Fato

De Dicionrio de Potica e Pensamento

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: "A [[história]] tem que se repensar originariamente em seu núcleo de [[manifestação]]: o [[acontecimento]], porque o [[acontecimento]] é o [[fato]] feito [[ato]]" (1). [[Fato]] provém do [[verbo]] latino ''facere'' (fazer, [[realizar]]), cujo particípio passado é ''factum'', que originou no português a [[palavra]] [[fato]], ou seja, o já feito, o que se tornou [[realização]]. Mas não há [[realização]] sem um [[processo]] histórico do [[realizar-se]]. O [[fato]] mantém assim implicitamente uma [[dinâmica]] sem a qual não poderia tornar-se [[realização]]. Por outro lado, o seu [[sentido]] provém da inserção na dinâmica histórica. E insisto neste aspecto: dinâmica histórica, pois [[apreender]] o [[sentido]] de qualquer [[fato]] supõe uma [[sociedade]] em contínua [[transformação]] segundo o [[sentido]] da [[história]]. Isso é o [[acontecer poético]] da [[realidade]]. De imediato, esse [[sentido]] se insere mais diretamente na [[época]] da qual o [[fato]] faz parte. Em última instância, a própria [[sociedade]] ou o [[social]] também depende do [[sentido]] desta [[dinâmica]] histórica no [[manifestar]] o [[sentido]] da [[realidade]]. Essa [[dinâmica]] histórica, enquanto [[sentido]] manifestando-se, encontra nas [[obras de arte]], em todas as [[artes]], o seu [[lugar]] de [[manifestação]] ou desvelamento. O [[ser humano]] não é determinado pelo [[social]], pelo contrário, encontra o seu [[sentido]] último no [[sentido]] da [[história]] enquanto o [[sentido]] da própria [[realidade]]. E é no [[ser humano]] que esse [[sentido]] acontece, podendo afirmar-se, neste [[horizonte]], que o a [[história]] (e não o [[social]] como tal) faz o [[homem]] e o [[homem]] faz a [[história]]. A esta [[dobra]] e seu [[sentido]] se pode denominar: o [[existir]] do [[ser humano]]. Sem este [[existir]] não há [[fatos]]. O [[sentido]] acontecendo é tal [[dinâmica]] eclodindo enquanto [[linguagem]]. Daí a sua ligação profunda com as [[obras de arte]], na medida em que estas, necessariamente, são [[mundo]] enquanto a [[verdade]] da [[realidade]], do [[ser]].
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: "A [[história]] tem que se repensar originariamente em seu núcleo de [[manifestação]]: o [[acontecimento]], porque o [[acontecimento]] é o [[fato]] feito [[ato]]" (1).  
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: [[Fato]] provém do [[verbo]] latino ''facere'' (fazer, [[realizar]]), cujo particípio passado é ''factum'', que originou no português a [[palavra]] [[fato]], ou seja, o já feito, o que se tornou [[realização]]. Mas não há [[realização]] sem um [[processo]] histórico do [[realizar-se]]. O [[fato]] mantém assim implicitamente uma [[dinâmica]] sem a qual não poderia tornar-se [[realização]]. Por outro lado, o seu [[sentido]] provém da inserção na dinâmica histórica. E insisto neste aspecto: dinâmica histórica, pois [[apreender]] o [[sentido]] de qualquer [[fato]] supõe uma [[sociedade]] em contínua [[transformação]] segundo o [[sentido]] da [[história]]. Isso é o [[acontecer poético]] da [[realidade]]. De imediato, esse [[sentido]] se insere mais diretamente na [[época]] da qual o [[fato]] faz parte. Em última instância, a própria [[sociedade]] ou o [[social]] também dependem do [[sentido]] desta [[dinâmica]] histórica no [[manifestar]] o [[sentido]] da [[realidade]]. Essa [[dinâmica]] histórica, enquanto [[sentido]] manifestando-se, encontra nas [[obras de arte]], em todas as [[artes]], o seu [[lugar]] de [[manifestação]] ou [[desvelamento]]. O [[ser humano]] não é determinado pelo [[social]], pelo contrário, encontra o seu [[sentido]] último no [[sentido]] da [[história]] enquanto o [[sentido]] da própria [[realidade]]. E é no [[ser humano]] que esse [[sentido]] acontece, podendo afirmar-se, neste [[horizonte]], que a [[história]] (e não o [[social]] como tal) faz o [[homem]] e o [[homem]] faz a [[história]]. A esta [[dobra]] e seu [[sentido]] se pode denominar: o [[existir]] do [[ser humano]]. Sem este [[existir]] não há [[fatos]]. O [[sentido]] acontecendo é tal [[dinâmica]] eclodindo enquanto [[linguagem]]. Daí a sua ligação profunda com as [[obras de arte]], na medida em que estas, necessariamente, são [[mundo]] enquanto a [[verdade]] da [[realidade]], do [[ser]].
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. ''O acontecer poético''. Rio de Janeiro: Antares, 1982, p. 45.
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. '''O acontecer poético'''. Rio de Janeiro: Antares, 1982, p. 45.
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: Para [[compreender]] o [[fato]] devemos apreendê-lo em seu [[acontecer]], que é o [[acontecer]] da [[realidade]]. Esta não cessa de se manifestar em [[fenômenos]], sejam históricos, sejam naturais, sejam psíquicos ou até artísticos, enfim, sejam humanos. [[Fenômeno]] é em si um processo acontecendo, se realizando. O [[fato]] indica o resultado final do [[processo]] ou [[fenômeno]] em sua [[realização]]. Todo [[fato]] é o resultado de um [[fazer]] no sentido de [[acontecer]] de [[tempo]] e [[ser]], ou seja, da [[manifestação]] da [[realidade]] em suas [[realizações]]. Não há [[fato]] sem o [[agir]]. Muitas vezes à totalidade dos [[fatos]] denominamos [[real]].
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: Para [[compreender]] o [[fato]] devemos apreendê-lo em seu [[acontecer]], que é o [[acontecer]] da [[realidade]]. Esta não cessa de se manifestar em [[fenômenos]], sejam [[históricos]], sejam [[naturais]], sejam [[psíquicos]] ou até [[artísticos]], enfim, sejam [[humanos]]. [[Fenômeno]] é em si um [[processo]] [[acontecendo]], se realizando. O [[fato]] indica o resultado final do [[processo]] ou [[fenômeno]] em sua [[realização]]. Todo [[fato]] é o resultado de um [[fazer]] no sentido de [[acontecer]] de [[tempo]] e [[ser]], ou seja, da [[manifestação]] da [[realidade]] em suas [[realizações]]. Não há [[fato]] sem o [[agir]]. Muitas vezes à totalidade dos [[fatos]] denominamos [[real]].
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Liberdade, vontade e uso de drogas". In: ----. '''Arte: o humano e o destino'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 274.
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: "Para Binswanger a [[vida]] [[mental]] é [[sintonia]] e [[disposição]] [[afetiva]], ''Stimmung und Befindlichkeit'', dois termos tirados de ''Ser e Tempo''. Uma [[pessoa]] nunca é, nem mesmo pode [[ser]] somente [[fato]] bruto. Todo [[fato]] é sempre [[feito]] e [[feito]] num [[processo]] sobredeterminado e [[pessoal]] de [[fazer]]. Todo [[sintoma]] tem um [[sentido]] dentro de uma nova [[intencionalidade]]. Por isso é [[necessário]] [[buscar]] não apenas os [[mecanismos]] de sua [[formação]], mas também a [[intencionalidade]] de seu [[sentido]] [[pessoal]]" (1).
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: Referência:
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: (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Análise da Existência humana em Binswanger". In: -----. '''Filosofia contemporânea'''. Teresópolis/RJ: Daimon Editora, 2013, p. 69.

