Não-saber

De Dicionrio de Potica e Pensamento

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: "E era bom. '[[Não-entender]]' era tão vasto que ultrapassava qualquer [[entender]] - [[entender]] era sempre [[limite|limitado]]. Mas [[não-entender]] não tinha fronteiras e levava ao [[infinito]], ao [[Deus]]. Não era um [[não-entender]] como um [[simples]] de [[espírito]]. O [[bom]] era ter uma [[inteligência]] e não [[entender]]. Era uma bênção estranha como a de [[ter]] [[loucura]] sem [[ser]] doida. Era um desinteresse manso em [[relação]] às [[coisas]] ditas do intelecto, uma doçura de estupidez" (1).
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: "E era bom. '[[Não-entender]]' era tão vasto que ultrapassava qualquer [[entender]] - [[entender]] era [[sempre]] [[limite|limitado]]. Mas [[não-entender]] não tinha [[fronteiras]] e levava ao [[infinito]], ao [[Deus]]. Não era um [[não-entender]] como um [[simples]] de [[espírito]]. O [[bom]] era ter uma [[inteligência]] e não [[entender]]. Era uma [[bênção]] estranha como a de [[ter]] [[loucura]] sem [[ser]] doida. Era um desinteresse manso em [[relação]] às [[coisas]] ditas do [[intelecto]], uma doçura de estupidez" (1).
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: (1) LISPECTOR, Clarice. ''Uma aprendizagem ou o livro dos prazeres''. 4. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1974, p. 42.
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: (1) LISPECTOR, Clarice. '''Uma aprendizagem ou o livro dos prazeres'''. 4. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1974, p. 42.
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: Quem pergunta é porque já quer ([[saber]]) e este [[querer]] não nos vem de nossa [[vontade]], mas do [[ser]] / [[saber]] (em Parmênides: ''[[einai]]'' / ''[[noein]]'') que nos foi doado e o qual tendemos já desde sempre a [[realizar]] completamente, mas porque somos limitados nunca conseguimos de maneira completa, pois nele não mais poderia haver [[saber]] e [[não-saber]]. Daí surge a [[dialética]] enquanto [[procura]] incessante de [[proximidade]] e [[distância]], de [[completude]] e falta, de [[sentido]] e [[não-sentido]], de [[verdade]] e [[não-verdade]], onde um tal não não indica falta, mas o que já se tem e tem demais e nunca cabe em nossos [[limites]]. Por isso, dentro deles só fazemos nos entregar incessantemente à [[procura]] da [[plenitude]] para a qual tendemos por sermos e não-sermos, e jamais como uma decisão de nossa [[vontade]], que só aparentemente é que quer.
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: Quem pergunta é porque já quer ([[saber]]) e este [[querer]] não nos vem de nossa [[vontade]], mas do [[ser]] / [[saber]] (em Parmênides: ''[[einai]]'' / ''[[noein]]'') que nos foi doado e o qual tendemos já desde sempre a [[realizar]] completamente, mas porque somos limitados nunca conseguimos de maneira completa, pois nele não mais poderia haver [[saber]] e [[não-saber]]. Daí surge a [[dialética]] enquanto [[procura]] incessante de [[proximidade]] e [[distância]], de [[completude]] e falta, de [[sentido]] e [[não-sentido]], de [[verdade]] e [[não-verdade]], onde um tal não não indica falta, mas o que já se tem e tem demais e nunca cabe em nossos [[limites]]. Por isso, dentro deles só fazemos nos entregar incessantemente à [[procura]] da [[plenitude]] para a qual tendemos por [[sermos]] e [[não-sermos]], e jamais como uma [[decisão]] de nossa [[vontade]], que só aparentemente é que quer.
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: "Dos dois elementos, [[saber]] e [[não-saber]], fizemos assim um só, uma condição de [[possibilidade]] da [[pergunta]] e que, na sua ainda indeterminação, podemos chamar de “''[[pré-saber]] ou [[pré-compreensão]] que a pergunta implica''”. No entanto, o [[pré-saber]] da [[pergunta]] nunca está na [[pergunta]] sob [[forma]] [[temática]], mas [[a-temática]].  [[Tematicamente]] está nela o [[não-saber]] e o [[querer-saber]]" (1).
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: "Dos dois [[elementos]], [[saber]] e [[não-saber]], fizemos assim um só, uma condição de [[possibilidade]] da [[pergunta]] e que, na sua ainda indeterminação, podemos chamar de “''[[pré-saber]] ou [[pré-compreensão]] que a pergunta implica''”. No entanto, o [[pré-saber]] da [[pergunta]] nunca está na [[pergunta]] sob [[forma]] [[temática]], mas [[a-temática]].  [[Tematicamente]] está nela o [[não-saber]] e o [[querer-saber]]" (1).
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ulisses e a Escuta do Canto das Sereias”. In: -----. ''Arte: o humano e o destino''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 177.
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: "O [[pleno]] [[saber]] das [[Sereias]], da [[palavra cantada]] como [[voz]] do [[silêncio]], que é a [[possibilidade]] da [[experienciação]] da [[morte]], é a oferta do [[não-saber]] em todo [[saber]] da [[fala]], é a oferta do [[não-caminho]] e do [[não-sentido]] em todo [[caminho]] e [[sentido]] do [[mar]], em toda [[finitude]] da [[não-finitude]]" (1).
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ulisses e a Escuta do Canto das Sereias”. In: -----. '''Arte: o humano e o destino'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 179.
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O mito de Midas da morte ou do ser feliz". In: -------. '''Arte: o humano e o destino'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 199.
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: "O [[saber]] de toda [[resposta]] é [[sempre]] o [[limite]] experienciado a partir do [[não-saber]], mas manifesto no plano do [[saber]] [[orgânico]], que é [[sempre]] [[entitativo]]. Isso significa que a [[resposta]] não se dá nunca no âmbito do [[ser]], mas tão-somente no plano do [[ente]]. Isso se dá porque a [[resposta]], só em parte, é [[resposta]] à [[questão]] posta na [[pergunta]]. A [[resposta]] nunca se dá no plano do [[ser]], e sim somente no plano do [[ente]] enquanto [[ente]] do [[ser]]. A [[resposta]] vai [[sempre]] [[ser]] [[paradoxal]], pois responde no plano do [[ente]], embora se mova e só se possa mover no plano do [[ser]]" (1).
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O mito de Midas da morte ou do ser feliz". In: -------. '''Arte: o humano e o destino'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 199.
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: "Por mais que se veja [[sempre]] há muito mais para [[ver]]. Por mais que se saiba [[sempre]] há muito mais para [[saber]]. O que a todos une e convoca enquanto [[pensar]] é o [[não-saber]]. Pelo [[não-saber]] chegamos ao [[saber]] do [[Nada]] que se dá enquanto [[saber]] do [[não-saber]] do [[Nada]]. [[Saber]] e [[ser]] são manifestações do [[Nada]]. Nelas se dá a [[experienciação]] do [[tempo]] [[mítico]]-[[poético]], na [[ritualização]] da crono-logia" (1).
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Tempo: o poético-circular e a cronologia". '''[[Ensaio]]''' não publicado.

