Representação
De Dicionrio de Potica e Pensamento
Edição feita às 14h34min de 30 de Abril de 2017 por Profmanuel (Discussão | contribs)
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- O conceito de representação tem muitos aspectos, mas um se torna fundamental com o advento da ciência: "O que a ciência faz ao tornar o cântaro com vinho por uma cavidade com líquido não é propriamente falso, é apenas exato. Mas, com isso, falamos do ser da coisa cântaro? Do ponto de vista da experiência originária da coisa, uma cavidade com líquido nunca é um cântaro com vinho. Nesse sentido, o saber representativo, ao invés de mostrar a coisa, acaba por escondê-la e anulá-la" (1).
- Referência:
- (1) MICHELAZZO, José Carlos. Do um como princípio ao dois como unidade. São Paulo: Annablume, 1999, pp. 184-5.
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- Este é um dos conceitos mais difíceis quanto ao vigor da representação ou à sua proveniência. Martin Heidegger dá uma visão que radica no destinar-se: "E somente o que já se destinou a uma representação objetivante torna acessível, como objeto, o histórico da historiografia, isto é, de uma ciência" (1).
- Referência:
- (1) HEIDEGGER, Martin. "A questão da técnica". In: Ensaios e conferências. Petrópolis: Vozes, 2002, p. 27.
- Ver também:
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- Ernesto Grassi (1) trata a arte como representação, a partir do conceito aristotélico de mímesis. E não se detém na questão filosófica de Aristóteles. Mas quando chega na questão de relacionar arte/mundo surge a questão histórica da interpretação da obra a partir do seu mundo. E aí questiona a validade do conceito de representação. Então utiliza o conceito de representação em mais de um sentido. E problematiza mais a imagem como representação quando examina a arte gótica, onde a imagem não representa: "... não é cópia ou reprodução ou retrato - é algo em si. A imagem é algo de próprio em substância e significado, em aparência e aspecto" (2). Ou seja, cai o conceito de representação. Daí: "Todavia, a espiritualização ocidental de tudo quanto é humano, levada a efeito e atestada pela arte gótica, remonta a um novo mito universal que alicercou uma nova representação do homem: a doutrina cristã" (3). Quando não se enfrenta a representação do ponto de vista filosófico gera-se esse impasse. O uso da palavra representação gera contradições.
- Referências:
- (1) GRASSI, Ernesto. Arte e Mito. Lisboa: Livros do Brasil, s/d, p. 178.
- (2) Idem, p. 179.
- (3) Idem, p. 179.
- Ver também:
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- A representação é uma questão, porém foi reduzida a um conceito. É que, na realidade, não há, ontologicamente, representação. Há mímesis. Sem ser pensada em seu vigor como questão, essa ideia reduziu-a à representação. Se penso que posso representar uma casa, um homem, uma mulher e tantas outras "coisas" em nomes, não é verdade. O nome não dá, recebe. Por isso, a palavra é o jogar ambíguo do "entre". Para entender o alcance da representação em seu valor de verdade, basta notar que a representação, no que ela tem de representação, já nos diz de algo aparente, falso, simulacro. Isto quer dizer, por exemplo, que o amor, se é amor, não pode ser representação. A justiça, se é justiça, não pode ser representação. E assim por diante. Que representação há na dança? Na música? O que um templo representa? A representação não diz diretamente respeito à "coisa", mas aos conceitos de "coisa" e, por isso, ela se inscreve na tensão entre verdadeiro e falso. Ocorre que para além destes dois conceitos existe a "coisa" e sua manifestação e ocultamento. Dessa tensão é que provém essa estranha sensação de que, em muitos "casos", a "coisa" nos advém como "representação". A representação está ligada ao signo. Porém, ele já diz respeito à linguagem entendida e reduzida a um instrumento e à "coisa" como objeto.
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- A questão da linguagem enquanto representação, que começa como homoíosis (semelhança, da qual surge o conceito de verdade por adequação), ou seja, como instrumento representacional, se exacerba na pós-modernidade. De mediação entre a "coisa" e o conceito, ela se torna cada vez mais autônoma e passando a ser não só um instrumento de representação, em função da coisa transformada em instrumento, ela mesma substitui a coisa e passa a ser o "real". A representação vale pelo real, um real intrumental, onde o principal instrumento é a própria linguagem. Esse é o real da pós-modernidade: o real como representação e simulacro, o real como "real virtual" e não mais o virtual do real. A esse real virtual como representação corresponde a redução da "coisa" à instrumentalização do conceito. O conceito sem a questão torna-se o real instrumental, apreendido e compreendido na redução do real à sociedade do conhecimento em rede. O início disso está na modernidade, construída a partir do predomínio da "razão instrumental", que se expande de tal maneira que transforma a Mãe Terra em recursos naturais e os seres humanos em recursos humanos. Recurso é aí a disposição das "coisas" para serem instrumentos em-si e em instrumentos para fazer instrumentos. É o que Heidegger chama Ge-stell como essência da técnica, em "A questão da técnica" (1). Porém, é importante perceber que isso se dispõe no próprio programa e sistema educativo: é um saber representativo-instrumental. Só a arte resiste. Mas que arte?
- Referência:
- (1) HEIDEGGER, Martin. "A questão da técnica". In: Ensaios e conferências. Petrópolis: Vozes, 2002.
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- A questão da representação ganha uma clareza, no seu encaminhamento metafísico-cartesiano, naquilo que hoje se torna tão evidente: a virtualização. O virtual é a manifestação de uma ausência. Nesse sentido, em virtude da "virtualização", termos tradicionais como "real", "virtual", "atual" e "potencial" ganham novos sentidos. Toda ciência é representação. O nó da representação está no fato de que ela pressupõe que há a apreensão de um real gerado a partir de um anterior. Ocorre que a existência do real é que é o problema. O que é o real para que dele se possa fazer uma representação? Por isso, a representação só se dá em cima de uma ideia de real. E isto é metafísica.
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- Há uma tendência a ver na relação com a cidade um mimetismo de representação. O termo representação é muito limitado. Visto pela ótica da memória/fluxo de tempo/realidade/permanência, não há representação, mas a apropriação pela memória poética, como transfiguração, do que flui e acontece e fica enquanto imagem poética (ou não será arte, poíesis), não como cópia, mas como transfiguração e manifestação de mundo/cidade/sentido/verdade. Mas a insistência na representação talvez indique muito mais a falta do que disse antes. Daí a solidão, a predominância de vivências em vez de experienciações e junto com as vivências uma forte estetização de tudo, até da morte e da dor, daí a sensação de um presente em contínuo fazer-se, sem passado (de certo modo, também memória) e sem futuro (não pregnância da morte).
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- Sem dúvida, a representação é uma dimensão básica para a construção da realidade e do homem. Mas o que entender por representação? Ela gira basicamente em torno da construção de uma determinada realidade e do homem, na medida em que toda representação implica uma construção do espaço e do tempo. É nesse sentido que deve ser pensada a proximidade e a distância. Stuart Hall faz observações importantes sobre a relação espaço, tempo e representação: "O que importa para nosso argumento quanto ao impacto da globalização sobre a identidade é que o tempo e o espaço são também as coordenadas básicas de todos os sistemas de representação" (1). Seria necessário confrontar essas afirmações com o que desenvolve Martin Heidegger no início do ensaio "A coisa" (2). Enquanto Hall pensa em contexto de espaço e tempo, Heidegger pensa a clareira como lugar.
- Referências:
- (1) HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: DP&A, 2001, p. 70.
- (2) HEIDEGGER, Martin. "A coisa". In: Ensaios e conferências. Petrópolis: Vozes, 2002.
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- É um conceito complexo. Mas para além das relações internas ou externas, há aí todo um problema epistemológico e ontológico. Por isso, Heidegger viu perfeitamente que está ligado à questão da verdade, no mito da caverna. É que esse mito é a expressão vigorosa e essencial da questão. Todo o mito da caverna trata da questão do real e da sua representação. Também é importante aí a questão da luz, que pode ser vista em relação ao externo, ao interno e ao transcendente, daí ela estar ligada à razão. Mas como já Platão o indica, o sol, fonte de toda luz, é o que não pode ser visto. No fundo, a questão da representação é também a questão da verdade. Como pensador, Platão pensa a questão do que permanece no fluxo das mudanças, no parecer e aparecer. A sua marca de pensador está na criação original do eîdos. Mas o que no todo de seu pensamento quer dizer é a grande questão.
- Ver também:
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- Essa anotação trata do que representação não é. É retirada a citação do ensaio "A origem da obra de arte", quando Heidegger fala do templo e o mostra como abrindo um mundo. Refere-se à estátua do deus e mostra como nessa dimensão não há representação. Essa não-representação faz entender melhor a representação. A representação é própria das relações intramundanas estabelecidas pelas diferentes ciências. Enquanto phýsis, terra, mundo, não há representação. Diz: "Somente o templo, no seu permanecer aí, dá às coisas sua vista e aos homens a visão de si mesmos. Esta visão permanece tanto tempo aberta quanto a obra é uma obra, tanto tempo quanto o deus não a abandona. O mesmo acontece com a imagem do deus que o vencedor lhe consagra na batalha. Não é nenhuma cópia para que nela se tome conhecimento mais facilmente de como o deus parece, mas é uma obra que deixa o próprio deus presentificar-se e, assim, o deus propriamente é. O mesmo vale para a obra da linguagem" (1).
- Referência:
- (1) HEIDEGGER, Martin. A origem da obra de arte. Trad. Manuel Antônio de Castro e Idalina Azevedo da Silva. Parágrafo 77. Lisboa: Edições 70, 2010, p. 105.
- Ver também:
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- "O corpo não se determina por suas qualidades, nem se quantifica em sua substancialidade, que é sempre indômita ao cálculo. O corpo não admite representação. Em relação a formas e conceitos, processos e procedimentos, efeitos e causas, consequências e determinações, idealidades e materialidades, as representações têm valor satisfatório, conseguem se fazer valer pelo que representam. Tal é o caso porque representam o que já se constitui como representante por um lado e representado por outro. O que se nota, portanto, é que, sempre que a representação tem qualquer valor, ela não se distingue da própria coisa tal como ela se dá já num modo representativo de considerar. A representação válida é parte essencial da estrutura ôntica das coisas vistas como representáveis, mas não apenas passíveis de representação, e sim, unicamente pensáveis na medida em que representadas. Por outro lado, quando as representações se referem ao corpo – já pensado no sentido pleno de sua corporeidade – elas jamais conseguem impor sua validade. Apresentam-se sempre como substitutas insuficientes, dispositivos meramente ilustrativos, símbolos, analogias e signos" (1).
- Referência:
- (1) BRAGA, Diego. A terceira margem do mito: hermenêutica da corporeidade. In: Revista Terceira margem. Revista do Programa de Pós-graduação em Ciência da Literatura da UFRJ. Ano XIV, 22, jan.-jun, 2010, p. 60.
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- "É preciso reconhecer que, em toda representação, há uma condição de possibilidade da representação que já não pode ser representada. Como diz Emmanuel Careniro Leão, na introdução a Ser e tempo (1): "... ninguém pode pular a própria sombra". O que for irrepresentável, ou seja, este caráter pré-ontológico cujo elemento próprio se permite o pensar é o ser" (2).
- Referências:
- (1) HEIDEGGER, Martin. Ser e tempo. Petrópolis: Vozes, 2006, p. 550.
- (2) TAVARES, Renata. Do silêncio à liberdade - Uma Aprendizagem ou O livro dos prazeres. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2012, p. 49.
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- "No pensamento, portanto, nem tudo é representação. Ao contrário, toda representaçao nos remete a pensar as raízes e origens de sua vigência e constituição, toda representação inclui sempre um nível de pensamento que não representa nada, toda representação vive de acolher e aceitar, em seus limites, o mistério da realidade, subtraindo-se em todas as realizações" (1).
- Referência:
- (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. Posfácio. In: HEIDEGGER, Martin. Ser e tempo. Trad. Márcia Sá Cavalcante Schuback. 2. e. Petrópolis: Vozes, 2006, p. 550.
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- "Somos seres que, por milênios. foram programados para concentrar-se em determinadas possibilidades e obedecer a determinados princípios. Assim, fomos programados, numa história milenar, a crer no progresso e a ter fé no poder da dominação, fomos programados para seguir modelos e obedecer a paradigmas, para cumprir ditados e aceitar tabus. Numa palavra, fomos programados, não apenas para ter, mas sobretudo, para ser consciência. O conteúdo, que povoa nossa consciência, são representações do que é, do que foi e do que será. São representações do que pode ser, do que vem a ser, do que deve ser. São representações de crenças e valores, de angústias e ansiedade ,de dor e prazer, de frustrações e satisfações. São representações de tudo. Mas, por outro lado, sempre em qualquer tempo, em qualquer lugar ou condições, os homens não são apenas consciência e representações" (1).
- Referência:
- (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Sociedade do conhecimento: passes e impasses". In: Revista Tempo Brasileiro, 152, jan.-mar., 2003, p. 18.
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- A representação tem dois momentos no destino do ser, no percurso cultural do Ocidente. Num primeiro momento, diz, segundo a proposta de pensamento de Parmênides, o que é, o que não-é e o que vem-a-ser: to on, ou seja, toda representação – re-presentação - é um tornar a (re-), no caso tornar a se presentear, re-tomando o não-ser em todo vir a ser, num círculo poético inesperado, havendo, por isso mesmo, um contínuo e incessante re-a-presentar-se, sempre diferente na sua identidade de ser o que é. Funda-se na dialética de ser e não-ser. A-presentar é chegar à presença, sendo, isto é, re-presentando-se, tornando-se novamente presença. Num segundo momento, ao se passar, entre os gregos, do on parmenídico para o on metafísico. Neste e por este o eidos ontológico de Platão, o pensador, é reduzido ao eidos epistemológico, fundamento do platonismo, que passou a dominar a trajetória ocidental, pelo qual o logos de Heráclito é reduzido à razão. Desde então predomina esta representação pela qual o on se torna conceitual, permanente, essencialista, abstrato, pois abstrai as mudanças e diferenças, ou seja, sem as determinações e qualidades sensíveis e mutáveis, porque necessariamente temporais, da realidade concreto. No conceito abstrai-se o sentido do tempo, reduzido ao significado, ou seja, a uma representação linguística a partir de um código. Desde então a representação deixou de ser questão como era o on parmenídico.