Intencionalidade

De Dicionrio de Potica e Pensamento

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: "A [[palavra]] [[intencionalidade]] provém do [[latim]] ''intentio'', que significa intenção pensada a partir do [[interesse]], da direção, do direcionamento, do [[sentido]]. [[Intencionalidade]] é aquela feição de nosso [[estado]] [[mental]] em que se pode dizer corretamente tratar-se de algo, isto é, ela é um “[[conteúdo]]”, ou seja, a [[forma]] referente a algo externo, a algo que está fora do [[Homem]], que é diferente dele, isto é, um [[objeto]] exterior que de alguma maneira o toca e o influencia posteriormente quando se torna um [[estado]] [[mental]]" (1).
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: (1)FRECHEIRAS, Marta Luzie de Oliveira. "Intencionalidade, memória e reminiscência em Aristóteles". In: Revista ''Tempo Brasileiro - Interdisciplinaridade: dimensões poéticas'', 164. Rio de Janeiro: jan.-mar. 2006, p. 37.
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: (1) FRECHEIRAS, Marta Luzie de Oliveira. "Intencionalidade, memória e reminiscência em Aristóteles". In: Revista '''Tempo Brasileiro - Interdisciplinaridade: dimensões poéticas''', 164. Rio de Janeiro: jan.-mar. 2006, p. 37.
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: Esse [[problema]] em [[Aristóteles]] pode ser encontrado não na sua [[teoria]] da [[sensação]], mas da [[fantasia]], da [[imaginação]]. Porém, para compreendermos a [[questão]] da [[intencionalidade]] em [[Aristóteles]] faz-se mister que compreendamos primeiro as suas [[teorias]] da [[sensação]], da [[memória]] e da [[rememoração]]" (1).
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: (1) FRECHEIRAS, Marta Luzie de Oliveira. "Intencionalidade, memória e reminiscência em Aristóteles". In: Revista ''Tempo Brasileiro - Interdisciplinaridade: dimensões poéticas'', 164. Rio de Janeiro: jan.-mar. 2006, p. 38.
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: (1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Análise da Existência humana em Binswanger". In: ---. '''Filosofia contemporânea'''. Teresópolis/RJ: Daimon Editora, 2013, p. 69.
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: Esta [[observação]] é [[fundamental]]. Todo [[saber]] diz respeito em primeira [[instância]] ao [[ser]] e a sua separação deste é pura [[abstração]]. Quando há a [[representação]] o interessante é que se cria uma defasagem [[entre]] o que se representa e o que acontece a [[partir]] de e na [[vigência]] do [[ser]]. E é aí que se dá toda a [[perda]] que a mera [[representação]] acarreta: perde-se o [[sentido]] da [[realidade]], de maneira que se dá uma [[defasagem]] e um afastamento dela. E isso acaba gerando a [[perda]] do seu [[sentido]] e de quem assim age. E sem [[sentido]] não se pode mais [[viver]], não se pode mais [[ser]].
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:  (1) HUMMES, o.f.m. Frei Cláudio. '''Metafísica'''. Mimeo. Daltro Filho / Imigrantes, RS, 1963. Depois tornou-se Bispo e hoje é Cardeal. Faleceu dia 4 de julho de 2022.
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:  (2) HUMMES, o.f.m. Frei Cláudio. '''Metafísica'''. Mimeo. Daltro Filho / Imigrantes, RS, 1963. Depois tornou-se Bispo e hoje é Cardeal. Faleceu dia 4 de julho de 22022.
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: [[Conhecer]] o [[ser]] que nos foi dado é [[renunciar]] aos [[limites]] que o [[ser]] jamais tem, por isso somos, mas estamos [[próximos]] e [[distantes]] do [[ser]], isso para [[dizer]] o quanto nos é [[difícil]] deixarmo-nos tomar pelo [[conhecer]] do [[ser]]. É um [[agir]] tão [[difícil]] e tão especial que ele é sem [[intencionalidade]]. Essa é a [[difícil]] tarefa do [[amar]], isto é, [[amar]] é não [[ter]] [[intencionalidade]], por isso é um [[agir]] que não satisfaz, mas leva à conquista do único que [[satisfaz]]: o [[conquistar-se]], pois no [[sermos]] reside a [[plenitude]], [[conquistar]] é [[conquistar-se]] no que já desde [[sempre]] somos. E este é sem [[intencionalidade]]. É dessa maneira que o que está fora não pode nos [[satisfazer]]. O que está fora nunca para de [[poder]] ser substituído, mas só o [[insubstituível]] nos satisfaz, pois o [[insubstituível]] é sem [[limites]]. [[Pensar]] é [[ser]].
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: - [[Manuel Antônio de Castro]].
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: "[[Perguntar]] só posso se ainda não sei, mas consciente deste [[não-saber]], eu tendo ao [[saber]]. [[Quero]] [[saber]] e por isto [[pergunto]]. A [[pergunta]] é, portanto, um [[movimento]] de [[tendência]] para ..., a qual ultrapassa o até agora sabido em direção a algo mais, ainda não sabido, mas que pode [[ser]] [[sabido]]. Ora, se esta [[tendência]] para... vai na direção de algo que pode [[ser]] [[sabido]], então ela o exerce – assim como acontece com o [[saber]] – dentro da [[luz]] do [[ser]] e no [[horizonte]] do [[ser]]. Esta [[tendência]], este [[querer]], é, portanto, – igualmente como o [[saber]] – um [[exercício espiritual]], visto que a característica do [[espírito]] é a de exercer-se na [[luz]] do [[ser]] e no [[horizonte]] do [[ser]]. Esta [[tendência]], este [[querer]], é, portanto, – igualmente como o [[saber]] – um [[exercício espiritual]], visto que a característica do [[espírito]] é a de exercer-se na [[luz]] do [[ser]] e no [[horizonte]] do [[ser]]. Assim temos aqui uma segunda forma de [[exercício espiritual]] – implicado na [[pergunta]] -, a saber, o [[querer]]" (1).
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:  (1) HUMMES, o.f.m. Frei Cláudio. '''Metafísica'''. Mimeo. Daltro Filho / Imigrantes, RS, 1963. Depois tornou-se Bispo e hoje é Cardeal. Faleceu dia 4 de julho de 2022.
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: Nossa [[relação]] com o [[ser]] do [[ente]] é complexa, vista sob a [[dimensão]] do [[saber]]: ele me aparece como [[objeto material]], quando quero [[saber]] [[o que é]]; me aparece como [[objeto formal]], quando quero [[saber]] [[o como é]]; temos ainda a [[dimensão]] introduzida por [[Kant]]: [[o como se sabe]]. E falta ainda considerar, sobretudo, aquela [[dimensão]] que diz respeito ao próprio [[saber]] como tal: [[o para que se sabe]], pois aí se manifesta a [[intencionalidade]]. O que falta [[pensar]] na [[intencionalidade]] é o não confundi-la com a [[finalidade]]. E isso é decisivo, porque quando se reduz tanto o [[ser]] quanto o [[saber]], na [[dimensão]] da [[intencionalidade]] à [[finalidade]] sucede a inversão [[moralista]] pela qual os [[fins]] justificam os [[meios]]. Mas tais [[fins]] já estão dados no [[sistema]] ou [[modelo]]. E só então nesse [[agir]] se vê todo o [[abismo]] em que se move todo o nosso [[agir]], quando tem como [[sentido]] o [[sentido]] do [[modelo]].
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: - [[Manuel Antônio de Castro]]

Edição atual tal como 02h49min de 20 de Outubro de 2022

Tabela de conteúdo

1

"A palavra intencionalidade provém do latim intentio, que significa intenção pensada a partir do interesse, da direção, do direcionamento, do sentido. Intencionalidade é aquela feição de nosso estado mental em que se pode dizer corretamente tratar-se de algo, isto é, ela é um “conteúdo”, ou seja, a forma referente a algo externo, a algo que está fora do Homem, que é diferente dele, isto é, um objeto exterior que de alguma maneira o toca e o influencia posteriormente quando se torna um estado mental" (1).


Referência:
(1) FRECHEIRAS, Marta Luzie de Oliveira. "Intencionalidade, memória e reminiscência em Aristóteles". In: Revista Tempo Brasileiro - Interdisciplinaridade: dimensões poéticas, 164. Rio de Janeiro: jan.-mar. 2006, p. 37.

2

"Mas, voltamos a perguntar: o que faz com que algo externo quando se transforma em um estado mental em nós, ganhe força, se consolide a ponto de possibilitar alguém tornar-se um artista?
Esse problema em Aristóteles pode ser encontrado não na sua teoria da sensação, mas da fantasia, da imaginação. Porém, para compreendermos a questão da intencionalidade em Aristóteles faz-se mister que compreendamos primeiro as suas teorias da sensação, da memória e da rememoração" (1).


Referência:
(1) FRECHEIRAS, Marta Luzie de Oliveira. "Intencionalidade, memória e reminiscência em Aristóteles". In: Revista Tempo Brasileiro - Interdisciplinaridade: dimensões poéticas, 164. Rio de Janeiro: jan.-mar. 2006, p. 38.

3

"Em Husserl é pela intencionalidade que a consciência está sempre passando do fenômeno para a fenomenologia. Há, pois, uma distinção entre fenômeno e fenomenologia e a intencionalidade da consciência serve de ponte de ligação. Sem consciência intencional não se dá fenomenologia" (1).


Referência:
(1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "Análise da Existência humana em Binswanger". In: ---. Filosofia contemporânea. Teresópolis/RJ: Daimon Editora, 2013, p. 69.

4

"Assim a pergunta aparece como sendo ao mesmo tempo um auto-exercício e um exercício de outro. Trata-se de um auto-exercício em que o sujeito como perguntador se transcende a si mesmo em direção ao outro como perguntado, ao objeto, ou seja, um auto-exercício que se realiza através do exercício de um outro" (1).
Está aqui, certamente, a intencionalidade de que trata a fenomenologia e, por isso mesmo, a questão do horizonte.
"Em outras palavras, em um mesmo exercício da pergunta o perguntador se exerce a si mesmo e a algo de outro. Já sabemos também que toda pergunta implica um saber que o perguntador possui de si mesmo e do objeto perguntado. Ora, todo saber é, em última análise, um saber referente ao ser, pois somente algo que é pode ser sabido" (2).
Esta observação é fundamental. Todo saber diz respeito em primeira instância ao ser e a sua separação deste é pura abstração. Quando há a representação o interessante é que se cria uma defasagem entre o que se representa e o que acontece a partir de e na vigência do ser. E é aí que se dá toda a perda que a mera representação acarreta: perde-se o sentido da realidade, de maneira que se dá uma defasagem e um afastamento dela. E isso acaba gerando a perda do seu sentido e de quem assim age. E sem sentido não se pode mais viver, não se pode mais ser.


- Manuel Antônio de Castro.
Referência:
(1) HUMMES, o.f.m. Frei Cláudio. Metafísica. Mimeo. Daltro Filho / Imigrantes, RS, 1963. Depois tornou-se Bispo e hoje é Cardeal. Faleceu dia 4 de julho de 2022.
(2) HUMMES, o.f.m. Frei Cláudio. Metafísica. Mimeo. Daltro Filho / Imigrantes, RS, 1963. Depois tornou-se Bispo e hoje é Cardeal. Faleceu dia 4 de julho de 22022.

5

Conhecer o ser que nos foi dado é renunciar aos limites que o ser jamais tem, por isso somos, mas estamos próximos e distantes do ser, isso para dizer o quanto nos é difícil deixarmo-nos tomar pelo conhecer do ser. É um agir tão difícil e tão especial que ele é sem intencionalidade. Essa é a difícil tarefa do amar, isto é, amar é não ter intencionalidade, por isso é um agir que não satisfaz, mas leva à conquista do único que satisfaz: o conquistar-se, pois no sermos reside a plenitude, conquistar é conquistar-se no que já desde sempre somos. E este é sem intencionalidade. É dessa maneira que o que está fora não pode nos satisfazer. O que está fora nunca para de poder ser substituído, mas só o insubstituível nos satisfaz, pois o insubstituível é sem limites. Pensar é ser.


- Manuel Antônio de Castro.

6

"Perguntar só posso se ainda não sei, mas consciente deste não-saber, eu tendo ao saber. Quero saber e por isto pergunto. A pergunta é, portanto, um movimento de tendência para ..., a qual ultrapassa o até agora sabido em direção a algo mais, ainda não sabido, mas que pode ser sabido. Ora, se esta tendência para... vai na direção de algo que pode ser sabido, então ela o exerce – assim como acontece com o saber – dentro da luz do ser e no horizonte do ser. Esta tendência, este querer, é, portanto, – igualmente como o saber – um exercício espiritual, visto que a característica do espírito é a de exercer-se na luz do ser e no horizonte do ser. Esta tendência, este querer, é, portanto, – igualmente como o saber – um exercício espiritual, visto que a característica do espírito é a de exercer-se na luz do ser e no horizonte do ser. Assim temos aqui uma segunda forma de exercício espiritual – implicado na pergunta -, a saber, o querer" (1).


Referência:
(1) HUMMES, o.f.m. Frei Cláudio. Metafísica. Mimeo. Daltro Filho / Imigrantes, RS, 1963. Depois tornou-se Bispo e hoje é Cardeal. Faleceu dia 4 de julho de 2022.

7

Nossa relação com o ser do ente é complexa, vista sob a dimensão do saber: ele me aparece como objeto material, quando quero saber o que é; me aparece como objeto formal, quando quero saber o como é; temos ainda a dimensão introduzida por Kant: o como se sabe. E falta ainda considerar, sobretudo, aquela dimensão que diz respeito ao próprio saber como tal: o para que se sabe, pois aí se manifesta a intencionalidade. O que falta pensar na intencionalidade é o não confundi-la com a finalidade. E isso é decisivo, porque quando se reduz tanto o ser quanto o saber, na dimensão da intencionalidade à finalidade sucede a inversão moralista pela qual os fins justificam os meios. Mas tais fins já estão dados no sistema ou modelo. E só então nesse agir se vê todo o abismo em que se move todo o nosso agir, quando tem como sentido o sentido do modelo.


- Manuel Antônio de Castro
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