Mito

De Dicionrio de Potica e Pensamento

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:Porém, hoje as ciências cognitivas, antigas ciências do espírito, já se dão conta de que é essencial trazer para a questão não só a vida do homem, mas também sua vida experienciada no cotidiano. Porém, do cotidiano enquanto [[ordinário]] sempre falaram as artes, mas não para reproduzi-lo, mas surpreendê-lo e apreendê-lo na dimensão do extra-ordinário. Porque entre um e outro é que se dá o vigor do poético, o ditar do sagrado enquanto energia que a tudo realiza. Por isso, o mito se dá sempre no entre dos ritos enquanto acontecer dos mitos. Quando os ritos esquecem os mitos, começa a necessidade de criar o simbóliico. As ciências cognitivas se não ouvirem o poder do mito como presença na experienciação cotidiana do extraordinário estarão ainda tolhidas e surdas para a fala e voz do humano do homem.
:Porém, hoje as ciências cognitivas, antigas ciências do espírito, já se dão conta de que é essencial trazer para a questão não só a vida do homem, mas também sua vida experienciada no cotidiano. Porém, do cotidiano enquanto [[ordinário]] sempre falaram as artes, mas não para reproduzi-lo, mas surpreendê-lo e apreendê-lo na dimensão do extra-ordinário. Porque entre um e outro é que se dá o vigor do poético, o ditar do sagrado enquanto energia que a tudo realiza. Por isso, o mito se dá sempre no entre dos ritos enquanto acontecer dos mitos. Quando os ritos esquecem os mitos, começa a necessidade de criar o simbóliico. As ciências cognitivas se não ouvirem o poder do mito como presença na experienciação cotidiana do extraordinário estarão ainda tolhidas e surdas para a fala e voz do humano do homem.
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:A cultura: tudo que o homem faz, pensa, quer, sente e crê.
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:A [[cultura]]: tudo que o homem faz, pensa, quer, sente e crê.
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:- [[Manuel Antônio de Castro]]
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:Seria necessário pensar a referência/relação mito/escrita. Até onde a [[escrita]] abole o [[rito]] e deixa o mito entregue ao rito da escrita, gerando assim uma “perda” entre o rito do mito e o rito da escrita, que se refletiria na própria relação/referência linguagem/língua/narração. Cf. para isso as distinções (insuficientes) que faço no ensaio: Teoria literária: representação e ética.
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:Seria necessário pensar a referência/ relação mito/ escrita. Até onde a [[escrita]] abole o [[rito]] e deixa o mito entregue ao rito da escrita, gerando assim uma "perda" entre o rito do mito e o rito da escrita, que se refletiria na própria relação/ referência linguagem/ língua/ narração. Conferir para isso as distinções (insuficientes) que faço no ensaio: "Teoria literária: representação e ética" (1).
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:- [[Manuel Antônio de Castro]]
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:www.travessiapoetica.blogspot.com
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:O mito é a língua do [[sagrado]]. A [[linguagem]]  é o sagrado se manifestando em língua. Por isso o mito é a linguagem de toda língua.
 
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:-[[Manuel Antônio de Castro]]
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:(1) [http://www.travessiapoetica.blogspot.com Travessia Poética]
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:Na poesia, o que se revela memória do mito é o apelo do logos para dizê-lo. Por isso, mais no silêncio e no vazio do que nas palavras, sons, gestos e cores, está presente o mito enquanto memória do silêncio  da poesia. O rito é o logos se fazendo palavras, música, dança e pintura do mito.
 
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:Os mitos no sentido moderno são: “... progresso, liberdade, igualdade e tantos outros criados pela razão moderna”. Ora estes mitos constituem a paidéia da *Bildung*. Dela se afasta a paidéia da poiesis.
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:O mito é a língua do [[sagrado]]. A [[linguagem]]  é o sagrado se manifestando em língua. Por isso, o mito é a linguagem de toda língua.
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:- [[Manuel Antônio de Castro]]
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:SOARES, André Marcelo Machado. ''Nietzsche e Heidegger na teologia de Paul Tillich''. In: Caderno de Letras. Faculdade de Letras. Departamento de Letras Anglo-Germânicas, Ufrj, no. 16, p. 127.
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: “A  recompensa, por se existir na ponte do tempo entre o silêncio e a fala, é avançar sempre e nunca parar.” (1) O mito é também o silêncio do rito. O rito é a fala do mito.
 
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:Na poesia, o que se revela [[memória]] do mito é o apelo do ''lógos'' para dizê-lo. Por isso, mais no silêncio e no vazio do que nas palavras, sons, [[gesto|gestos]] e cores, está presente o mito enquanto memória do silêncio da poesia. O rito é o ''lógos'' se fazendo palavras, música, [[dança]] e [[pintura]] do mito.
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:Referência
 
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:(1)LEÃO, Emmanuel Carneiro. ''Aprendendo a pensar II''. Petrópolis, Vozes, 1992, p.28.
 
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:- [[Manuel Antônio de Castro]]
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:Uma reflexão da ligação do mito com a literatura e a arte está exposta na interpretação de SCHUBACK: “Ao narrar que Ulisses [Kafka] com cera nos ouvidos jamais poderia ouvir que as sereias não teriam cantado e, assim, descobrir que o mito seria ilusão, Kafka mostra que a literatura é itinerário para a verdade do mito. Literatura é a saga de Ulisses de volta para o mito”. (1) Não só Ulisses tapa os ouvidos com cera, mas as sereias não cantam: “Mais do que silêncio, elas deixam em cena o seu não-canto e assim a ausência de encantamento que constituem “armas ainda mais terríveis do que o canto” (2). O canto cotidiano nos enche de contentamento, mas nos pode obstruir o caminho para o não-encantamento, para o silêncio. E esta pode ser a verdade do mito, o supremo encantamento, a morte, porque depois que o silêncio fala, qualquer palavra é excessiva, cada um achou a sua plenitude. Ulisses ao ouvir o que não pode ser ouvido só se salva porque se amarra ao limite que toda fala implica. O máximo de limite da fala frente ao ilimitado de todo silêncio está na palavra cantada, onde o encantamento advém como real e como possível, como desvelado e velado, como ordinário e extraordinário, onde a ambigüidade se faz o uno de toda diversidade. A palavra cantada sendo sucessão de sons se faz sentido enquanto uno de toda realidade. Por isso o ritmo é o real se dando, se manifestando em formas no devir continuo da não-forma. Eis porque na pausa não há ritmo, só na fala cantada do silêncio.
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:Referências
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:(1) Schuback, Márcia Sá Cavalcante. "As cordas serenas de Ulisses". In: Ensaios de Filosofia. Petrópolis, Vozes, 1999, p.165.
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:Os mitos no sentido moderno são: "[...] [[progresso]], liberdade, igualdade e tantos outros criados pela razão moderna" (1). Ora estes mitos constituem a ''[[paidéia]]'' da ''Bildung''. Dela se afasta a ''paidéia'' da ''poíesis''.
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:(2) idem, p. 164.
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:Emmanuel Carneiro Leão diz que a filosofia, mais que um conhecimento ou uma ideologia ou uma visão de mundo, é uma experiência de pensamento. “Mas essa experiência de pensamento  que nós não sabemos ainda o que é precisamente não é a única experiência grega, nem a única experiência grega de pensamento. Outra experiência de pensamento é o mito, a mística. Outras são os deuses e o extraordinário. Ainda há uma outra, a poesia e a arte. Uma outra experiência de pensamento é a polis e a politéia, isto é, a organização, a ordem política da cidadania...uma outra... a primeira experiência grega de pensamento é a vida e a morte, Eros kai Thanatos.”(1). Penso que por essa riqueza de experiência de pensamento é que se dá a [[complexidade]] da linguagem (mito, logos, epos), a própria experiência de ser e não-ser.
 
