Coisa

De Dicionrio de Potica e Pensamento

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:"Sobretudo aprendera agora a se [[proximidade|aproximar]] das coisas sem ligá-las à sua [[função]]. Parecia agora poder ver como seriam as coisas e as pessoas antes que lhes tivéssemos dado o sentido de nossa [[esperança]] humana ou de nossa [[dor]]. Se não houvesse humanos na Terra, seria assim: chovia, as coisas se ensopavam sozinhas e secavam e depois ardiam secas ao sol e se crestavam em poeira. Sem dar ao [[mundo]] o nosso sentido, como Lóri se assustava!" (1).
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: "Sobretudo aprendera agora a se [[proximidade|aproximar]] das coisas sem ligá-las à sua [[função]]. Parecia agora poder ver como seriam as coisas e as pessoas antes que lhes tivéssemos dado o sentido de nossa [[esperança]] humana ou de nossa [[dor]]. Se não houvesse humanos na Terra, seria assim: chovia, as coisas se ensopavam sozinhas e secavam e depois ardiam secas ao sol e se crestavam em poeira. Sem dar ao [[mundo]] o nosso sentido, como Lóri se assustava!" (1).
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:(1) LISPECTOR, Clarice. ''Uma aprendizagem ou o livro dos prazeres''. 4ª. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1974, p. 32.
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: (1) LISPECTOR, Clarice. '''Uma aprendizagem ou o livro dos prazeres'''. 4. e. Rio de Janeiro: José Olympio, 1974, p. 32.
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:A respeito, conferir itens abaixo.
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: "Um dos transcendentais de [[ente]] é ser [[uno]]. Leibniz pensou-o como ''principium identitatis indiscernibilium'': o [[princípio]] de [[identidade]] dos indiscerníveis" (1).  
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:BAKHTIN, Mikhail. ''Estética da criação verbal''. São Paulo: Martins Fontes, 2000, pp. 403-405 e p. 407.
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: (1) HEIDEGGER, Martin. '''O que é uma coisa?'''. Lisboa: Edições 70, 1992, p.32.
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:HEIDEGGER, Martin. ''Ser e Tempo''. Petrópolis: Vozes, 1988, p. 206, § 32.
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:Para: [[sentido]] restrito - sentido ''lato'' - sentido ainda mais ''lato'' - coisa-em-si - coisa-para-nós ([[fenômeno]]): Consultar(1).  
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: "Não se deve esperar encontrar nas [[línguas]] arcaicas essa [[terminologia]] dos [[filósofos]] - [[real]]-[[irreal]] etc. -, mas encontra-se a [[coisa]]" (1).  
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:Sobre a relação entre coisa e disciplina, consultar(2).  
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:(1)HEIDEGGER, Martin. ''Que é uma coisa?''. Lisboa: Edições 70, 1992, p.17.
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:(2)______. ''Heráclito''. Rio de Janeiro: Relumme Dumará, 1998, p. 244.
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: (1) ELIADE, Mircea. '''O sagrado e o profano'''. São Paulo: Martins Fontes, 2001, p. 18
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:Um dos transcendentais de [[ente]] é ser [[uno]]. Leibniz pensou-o como ''principium identitatis indiscernibilium'': o princípio de [[identidade]] dos indiscerníveis.  
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: "Reunião integradora é o que diz uma antiga [[palavra]] da [[língua]] alemã ''Ding'', [[coisa]]" (1).
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:HEIDEGGER, Martin. ''O que é uma coisa?''. Lisboa: Edições 70, 1992, p.32.
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: (1) HEIDEGGER, Martin. "Construir, habitar, pensar". In: '''Ensaios e Conferências'''. Tradução de Emmanuel Carneiro Leão, Gilvan Fogel e Marcia Sá Cavalcante Schuback. Petrópolis: Vozes, 2001, p. 133.
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:"Não se deve esperar encontrar nas línguas arcaicas essa [[terminologia]] dos filósofos - real-irreal etc. -, mas encontra-se a coisa" (1).  
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: Fritjof Capra (1), baseado em [[conceitos]], estabelece dois níveis de aproximação da [[coisa]] como [[organismo]]. Primeiro: [[padrão]] organizacional; segundo: [[estrutura]]. Com estes dois níveis ele quer dar conta da [[questão]] que dá [[início]] à trajetória [[ocidental]]: o que permanece e o que muda. O que é [[questão]] inicial se reduz aos poucos em [[questão]] da [[essência]]. E esta acaba por ser reduzida ao [[conceito]], em diferentes graus de [[abstração]]: [[padrão]] [[organizacional]] e [[estrutura]] (singular). O importante, no caso da [[vida]], é que ele vai centralizar-se nos [[processos]]. E, nestes, na [[questão]] da [[autopoiese]], ou seja, no [[surgimento]] da [[ordem]] a partir do [[caos]]. A [[introdução]] deste, no entanto, traz algo que o [[padrão]] e a [[estrutura]] não dão. Basta [[pensar]] no [[fato]] de haver a [[morte]] em tensão com o [[caos]] e com a [[autopoiese]].  
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: O que é a [[morte]]? É a volta ao [[caos]]? Mas então como o [[caos]] pode [[ser]] a base da [[autopoiese]]? E note-se que a [[questão]] da [[coisa]] aparece então aí claramente, pois há duas [[mortes]]. A [[morte]] na [[ordem]] do ''[[bíos]]'' e a [[morte]] na [[ordem]] da ''[[dzoé]]''. Como? A [[memória]] morre? A [[história]] passa como [[história]]. E a [[memória]]? Não é por causa da [[memória]] que há [[história]]? Então qual a relação [[entre]] [[morte]], [[vida]] e [[memória]]? É neste [[horizonte]] que é [[necessário]] [[pensar]] a [[linguagem]] e com ela a [[coisa]], o [[mundo]] (''[[lógos]]'') e o [[sentido]]. Mas, então, o [[saber]] é da ordem da [[memória]]. E esta? Não pode ser reduzida às formações discursivas. As [[questões]] da [[vida]], [[morte]], [[memória]] e [[linguagem]] não são nem podem ficar dependentes das formações [[discursivas]]. Mas o inverso, porque estas são modos de encarar tais [[questões]]. Como na ordem dos [[discursos]] só há [[significados]], na ordem das [[questões]] se dá também a [[questão]] do [[sentido]]. [[Sentido]] não é [[significado]]. É mais. E é então que a [[morte]] se dá como [[morte]], a [[vida]] como [[vida]], a [[memória]] como [[memória]], a [[linguagem]] como [[linguagem]]. A [[coisa]] como [[coisa]]. É bem [[verdade]] que os geneticistas não pensam a [[coisa]], mas a [[unidade]]. Pode haver [[unidade]] que não seja [[coisa]]? E nem todo [[ente]] é [[unidade]]. [[Ente]] em [[grego]] [[é]] ''[[on]]'', que foi traduzido para o [[latim]] como [[ente]] e ''[[res]]''/[[coisa]]. [[Pensando]] a [[coisa]] no [[horizonte]] da [[unidade]] dos [[geneticistas]] ajuda a tirar o caráter [[abstrato]] do [[ente]], da [[coisa]], desde que apareça como [[questão]].
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:(1) ELIADE, Mircea. ''O sagrado e o profano''. São Paulo: Martins Fontes, 2001, p. 18
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: - [[Manuel Antônio de Castro]]
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: (1) CAPRA, Fritjof. '''A teia da vida'''. São Paulo: Cultrix, 2004.
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:Esta questão na [[interpretação]] do poema de Angelus Silesius: "A rosa é sem porquê". Conferir Emmanuel Carneiro Leão (1).
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: O que definiria um [[corpo]]? Ora, se observarmos quando perguntamos isso e fazemos da pergunta uma questão, tudo se complica. O princípio que definiria um corpo seria o mesmo do que define uma coisa? Mas, por outro lado, o que identificar como [[coisa]]? Claro que aí pressupomos nas nossas respostas duas questões já respondidas: a) ente/ser; b) finito/não finito. As duas se implicam. Nesse sentido, a determinação do limite é essencial. Mas como fazê-lo? Ele vem da [[coisa]] ou do que teorizamos o que seja a [[coisa]]? Normalmente, julgamos que algo fundamental numa [[coisa]] é a matéria. E, em cima deste, julgamos resolver a questão da [[coisa]] com a forma ou limite. Ocorre que mesmo antes de a forma ser questionada é necessário questionar a matéria. E isso ficou bem claro a partir de física quântica e da teoria da relatividade de Einstein. Onda e partícula são complementares, não no sentido de que uma suplementa a outra, mas de que a ''phýsis''/natureza/nascividade ora se mostra como partícula ora como onda, o que significa que ela, ao mesmo tempo, é onda e é partícula. O que aí fica misterioso é esse "e". Mas devemos compreender que a complementaridade não leva em conta a questão do que é e não-é. Porém, é aí que se põe e propõe a verdadeira questão. Ora, o mesmo se vai dar com Matéria e Energia. Matéria pode virar Energia e esta se condensar em Matéria. Na medida em que há essa intercambiação como apreender o que é [[coisa]]? E como fica aí o inter-(cambiar)? Então a [[coisa]] vai nos aparecer, a partir do entre, no horizonte do ser e não-ser, isto é, da questão do [[sentido]] e do [[mundo]]. Corpo aparece, portanto, na complexa e misteriosa realidade de matéria/energia, forma/limite, mundo/sentido, mas onde isso deve ser pensado no horizonte do não-limite, do ser e do não-ser.
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: - [[Manuel Antônio de Castro]]
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:(1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. ''Aprendendo a pensar II''. Petrópolis: Vozes, 1992, pp.182-183.
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:"[[Reunião]] integradora é o que diz uma antiga [[palavra]] da língua alemã ''Ding'', coisa" (1).
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: [[Rosa]] faz da [[coisa]] um [[tema]] constante. É prestar atenção, pois elas aparecem em seu [[vigor]] de [[mundo]] [[mítico]]. É preciso olhá-las com o [[olhar]] [[mítico]]: "Assim, o Menino, entre dia, no acabrunho, pelejava com o que não parecia [[querer]] em si. Não suportava atentar, a cru, nas [[coisas]], como são, e sempre vão ficando: mais pesadas, mais-[[coisas]] – quando olhadas sem precauções" (1). Este [[estado]] [[mítico]] é bem expresso por [[Rosa]] logo adiante, quando diz: "Depois do [[encanto]], a [[gente]] entrava no [[vulgar]] inteiro do [[dia]]. O dos [[outros]], não da [[gente]]" (2).
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: - [[Manuel Antônio de Castro]]
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:(1) HEIDEGGER, Martin. ''Ensaios e Conferências''. Tradução de Emmanuel Carneiro Leão, Gilvan Fogel e Marcia Sá Cavalcante Schuback. Petrópolis: Vozes, 2001, p. 133.
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: (1) ROSA, Guimarães. "Os Cimos". In: '''Primeiras Estórias'''. Rio de Janeiro: José Olympio, 1967, p. 172.
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: (2) Idem, p. 173.
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: "Eu sabia que não era para se [[responder]]. Ele, afinal, não falava o que dizia. Referia outro [[assunto]]. Cada [[coisa]] tem direito a ser uma [[palavra]]. Cada [[palavra]] tem o [[dever]] de não ser nenhuma [[coisa]]" (1).
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: (1) COUTO, Mia. '''O último voo do flamingo'''. Lisboa: Caminho, p. 139.
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:"Nunca se permitiria contar, mesmo a papai, que não conseguia pegar a "a coisa". Tudo o que mais valia exatamente ela não podia contar" (1).
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: (1) LISPECTOR, Clarice. '''Perto do coração selvagem'''. 4. e. Rio de Janeiro: Sabiá, 1972, p. 12.
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:"Nós também: estamos sempre a inventar [[regras]] na [[esperança]] de domar o que não se pode domar. O que, provavelmente, não se deve domar. A [[verdade]] insuportável, que a doce Alice nos obriga a encarar, é que vivemos em um [[mundo]] no qual existem muito mais [[enigmas]] do que respostas. Um mundo inconstante, cheio de coisas que servem para outras coisas - e não para aquelas que imaginamos a que estejam destinadas" (1). O autor está falando de Alice, a personagem paradoxal da obra de Lewis Carroll ''Alice no país das maravilhas''.
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: [[Manuel Antônio de Castro]].
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: (1) CASTELLO, José. "Por que ler 'Alice'?. In: '''O Globo''', Caderno '''Prosa e verso''', 23-05-2015, p. 5.
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: "Pois justamente a [[relação]] entre [[coisa]] e [[palavra]], e isso na configuração de [[ser]] e [[dizer]], foi uma das primeiras coisas que o [[pensamento]]  ocidental colocou em [[palavras]]. Essa [[relação]] avassalou o [[pensamento]] de tal modo que se pronunciou numa única [[palavra]]. Essa [[palavra]] diz: ''[[logos]]''. Essa [[palavra]] é, ao mesmo tempo, [[nome]] para o [[ser]] e para o [[dizer]]" (1).
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: (1) HEIDEGGER, Martin. "A essência da linguagem". In: ---. '''A caminho da Linguagem'''. Trad. Marcia Sá Cavalcante Schuback. Petrópolis (RJ): Vozes. Bragança Paulista (SP): Editora Universitária São Francisco, 2003, p. 144.
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: "O [[fogo]], sobrevindo, há de distinguir e [[reunir]] todas as [[coisas]]" (1).
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: (1) HERÁCLITO. Fragmento 66. In: '''Os pensadores originários - Anaximandro, Parmênides, Heráclito'''. Trad. Emmanuel Carneiro Leão. Petrópolis: Vozes, 1991, p. 75.
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: "O segundo [[argumento]] diz respeito à [[ideia]] de [[causa]], principal recurso para se [[explicar]] a [[razão]] da [[existência]] das [[coisas]]. [[Todas]] as [[coisas]] são isto ou aquilo por causa de [[outras]] [[coisas]]; nenhum [[ser]] pode [[ser]] por si mesmo, ou a partir de [[nada]]. Em outras [[palavras]], as [[coisas]] são [[relativas]] e impõe-se [[conceber]] como [[existente]], [[necessariamente]], um [[ser absoluto]] que é a [[causa]] de si mesmo e [[fundamento]] de [[todos]] os demais [[seres]]" (1). O Apresentador das obras de ''[[Santo Anselmo]]'' está se referindo ao segundo [[argumento]] de ''[[Santo Anselmo]]'' sobre a [[existência]] de [[Deus]], apresentado na sua [[obra]] ''Proslógio''.
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: - [[Manuel Antônio de Castro]].
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: Referência:
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: (1) ''Sto. Anselmo'' - Vida e Obra. Consultoria de Carlos Lopes de Mattos. In: '''Os Pensadores. Santo Anselmo - Abelardo'''. São Paulo: Abril Cultural, 2. e., 1979, p. VII.
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: "Porém: as “[[coisas]]” são [[questões]] e nos escapam porque são fugidias, embora acessíveis e disponíveis; enigmáticas, embora presentes e visíveis; [[simples]], embora complexas e impenetráveis; [[silenciosas]], embora insinuantes e [[musicais]]" (1).
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:Fritjof Capra, em ''A teia da vida'' (São Paulo: Cultrix, 2004) baseado em conceitos, estabelece dois níveis de aproximação da coisa como [[organismo]]. Primeiro: padrão organizacional; segundo: estrutura. Com estes dois níveis ele quer dar conta da questão que dá início à trajetória ocidental: o que permanece e o que muda. O que é questão inicial se reduz aos poucos em questão da essência. E esta acaba por ser reduzida ao conceito, em diferentes graus de abstração: padrão organizacional e estrutura (singular). O importante, no caso da vida, é que ele vai centralizar-se nos PROCESSOS. E, nestes, na questão da autopoiese, ou seja, no surgimento da ordem a partir do caos. A introdução deste, no entanto, traz algo que o padrão e a estrutura não dão. Basta pensar no fato de haver a morte em tensão com o caos e com a autopoiese. O que é a [[morte]]? É a volta ao caos? Mas então como o caos pode ser a base da autopoiese? E note-se que a questão da coisa aparece então aí claramente, pois há "duas mortes". A morte na ordem do bios e a morte na "ordem" da ''dzoé''. Como? A memória morre? A história passa como história. E a memória? Não é por causa da memória que há história? Então qual a relação entre "morte", vida e memória? É neste horizonte que é necessário pensar a linguagem e com ela a coisa, o mundo (logos) e o sentido. Mas então o saber é da ordem da memória. E esta? Não pode ser reduzida "às formações discursivas". As questões da vida, morte, memória e linguagem não são nem podem ficar dependentes das formações discursivas. Mas o inverso, porque estas são modos de encarar tais questões. Como na ordem dos discursos só há significados, na ordem das questões se dá também a questão do sentido. Sentido não é significado. É mais. E é então que a morte se dá como morte, a vida como vida, a memória como memória, a linguagem como linguagem. A coisa como COISA. É bem verdade que os geneticistas não pensam a coisa, mas a "unidade". Pode haver unidade que não seja? E nem todo ente é unidade. Ente em grego é ''on'', que foi traduzido para o latim como ente e ''res''/coisa. Pensando a coisa no horizonte da unidade dos geneticistas ajuda a tirar o caráter abstrato do ente, da coisa, desde que apareça como questão.
 
