Obra de arte

De Dicionário de Poética e Pensamento

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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. " ''Phýsis'' e humano: a arteâ€. In: -----. ''Arte: o humano e o destino''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 264.
: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. " ''Phýsis'' e humano: a arteâ€. In: -----. ''Arte: o humano e o destino''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 264.
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: Para [[compreender]] e [[apreender]] o que é o [[olhar]], o melhor [[caminho]] é [[pensar]] a [[diferença]] [[ontológica]] [[entre]] [[olhar]] e [[ver]]. Concretamente, um exemplo clássico pode nos fazer [[pensar]] essa [[diferença]]: quando Édipo, o famoso [[personagem]] do [[mito]] de Édipo, pensado por Sófocles em sua famosa [[obra]] ''Rei Édipo'', tinha [[olhos]] não penetrara e nem vira os [[caminhos]] de seu [[destino]]. É que o [[olho]] é [[funcional]], faz parte do nosso [[organismo]] que diz respeito ao [[olhar]], não necessariamente ao [[ver]], pois foi quando arrancou os [[olhos]] que passou a [[ver]] na [[luz]] da [[verdade]] os [[caminhos]] e [[descaminhos]] do seu [[destino]]. O [[olho]] diz respeito aos [[sentidos]], a [[visão]] diz respeito ao [[sentido]]. Não basta [[olhar]], é necessário [[ver]]. E é nesta distinção [[fundamental]] que os [[gregos]] pensaram a [[essência]] da ''[[aletheia]]'', [[desvelamento]] ou [[verdade]]. Por isso, este diz respeito à [[manifestação]] do [[sentido]] do [[destino]]. E é nesse [[horizonte]] que se diferencia radicalmente a [[verdade]] da [[obra de arte]] e a [[verdade]] [[funcional]] da [[lógica]], que fundamenta a [[ciência]] fundada na [[razão]].
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: - [[Manuel Antônio de Castro]].

Edição de 14h01min de 8 de Julho de 2019

1

Caminhar nas e com as questões dá o mesmo trabalho de limpar, arar, semear, plantar, o terreno e esperar a firme, mas lenta maturação do semeado para sua eclosão no e com o tempo propício. A semente para amadurecer precisa de três instâncias: a semente como tal, o terreno, o tempo de maturação. Notamos que a ação do homem - o trabalho - apenas agencia o que já tem ação em si mesmo, mas pelo ordenamento (legein) lhe dá sentido. Isso é o mesmo que questionar e aprender, porque quem medra enquanto aprender é o que se é, a vida que se recebeu. Desse trabalho surge o formar do que chega a desabrochar (infelizmente muitas sementes e seres humanos estiolam antes disso tudo acontecer), mas também a forma das obras de arte (e dos utensílios) e do próprio ser humano, que são indissociáveis, sendo impossível haver forma sem o triplo agir (trabalho em sentido amplo), onde se inclui e é necessário incluir o agir da natureza / physis, acima apresentado. Portanto, nada tem a ver com formalismos técnicos. Pelo contrário, é o que os gregos denominavam morphe, a presença da forma enquanto presença do agir e realizar-se. É nesse sentido que a obra de arte é aquela onde se faz presente não apenas uma forma, mas onde nesta vigora o próprio agir enquanto presença do sentido. Se considerarmos que a forma, de alguma maneira, introduz o limite, a presença enquanto sentido projeta o agir da obra para além do limite. É isso a morphe, em sentido grego.


- Manuel Antônio de Castro


Ver também:


2

As questões da realidade e do humano são a fonte de todo e qualquer mundo, enquanto sentido do destinar-se do ser. Há diferenças, sim, mas estas dizem respeito não a um novo ser humano, mas a uma explicitação mais ampla e a aspectos diferentes daqueles tematizados e manifestados em épocas e obras anteriores. Devemos sempre considerar as obras de arte como grandes expedições de descoberta de paisagens novas da realidade naquilo que ela tem de essencial. Como jamais podemos separar a realidade da essência do humano, sendo esta uma doação dessa mesma realidade para que seja manifestada pelo próprio do ser humano, podemos afirmar que essas novas paisagens da realidade, que surgem da profundeza das obras de arte, nos encaminham para uma compreensão diferente da realidade.


- Manuel Antônio de Castro


3

Obra de arte é o mundo acontecendo como inesperado ou sentido do nada criativo.


