Ausculta

De Dicionrio de Potica e Pensamento

1

Ausculta é a audição que se torna audição, isto é, que se ouve como escuta. Porém toda escuta, para se tornar ausculta, pressupõe uma fala. Quem fala? A linguagem. Esta, falando e se dando a escutar, funda a ausculta, isto é, o ser humano. Tudo que é escuta, mas não necessariamente ausculta. O que é se dá em linguagem e funda a escuta e a ausculta. No homem, o Ser se destina como ausculta, a fala da linguagem. A escuta da linguagem (lógos) é a manifestação do Ser no ser humano, em que este se escutando no que fala pode e deve auscultar o Ser. A fala e a escuta sem a ausculta põem e estatuem a subjetividade. A fala e a escuta a partir da ausculta põem, instituem e constituem o humano do homem. Só então o homem é homem e só então, propriamente, o homem fala e escuta. É a vigência da ausculta da fala da linguagem do Ser.


- Manuel Antônio de Castro

2

"Ouve-me. Ouve o meu silêncio. O que falo nunca é o que falo e, sim, outra coisa. Capta a outra coisa porque eu mesmo não posso" (1). Como nos diz a pensadora-poeta Clarice, a escuta real pressupõe também silêncio. Quando tal acontece, temos o auscultar, a ausculta. Mas toda escuta do silêncio, ou ausculta, é pensar.


- Manuel Antônio de Castro.
Referência:
(1) LISPECTOR, Clarice. Texto publicado numa montagem artística de fotos com textos de Clarice, sem indicação da fonte.

3

"O homem só é homem pela escuta, mas não por qualquer escuta. Para isso já nos advertia há dois mil e seiscentos anos o pensador Heráclito, no fragmento 50:
Auscultando não a mim, mas ao Lógos, é sábio concordar que tudo é um (1).
Não é ao poeta, ao compositor, ao cantor, enfim, ao homem que devemos escutar, mas ao lógos. Este é a irrupção, em nossa vida ordinária, do extraordinário, da Linguagem poética, do mito, enfim, do sagrado" (2).


Referências:
(1) HERÁCLITO. Fragmento 50. In: Os pensadores originários - Anaximandro, Parmênides, Heráclito. Trad. Emmanuel Carneiro Leão. Petrópolis: Vozes, 1991, p. 71.
(2) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ulisses e a Escuta do Canto das Sereias”. In: -----. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 152.

4

"A ausculta do lógos nos remete para o mistério da realidade, onde a diversidade de tempos e lugares, de homens e coisas, de mortais e imortais, é um, porque o lógos é a unidade de reunião da tensão de contrários da realidade, em sua ambiguidade abismal e misteriosa" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ulisses e a Escuta do Canto das Sereias”. In: -----. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 152.

5

"A experienciação da linguagem como nosso maior bem não pode ser ensinada nem transmitida, porque é ethos. O que cada um é só pode ser experienciação a partir do que cada um é. E nem é decisão de cada um. É uma doação para a qual somos convocados pela ausculta. Mas a ausculta também nos é dada. Diz Hölderlin:
O mais perigoso de todos os bens foi dado ao homem:
a linguagem...
Para que ele testemunhe o que ele é...


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. Linguagem: nosso maior bem. Série Aulas Inaugurais. Faculdade de Letras, UFRJ, 2o. sem. / 2004, p. 26.
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