 +
: Referência:
-
:- [[Manuel Antônio de Castro]]
+
: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "A coisa como questão". '''Ensaio''' não publicado.

Edição atual tal como 02h13min de 16 de fevereiro de 2022

1

"Sobretudo aprendera agora a se aproximar das coisas sem ligá-las à sua função. Parecia agora poder ver como seriam as coisas e as pessoas antes que lhes tivéssemos dado o sentido de nossa esperança humana ou de nossa dor. Se não houvesse humanos na Terra, seria assim: chovia, as coisas se ensopavam sozinhas e secavam e depois ardiam secas ao sol e se crestavam em poeira. Sem dar ao mundo o nosso sentido, como Lóri se assustava!" (1).


Referência:
(1) LISPECTOR, Clarice. Uma aprendizagem ou o livro dos prazeres. 4. e. Rio de Janeiro: José Olympio, 1974, p. 32.

2

"Um dos transcendentais de ente é ser uno. Leibniz pensou-o como principium identitatis indiscernibilium: o princípio de identidade dos indiscerníveis" (1).


Referência:
(1) HEIDEGGER, Martin. O que é uma coisa?. Lisboa: Edições 70, 1992, p.32.

3

"Não se deve esperar encontrar nas línguas arcaicas essa terminologia dos filósofos - real-irreal etc. -, mas encontra-se a coisa" (1).


Referência:
(1) ELIADE, Mircea. O sagrado e o profano. São Paulo: Martins Fontes, 2001, p. 18

4

"Reunião integradora é o que diz uma antiga palavra da língua alemã Ding, coisa" (1).


Referência:
(1) HEIDEGGER, Martin. "Construir, habitar, pensar". In: Ensaios e Conferências. Tradução de Emmanuel Carneiro Leão, Gilvan Fogel e Marcia Sá Cavalcante Schuback. Petrópolis: Vozes, 2001, p. 133.

5

Fritjof Capra (1), baseado em conceitos, estabelece dois níveis de aproximação da coisa como organismo. Primeiro: padrão organizacional; segundo: estrutura. Com estes dois níveis ele quer dar conta da questão que dá início à trajetória ocidental: o que permanece e o que muda. O que é questão inicial se reduz aos poucos em questão da essência. E esta acaba por ser reduzida ao conceito, em diferentes graus de abstração: padrão organizacional e estrutura (singular). O importante, no caso da vida, é que ele vai centralizar-se nos processos. E, nestes, na questão da autopoiese, ou seja, no surgimento da ordem a partir do caos. A introdução deste, no entanto, traz algo que o padrão e a estrutura não dão. Basta pensar no fato de haver a morte em tensão com o caos e com a autopoiese.
O que é a morte? É a volta ao caos? Mas então como o caos pode ser a base da autopoiese? E note-se que a questão da coisa aparece então aí claramente, pois há duas mortes. A morte na ordem do bíos e a morte na ordem da dzoé. Como? A memória morre? A história passa como história. E a memória? Não é por causa da memória que há história? Então qual a relação entre morte, vida e memória? É neste horizonte que é necessário pensar a linguagem e com ela a coisa, o mundo (lógos) e o sentido. Mas, então, o saber é da ordem da memória. E esta? Não pode ser reduzida às formações discursivas. As questões da vida, morte, memória e linguagem não são nem podem ficar dependentes das formações discursivas. Mas o inverso, porque estas são modos de encarar tais questões. Como na ordem dos discursos só há significados, na ordem das questões se dá também a questão do sentido. Sentido não é significado. É mais. E é então que a morte se dá como morte, a vida como vida, a memória como memória, a linguagem como linguagem. A coisa como coisa. É bem verdade que os geneticistas não pensam a coisa, mas a unidade. Pode haver unidade que não seja coisa? E nem todo ente é unidade. Ente em grego é on, que foi traduzido para o latim como ente e res/coisa. Pensando a coisa no horizonte da unidade dos geneticistas ajuda a tirar o caráter abstrato do ente, da coisa, desde que apareça como questão.


- Manuel Antônio de Castro
Referência:
(1) CAPRA, Fritjof. A teia da vida. São Paulo: Cultrix, 2004.

6

O que definiria um corpo? Ora, se observarmos quando perguntamos isso e fazemos da pergunta uma questão, tudo se complica. O princípio que definiria um corpo seria o mesmo do que define uma coisa? Mas, por outro lado, o que identificar como coisa? Claro que aí pressupomos nas nossas respostas duas questões já respondidas: a) ente/ser; b) finito/não finito. As duas se implicam. Nesse sentido, a determinação do limite é essencial. Mas como fazê-lo? Ele vem da coisa ou do que teorizamos o que seja a coisa? Normalmente, julgamos que algo fundamental numa coisa é a matéria. E, em cima deste, julgamos resolver a questão da coisa com a forma ou limite. Ocorre que mesmo antes de a forma ser questionada é necessário questionar a matéria. E isso ficou bem claro a partir de física quântica e da teoria da relatividade de Einstein. Onda e partícula são complementares, não no sentido de que uma suplementa a outra, mas de que a phýsis/natureza/nascividade ora se mostra como partícula ora como onda, o que significa que ela, ao mesmo tempo, é onda e é partícula. O que aí fica misterioso é esse "e". Mas devemos compreender que a complementaridade não leva em conta a questão do que é e não-é. Porém, é aí que se põe e propõe a verdadeira questão. Ora, o mesmo se vai dar com Matéria e Energia. Matéria pode virar Energia e esta se condensar em Matéria. Na medida em que há essa intercambiação como apreender o que é coisa? E como fica aí o inter-(cambiar)? Então a coisa vai nos aparecer, a partir do entre, no horizonte do ser e não-ser, isto é, da questão do sentido e do mundo. Corpo aparece, portanto, na complexa e misteriosa realidade de matéria/energia, forma/limite, mundo/sentido, mas onde isso deve ser pensado no horizonte do não-limite, do ser e do não-ser.


- Manuel Antônio de Castro

7

Rosa faz da coisa um tema constante. É prestar atenção, pois elas aparecem em seu vigor de mundo mítico. É preciso olhá-las com o olhar mítico: "Assim, o Menino, entre dia, no acabrunho, pelejava com o que não parecia querer em si. Não suportava atentar, a cru, nas coisas, como são, e sempre vão ficando: mais pesadas, mais-coisas – quando olhadas sem precauções" (1). Este estado mítico é bem expresso por Rosa logo adiante, quando diz: "Depois do encanto, a gente entrava no vulgar inteiro do dia. O dos outros, não da gente" (2).


