Voz
De Dicionrio de Potica e Pensamento
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- | :A voz não é compreendida como ''phoné'', mas como '' | + | : A [[voz]] não é compreendida como ''phoné'', mas como ''[[Logos]]'', ou seja, como [[voz]] que gera um [[sentido]] [[ético]]-[[poético]]. É, porém, [[essencial]] [[compreender]] que os sons que os animais produzem são próprios, são deles e não uma [[criação]] do [[homem]] ao manifestá-los como [[sentido]]. É pelo [[vigorar]] da ''[[physis]]'' tanto nos animais como nos [[homens]] que há sons e [[voz]]. A ''[[physis]]''/[[ser]] se dimensiona como ''[[logos]]'' no [[homem]] e só no [[homem]] é que ela mesma se dá e manifesta como som e [[voz]] ao mesmo tempo. A [[voz]] se faz [[sentido]] no [[homem]], abrindo as [[possibilidades]] das [[criações]] da [[música]] e esta vigindo se dá nos [[ritmos]]. Em todo [[falar]] [[humano]], por ser [[voz]], há [[ritmo]], [[musicalidade]]. E nas [[poesias]] esse [[ritmo]] da [[voz]] se presenteia como algo constitutivo no e pelo [[sentido]] de toda emissão de [[voz]]. Qual é o [[sentido]] dos [[sons]] para quem os emite não nos é dado [[saber]], mas os [[sons]] são. Porém, não se pode nem se deve dicotomizar [[som]] e [[voz]]. O [[sentido]] do [[som]] se vela para o [[homem]] na mesma [[dimensão]] em que o [[sendo]] se dissimula, esgueira e subtrai. É o [[mistério]] da ''[[physis]]'' / [[ser]]. |
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+ | : O que é isto – o [[dizer]]? O que é isto – a [[voz]]? A [[palavra]] latina ''vox'' ([[voz]], em [[português]]) liga-se à "...raiz indo-européia *wek.*, que indica a emissão de [[voz]] com todas as forças religiosas e jurídicas..." (1) (no sentido do “''jus dicere''” divino). Daí vem o [[sentido]] [[poético]] e [[originário]] do que é denso, consistente, que perdura, porque provém do [[sagrado]], a [[vigência]] da [[realidade]]. Sem esta [[voz]] não há [[fala]] [[humana]], pois não há [[linguagem]] nem [[sentido]], não há [[mundo]], não há, enfim, o [[humano]]. A [[voz]] do [[poeta]], do [[aedo]], é a [[voz]] do [[sagrado]]. Claro que se entende aí por “forças” o que é portador de [[sentido]], de [[verdade]], de [[acontecer]], de [[ético]], de [[mundo]]. São a ''dynamis'' e ''enérgeia'' aristotélicas. | ||
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+ | : (1) Cf. ERNOUT E MEILLET. '''Dictionnaire etymologique de la langue latine. Paris: Éditions Klincksieck, 1979, p. 754. [[Dicionário]] etimológico da [[língua]] latina. (Tradução de Manuel Antônio de Castro).''' | ||
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+ | : "Da [[Escuta]] e da [[Não-escuta]] do [[canto das Sereias]] se faz a nossa [[travessia poética]]. [[Ulisses]] não é apenas astucioso, é [[sábio]]. Mas onde a [[sabedoria]] em meio à [[sociedade]] da [[comunicação]] e do [[consumo]]? O [[apelo]] [[originário]] para [[ser]], ontem, hoje e [[sempre]], como muito bem diz o [[mito]], nos advém no [[Canto das Sereias]]. Cada um tem que assumir a sua [[travessia poética]] pela [[Escuta]] da [[fala]] da [[voz]] do [[silêncio]]" (1). | ||
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- | : (1) | + | : (1) CASTRO, Manuel Antônio de.''' "[[Ulisses]] e a [[Escuta]] do [[Canto]] das [[Sereias]]”. In: -----. [[Arte]]: o [[humano]] e o [[destino]]. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 181.''' |
Edição atual tal como 22h21min de 14 de fevereiro de 2025
1
- Diversos animais emitem sons, mas só o homem emite voz. A voz só é voz pela vigência da linguagem. Por isso, também é a partir da voz que podemos falar do som dos animais, que podemos falar dos animais, que podemos, enfim, falar das coisas, dos entes. Ora, é a partir da linguagem que o real se manifesta como mundo.
- A voz não é compreendida como phoné, mas como Logos, ou seja, como voz que gera um sentido ético-poético. É, porém, essencial compreender que os sons que os animais produzem são próprios, são deles e não uma criação do homem ao manifestá-los como sentido. É pelo vigorar da physis tanto nos animais como nos homens que há sons e voz. A physis/ser se dimensiona como logos no homem e só no homem é que ela mesma se dá e manifesta como som e voz ao mesmo tempo. A voz se faz sentido no homem, abrindo as possibilidades das criações da música e esta vigindo se dá nos ritmos. Em todo falar humano, por ser voz, há ritmo, musicalidade. E nas poesias esse ritmo da voz se presenteia como algo constitutivo no e pelo sentido de toda emissão de voz. Qual é o sentido dos sons para quem os emite não nos é dado saber, mas os sons são. Porém, não se pode nem se deve dicotomizar som e voz. O sentido do som se vela para o homem na mesma dimensão em que o sendo se dissimula, esgueira e subtrai. É o mistério da physis / ser.
- Ver também:
- * Bardo
2
- O que é isto – o dizer? O que é isto – a voz? A palavra latina vox (voz, em português) liga-se à "...raiz indo-européia *wek.*, que indica a emissão de voz com todas as forças religiosas e jurídicas..." (1) (no sentido do “jus dicere” divino). Daí vem o sentido poético e originário do que é denso, consistente, que perdura, porque provém do sagrado, a vigência da realidade. Sem esta voz não há fala humana, pois não há linguagem nem sentido, não há mundo, não há, enfim, o humano. A voz do poeta, do aedo, é a voz do sagrado. Claro que se entende aí por “forças” o que é portador de sentido, de verdade, de acontecer, de ético, de mundo. São a dynamis e enérgeia aristotélicas.
- Referência:
- (1) Cf. ERNOUT E MEILLET. Dictionnaire etymologique de la langue latine. Paris: Éditions Klincksieck, 1979, p. 754. Dicionário etimológico da língua latina. (Tradução de Manuel Antônio de Castro).
3
- "Da Escuta e da Não-escuta do canto das Sereias se faz a nossa travessia poética. Ulisses não é apenas astucioso, é sábio. Mas onde a sabedoria em meio à sociedade da comunicação e do consumo? O apelo originário para ser, ontem, hoje e sempre, como muito bem diz o mito, nos advém no Canto das Sereias. Cada um tem que assumir a sua travessia poética pela Escuta da fala da voz do silêncio" (1).
- Referência: