Ser

De Dicionário de Poética e Pensamento

Edição feita às 22h18min de 14 de Agosto de 2013 por Profmanuel (Discussão | contribs)

1

"Ser: viver, surgir, permanecer. Estes sentidos correspondem às três raízes que aparecem no verbo ser" (1).


Referência:
(1) HEIDEGGER, Martin. Introdução à Metafísica. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1969, pp. 97-8.


Ver também:

2

"Revela-se que o Ser é o encanto das Vozes (isto é, as Musas) e as Musas não são outra coisa que a múltipla Presença do Divino" (1). "Relação entre linguagem e ser, ou seja: entre o Canto em seu encanto e a aparição do que se canta, e consequentemente entre a Revelação (alétheia) e o Esquecimento (lesmosýne/léthe)" (2). "A rigor, não há na Teogonia uma relação entre linguagem e ser, mas uma imanência recíproca entre eles" (3).


Referências:
(1) TORRANO, JAA. "Introdução". In: Hesíodo. Teogonia. Trad. JAA Torrano. São Paulo: Iluminuras, 1992, p. 28.
(2) Idem, p. 29.
(3) Idem, p. 29.


Ver também:

3

Não basta ter conhecimentos, é preciso ser o que se conhece. Há aqui uma tensão entre ser e ter. Emmanuel Carneiro Leão trata da questão do ter no ensaio "Leitura órfica de uma sentença grega" (1). Trata-se do "ter linguagem". Em que sentido se emprega o "ter"? Diz Márcia Schuback: "'Ser' homem para o grego é 'ter' lógos (...) Ser homem para o grego significa, sobretudo, estar na disposição do lógos. De modo algum, o homem 'tem' lógos como uma propriedade dada genética, natural. Tem o lógos enquanto uma disposição para empenhar-se pelo lógos" (2).


- Manuel Antônio de Castro


Referências:
(1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. Aprendendo a pensar II. Petrópolis: Vozes, 1992.
(2) SCHUBACK, Márcia Sá Cavalcante. "As cordas serenas de Ulisses". In: Ensaios de filosofia. Petrópolis: Vozes, 1999, p. 174.

4

Ao enigma que é o ser podemos chegar por quatro vias, todas integradas na questão da liminaridade: a) como horizonte, quando no visível o ser humano já desde sempre se lança para o invisível. Mas esse movimento de ver o não-visível do visível, sempre se dá num movimento incessante inerente a toda questão, articulando tanto mais um ver quanto mais se lança no não-ver. O ser humano é convocado pela questão do não-ver; b) Como saber, pois quando pergunta, pergunta porque não sabe e quer saber o não-saber, mas, ao mesmo tempo, só pode perguntar porque já sabe o não-saber. E, por isso, o ser humano é convocado pela questão do não-saber; c) Como querer, quando deseja-se isto e aquilo. Mas isto e aquilo são uma posse e não o poder da posse das possibilidades. Por isso, isto e aquilo não satisfazem o desejo. O desejo não é disto ou aquilo enquanto posse disto ou daquilo. O desejo é sempre poder a posse de todas as possibilidades. O ser humano é convocado pela questão do não-querer. Só esta posse faz o ser humano feliz, ou seja, responde e corresponde ao seu querer/desejar; d) Como ser, quando questiona "o que é isto?", "o que é aquilo?". Mas ao perguntar por isto e aquilo, no fundo, não pergunta por isto e aquilo enquanto ente, mas sempre e já a partir do ser, senão nem poderia perguntar. Contudo toda questão pergunta pelo o ser na dimensão verbal do ente enquanto não-é: o que é, o que foi, o que será? Por isso, a resposta da questão será sempre no plano do ente, recolocando a questão do não-ser. O ser humano, contudo, é sempre convocado pela questão do ser, na dimensão do ver, do saber, do querer e do não-ser. Esse é o enigma do ser humano que sempre se dimensiona na questão porque nela ele se mede como ente na medida do ser por não-ser. A questão antes de ser perguntada já nos ultrapassa. Ela é a desmedida de toda medida da pergunta por, sobre e com.


- Manuel Antônio de Castro


Ver também:

5

"Ser não pode ser. Se fosse (ser) não mais permaneceria ser, mas seria ente" (1).


Referência:
(1) HEIDEGGER, Martin. In: A tese de Kant sobre o ser. São Paulo: Duas Cidades, 1970, p. 95.


Ver também:

6

"Tudo é e não é" (1). Esta afirmação do pensador Rosa pode ser desdobrada em: Tudo é. Tudo não é. Isso que parece tão simples nos lança no mistério do ser. Como o ser que é e sem ser não há é, pode ser e não ser? Isso é o que não cabe em nenhuma lógica e em nenhuma identidade lógica, metafísica. O ente foi considerado ao longo do percurso metafísico como o que é, o como é, o de onde e o para que é. Posteriormente na Modernidade se acrescentou à reflexão sobre o ente um desdobramento reflexivo, especular, quando se investiga em o como é, o como se conhece. Este pode se encaminhado pela razão subjetiva ou pelo pensar, segundo a sentença de Parmênides, quando diz que pensar e ser são o mesmo. Então a questão do ser se desloca, sem se separar, para a questão da unidade de pensar e ser. O que sempre ficou impensado em todo esse percurso: o "Tudo não é" de que nos fala Rosa. É este Tudo não é o a-ser-pensado. Isto coloca a questão da negatividade e ser de que trata heidegger já para o final de Carta sobre o humanismo.


- Manuel Antônio de Castro
- Referência:
(1) ROSA, João Guimarães. Grande sertão: veredas. Rio de Janeiro: José Olympio, 1968, p. 12.

7

"Ser e pensar, em Parmênides, se identificam como condições de possibilidade do existir na mesmidade. Ser e pensar unem e trazem consigo o mundo e a phýsis como possibilidade de constituição de uma espácio-temporalidade que se estrutura para além do domínio das realizações, mas também o mundo e a phýsis como espácio-temporalidade de constituição da realidade do ser como desvelamento" (1).


Referência:
(1) JARDIM, Antonio. Música: vigência do pensar poético. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 62.

8

"O ser não é 'algo' que se acha escondido num lugar supra-sensível ou no alto de uma especulação distante e elevada. Como nos mostra a todo instante a palavrinha 'é', ser 'é' o mais próximo da proximidade" (1).


Referência:
(1) HEIDEGGER, Martin. Heráclito. Trad. Márcia Sá Cavalcante Schuback. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 1998, p.115.


9

"Tenho medo de dizer quem sou: no momento em que tento falar, não exprimo o que sinto e o que sinto se transforma, lentamente, no que eu digo" (1).


Referência:
(1) LISPECTOR, Clarice. Texto publicado numa montagem artística de fotos com textos de Clarice, sem indicação da fonte.


10

"O que verdadeiramente somos é aquilo que o impossível cria em nós" (1).


Referência:
(1) LISPECTOR, Clarice. Texto publicado numa montagem artística de fotos com textos de Clarice, sem indicação da fonte.

11

Sabemos muito bem que não basta viver como não basta saber. É necessário ser o que se sabe. Não basta viver sentindo, é necessário ser o que se sente. Ser sabendo e sentindo é deixar eclodir o sentido enquanto vigorar do ser. Sem sentido o viver e sentir perdem o vigorar do viver sendo. Então a questão que nos orienta e origina torna-se a questão do sentido do ser vivendo e do viver sendo sentido. O que nos faz falta é o sentido do ser.


- Manuel Antônio de Castro


12

Por já vigorarmos, por tudo já vigorar no ser, ele não é fundamento de nada, porque ele simplesmente vigora, independentemente de minhas nomeações e reflexões. Ele está tão próximo, tão próximo que até já desde sempre o somos e nele somos o que somos. Mas nossa procura do saber do ser acaba se desviando para o saber imperfeito e limitado e não nos abrimos para o seu sentido que é o máximo de saber, porque o seu sentido é o silêncio em que ele vigora e se dá a ver e a saber (que são o mesmo). O sentido, o silêncio, o vazio são o mais presente do presente, são sempre o já vigorando e sem o qual nada se dá a saber e a ver. Vigorar diz fundar, dar-se e retrair-se, desvelar-se e velar-se, mas jamais distanciar-se num fundo perdido e inacessível. Ser é mistério porque por mais que seja tudo dele "nada" nos advém. É esse mistério que nos angustia e dá plenitude. Vivemos nesse entre.


- Manuel Antônio de Castro


13

"Assim devemos dizer que o horizonte de ser, como condição fundamental de todo perguntar deve constituir um horizonte sabido-não-sabido por mim. Assim perguntar pelo ser eu só poderei se o ser significar sempre para mim um não-sabido além de ser algo de sabido, e assim sucede que meu não saber do ser nunca seja totalmente redutível a um saber, pois então se dissolveria a possibilidade de perguntar pelo ser e, igualmente, a possibilidade de qualquer outra pergunta. Assim o ser - como horizonte fundamental e original sabido e não sabido ao mesmo tempo - deve constituir para o homem um mistério original, fundamental, e como tal, inesgotável" (1).


14

"É que o ser não somente não pode ser definido, como também nunca se deixa determinar em seu sentido por outra coisa nem como outra coisa. O ser só pode ser determinado a partir de seu sentido como ele memso. Também não pode ser comparado com algo que tivesse condições de determiná-lo positivamente em seu sentido. O ser é algo derradeiro e último que subsiste por seu sentido, é algo autônomo e independente que se dá em seu sentido" (1).


Referência:
(1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. Posfácio. In: HEIDEGGER, Martin. Ser e tempo. Trad. Márcia Sá Cavalcante Schuback. 2. e. Petrópolis: Vozes, 2006, p. 551.


15

"Ao que de ordinário nos rodeia, os objetos particulares (=os "objetos"), chamamos também de ente, o que é. Porém, este "é", ao nível do ente, não é, por sua vez, algo de ente, senão o que deixa primeiro a todo ente ser um Ente e por isso o rodeia de cuidados e o protege. Chamamo-lo Ser" (1).


Referência:
(1) HEIDEGGER, Martin. La pobreza. Buenos Aires: Amorrutu, 2006, p. 103.
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