Racional

De Dicionrio de Potica e Pensamento

(Diferença entre revisões)
(1)
 
(2 edições intermediárias não estão sendo exibidas.)
Linha 1: Linha 1:
__NOTOC__
__NOTOC__
== 1 ==
== 1 ==
-
:A definição do homem como animal racional ocasionou alguns desvios fundamentais, pois o racional acabou por impor ao homem um padrão ou pradrões que exatamente não dão conta do que mais caracteriza o homem. Temos o caso da loucura. Esta não se encaixa na definição do homem como animal racional e aí ele começa a ser excluído do sistema, porque a loucura é humana e só o homem pode ser louco, mas não é racional. A loucura é uma das características mais tradicionais e originárias do homem. No fundo, o racional nada tem a dizer sobre a loucura, até porque a loucura em seu sentido mais radical indicia a eclosão do homem como linguagem. Na medida em que o racional é uma medida da linguagem (''ratio'' = linguagem medida), cria-se uma incompatibilidade entre razão e linguagem não medida. Outro índice radicalmente [[humano]] que não se encaixa na definição do homem como animal racional é o jogo. Em si, o jogo se constitui num todo racional, mas onde a essência do jogo é um sutil paradoxo: fazer eclodir o inesperado, o além, o novo, o inventado dentro das regras do jogo. É o que se chama a criatividade. O homem não recebe o apelo das regras do jogo, mas do que a partir das regras explode em pura criatividade, o que, no fundo, é o que está para além do racional. Um terceiro índice que mostra o homem para além do racional é o ''eros''/[[amor]]. Há uma relação racional no comportamento amoroso, mas o amor propriamente dito é aquilo que ultrapassa e está além dessa mera relação racional. Daí as variáveis de amor e [[paixão]], onde esta é marcada por um arrebatamento próximo da [[loucura]] e que nada tem de racional. Muito pelo contrário. Se bem atentarmos, o racional, em vez de caracterizar o homem naquilo que o homem tem de mais essencial e que é seu [[cuidado]] (''cura'') originário nada tem de racional. Não é que o racional esteja ausente desses índices, mas, sim, de que eles não dão conta do apelo mais radical e originário do que o homem é. Por isso, o índice mais radical de ser humano, a nossa condição, é o não-ser, o nada, a [[morte]]. Diante da morte, toda racionalidade se esvai e não resta senão a arrogância niilista, [[horizonte]] no qual o humano do [[homem]] perde o sentido e sabedoria.
+
: A [[definição]] do [[homem]] como [[animal]] [[racional]] ocasionou alguns desvios fundamentais, pois o [[racional]] acabou por impor ao [[homem]] um [[padrão]] ou [[padrões]] que exatamente não dão conta do que mais caracteriza o [[ser humano]]. Temos o caso da [[loucura]]. Esta não se encaixa na definição do [[homem]] como [[animal]] [[racional]] e aí ele começa a ser excluído do [[sistema]], porque a [[loucura]] é [[humana]] e só o [[homem]] pode [[ser]] [[louco]], mas não é [[racional]]. A [[loucura]] é uma das características mais tradicionais e [[originárias]] do [[ser humano]]. No fundo, o [[racional]] nada tem a [[dizer]] sobre a [[loucura]], até porque a [[loucura]] em seu [[sentido]] mais [[radical]] indicia a eclosão do [[homem]] como [[linguagem]]. Na medida em que o [[racional]] é uma [[medida]] da [[linguagem]] (''[[ratio]]'' = [[linguagem]] medida), cria-se uma incompatibilidade entre [[razão]] e [[linguagem]] não medida. Outro índice radicalmente [[humano]] que não se encaixa na [[definição]] do [[homem]] como [[animal]] [[racional]] é o [[jogo]]. Em si, o [[jogo]] se constitui num todo [[racional]], mas onde a [[essência]] do [[jogo]] é um sutil [[paradoxo]]: fazer eclodir o [[inesperado]], o além, o [[novo]], o inventado dentro das regras do [[jogo]]. É o que se chama a [[criatividade]]. O [[homem]] não recebe o [[apelo]] das regras do [[jogo]], mas do que a partir das regras explode em pura [[criatividade]], o que, no fundo, é o que está para além do [[racional]]. Um terceiro índice que mostra o [[homem]] para além do [[racional]] é o ''[[eros]]''/[[amor]]. Há uma [[relação]] [[racional]] no comportamento amoroso, mas o [[amor]] propriamente dito é aquilo que ultrapassa e está além dessa mera [[relação]] [[racional]]. Daí as variáveis de [[amor]] e [[paixão]], onde esta é marcada por um arrebatamento próximo da [[loucura]] e que nada tem de [[racional]]. Muito pelo contrário. Se bem atentarmos, o [[racional]], em vez de caracterizar o [[homem]] naquilo que o [[homem]] tem de mais [[essencial]] e que é seu [[cuidado]] (''[[cura]]'') [[originário]] nada tem de [[racional]]. Não é que o [[racional]] esteja ausente desses índices, mas, sim, de que eles não dão conta do apelo mais [[radical]] e [[originário]] do que o [[homem]] [[é]]. Por isso, o índice mais [[radical]] do [[ser humano]], a nossa [[condição]], é o [[não-ser]], o [[nada]], a [[morte]]. Diante da [[morte]], toda [[racionalidade]] se esvai e não resta senão a arrogância [[niilista]], [[horizonte]] no qual o [[humano]] do [[homem]] perde o [[sentido]] e [[sabedoria]].
-
 
+
:- [[Manuel Antônio de Castro]]
:- [[Manuel Antônio de Castro]]
 +
 +
 +
:'''Ver também:'''
 +
 +
:*[[Conceito]]
 +
:*[[Conceituar]]

Edição atual tal como 22h26min de 20 de Maio de 2019

1

A definição do homem como animal racional ocasionou alguns desvios fundamentais, pois o racional acabou por impor ao homem um padrão ou padrões que exatamente não dão conta do que mais caracteriza o ser humano. Temos o caso da loucura. Esta não se encaixa na definição do homem como animal racional e aí ele começa a ser excluído do sistema, porque a loucura é humana e só o homem pode ser louco, mas não é racional. A loucura é uma das características mais tradicionais e originárias do ser humano. No fundo, o racional nada tem a dizer sobre a loucura, até porque a loucura em seu sentido mais radical indicia a eclosão do homem como linguagem. Na medida em que o racional é uma medida da linguagem (ratio = linguagem medida), cria-se uma incompatibilidade entre razão e linguagem não medida. Outro índice radicalmente humano que não se encaixa na definição do homem como animal racional é o jogo. Em si, o jogo se constitui num todo racional, mas onde a essência do jogo é um sutil paradoxo: fazer eclodir o inesperado, o além, o novo, o inventado dentro das regras do jogo. É o que se chama a criatividade. O homem não recebe o apelo das regras do jogo, mas do que a partir das regras explode em pura criatividade, o que, no fundo, é o que está para além do racional. Um terceiro índice que mostra o homem para além do racional é o eros/amor. Há uma relação racional no comportamento amoroso, mas o amor propriamente dito é aquilo que ultrapassa e está além dessa mera relação racional. Daí as variáveis de amor e paixão, onde esta é marcada por um arrebatamento próximo da loucura e que nada tem de racional. Muito pelo contrário. Se bem atentarmos, o racional, em vez de caracterizar o homem naquilo que o homem tem de mais essencial e que é seu cuidado (cura) originário nada tem de racional. Não é que o racional esteja ausente desses índices, mas, sim, de que eles não dão conta do apelo mais radical e originário do que o homem é. Por isso, o índice mais radical do ser humano, a nossa condição, é o não-ser, o nada, a morte. Diante da morte, toda racionalidade se esvai e não resta senão a arrogância niilista, horizonte no qual o humano do homem perde o sentido e sabedoria.


- Manuel Antônio de Castro


Ver também: