janeiro: 7Letras, 2004, p. 33.
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Poíesis, sujeito e metafísica". In: CASTRO, Manuel Antônio de (org.). '''A construção poética do real'''. Rio de Janeiro: 7Letras, 2004, p. 33.
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:"Um grilo vivia numa clareira da Floresta. A clareira é dada pela [[ausência]] da Floresta na forma de liberdade das árvores. Em ausência, a Floresta presenteia o grilo com sua [[presença]] de claridade. É que na claridade da clareira se concentra toda a Floresta. Quer ouvindo a sinfonia dos sons ou respirando os perfumes silvestres, quer pulando sobre as folhas ou cantando o ar da liberdade, quer olhando a variedade das cores ou movendo-se no espaço dos lugares, o grilo pulsa com as pulsações e vibra com as vibrações da Floresta. Assim é justamente a ausência da Floresta que proporciona ao grilo [[liberdade]] para todos os casos de sua vida.
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: "Um grilo vivia numa [[clareira]] da [[Floresta]]. A [[clareira]] é dada pela [[ausência]] da [[Floresta]] na [[forma]] de [[liberdade]] das árvores. Em [[ausência]], a [[Floresta]] presenteia o grilo com sua [[presença]] de [[claridade]]. É que na [[claridade]] da [[clareira]] se concentra toda a [[Floresta]]. Quer ouvindo a sinfonia dos sons ou respirando os perfumes silvestres, quer pulando sobre as folhas ou cantando o ar da [[liberdade]], quer olhando a variedade das cores ou movendo-se no [[espaço]] dos [[lugares]], o grilo pulsa com as pulsações e vibra com as vibrações da [[Floresta]]. Assim é justamente a [[ausência]] da [[Floresta]] que proporciona ao grilo [[liberdade]] para todos os casos de sua [[vida]].
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:Até mesmo a única coisa, que, com a sua mecânica, o grilo julga conhecer da Floresta – a saber, que a Floresta é a não-clareira, a meta-clareira – ainda é um conhecimento da clareira. A clareira é todo o seu [[mundo]]. Todas as coisas presentes e ausentes, todos os casos reais e irreais, todas as combinações possíveis imagináveis, todas as sentenças verdadeiras ou falsas, toda a realidade e toda a possibilidade, o [[ser]] e o [[não-ser]] pertencem à clareira. Daí também, a não-clareira, a meta-clareira, dizendo o não-tudo, nenhuma coisa existente ou imaginável, nenhuma realidade ou possibilidade, nada em seu mundo, não tem sentido na clareira por força da própria clareira. Clareira e meta-clareira são a mesma [[coisa]], enquanto ambas se acham igualmente aprisionadas e na dependência da mecânica da clareira" (1).
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: Até mesmo a única [[coisa]], que, com a sua mecânica, o grilo julga [[conhecer]] da [[Floresta]] – a [[saber]], que a [[Floresta]] é a não-clareira, a meta-clareira – ainda é um [[conhecimento]] da [[clareira]]. A [[clareira]] é todo o seu [[mundo]]. Todas as [[coisas]] [[presentes]] e [[ausentes]], todos os casos [[reais]] e [[irreais]], todas as combinações possíveis imagináveis, todas as [[sentenças]] [[verdadeiras]] ou falsas, toda a [[realidade]] e toda a [[possibilidade]], o [[ser]] e o [[não-ser]] pertencem à [[clareira]]. Daí também, a não-clareira, a meta-clareira, dizendo o não-tudo, nenhuma coisa existente ou imaginável, nenhuma [[realidade]] ou [[possibilidade]], [[nada]] em seu [[mundo]], não tem [[sentido]] na [[clareira]] por força da própria [[clareira]]. [[Clareira]] e meta-clareira são a mesma [[coisa]], enquanto ambas se acham igualmente aprisionadas e na dependência da mecânica da [[clareira]]" (1).
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:(1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "A poesia e a linguagem". In: ______. ''Aprendendo a pensar''. Petrópolis: Vozes, 1977, p. 175; p. 177.
