Método

De Dicionrio de Potica e Pensamento

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:A questão do método tem muitos caminhos, mas para uma [[hermenêutica]] [[ontologia|ontológica]], ele passa necessariamente pela "questão que é digna de ser pensada", pela “questão do [[pensamento]]”. Em relação ao método, diz Ernildo Stein na “Nota do Tradutor”: “Não discutiremos aqui até que ponto Heidegger terá razão quando critica e procura superar Hegel e Husserl. É, sem dúvida, simplificação resumir a filosofia de ambos na [[subjetividade]] e, conseqüentemente, na questão do método; como também é impossível pensar em separar, na 'questão do pensamento', método e [[questão]]” (1). Ora, Heidegger não separa método e questão, apenas não fica preso às formulações metodológicas de ambos, que acabam por configurar seu pensamento, mas Heidegger pensa o método já dentro da questão, ao pensar o [[círculo]] da circularidade perfeita, nas trilhas do [[pensador]] Heráclito. Não se pode entender método em seu aspecto formal. Por isso Heidegger fala muito em caminho e o caminho nunca está desligado da questão. Ver como exemplo o ensaio “O caminho do campo”. Esta questão do método também é fundamental para a questão da arte.
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:A questão do método tem muitos caminhos, mas para uma [[hermenêutica]] [[ontologia|ontológica]], ele passa necessariamente pela "questão que é digna de ser pensada", pela “questão do [[pensamento]]”. Em relação ao método, diz Ernildo Stein na “Nota do Tradutor”: “Não discutiremos aqui até que ponto Heidegger terá razão quando critica e procura superar Hegel e Husserl. É, sem dúvida, simplificação resumir a filosofia de ambos na [[subjetividade]] e, consequentemente, na questão do método; como também é impossível pensar em separar, na 'questão do pensamento', método e [[questão]]” (1). Ora, Heidegger não separa método e questão, apenas não fica preso às formulações metodológicas de ambos, que acabam por configurar seu pensamento, mas Heidegger pensa o método já dentro da questão, ao pensar o [[círculo]] da circularidade perfeita, nas trilhas do [[pensador]] Heráclito. Não se pode entender método em seu aspecto formal. Por isso, Heidegger fala muito em caminho e o caminho nunca está desligado da questão. Ver como exemplo o ensaio “O caminho do campo” (2). Esta questão do método também é fundamental para a questão da arte.
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:STEIN, Ernildo. In: ''Os Pensadores''. São Paulo: Abril Cultural, 1979, p. 67.
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:(1) STEIN, Ernildo. In: ''Os Pensadores''. São Paulo: Abril Cultural, 1979, p. 67.
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:(2) HEIDEGGER, Martin. "O caminho do campo". In: ''Revista de Cultura Vozes'', nº 4. Petrópolis: Vozes, 1977, pp. 326-8.  
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:O método, enquanto caminho, implica a verdade, porque aí caminho é, no fundo, realizar como ''éthos''/ agir o que nos é próprio. ''[[Éthos]]'', de onde se forma a palavra ética,  é o agir no horizonte do sentido do ser, onde se dá a [[ética]], o livre agir movido pela [[sabedoria]]. Há, portanto, no método: 1-caminho; 2-ação; 3-''éthos''; 4-''lógos'', como reunião de desvelamento e velamento. Portanto, tudo isso leva à ''[[alétheia]]'' (desvelamento ou verdade). Verdade enquanto ''alétheia'', a palavra [[grego|grega]] para verdade, não pode ser confundida com verdadeiro (a que se opõe falso). A verdade se dá em tensão com a não-verdade e não com o falso. Não se pode falar de verdadeiro se já não nos movemos dentro e a partir da verdade.
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:O método, enquanto caminho, implica a verdade, porque aí caminho é, no fundo, realizar como ''[[éthos]]''/ agir o que nos é próprio. ''Éthos'', de onde se forma a palavra ética,  é o agir no horizonte do sentido do ser, onde se dá a [[ética]], o livre agir movido pela [[sabedoria]]. Há, portanto, no método: 1-caminho; 2-ação; 3-''éthos''; 4-''lógos'', como reunião de desvelamento e velamento. Portanto, tudo isso leva à ''[[alétheia]]'' (desvelamento ou verdade). Verdade enquanto ''alétheia'', a palavra [[grego|grega]] para verdade, não pode ser confundida com verdadeiro (a que se opõe falso). A verdade se dá em tensão com a não-verdade e não com o falso. Não se pode falar de verdadeiro se já não nos movemos dentro e a partir da verdade.
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:Para as obras de arte não há um método geral e único. Quando isso ocorre, o [[próprio]] da obra de arte se [[retração|retrai]] e fica silenciado. Toda obra de arte institui nela mesma o método ou caminho que devemos pela escuta seguir atenta e inauguralmente. Ao solicitar em primeiro lugar a escuta, a obra exige de cada leitor um caminho sempre inaugural. Por isso é que, nas leituras das grandes obras de arte, não só diferentes leituras do mesmo leitor, mas também as leituras de diferentes momentos históricos encontram sempre caminhos novos.  “A ''Paideia'' poética hölderliniana revigora a hermenêutica, pois esta admite que cada obra de arte solicita um método adequado ao princípio que articula seu [[corpo]]. O método canônico, pretensamente único e verdadeiro, tão cultuado pela metodologia hipertrofia|hipertrofiada na "metodomania", se denuncia como uma [[abstração]] que vale para tudo e coisa nenhuma” (1).  
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:Para as obras de arte não há um método geral e único. Quando isso ocorre, o [[próprio]] da obra de arte se [[retração|retrai]] e fica silenciado. Toda obra de arte institui nela mesma o método ou caminho que devemos pela escuta seguir atenta e inauguralmente. Ao solicitar em primeiro lugar a escuta, a obra exige de cada leitor um caminho sempre inaugural. Por isso é que, nas leituras das grandes obras de arte, não só diferentes leituras do mesmo leitor, mas também as leituras de diferentes momentos históricos encontram sempre caminhos novos.  “A ''Paideia'' poética hölderliniana revigora a hermenêutica, pois esta admite que cada obra de arte solicite um método adequado ao princípio que articula seu [[corpo]]. O método canônico, pretensamente único e verdadeiro, tão cultuado pela metodologia [[hipertrofia|hipertrofiada]] na "metodomania", se denuncia como uma [[abstração]] que vale para tudo e coisa nenhuma” (1).  
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:Toda [[questão]] só é questão na medida em que empreende uma caminhada. Nesta, a questão advém e fala como [[verdade]]. É a ''[[alétheia]]'' (palavra grega que diz: desvelamento, e este é o que poeticamente se denomina verdade) do ''[[lógos]]'' (linguagem). A ''alétheia'' pode ser a ''alétheia'' do ''lógos'' porque ela se torna e é a partir da ''[[poíesis]]'' (vigor do poético) enquanto ''[[éthos]]'' (vigor do sentido do agir, ética) da questão. Por ser o ''éthos'' da questão, ela se dá como ''sophia'' (sabedoria) e não simplesmente como o a ser conhecido tecnicamente. Todo ''sophia'', como ''éthos'', vige na essência da [[linguagem]]: a ''phýsis'' (nascividade) / dzoé (vida). A questão de todo querer se dá como caminho e não simplesmente como desejo ao nível do [[psique|psíquico]] ou pela vontade do querer.
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:Toda [[questão]] só é questão na medida em que empreende uma caminhada. Nesta, a questão advém e fala como [[verdade]]. É a ''[[alétheia]]'' (palavra grega que diz: desvelamento, e este é o que poeticamente se denomina verdade) do ''[[lógos]]'' (linguagem). A ''alétheia'' pode ser a ''alétheia'' do ''lógos'' porque ela se torna e é a partir da ''[[poíesis]]'' (vigor do poético) enquanto ''[[éthos]]'' (vigor do sentido do agir, ética) da questão. Por ser o ''éthos'' da questão, ela se dá como ''sophia'' (sabedoria) e não simplesmente como o a ser conhecido tecnicamente. Todo ''sophía'', como ''éthos'', vige na essência da [[linguagem]]: a ''phýsis'' (nascividade) / dzoé (vida). A questão de todo querer se dá como caminho e não simplesmente como desejo ao nível do [[psique|psíquico]] ou pela vontade do querer.
:Eis o que nos diz Heidegger: “A seguir questionaremos a técnica. O questionamento trabalha na construção de um caminho. Por isso aconselha-se a considerar sobretudo o caminho e a não ficar preso às várias sentenças e aos diversos títulos. O caminho é um caminho do pensamento. Todo caminho de pensamento passa, de maneira mais ou menos [[percepção|perceptível]] e de modo extraordinário, pela linguagem” (1).  
:Eis o que nos diz Heidegger: “A seguir questionaremos a técnica. O questionamento trabalha na construção de um caminho. Por isso aconselha-se a considerar sobretudo o caminho e a não ficar preso às várias sentenças e aos diversos títulos. O caminho é um caminho do pensamento. Todo caminho de pensamento passa, de maneira mais ou menos [[percepção|perceptível]] e de modo extraordinário, pela linguagem” (1).  
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:A questão metodológica está pouco elaborada no que diz respeito  aos estudos literários. Por isso, a seguinte observação de Mircea Eliade esclarece: “Atualmente, os historiadores das religiões estão divididos entre duas orientações metodológicas divergentes, mas complementares: uns concentram sua atenção nas estruturas específicas dos fenômenos religiosos, enquanto outros interessam-se de preferência pelo contexto histórico desse fenômeno; os primeiros esforçam-se por compreender a essência da [[religião]], os outros trabalham por decifrar e apresentar sua história” (1). A hermenêutica ontológica trabalha ao mesmo tempo sobre a essência e sobre a [[história]], mas dando à interpretação e a esses conceitos um sentido ontológico. Os dois métodos de que fala Eliade têm origem científica. Que método usar para ficar fiel ao fato religioso, não como fato mas como fenômeno religioso? Pensando em Gadamer, notamos que o núcleo é a questão histórica, mas como fica a interpretação em sociedades arcaicas que não vivenciam o real como [[histórico]] no sentido científico? O homem também aí se dá um sentido e é de alguma maneira histórico. Mas que histórico é este? O que é isto o histórico? Pode haver histórico sem acontecer poético, pois como saber o que é a história sem tematizar o [[tempo]] e como questionar o tempo sem questionar a [[memória]]? Em relação à memória não se inscreve o método como caminhada de [[diálogo]]?
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:A questão metodológica está pouco elaborada no que diz respeito  aos estudos literários. Por isso, a seguinte observação de Mircea Eliade esclarece: “Atualmente, os historiadores das religiões estão divididos entre duas orientações metodológicas divergentes, mas complementares: uns concentram sua atenção nas estruturas específicas dos fenômenos religiosos, enquanto outros interessam-se de preferência pelo contexto histórico desse fenômeno; os primeiros esforçam-se por compreender a essência da [[religião]], os outros trabalham por decifrar e apresentar sua história” (1). A hermenêutica ontológica trabalha ao mesmo tempo sobre a essência e sobre a [[história]], mas dando à interpretação e a esses conceitos um sentido ontológico. Os dois métodos de que fala Eliade têm origem científica. Que método usar para ficar fiel ao fato religioso, não como fato mas como fenômeno religioso? Pensando em Gadamer, notamos que o núcleo é a questão histórica, mas como fica a interpretação em sociedades arcaicas que não vivenciam o real como [[histórico]] no sentido científico? O homem também aí se dá um sentido e é de alguma maneira histórico. Mas que histórico é este? O que é isto o histórico? Pode haver histórico sem acontecer poético, pois como saber o que é a história sem tematizar o [[tempo]] e como questionar o tempo sem questionar a [[memória]]? Em relação à memória não se inscreve o método como caminhada de [[diálogo]]?
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:(1)  CASTRO, Manuel Antônio de. "Interdisciplinaridade poética: o 'entre'". In: ''Revista Tempo Brasileiro''. Rio de Janeiro: número 164, jan.-mar. 2006, p. 19.   
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:(1)  CASTRO, Manuel Antônio de. "Interdisciplinaridade poética: o 'entre'". In: ''Revista Tempo Brasileiro'', nº 164. Rio de Janeiro, 2006, p. 19.   

Edição de 21h22min de 19 de Setembro de 2009

1

"O meu propósito não consiste aqui em ensinar o método que cada um deve seguir para bem dirigir a razão, mas sim mostrar apenas de que modo consegui dirigir a minha... Logo que terminei o curso de estudos com que é costume ser-se recebido na classe dos doutos, mudei inteiramente de opinião, pois vi-me tão embaraçado com dúvidas e erros que me pareceu não ter obtido outro proveito, ao tratar de me instruir, senão descobrir cada vez mais a minha ignorância" (1).


Referência:
(1) KIERKEGAARD, Sören. Temor e tremor. Lisboa: Guimarães Editores, 1998, p. 20.


Ver também:


2

Emmanuel Carneiro Leão precisa bem o conteúdo do método enquanto metodologia, em seu livro Aprendendo a Pensar II: "É necessário ter bem claro o objetivo deste fazer específico que é investigar. O objetivo estabelecido no tema determina o método, isto é, o conjunto das decisões sobre o caminho a seguir, o nível e registro a tomar, os recursos e meios a empregar, o grau e o como fazer. Decide, sobretudo, do necessário para a viagem chegar ao fim e atingir o objetivo. Pois desta definição prévia depende tudo: quem investiga, para quê, o quê, como e onde investigar!" (1).


Referência:
(1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. Aprendendo a pensar II. Petrópolis: Vozes, 1992, p. 164.


Ver também:


3

A questão do método tem muitos caminhos, mas para uma hermenêutica ontológica, ele passa necessariamente pela "questão que é digna de ser pensada", pela “questão do pensamento”. Em relação ao método, diz Ernildo Stein na “Nota do Tradutor”: “Não discutiremos aqui até que ponto Heidegger terá razão quando critica e procura superar Hegel e Husserl. É, sem dúvida, simplificação resumir a filosofia de ambos na subjetividade e, consequentemente, na questão do método; como também é impossível pensar em separar, na 'questão do pensamento', método e questão” (1). Ora, Heidegger não separa método e questão, apenas não fica preso às formulações metodológicas de ambos, que acabam por configurar seu pensamento, mas Heidegger pensa o método já dentro da questão, ao pensar o círculo da circularidade perfeita, nas trilhas do pensador Heráclito. Não se pode entender método em seu aspecto formal. Por isso, Heidegger fala muito em caminho e o caminho nunca está desligado da questão. Ver como exemplo o ensaio “O caminho do campo” (2). Esta questão do método também é fundamental para a questão da arte.


- Manuel Antônio de Castro


Referência:
(1) STEIN, Ernildo. In: Os Pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1979, p. 67.
(2) HEIDEGGER, Martin. "O caminho do campo". In: Revista de Cultura Vozes, nº 4. Petrópolis: Vozes, 1977, pp. 326-8.


4

O método, enquanto caminho, implica a verdade, porque aí caminho é, no fundo, realizar como éthos/ agir o que nos é próprio. Éthos, de onde se forma a palavra ética, é o agir no horizonte do sentido do ser, onde se dá a ética, o livre agir movido pela sabedoria. Há, portanto, no método: 1-caminho; 2-ação; 3-éthos; 4-lógos, como reunião de desvelamento e velamento. Portanto, tudo isso leva à alétheia (desvelamento ou verdade). Verdade enquanto alétheia, a palavra grega para verdade, não pode ser confundida com verdadeiro (a que se opõe falso). A verdade se dá em tensão com a não-verdade e não com o falso. Não se pode falar de verdadeiro se já não nos movemos dentro e a partir da verdade.


- Manuel Antônio de Castro


5

Para as obras de arte não há um método geral e único. Quando isso ocorre, o próprio da obra de arte se retrai e fica silenciado. Toda obra de arte institui nela mesma o método ou caminho que devemos pela escuta seguir atenta e inauguralmente. Ao solicitar em primeiro lugar a escuta, a obra exige de cada leitor um caminho sempre inaugural. Por isso é que, nas leituras das grandes obras de arte, não só diferentes leituras do mesmo leitor, mas também as leituras de diferentes momentos históricos encontram sempre caminhos novos. “A Paideia poética hölderliniana revigora a hermenêutica, pois esta admite que cada obra de arte solicite um método adequado ao princípio que articula seu corpo. O método canônico, pretensamente único e verdadeiro, tão cultuado pela metodologia hipertrofiada na "metodomania", se denuncia como uma abstração que vale para tudo e coisa nenhuma” (1).


Referência:
(1) SOUZA, Ronaldes de Melo e. "Atualidade da tragédia grega". In: ROSENFIELD, Denis L. (Org.). Filosofia e literatura: o trágico. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2001, pp. 115-140.


6

Toda questão só é questão na medida em que empreende uma caminhada. Nesta, a questão advém e fala como verdade. É a alétheia (palavra grega que diz: desvelamento, e este é o que poeticamente se denomina verdade) do lógos (linguagem). A alétheia pode ser a alétheia do lógos porque ela se torna e é a partir da poíesis (vigor do poético) enquanto éthos (vigor do sentido do agir, ética) da questão. Por ser o éthos da questão, ela se dá como sophia (sabedoria) e não simplesmente como o a ser conhecido tecnicamente. Todo sophía, como éthos, vige na essência da linguagem: a phýsis (nascividade) / dzoé (vida). A questão de todo querer se dá como caminho e não simplesmente como desejo ao nível do psíquico ou pela vontade do querer.
Eis o que nos diz Heidegger: “A seguir questionaremos a técnica. O questionamento trabalha na construção de um caminho. Por isso aconselha-se a considerar sobretudo o caminho e a não ficar preso às várias sentenças e aos diversos títulos. O caminho é um caminho do pensamento. Todo caminho de pensamento passa, de maneira mais ou menos perceptível e de modo extraordinário, pela linguagem” (1).


- Manuel Antônio de Castro


Referência:
(1) HEIDEGGER, Martin. "A questão da técnica". In: Ensaios e conferências. Petrópolis: Vozes, 2002, p.11.


7

Fazer o itinerário ocidental do mito à ciência é fazer o itinerário das opções de método e o que ele sempre implica: a verdade. Na medida em que implica a verdade, nele estão implicados: o homem, o mundo, o real, a terra. Ora, o caminho no caminhar se dá sempre como diálogo. Por isso o diá-logo vai implicar a memória/ história, a cultura, a co-letividade originária, que é originária quando se dá o cum-legere (verbo latino que significa: o ler em conjunto, em unidade) do homoleguein (verbo grego que significa: falar a partir do mesmo): é neste que temos a identidade originária ou ontológica.
É nessa dimensão que podemos diferenciar o que Marx diz sobre alienação e o que diz Heidegger. A questão já está encaminhada na escolha do método por Marx ao tomar como base a dialética hegeliana, ao passo que Heidegger a questiona e vai às diferenças. O que está em questão tanto em Marx quanto em Heidegger é a questão do humano. O que é o humano? A questão é que nenhum humanismo pode dimensionar o humano do homem. E é nisso que Heidegger insiste. É com este olhar que é preciso ler os dois ensaios de Heidegger, que depois foram reunidos: "Identidade e diferença". O método decide da questão porque nele se dimensiona a questão da verdade. Verdade e método decidem do que no questionar se coloca como homem, mundo, real, ou seja, como essência do agir.


- Manuel Antônio de Castro


8

A questão metodológica está pouco elaborada no que diz respeito aos estudos literários. Por isso, a seguinte observação de Mircea Eliade esclarece: “Atualmente, os historiadores das religiões estão divididos entre duas orientações metodológicas divergentes, mas complementares: uns concentram sua atenção nas estruturas específicas dos fenômenos religiosos, enquanto outros interessam-se de preferência pelo contexto histórico desse fenômeno; os primeiros esforçam-se por compreender a essência da religião, os outros trabalham por decifrar e apresentar sua história” (1). A hermenêutica ontológica trabalha ao mesmo tempo sobre a essência e sobre a história, mas dando à interpretação e a esses conceitos um sentido ontológico. Os dois métodos de que fala Eliade têm origem científica. Que método usar para ficar fiel ao fato religioso, não como fato mas como fenômeno religioso? Pensando em Gadamer, notamos que o núcleo é a questão histórica, mas como fica a interpretação em sociedades arcaicas que não vivenciam o real como histórico no sentido científico? O homem também aí se dá um sentido e é de alguma maneira histórico. Mas que histórico é este? O que é isto – o histórico? Pode haver histórico sem acontecer poético, pois como saber o que é a história sem tematizar o tempo e como questionar o tempo sem questionar a memória? Em relação à memória não se inscreve o método como caminhada de diálogo?


- Manuel Antônio de Castro


Referência:
(1) ELIADE, Mircea. O sagrado e o profano. São Paulo: Martins Fontes, 2001, p. 13.


Ver também:


9

"O questionamento trabalha na construção de um caminho. Por isso, aconselha-se a considerar sobretudo o caminho e a não ficar preso às várias sentenças e aos diversos títulos. O caminho é um caminho de pensamento. Todo caminho de pensamento passa de maneira mais ou menos perceptível e de modo extraordinário pela linguagem" (1).


Referência:
(1) HEIDEGGER, Martin. Ensaios e conferências. Petrópolis: Vozes, 2002, p. 11.


10

"Mas o método (ainda não metodologia) de maneira alguma constitui algo em si. Ele surge do estranho que é para o ser humano ele mesmo e tudo o que o cerca, em seu permanecer e devir" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Interdisciplinaridade poética: o 'entre'". In: Revista Tempo Brasileiro, nº 164. Rio de Janeiro, 2006, p. 19.


Ver também: