Questão
De Dicionário de Poética e Pensamento
Edição feita às 15h15min de 13 de Abril de 2019 por Profmanuel (Discussão | contribs)
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- Há cinco questões básicas: phýsis, tempo, linguagem, memória, história. Não basta dizer que não sabemos o que são e que mantêm entre si uma referência fundamental. Não basta tomar o caminho do não-saber como possibilidade de todo saber. Não basta falar das experienciações. Tudo isso é válido. Diz Heidegger: "O que se disse acerca do caráter histórico da questão 'O que é uma coisa?' é válido para qualquer questão de filosofia, que colocamos hoje ou no futuro, admitindo, certamente, que a filosofia é um questionar que se põe a si mesmo em questão e que, em conseqüência, se movimenta, sempre e em toda a parte em cÃrculo" (1). Para fugir da linearidade causal da historiografia, do tempo, da memória é necessário ter presente, por exemplo, que quando se pergunta "O que é a história?", essa pergunta não se pode responder através de dados historiográficos. A historiografia já pressupõe que de antemão se defina o seu objeto e o seu método. A historiografia nunca pergunta pelo isto que ela é. Quando pergunta, deixa de ser historiografia e passa a ser "filosofia". Por isso, a experiência da história como conhecimento e como experienciação do que é História são diferentes. Na História (experienciação) há um acontecer. Na historiografia há uma experiência como conhecimento. Aà já se inclui a phýsis (res/real) o tempo, a linguagem, a memória.
- Referência:
- (1) HEIDEGGER, Martin. O que é uma coisa?. Lisboa: Edições 70, 1992, p. 54.
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- "Como a palavra querer, também as palavras questão, questionar e questionamento vêm do latim: quaerere. Quaerere significa: empenhar-se na busca e na procura do que não se tem, por já se ter e para se vir a ter" (1).
- Referência:
- (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. Aprendendo a pensar. Petrópolis: Vozes, 1977, p. 44.
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- Não questionamos porque agimos logicamente. Só podemos agir logicamente porque já somos desde sempre questão. Enquanto o isto da essência do homem, quer dizer, pelo simples fato de questionarmos, já estamos lançados e vigoramos no e a partir do logos. Questionar é pensar. "O pensamento con-suma a referência do Ser à Essência do homem. Não a produz nem a efetua. O pensamento apenas a restitui ao Ser como algo que lhe foi entregue pelo próprio Ser. Essa restituição consiste em que, no pensamento, o ser se torna linguagem. A linguagem é a Casa do ser" (1). A linguagem é o logos. Como a questão, não somos nós que temos a linguagem, mas é a linguagem que nos tem, dando-nos o sentido de existir. A linguagem fala, não o homem. Só existimos porque vigoramos já desde sempre na linguagem e pensamento. Eis a diferença ontológica.
- Referência:
- (1) HEIDEGGER, Martin. Carta sobre o humanismo. Trad. Emmanuel Carneiro Leão. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1967, p. 24.
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- "Ao doar-se da physis, da realidade, no homem enquanto mito, poesia, pensamento, filosofia e o mÃstico enquanto mistério, é o que denominamos questões. Não é o homem que tem as questões, são estas que têm e constituem o homem. Ao narrar mitos e ao escreverem-se obras poéticas, nelas e por elas as questões se tornam obras-questões-mitos do real no homem" (1).
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Permanência e atualidade da Poética". In: Revista Tempo Brasileiro. Rio de Janeiro: número 171, out.-dez. 2007, p. 12.
- Ver também:
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- O querer de toda questão é o empenho em torno do penhor pelo qual o homem se empenha no seu agir. O agir (poiesis) é, portanto, a presentificação (sendo) do penhor nos empenhos do homem, mas jamais pela decisão apenas do homem. Na ação humana, o homem responde ao apelo de escuta, espera e cuidado. Nisso consiste a questão e o questionar.
- Ver também:
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- A realidade, o nada criativo, é um enigma que permeia o labirinto em que a verdade poética acontece. É o que denominamos questão. A travessia é a questão acontecendo como caminho e caminhada no labirinto que é a realidade em seu acontecer permanente.
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- Em verdade, pensar é deixar-se tomar pela questão. E as respostas? São respostas, não são solução. Para a questão a resposta só é resposta se tiver a dimensão de recolocar a questão em novo horizonte. Por isso vale a pena perguntar e responder. Tudo e sempre se torna diferente.
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- As questões como questões fazem parte de toda cultura e a precedem e não dependem da sua sofisticação em elaborações conceituais. Porém, o próprio de toda questão é ser simples e complexa. Dessa maneira as questões sempre podem aparecer em novas dimensões que elas já têm, mas cabe a nós ampliá-las, uma ampliação que não determina a questão, apenas a densifica. Em si as questões não mudam e nem são modificadas nem diminuÃdas ou ampliadas. Como somos finitos, precisamos das respostas para ir abarcando cada vez mais a questão em toda a sua simplicidade e riqueza. O horizonte desta riqueza é o infinito. Esse é o desafio de toda obra de arte. E é por isso que toda obra de arte é um enigma.
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- Na realidade, a questão é sempre a mesma, isto não quer dizer que seja sempre a mesma coisa, pois ela acontece na dialética de pergunta e resposta, de não saber e saber, sempre em aberto, impossÃvel de se fechar, de terminar. Por isso somos históricos.
- Tudo muda quando a questão se torna problema. Todo problema é localizado, o que pressupõe também uma resposta localizada. A palavra problema diz exatamente isso: o colocar para diante algo, que se re-solve na resposta. Um problema pode ter uma solução, a questão jamais. Na questão a resposta nada mais é, quando é resposta, do que uma maneira de re-colocar a questão.
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- "Cuidar e procurar, enquanto querer, devem ser o querer do que em nós já sempre vigora: o que somos. E o que somos essencialmente é questão. Viver em procura é deixar-se tomar pela questão. E, então, Cura e questão serão um e o mesmo. É que no querer da questão a cura se plenifica" (1).
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "O mito de Cura e o ser humano". In: --------. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 233.
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- "Que a existência é o penhor de todo empenho e desempenho, é a questão de todas as questões verdadeiras, isto é, daqueles que, ao questionarem qualquer coisa, se colocam a si mesmos em questão. É a questão que sempre, sabendo ou sem saber, se questiona em toda questão. Nenhum questionamento, nenhum problema teórico ou prático, racional ou emocional, natural ou cultural, se compreende a si mesmo se não se compreender a questão de todas as questões, isto é, se não questioná-la" (1).
- Referência:
- (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Aprender e Ensinar". In: -----. Aprendendo a pensar. Petrópolis R/J: Vozes, 1977, p. 45.
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- "... o vocabulário, em sua amplitude, tende num primeiro momento a manter uma tensão entre questões e conceitos. Os conceitos são o dito, as questões são o não-dizer de todo dizer vivo e pulsante. Os conceitos são representações. As questões são sempre presenças velantes, dissimulantes. Como aqueles tendem mais a se impor em detrimento da dinâmica das questões, eles imprimem ao mundo real o seu caráter abstrato e representacional. E acabam por circunscreverem um mundo abstrato em detrimento do mundo real, vivo, operante" (1).
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Obra de arte, vocabulário e mundo". In: ------------. Leitura: questões. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2015, p. 243.
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- É que a realidade, o nada criativo, é um enigma que permeia o labirinto em que a verdade poética acontece, desvelando a realidade em mundo e velando-se como enigma, mistério. É o que denominamos questão.