- Manuel Antônio de Castro
Referências:
(1) ROSA, Guimarães. "Os Cimos". In: Primeiras Estórias. Rio de Janeiro: José Olympio, 1967, p. 172.
(2) Idem, p. 173.

8

"Eu sabia que não era para se responder. Ele, afinal, não falava o que dizia. Referia outro assunto. Cada coisa tem direito a ser uma palavra. Cada palavra tem o dever de não ser nenhuma coisa" (1).


Referência:
(1) COUTO, Mia. O último voo do flamingo. Lisboa: Caminho, p. 139.

9

"Nunca se permitiria contar, mesmo a papai, que não conseguia pegar a "a coisa". Tudo o que mais valia exatamente ela não podia contar" (1).


Referência:
(1) LISPECTOR, Clarice. Perto do coração selvagem. 4. e. Rio de Janeiro: Sabiá, 1972, p. 12.

10

"Nós também: estamos sempre a inventar regras na esperança de domar o que não se pode domar. O que, provavelmente, não se deve domar. A verdade insuportável, que a doce Alice nos obriga a encarar, é que vivemos em um mundo no qual existem muito mais enigmas do que respostas. Um mundo inconstante, cheio de coisas que servem para outras coisas - e não para aquelas que imaginamos a que estejam destinadas" (1). O autor está falando de Alice, a personagem paradoxal da obra de Lewis Carroll Alice no país das maravilhas.


Manuel Antônio de Castro.
(1) CASTELLO, José. "Por que ler 'Alice'?. In: O Globo, Caderno Prosa e verso, 23-05-2015, p. 5.

11

"Pois justamente a relação entre coisa e palavra, e isso na configuração de ser e dizer, foi uma das primeiras coisas que o pensamento ocidental colocou em palavras. Essa relação avassalou o pensamento de tal modo que se pronunciou numa única palavra. Essa palavra diz: logos. Essa palavra é, ao mesmo tempo, nome para o ser e para o dizer" (1).


Referência:
(1) HEIDEGGER, Martin. "A essência da linguagem". In: ---. A caminho da Linguagem. Trad. Marcia Sá Cavalcante Schuback. Petrópolis (RJ): Vozes. Bragança Paulista (SP): Editora Universitária São Francisco, 2003, p. 144.

12

"O fogo, sobrevindo, há de distinguir e reunir todas as coisas" (1).


Referência:
(1) HERÁCLITO. Fragmento 66. In: Os pensadores originários - Anaximandro, Parmênides, Heráclito. Trad. Emmanuel Carneiro Leão. Petrópolis: Vozes, 1991, p. 75.

13

"O segundo argumento diz respeito à ideia de causa, principal recurso para se explicar a razão da existência das coisas. Todas as coisas são isto ou aquilo por causa de outras coisas; nenhum ser pode ser por si mesmo, ou a partir de nada. Em outras palavras, as coisas são relativas e impõe-se conceber como existente, necessariamente, um ser absoluto que é a causa de si mesmo e fundamento de todos os demais seres" (1). O Apresentador das obras de Santo Anselmo está se referindo ao segundo argumento de Santo Anselmo sobre a existência de Deus, apresentado na sua obra Proslógio.


- Manuel Antônio de Castro.
Referência:
(1) Sto. Anselmo - Vida e Obra. Consultoria de Carlos Lopes de Mattos. In: Os Pensadores. Santo Anselmo - Abelardo. São Paulo: Abril Cultural, 2. e., 1979, p. VII.

14

"Porém: as “coisas” são questões e nos escapam porque são fugidias, embora acessíveis e disponíveis; enigmáticas, embora presentes e visíveis; simples, embora complexas e impenetráveis; silenciosas, embora insinuantes e musicais" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "A coisa como questão". Ensaio não publicado.
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