Edição atual tal como 22h26min de 12 de fevereiro de 2024

Tabela de conteúdo

1

"E era bom. 'Não-entender' era tão vasto que ultrapassava qualquer entender - entender era sempre limitado. Mas não-entender não tinha fronteiras e levava ao infinito, ao Deus. Não era um não-entender como um simples de espírito. O bom era ter uma inteligência e não entender. Era uma bênção estranha como a de ter loucura sem ser doida. Era um desinteresse manso em relação às coisas ditas do intelecto, uma doçura de estupidez" (1).


Referência:
(1) LISPECTOR, Clarice. Uma aprendizagem ou o livro dos prazeres. 4. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1974, p. 42.

2

Quem pergunta é porque já quer (saber) e este querer não nos vem de nossa vontade, mas do ser / saber (em Parmênides: einai / noein) que nos foi doado e o qual tendemos já desde sempre a realizar completamente, mas porque somos limitados nunca conseguimos de maneira completa, pois nele não mais poderia haver saber e não-saber. Daí surge a dialética enquanto procura incessante de proximidade e distância, de completude e falta, de sentido e não-sentido, de verdade e não-verdade, onde um tal não não indica falta, mas o que já se tem e tem demais e nunca cabe em nossos limites. Por isso, dentro deles só fazemos nos entregar incessantemente à procura da plenitude para a qual tendemos por sermos e não-sermos, e jamais como uma decisão de nossa vontade, que só aparentemente é que quer.


- Manuel Antônio de Castro.

3

"A pergunta implica sempre dois elementos: o saber e o não-saber. É este que faz surgir a pergunta para saber, mas ele não é um não-saber totalmente vazio, algo totalmente desconhecido. Trata-se antes - na unidade do saber e não-saber já ciente - de um não-saber em que pelo fato de perguntarmos o perguntado já é conhecido numa forma geral e indeterminada, mas não é ainda em forma específica e determinada" (1).


Referência:
(1) HUMMES, o.f.m. Cláudio. Metafísica. Mimeo. Daltro Filho / Imigrantes, RS, 1963. Depois tornou-se Bispo e hoje é Cardeal. Já faleceu.

4

"Para que haja pergunta já se exige mais que uma mútua delimitação de saber e não-saber: exige-se um não-saber ciente, que ciente do seu próprio não-saber e ultrapassando-o se projeta para mais adiante do que onde ele está, na direção do ainda-não-sabido, pois, do contrário, não poderia constituir uma direção. De um tal não-saber ciente surge o querer saber e do querer saber surge a pergunta" (1).


Referência:
(1) HUMMES, o.f.m. Cláudio. Metafísica. Mimeo. Daltro Filho / Imigrantes, RS, 1963. Depois tornou-se Bispo e hoje é Cardeal. Já faleceu.

5

"Dos dois elementos, saber e não-saber, fizemos assim um só, uma condição de possibilidade da pergunta e que, na sua ainda indeterminação, podemos chamar de “pré-saber ou pré-compreensão que a pergunta implica”. No entanto, o pré-saber da pergunta nunca está na pergunta sob forma temática, mas a-temática. Tematicamente está nela o não-saber e o querer-saber" (1).
Referência:
(1) HUMMES, o.f.m. Cláudio. Metafísica. Mimeo. Daltro Filho / Imigrantes, RS, 1963. Depois tornou-se Bispo e hoje é Cardeal. Já faleceu.

6

"Poética e miticamente a Palavra Cantada nos aparece como Memória, Musas e Sereias. Estas, por tudo saberem, têm como reverso a morte. Há a definição da morte “biológica”, mas nós não sabemos o que é a morte do que somos. E por quê? Quem experimentou a morte não voltou para dizer. A morte é o umbral do não-saber, do saber infinito. Nosso saber é finito" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ulisses e a Escuta do Canto das Sereias”. In: -----. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 177.

7

"O pleno saber das Sereias, da palavra cantada como voz do silêncio, que é a possibilidade da experienciação da morte, é a oferta do não-saber em todo saber da fala, é a oferta do não-caminho e do não-sentido em todo caminho e sentido do mar, em toda finitude da não-finitude" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Ulisses e a Escuta do Canto das Sereias”. In: -----. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 179.

8

"O saber, todo saber, é entitativo. Só o saber do não-saber a partir do qual e no qual se põe a questão é não-entitativo, ou seja, se dá e vige, desde sempre, no âmbito do ser. É sempre a partir da vigência neste que se pode questionar, isto é, querer em tudo que quer o não-querer" (1).


Referência bibliográfica:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O mito de Midas da morte ou do ser feliz". In: -------. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 199.

9

"O saber de toda resposta é sempre o limite experienciado a partir do não-saber, mas manifesto no plano do saber orgânico, que é sempre entitativo. Isso significa que a resposta não se dá nunca no âmbito do ser, mas tão-somente no plano do ente. Isso se dá porque a resposta, só em parte, é resposta à questão posta na pergunta. A resposta nunca se dá no plano do ser, e sim somente no plano do ente enquanto ente do ser. A resposta vai sempre ser paradoxal, pois responde no plano do ente, embora se mova e só se possa mover no plano do ser" (1).


Referência bibliográfica:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O mito de Midas da morte ou do ser feliz". In: -------. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 199.

10

"Por mais que se veja sempre há muito mais para ver. Por mais que se saiba sempre há muito mais para saber. O que a todos une e convoca enquanto pensar é o não-saber. Pelo não-saber chegamos ao saber do Nada que se dá enquanto saber do não-saber do Nada. Saber e ser são manifestações do Nada. Nelas se dá a experienciação do tempo mítico-poético, na ritualização da crono-logia" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Tempo: o poético-circular e a cronologia". Ensaio não publicado.