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: (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "A poesia e a linguagem". In: ______. '''Aprendendo a pensar'''. Petrópolis: Vozes, 1977, p. 175; p. 177.
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:"Na medida em que o [[ser]] vige a partir da ''[[alétheia]]'', pertence a ele o emergir auto-desvelante. Nós denominamos isso a ação de auto-iluminar-se e a [[iluminação]], a clareira (cf. ''Ser e tempo'')" (1).
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: "Na medida em que o [[ser]] vige a partir da ''[[alétheia]]'', pertence a ele o emergir auto-desvelante. Nós denominamos isso a ação de auto-iluminar-se e a [[iluminação]], a [[clareira]] (cf. '''[[Ser e tempo]]''')" (1).
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:(1) HEIDEGGER, Martin. ''Parmênides''. Trad. Sérgio Mário Wrublevski. Petrópolis: Vozes, 2008, p. 155.
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: (1) HEIDEGGER, Martin. '''Parmênides'''. Trad. Sérgio Mário Wrublevski. Petrópolis: Vozes, 2008, p. 155.
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:"Diga-se ainda que não é a [[posição]] ou data histórica da composição do [[mito]] e a [[forma]] narrativa que devem determinar o [[diálogo]] com ele. É que não podemos reduzir a [[narrativa]] a uma posição formal. Para haver posição, já antes o [[narrador]] se acha posicionado no [[horizonte]] que a própria [[linguagem]] abre. Podemos denominar essa abertura a clareira do aberto, na qual todo horizonte acontece" (1).
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: "Diga-se ainda que não é a [[posição]] ou data [[histórica]] da [[composição]] do [[mito]] e a [[forma]] [[narrativa]] que devem [[determinar]] o [[diálogo]] com ele. É que não podemos [[reduzir]] a [[narrativa]] a uma [[posição]] [[formal]]. Para haver [[posição]], já antes o [[narrador]] se acha posicionado no [[horizonte]] que a própria [[linguagem]] abre. Podemos [[denominar]] essa [[abertura]] a [[clareira]] do [[aberto]], na qual todo [[horizonte]] acontece. [[Horizonte]] é [[amplitude]] do [[visível]] em [[tensão]]  com o [[não-visível]]. Mas para haver [[horizonte]], já ele se mostrou na [[abertura]] da [[clareira]]" (1).
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. ''Arte: o humano e o destino''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 226.
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O mito de Cura e o ser humano". In: .... .'''Arte: o humano e o destino'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 226.
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: Em suas [[obras]], [[Heidegger]] propõe [[pensar]] o [[homem]] enquanto o “[[lugar]]” (''Da'', em alemão, que aparece na [[palavra]] ''[[Dasein]]'', no [[pensamento]] de [[Heidegger]]), a [[clareira]], na qual o ser con-cresce e aparece. Não há [[clareira]] sem [[floresta]], porém a [[floresta]] aparece como [[floresta]] na [[medida]] em que se retira e se deixa [[ver]], [[perceber]], [[manifestar]], isto é, vir à [[luz]], iluminar-se, na [[clareira]]. Eis a [[verdade]] como ''[[a-letheia]]''. Ora, o ''Da-'' indica o [[lugar]] do ''[[entre]]'', isto é, o [[vigorar]] ambíguo do que dando-se, presenteando-se, se retrai. O [[ser humano]] não é apenas ''Da-'', é ''[[Da-sein]]'', ''[[Entre-ser]]'', segundo Heidegger. Eis aí bem clara a [[clareira]] numa [[dialética]] constante com a ''[[floresta]]''. Só o [[ser humano]] possui o caráter fundamental (''Grundzug'') de ec-sistência: a insistência ec-stática na [[verdade]] do [[ser]]. Portanto, é impossível separar [[clareira]] de [[verdade]], em que esta é o próprio [[ser humano]] sendo. O [[homem]] é a [[presença]], [[palavra]] esta que se compõe de ''prae-'', prefixo latino que significa: [[lugar]], localização; e -sença: ''-sentia'', do verbo latino ''esse'', [[ser]]. Desta maneira, só o [[homem]] existe e tem [[consciência]] disso, pois é isto o que o diferencia dos demais [[entes]]. É nesse sentido que não podemos separar [[ser humano]] de [[verdade]] e esta de [[ser]]. Desse modo o que caracteriza essencialmente o [[ser humano]] é a [[diferença ontológica]], ou seja, a [[existência]].
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: - [[Manuel Antônio de Castro]].
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: "Assim como a [[clareira]] é [[doação]] da floresta e a [[música]], que é nossa [[vida]], é [[doação]] e presentificação do [[silêncio]]. Nesse e sempre nesse [[horizonte]], a [[vida]] é [[doação]] da [[morte]]. Por isso, somos [[mortais]]. A [[morte]] não é o [[fim]], mas a [[plenitude]] da [[vida]] na qual [[agir]] e não-agir são um e o [[mesmo]]: [[ser]]-[[feliz]]" (1).
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:  (1) CASTRO, Manuel Antônio de. “O mito de Midas da morte ou do ser feliz”. In: ------. '''Arte: o humano e o destino'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 210.
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: "A [[Terra]] se entretecendo como [[mundo]] é o [[Sol]] se doando em dias e noites. [[Terra]] E [[Sol]] tanto mais se doam quanto mais se retraem. O [[mundo]] [[doado]] pela [[Terra]] E pelo [[Sol]] é a [[clareira]] do [[claro]] [[aberto]] do “[[entre]]” [[ambíguo]]. A [[clareira]] [[originária]] do “[[entre]]” [[integra]] [[Mundo]] E [[Terra]] e [[Sol]]" (1).
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: Referência:
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Interdisciplinaridade poética: o ''entre''". Rio de Janeiro: '''Revista Tempo Brasileiro: Interdisciplinaridade: dimensões poéticas''', 164, jan.-mar., 2006, p. 34.
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: "Nas [[imagens-questões]] há uma tensão permanente [[entre]] o dito da [[língua]] e a [[ausculta]] da [[linguagem]]. No trânsito desse transe transam o [[saber]] e sabor de toda [[sabedoria]] da ''[[poiesis]]'' como [[imagens]] sonoro-visuais, que manifestam o [[real]] em [[caminhos]] que não conduzem a [[lugar]] nenhum, porque o [[caminho]] é o [[próprio]] [[real]] se dando em [[desvelo]] velado de [[realizações]]. Nesta [[escuta]] erótico-amorosa, a [[linguagem]] [[poética]] do [[silêncio]] se tece e entretece mergulhando tanto mais nas profundezas, como [[raiz]], quanto mais eclode no [[livre aberto]] de toda [[abertura]] e [[clareira]] apropriante e manifestante das [[questões]]" (1).
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: Referência:
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:  (1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Heidegger e as questões da arte”. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). '''Arte em questão: as questões da arte'''. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 19.
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: Se [[posição]] diz o [[estar]], o [[êxtase]] pode abrir-nos para o [[ser]], o que está fora de, além do [[estado]], da [[posição]], ou seja, o nos projetar no [[livre aberto]] ([[clareira]]) da [[libertação]] essencial. A [[possibilidade]] [[ontológica]] é a [[essência]] da [[liberdade]]. Daí advir no [[êxtase]] [[ontológico]] a [[completude]] da [[liberdade]], do [[livre aberto]], da [[clareira]], em que nos podemos projetar e sair dos nossos [[limites]] posicionais, [[substantivos]], da nossa [[finitude]].
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: - [[Manuel Antônio de Castro]]

Edição atual tal como 22h43min de 13 de Setembro de 2021

1

"O destino se apropria como a clareira do ser, que é, enquanto clareira. É a clareira que outorga a proximidade do ser. Nessa proximidade, na clareira do Da lugar, mora o homem como ex-sistente, sem que ele já possa hoje experimentar e assumir esse morar" (1).


Referência:
(1) HEIDEGGER, Martin. Carta sobre o humanismo. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1967, p. 61.


Ver também:
*Dar-se
*Doação
*Da sein - Dasein.

2

Heidegger dedica uma atenção profunda e ampla à questão da verdade, pois é nela que se decide e constrói o projeto do pensamento metafísico ocidental. Porém, Heidegger se centraliza na palavra grega alétheia, traduzida normalmente como verdade. O pensador prefere traduzi-la por desvelamento. Desvelamento é, inicialmente, o ón vindo à sua presença. Porém, se ficasse só no desvelamento ainda estaria se limitando à predominância do pensamento metafísico, que se constrói em cima da presença e da luz, sintetizado na questão motriz para Platão: Eîdos, que originou a palavra portuguesa ideia. Não podemos esquecer que para os gregos a grande e permanente questão é o permanecer. Então, Heidegger vai refletir sobre a possibilidade do ón aparecer como o que aparecendo se faz presente. E assim surge a questão da clareira. Ela não foi pensada pela filosofia e, por isso, quando a filosofia chega ao fim e é substituída pela ciência, a questão da clareira passa a ser a questão da filosofia. Mas aí a filosofia se torna um questionar enquanto pensar. E a questão não é mais simplesmente o ón enquanto o que se faz presente, mas a clareira, ou seja, o livre aberto. Como possibilidade de aparecimento, a presença do ón, ou seja, da clareira, como o lugar tanto do desvelar como do velar.
Diz Heidegger: "... o claro, no sentido do livre aberto, não possui nada de comum, nem sob o ponto de vista linguístico, nem no atinente à coisa que é expressa com o adjetivo 'luminoso', que significa 'claro'" (1).


- Manuel Antônio de Castro
Referência:
(1) HEIDEGGER, Martin. "O fim da filosofia e a tarefa do pensamento". In: Os pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1979, p. 79.
Ver também:

3

"Porque na clareira e só na clareira a luz da visão pode aparecer como luz e como visão. A luz não é a clareira. Pressupõe-na. Na clareira não há só luz, há também sombras. O raio que risca brilhando só o pode fazer porque brilha no aberto livre da clareira. Não vemos a partir da visão, vemos com a visão a partir do aberto livre da clareira" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Poíesis, sujeito e metafísica". In: CASTRO, Manuel Antônio de (org.). A construção poética do real. Rio de Janeiro: 7Letras, 2004, p. 33.

4

"Um grilo vivia numa clareira da Floresta. A clareira é dada pela ausência da Floresta na forma de liberdade das árvores. Em ausência, a Floresta presenteia o grilo com sua presença de claridade. É que na claridade da clareira se concentra toda a Floresta. Quer ouvindo a sinfonia dos sons ou respirando os perfumes silvestres, quer pulando sobre as folhas ou cantando o ar da liberdade, quer olhando a variedade das cores ou movendo-se no espaço dos lugares, o grilo pulsa com as pulsações e vibra com as vibrações da Floresta. Assim é justamente a ausência da Floresta que proporciona ao grilo liberdade para todos os casos de sua vida.
[...]
Até mesmo a única coisa, que, com a sua mecânica, o grilo julga conhecer da Floresta – a saber, que a Floresta é a não-clareira, a meta-clareira – ainda é um conhecimento da clareira. A clareira é todo o seu mundo. Todas as coisas presentes e ausentes, todos os casos reais e irreais, todas as combinações possíveis imagináveis, todas as sentenças verdadeiras ou falsas, toda a realidade e toda a possibilidade, o ser e o não-ser pertencem à clareira. Daí também, a não-clareira, a meta-clareira, dizendo o não-tudo, nenhuma coisa existente ou imaginável, nenhuma realidade ou possibilidade, nada em seu mundo, não tem sentido na clareira por força da própria clareira. Clareira e meta-clareira são a mesma coisa, enquanto ambas se acham igualmente aprisionadas e na dependência da mecânica da clareira" (1).


Referência:
(1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "A poesia e a linguagem". In: ______. Aprendendo a pensar. Petrópolis: Vozes, 1977, p. 175; p. 177.

5

"Na medida em que o ser vige a partir da alétheia, pertence a ele o emergir auto-desvelante. Nós denominamos isso a ação de auto-iluminar-se e a iluminação, a clareira (cf. Ser e tempo)" (1).


Referência:
(1) HEIDEGGER, Martin. Parmênides. Trad. Sérgio Mário Wrublevski. Petrópolis: Vozes, 2008, p. 155.

6

"Diga-se ainda que não é a posição ou data histórica da composição do mito e a forma narrativa que devem determinar o diálogo com ele. É que não podemos reduzir a narrativa a uma posição formal. Para haver posição, já antes o narrador se acha posicionado no horizonte que a própria linguagem abre. Podemos denominar essa abertura a clareira do aberto, na qual todo horizonte acontece. Horizonte é amplitude do visível em tensão com o não-visível. Mas para haver horizonte, já ele se mostrou na abertura da clareira" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O mito de Cura e o ser humano". In: .... .Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 226.

7

Em suas obras, Heidegger propõe pensar o homem enquanto o “lugar” (Da, em alemão, que aparece na palavra Dasein, no pensamento de Heidegger), a clareira, na qual o ser con-cresce e aparece. Não há clareira sem floresta, porém a floresta aparece como floresta na medida em que se retira e se deixa ver, perceber, manifestar, isto é, vir à luz, iluminar-se, na clareira. Eis a verdade como a-letheia. Ora, o Da- indica o lugar do entre, isto é, o vigorar ambíguo do que dando-se, presenteando-se, se retrai. O ser humano não é apenas Da-, é Da-sein, Entre-ser, segundo Heidegger. Eis aí bem clara a clareira numa dialética constante com a floresta. Só o ser humano possui o caráter fundamental (Grundzug) de ec-sistência: a insistência ec-stática na verdade do ser. Portanto, é impossível separar clareira de verdade, em que esta é o próprio ser humano sendo. O homem é a presença, palavra esta que se compõe de prae-, prefixo latino que significa: lugar, localização; e -sença: -sentia, do verbo latino esse, ser. Desta maneira, só o homem existe e tem consciência disso, pois é isto o que o diferencia dos demais entes. É nesse sentido que não podemos separar ser humano de verdade e esta de ser. Desse modo o que caracteriza essencialmente o ser humano é a diferença ontológica, ou seja, a existência.


- Manuel Antônio de Castro.

8

"Assim como a clareira é doação da floresta e a música, que é nossa vida, é doação e presentificação do silêncio. Nesse e sempre nesse horizonte, a vida é doação da morte. Por isso, somos mortais. A morte não é o fim, mas a plenitude da vida na qual agir e não-agir são um e o mesmo: ser-feliz" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. “O mito de Midas da morte ou do ser feliz”. In: ------. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 210.

9

"A Terra se entretecendo como mundo é o Sol se doando em dias e noites. Terra E Sol tanto mais se doam quanto mais se retraem. O mundo doado pela Terra E pelo Sol é a clareira do claro aberto do “entreambíguo. A clareira originária do “entreintegra Mundo E Terra e Sol" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Interdisciplinaridade poética: o entre". Rio de Janeiro: Revista Tempo Brasileiro: Interdisciplinaridade: dimensões poéticas, 164, jan.-mar., 2006, p. 34.

10

"Nas imagens-questões há uma tensão permanente entre o dito da língua e a ausculta da linguagem. No trânsito desse transe transam o saber e sabor de toda sabedoria da poiesis como imagens sonoro-visuais, que manifestam o real em caminhos que não conduzem a lugar nenhum, porque o caminho é o próprio real se dando em desvelo velado de realizações. Nesta escuta erótico-amorosa, a linguagem poética do silêncio se tece e entretece mergulhando tanto mais nas profundezas, como raiz, quanto mais eclode no livre aberto de toda abertura e clareira apropriante e manifestante das questões" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Heidegger e as questões da arte”. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). Arte em questão: as questões da arte. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 19.

11

Se posição diz o estar, o êxtase pode abrir-nos para o ser, o que está fora de, além do estado, da posição, ou seja, o nos projetar no livre aberto (clareira) da libertação essencial. A possibilidade ontológica é a essência da liberdade. Daí advir no êxtase ontológico a completude da liberdade, do livre aberto, da clareira, em que nos podemos projetar e sair dos nossos limites posicionais, substantivos, da nossa finitude.


- Manuel Antônio de Castro