- Manuel Antônio de Castro

4

"No utensílio, a forma é a sua finalidade. Como a obra de arte não tem finalidade nem funcionalidade, ela não tem forma. Presencia, desvela a realidade, que não cessa de velar-se, retrair-se. À presencialização da realidade no que ela é sendo é o que se chama telos, ou seja, a realidade se dando em sentido enquanto realização (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Obra de arte: presença e forma". In: ------. Leitura: questões. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2015, p. 221.

5

"A moral tende ao estático e estabelecido, ao sistema auto-referenciado. É bem o contrário da ética, onde o essencial é o poético. Não há ético sem poético e não há poético sem ético. E é isso que desde sempre se denominou obra de arte, se pusermos em primeiro lugar o que a palavra “obra†diz, aliás, o mesmo que poético no grego: o que age, o que faz acontecer, o que realiza. É necessário pensar a essência do agir, horizonte onde nos aparece a condição humana" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O humano, o poético e a contracultura". In: www.travessiapoetica.Blogspot.com.


6

"O estudo e classificações das obras de arte ficaram submissas à tradição retórico-gramatical, num conhecimento historiográfico de formas e influências sócio-culturais, segundo as diferentes épocas. Com isso, prevaleceu a concepção da língua como código e da obra – enquanto discurso – como organismo" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Obra de arte, vocabulário e mundo". In: ------------. Leitura: questões. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2015, p. 249.


7

"Cada obra de arte é uma semente pronta a eclodir, se mergulhada na terra fértil do diálogo (dia-logos). O diálogo, como fala sagrada e escuta, é o tempo propício [kairós] para a eclosão da dzoe / Vida, que subjaz na semente, que é a obra de arte.


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Obra de arte, vocabulário e mundo". In: ------------. Leitura: questões. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2015, p. 251.


8

"Tudo é reduzido a causas porque tudo é reduzido a funções dentro do sistema e as próprias funções estão em função, dentro do sistema, das finalidades do sistema, que se torna, então, o fundamento, o horizonte a partir do qual julgamos tudo e classificamos tudo. É dentro dessa estruturação que determinamos cada sendo ou melhor cada “coisaâ€, cada “utensílio†e cada “obra de arteâ€. Mas será que a obra de arte se reduz a um sistema de relações causais e funcionais? Não. Isso diz a Estética, produto do fundamento racional. A Poética, vigência do ser no sendo, da obra enquanto operar da verdade, diz o vigorar do fundar" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Fundar e fundamentar". In: Pensamento no Brasil, v.I - Emmanuel Carneiro Leão. SANTORO, Fernando e Outros, Org. Rio de Janeiro: Hexis, 2010, p. 213.


9

"Toda obra de arte é originária. Ela não é a-temporal. Pelo contrário, é o tempo em sua densidade máxima, porque na obra de arte acontece poeticamente o tempo da memória. É isso o que nos diz a palavra originário. A dificuldade em compreender e apreender o originário de toda obra de arte decorre de que nosso olhar já está, a priori, armado com algum suporte ou paradigma estético-formal ou ideológico intervencionista, para achar a sua função ou para classificá-la" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. “A menina e a bicicleta: arte e confiabilidadeâ€. In: ------. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 281.


10

"O operar das obras de arte, como dobra de phýsis e humano, radica sempre além e aquém de todo humanismo" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. " Phýsis e humano: a arteâ€. In: -----. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 264.


11

Para compreender e apreender o que é o olhar, o melhor caminho é pensar a diferença ontológica entre olhar e ver. Concretamente, um exemplo clássico pode nos fazer pensar essa diferença: quando Édipo, o famoso personagem do mito de Édipo, pensado por Sófocles em sua famosa obra Rei Édipo, tinha olhos não penetrara e nem vira os caminhos de seu destino. É que o olho é funcional, faz parte do nosso organismo que diz respeito ao olhar, não necessariamente ao ver, pois foi quando arrancou os olhos que passou a ver na luz da verdade os caminhos e descaminhos do seu destino. O olho diz respeito aos sentidos, a visão diz respeito ao sentido. Não basta olhar, é necessário ver. E é nesta distinção fundamental que os gregos pensaram a essência da aletheia, desvelamento ou verdade. Por isso, este diz respeito à manifestação do sentido do destino. E é nesse horizonte que se diferencia radicalmente a verdade da obra de arte e a verdade funcional da lógica, que fundamenta a ciência fundada na razão.


- Manuel Antônio de Castro.
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