Edição atual tal como 20h57min de 15 de fevereiro de 2024

Tabela de conteúdo

1

"A história tem que se repensar originariamente em seu núcleo de manifestação: o acontecimento, porque o acontecimento é o fato feito ato" (1).
Fato provém do verbo latino facere (fazer, realizar), cujo particípio passado é factum, que originou no português a palavra fato, ou seja, o já feito, o que se tornou realização. Mas não há realização sem um processo histórico do realizar-se. O fato mantém assim implicitamente uma dinâmica sem a qual não poderia tornar-se realização. Por outro lado, o seu sentido provém da inserção na dinâmica histórica. E insisto neste aspecto: dinâmica histórica, pois apreender o sentido de qualquer fato supõe uma sociedade em contínua transformação segundo o sentido da história. Isso é o acontecer poético da realidade. De imediato, esse sentido se insere mais diretamente na época da qual o fato faz parte. Em última instância, a própria sociedade ou o social também dependem do sentido desta dinâmica histórica no manifestar o sentido da realidade. Essa dinâmica histórica, enquanto sentido manifestando-se, encontra nas obras de arte, em todas as artes, o seu lugar de manifestação ou desvelamento. O ser humano não é determinado pelo social, pelo contrário, encontra o seu sentido último no sentido da história enquanto o sentido da própria realidade. E é no ser humano que esse sentido acontece, podendo afirmar-se, neste horizonte, que a história (e não o social como tal) faz o homem e o homem faz a história. A esta dobra e seu sentido se pode denominar: o existir do ser humano. Sem este existir não há fatos. O sentido acontecendo é tal dinâmica eclodindo enquanto linguagem. Daí a sua ligação profunda com as obras de arte, na medida em que estas, necessariamente, são mundo enquanto a verdade da realidade, do ser.


- Manuel Antônio de Castro
Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. O acontecer poético. Rio de Janeiro: Antares, 1982, p. 45.

2

Para compreender o fato devemos apreendê-lo em seu acontecer, que é o acontecer da realidade. Esta não cessa de se manifestar em fenômenos, sejam históricos, sejam naturais, sejam psíquicos ou até artísticos, enfim, sejam humanos. Fenômeno é em si um processo acontecendo, se realizando. O fato indica o resultado final do processo ou fenômeno em sua realização. Todo fato é o resultado de um fazer no sentido de acontecer de tempo e ser, ou seja, da manifestação da realidade em suas realizações. Não há fato sem o agir. Muitas vezes à totalidade dos fatos denominamos real.


- Manuel Antônio de Castro

3

Todo evento é o realizar-se de uma possibilidade da realidade. A ideia de uma realidade estática é um equívoco. Ela não para de estar acontecendo. Nesse sentido temos em cada evento um acontecimento. Assim sendo, todo evento é uma realização da realidade. A noção de evento é muito importante, sobretudo para a ciência porque desfaz a ilusão de termos leis permanentes na ciência. Toda lei está ligada ao tempo. E este não para. Claro, há uma recorrência dos acontecimentos da vida, da realidade. Por exemplo, todo ser vivo morre algum dia. Porém, o principal dessa recorrência é o que acontece em seu realizar-se, o seu sentido, o seu motivo. Nesse sentido, devemos diferenciar a certeza dos conceitos pelas possibilidades contínuas de todo ente, de todo acontecer. Por isso, o evento é mais importante do que o fato e, então, temos a diferença fundamental, essencial, de conceito e questão. Desse modo, temos que passar de uma visão estática da realidade e da própria ciência para uma visão dinâmica. Neste horizonte, todo fato é a realização de uma possibilidade da realidade, mas que não se pode tornar uma lei universal, no que diz respeito à realidade. Essa lei universal diz muito mais respeito a uma determinada teoria da realidade. Nesse horizonte, com as descobertas da física quântica certas concepções de ciência sofreram uma grande transformação. Talvez, a maior delas é o fim da certeza absoluta, ou seja, de uma certeza que é uma verdade acabada. Todo evento, em seu sentido fundamental, essencial, é um acontecimento.


- Manuel Antônio de Castro.

4

"Quando o fato precede e determina o ato, deixa de haver liberdade essencial, deixa de haver a essência do agir. Há, portanto, o agir dos fatos e o agir dos atos. Que falamos é um fato, que podemos falar é um ato. Também podemos silenciar. Neste convivem muito bem ato e fato. Em todo ato de fala quem vigora sempre é a linguagem, falemos em que língua (fato) falemos" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Liberdade, vontade e uso de drogas". In: ----. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 274.

5

"Para Binswanger a vida mental é sintonia e disposição afetiva, Stimmung und Befindlichkeit, dois termos tirados de Ser e Tempo. Uma pessoa nunca é, nem mesmo pode ser somente fato bruto. Todo fato é sempre feito e feito num processo sobredeterminado e pessoal de fazer. Todo sintoma tem um sentido dentro de uma nova intencionalidade. Por isso é necessário buscar não apenas os mecanismos de sua formação, mas também a intencionalidade de seu sentido pessoal" (1).


Referência:
(1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Análise da Existência humana em Binswanger". In: -----. Filosofia contemporânea. Teresópolis/RJ: Daimon Editora, 2013, p. 69.