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:Referência:
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:Referência
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:(1) SOARES, André Marcelo Machado. "Nietzsche e Heidegger na teologia de Paul Tillich". In: ''Caderno de Letras'', nº 16. Rio de Janeiro: UFRJ, Faculdade de Letras, Departamento de Letras Anglo-Germânicas p. 127.
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:(1)''A filosofia grega hoje''. In: Caderno de Letras. Faculdade de Letras, Departamento de Letras Anglo-Germânicas, 18, 2002, p. 21
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:Na ficha "Mito número 1", apontam-se as três construções do real: [[filosofia]], [[teologia]], [[ciência]]. Mas elas não estão separadas, pois a ciência fragmenta a construção do homem e do real numa série de disciplinas. E cada uma de acordo com o seu objeto e método, nos propõe um entendimento do mito: antropologia, etnografia (ou etnologia), psicologia, psiquiatria, psicanálise, história. E dentro de cada [[disciplina]] ainda há as correntes. Isso numa primeira instância pulveriza o entendimento do mito, afastando-nos do seu vigor manifestativo e construtivo. Por outro lado, afirmando-se o mito um núcleo impenetrável, só ocasiona uma possibilidade de abertura para o sentido do mito no que o mito é: manifestação originária do [[real]]. Pensadas não as interpretações mas este núcleo indecifrável, se abre para nós a essência do mito, que é, no fundo, a essência da [[linguagem]] ou do real como totalidade cósmica. O que seja isto é o que o mito nos leva a pensar. E aqui se dá a diferença entre o mito como conhecimento e o mito como uma experiência de pensamento mítica. O mito em seu núcleo duro [[é]] sempre uma experiência de pensamento e não a formulação de um conhecimento. Quando se pensa a arte essencialmente se chega à questão do mito como experiência de pensamento, ou seja, à experiência de pensamento do sagrado. É o que Platão, no Íon, fala sobre a inspiração dos poetas pelas Musas.
 
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:"A  recompensa, por se existir na ponte do [[tempo]] entre o silêncio e a [[fala]], é avançar sempre e nunca parar" (1). O mito é também o silêncio do rito. O rito é a fala do mito.  
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:Torrano, JAA. O sentido de Zeus. São Paulo, Iluminuras, 1996, p. 25 e 26. (O mito na dinâmica do Canto e do Culto.[[)]]
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:- [[Manuel Antônio de Castro]]
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:Referência:
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:(1)LEÃO, Emmanuel Carneiro. ''Aprendendo a pensar II''. Petrópolis: Vozes, 1992, p.28.
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:Uma reflexão da ligação do mito com a [[literatura]] e a arte está exposta na interpretação de SCHUBACK: "Ao narrar que Ulisses [Kafka] com cera nos ouvidos jamais poderia ouvir que as sereias não teriam cantado e, assim, descobrir que o mito seria [[ilusão]], Kafka mostra que a literatura é itinerário para a verdade do mito. Literatura é a saga de Ulisses de volta para o mito" (1). Não só Ulisses tapa os ouvidos com cera, mas as sereias não cantam: "Mais do que silêncio, elas deixam em cena o seu não-canto e assim a [[ausência]] de [[encantamento]] que constituem 'armas ainda mais terríveis do que o canto'" (2). O [[canto]] cotidiano nos enche de contentamento, mas nos pode obstruir o [[caminho]] para o não-encantamento, para o silêncio. E esta pode ser a verdade do mito, o supremo encantamento, a morte, porque depois que o silêncio fala, qualquer palavra é excessiva, cada um achou a sua plenitude. Ulisses ao ouvir o que não pode ser ouvido só se salva porque se amarra ao [[limite]] que toda fala implica. O máximo de limite da fala frente ao ilimitado de todo silêncio está na palavra cantada, onde o encantamento advém como [[real]] e como possível, como desvelado e velado, como ordinário e extraordinário, onde a ambiguidade se faz o uno de toda diversidade. A palavra cantada sendo sucessão de sons se faz sentido enquanto uno de toda realidade. Por isso, o ritmo é o real se dando, se manifestando em formas no devir contínuo da não-forma. Eis porque na pausa não há ritmo, só na fala cantada do silêncio.
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:- [[Manuel Antônio de Castro]]
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:Referências:
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:(1) SCHUBACK, Marcia Sá Cavalcante. "As cordas serenas de Ulisses". In: ''Ensaios de Filosofia''. Petrópolis: Vozes, 1999, p.165.
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:(2) Idem, p. 164.
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:Emmanuel Carneiro Leão diz que a filosofia, mais que um conhecimento ou uma [[ideologia]] ou uma visão de mundo, é uma experiência de [[pensamento]]. "Mas essa experiência de pensamento  que nós não sabemos ainda o que é precisamente não é a única experiência [[grego|grega]], nem a única experiência grega de pensamento. Outra experiência de pensamento é o mito, a mística. Outras são os deuses e o extraordinário. Ainda há uma outra, a [[poesia]] e a arte. Uma outra experiência de pensamento é a ''pólis'' e a ''politéia'', isto é, a organização, a ordem política da cidadania... uma outra... a primeira experiência grega de pensamento é a vida e a morte, ''Eros kai Thanatos''" (1). Penso que por essa riqueza de experiência de pensamento é que se dá a [[complexidade]] da linguagem (mito, ''[[lógos]]'', ''épos''), a própria experiência de ser e não-ser.
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:Referência:
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:(1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "A filosofia grega hoje". In: ''Caderno de Letras'', nº 18. Rio de Janeiro: UFRJ, Faculdade de Letras, Departamento de Letras Anglo-Germânicas, 2002, p. 21.
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:Na ficha [[#1|Mito,1]], apontam-se as três construções do real: [[filosofia]], [[teologia]], [[ciência]]. Mas elas não estão separadas, pois a ciência fragmenta a construção do homem e do real numa série de disciplinas. E cada uma de acordo com o seu objeto e método, nos propõe um entendimento do mito: antropologia, etnografia (ou etnologia), psicologia, psiquiatria, psicanálise, história. E dentro de cada [[disciplina]] ainda há as correntes. Isso numa primeira instância pulveriza o entendimento do mito, afastando-nos do seu vigor manifestativo e construtivo. Por outro lado, afirmando-se o mito um núcleo impenetrável, só ocasiona uma possibilidade de abertura para o sentido do mito no que o mito é: manifestação originária do [[real]]. Pensadas não as interpretações mas este núcleo indecifrável, se abre para nós a essência do mito, que é, no fundo, a essência da [[linguagem]] ou do real como totalidade cósmica. O que seja isto é o que o mito nos leva a pensar. E aqui se dá a diferença entre o mito como conhecimento e o mito como uma experiência de pensamento mítica. O mito em seu núcleo duro [[é]] sempre uma experiência de pensamento e não a formulação de um conhecimento. Quando se pensa a arte essencialmente se chega à questão do mito como experiência de pensamento, ou seja, à experiência de pensamento do sagrado. É o que Platão, no ''Íon'', fala sobre a inspiração dos poetas pelas Musas.
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:- [[Manuel Antônio de Castro]]
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:No mito deve ser considerado fundamentalmente o [[rito]]. O mito nos advém no rito. Mas quando consideramos o rito, constatamos que ele não é um [[conceito]], nem, evidentemente, uma [[representação]]. Por isso, o rito se constitui na essência de sua poética mítica. Não temos só poética quando o mito nos dá a ritualização da própria [[linguagem]], como no mito de Hermes. Todo rito pressupõe uma poética, pois todo rito reúne momentos de música, poesia, dança, pintura, escultura... O rito reúne as linguagens poéticas no mito como linguagem. A poética do mito se dá na consideração da tensão entre mito e rito.
:No mito deve ser considerado fundamentalmente o [[rito]]. O mito nos advém no rito. Mas quando consideramos o rito, constatamos que ele não é um [[conceito]], nem, evidentemente, uma [[representação]]. Por isso, o rito se constitui na essência de sua poética mítica. Não temos só poética quando o mito nos dá a ritualização da própria [[linguagem]], como no mito de Hermes. Todo rito pressupõe uma poética, pois todo rito reúne momentos de música, poesia, dança, pintura, escultura... O rito reúne as linguagens poéticas no mito como linguagem. A poética do mito se dá na consideração da tensão entre mito e rito.
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:Rito e mito se dão também como culto na cerimônia ritual. O que seria o culto? Diz Ronaldes: ...o culto explica a cultura que o desenvolve, e a [[cultura]] implica o culto que a envolve. Não subsiste a cultura senão enquanto existe o sortilégio da pulsão mítica que a dinamiza e da compulsão ritual que a potencializa. O ato cultual do conato pulsional é que processualiza o fato cultural. O mito dramaticamente ritualizado não é unicamente o prodigalizador das razões da sociedade, mas principalmente o inseminador das paixões da humanidade. A cultura persiste em sua duração histórica somente enquanto insiste na perduração mitológica do seu culto” (1).
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:Rito e mito se dão também como [[culto]] na cerimônia ritual. O que seria o culto? Diz Ronaldes de Melo e Souza: "[...] o culto explica a cultura que o desenvolve, e a [[cultura]] implica o culto que a envolve. Não subsiste a cultura senão enquanto existe o sortilégio da pulsão mítica que a dinamiza e da compulsão ritual que a potencializa. O ato cultual do conato pulsional é que processualiza o fato cultural. O mito dramaticamente ritualizado não é unicamente o prodigalizador das razões da sociedade, mas principalmente o inseminador das paixões da humanidade. A cultura persiste em sua duração histórica somente enquanto insiste na perduração mitológica do seu culto" (1).
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:Referência
 
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:(1) SOUZA, Ronaldes de Melo e. ''Hermenêutica da concriatividade''. Faculdade de Letras. Programa de Ciência da Literatura. Tese, 1988, p. 356.
 
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:- [[Manuel Antônio de Castro]]
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:"O mito tem a força da verdade, a manifestação do real. O mito como palavra coloca a [[linguagem]] como a manifestação do ser. Nesse sentido, a linguagem também é mito. Ela restitui a essência ao ser. É a manifestação pela qual o real eclode em sua essência. Em grego, ''mythos'' originou-se do verbo ''mytheomai'', que significa: desocultar pela palavra. Palavra essa, organizada na forma de discurso sagrado. Tem o sentido de palavra divina, através do canto poético aquecido como uma fonte referente ao sentido do ser e às formas divinas do mundo. Assim, dizemos que o mito aparece como o próprio real. O real a se doar, a eclodir como Linguagem"(1).
 
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:Referência
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:(1) SOUZA, Ronaldes de Melo e. ''Hermenêutica da concriatividade''. 1988. Tese de doutorado - Faculdade de Letras, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, p. 356.
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:(1) GROETAERS, Elenice.''A poética da noite em Vinicius de Moraes''. São Paulo: Scortecci, 2007, p.58-59.
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:"Mythos já diz o manifestar-se do real em sua essência originária, em ser o próprio extra-ordinário em seu vigor atuante, em sua concreticidade, pois o concreto é a vigência do vigente na pergunta que a questão nos põe. Todo mito é uma pergunta gerada pelas questões. Dialogar e interpretar os mitos é sempre experienciar como rito a resposta à pergunta que o mito sempre e permanentemente coloca" (1).
 
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:"O mito tem a força da verdade, a manifestação do real. O mito como palavra coloca a [[linguagem]] como a manifestação do ser. Nesse sentido, a linguagem também é mito. Ela restitui a essência ao ser. É a manifestação pela qual o real eclode em sua essência. Em grego, ''mýthos'' originou-se do verbo ''mytheomai'', que significa: desocultar pela palavra. Palavra essa, organizada na forma de discurso sagrado. Tem o sentido de palavra divina, através do canto poético aquecido como uma fonte referente ao sentido do ser e às formas divinas do mundo. Assim, dizemos que o mito aparece como o próprio real. O real a se doar, a eclodir como Linguagem" (1).
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:Referência
 
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:(1) CASTRO, Manuel Antônio de. Permanência e atualidade da Poética. In: Revista ''Tempo Brasileiro'', 171, out.-dez., 2007, p. 11.
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:(1) GROETAERS, Elenice. ''A poética da noite em Vinicius de Moraes''. São Paulo: Scortecci, 2007, pp.58-9.
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== 14  ==
 
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:"O mito, em seu vigor imperante, está presente, como não podia deixar de ser, em todos os momentos e acontecimentos do homem, Poesia que é" (1).
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:"''Mýthos'' já diz o manifestar-se do real em sua essência originária, em ser o próprio extra-ordinário em seu vigor atuante, em sua concreticidade, pois o [[concreto]] é a vigência do vigente na pergunta que a questão nos põe. Todo mito é uma pergunta gerada pelas questões. Dialogar e interpretar os mitos é sempre experienciar como rito a resposta à pergunta que o mito sempre e permanentemente coloca" (1).
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:(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Permanência e atualidade da Poética". In: ''Revista Tempo Brasileiro'', nº 171. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2007, p. 11.
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:"O mito, em seu vigor imperante, está [[presença|presente]], como não podia deixar de ser, em todos os momentos e acontecimentos do homem, Poesia que é" (1).
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:(1) CASTRO, Manuel Antônio de. ''O acontecer poético'' - a história literária. Rio de Janeiro: Antares, 1982, p. 39.
 
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:Referência:
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==Ver Também==
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:(1) CASTRO, Manuel Antônio de. ''O acontecer poético - a história literária''. Rio de Janeiro: Antares, 1982, p. 39.
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*[[Culto]]
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*[[Cultura]]
+
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*[[Encantamento]]
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*[[Escrita]]
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*[[Fala]]
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*[[Língua]]
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*[[Logos]]
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*[[Paidéia|Paidéia(Bildung)]]
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*[[Pensamento]]
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*[[Razão]]
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*[[Rito]]
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Edição de 20h02min de 22 de março de 2009

1

O ser humano se desdobra em diversas faces, mas a razão tende a tudo querer abarcar. No mito isso não acontece e não há a separação dessas faces, que seriam:
Conhecer
Pensar ______________ RAZÃO
Compreender
Querer
Desejar ______________ VONTADE
Questionar
Imaginar
Sonhar________________ IMAGINAÇÃO
Inventar
Crer __________________FÉ
Sentir
Apaixonar ____________ AFETIVIDADE / EMOÇÃO
Sensibilizar
      Mito   Arte   Religião  ____  AMAR


A ciência dividiu essa realidade complexa em três campos:
1- Racional
2- Volitivo
3- Afetivo


E a dois métodos:
1-Dedutivo-racional
2-Indutivo-experimental - observacional - estatístico


Porém, hoje as ciências cognitivas, antigas ciências do espírito, já se dão conta de que é essencial trazer para a questão não só a vida do homem, mas também sua vida experienciada no cotidiano. Porém, do cotidiano enquanto ordinário sempre falaram as artes, mas não para reproduzi-lo, mas surpreendê-lo e apreendê-lo na dimensão do extra-ordinário. Porque entre um e outro é que se dá o vigor do poético, o ditar do sagrado enquanto energia que a tudo realiza. Por isso, o mito se dá sempre no entre dos ritos enquanto acontecer dos mitos. Quando os ritos esquecem os mitos, começa a necessidade de criar o simbóliico. As ciências cognitivas se não ouvirem o poder do mito como presença na experienciação cotidiana do extraordinário estarão ainda tolhidas e surdas para a fala e voz do humano do homem.
A cultura: tudo que o homem faz, pensa, quer, sente e crê.


- Manuel Antônio de Castro


2

Seria necessário pensar a referência/ relação mito/ escrita. Até onde a escrita abole o rito e deixa o mito entregue ao rito da escrita, gerando assim uma "perda" entre o rito do mito e o rito da escrita, que se refletiria na própria relação/ referência linguagem/ língua/ narração. Conferir para isso as distinções (insuficientes) que faço no ensaio: "Teoria literária: representação e ética" (1).


- Manuel Antônio de Castro


Referência:
(1) Travessia Poética


3

O mito é a língua do sagrado. A linguagem é o sagrado se manifestando em língua. Por isso, o mito é a linguagem de toda língua.


- Manuel Antônio de Castro


4

Na poesia, o que se revela memória do mito é o apelo do lógos para dizê-lo. Por isso, mais no silêncio e no vazio do que nas palavras, sons, gestos e cores, está presente o mito enquanto memória do silêncio da poesia. O rito é o lógos se fazendo palavras, música, dança e pintura do mito.


- Manuel Antônio de Castro


5

Os mitos no sentido moderno são: "[...] progresso, liberdade, igualdade e tantos outros criados pela razão moderna" (1). Ora estes mitos constituem a paidéia da Bildung. Dela se afasta a paidéia da poíesis.


Referência:
(1) SOARES, André Marcelo Machado. "Nietzsche e Heidegger na teologia de Paul Tillich". In: Caderno de Letras, nº 16. Rio de Janeiro: UFRJ, Faculdade de Letras, Departamento de Letras Anglo-Germânicas p. 127.


6

"A recompensa, por se existir na ponte do tempo entre o silêncio e a fala, é avançar sempre e nunca parar" (1). O mito é também o silêncio do rito. O rito é a fala do mito.


- Manuel Antônio de Castro


Referência:
(1)LEÃO, Emmanuel Carneiro. Aprendendo a pensar II. Petrópolis: Vozes, 1992, p.28.


7

Uma reflexão da ligação do mito com a literatura e a arte está exposta na interpretação de SCHUBACK: "Ao narrar que Ulisses [Kafka] com cera nos ouvidos jamais poderia ouvir que as sereias não teriam cantado e, assim, descobrir que o mito seria ilusão, Kafka mostra que a literatura é itinerário para a verdade do mito. Literatura é a saga de Ulisses de volta para o mito" (1). Não só Ulisses tapa os ouvidos com cera, mas as sereias não cantam: "Mais do que silêncio, elas deixam em cena o seu não-canto e assim a ausência de encantamento que constituem 'armas ainda mais terríveis do que o canto'" (2). O canto cotidiano nos enche de contentamento, mas nos pode obstruir o caminho para o não-encantamento, para o silêncio. E esta pode ser a verdade do mito, o supremo encantamento, a morte, porque depois que o silêncio fala, qualquer palavra é excessiva, cada um achou a sua plenitude. Ulisses ao ouvir o que não pode ser ouvido só se salva porque se amarra ao limite que toda fala implica. O máximo de limite da fala frente ao ilimitado de todo silêncio está na palavra cantada, onde o encantamento advém como real e como possível, como desvelado e velado, como ordinário e extraordinário, onde a ambiguidade se faz o uno de toda diversidade. A palavra cantada sendo sucessão de sons se faz sentido enquanto uno de toda realidade. Por isso, o ritmo é o real se dando, se manifestando em formas no devir contínuo da não-forma. Eis porque na pausa não há ritmo, só na fala cantada do silêncio.


- Manuel Antônio de Castro


Referências:
(1) SCHUBACK, Marcia Sá Cavalcante. "As cordas serenas de Ulisses". In: Ensaios de Filosofia. Petrópolis: Vozes, 1999, p.165.
(2) Idem, p. 164.


8

Emmanuel Carneiro Leão diz que a filosofia, mais que um conhecimento ou uma ideologia ou uma visão de mundo, é uma experiência de pensamento. "Mas essa experiência de pensamento que nós não sabemos ainda o que é precisamente não é a única experiência grega, nem a única experiência grega de pensamento. Outra experiência de pensamento é o mito, a mística. Outras são os deuses e o extraordinário. Ainda há uma outra, a poesia e a arte. Uma outra experiência de pensamento é a pólis e a politéia, isto é, a organização, a ordem política da cidadania... uma outra... a primeira experiência grega de pensamento é a vida e a morte, Eros kai Thanatos" (1). Penso que por essa riqueza de experiência de pensamento é que se dá a complexidade da linguagem (mito, lógos, épos), a própria experiência de ser e não-ser.


Referência:
(1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. "A filosofia grega hoje". In: Caderno de Letras, nº 18. Rio de Janeiro: UFRJ, Faculdade de Letras, Departamento de Letras Anglo-Germânicas, 2002, p. 21.


9

Na ficha Mito,1, apontam-se as três construções do real: filosofia, teologia, ciência. Mas elas não estão separadas, pois a ciência fragmenta a construção do homem e do real numa série de disciplinas. E cada uma de acordo com o seu objeto e método, nos propõe um entendimento do mito: antropologia, etnografia (ou etnologia), psicologia, psiquiatria, psicanálise, história. E dentro de cada disciplina ainda há as correntes. Isso numa primeira instância pulveriza o entendimento do mito, afastando-nos do seu vigor manifestativo e construtivo. Por outro lado, afirmando-se o mito um núcleo impenetrável, só ocasiona uma possibilidade de abertura para o sentido do mito no que o mito é: manifestação originária do real. Pensadas não as interpretações mas este núcleo indecifrável, se abre para nós a essência do mito, que é, no fundo, a essência da linguagem ou do real como totalidade cósmica. O que seja isto é o que o mito nos leva a pensar. E aqui se dá a diferença entre o mito como conhecimento e o mito como uma experiência de pensamento mítica. O mito em seu núcleo duro é sempre uma experiência de pensamento e não a formulação de um conhecimento. Quando se pensa a arte essencialmente se chega à questão do mito como experiência de pensamento, ou seja, à experiência de pensamento do sagrado. É o que Platão, no Íon, fala sobre a inspiração dos poetas pelas Musas.


- Manuel Antônio de Castro


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No mito deve ser considerado fundamentalmente o rito. O mito nos advém no rito. Mas quando consideramos o rito, constatamos que ele não é um conceito, nem, evidentemente, uma representação. Por isso, o rito se constitui na essência de sua poética mítica. Não temos só poética quando o mito nos dá a ritualização da própria linguagem, como no mito de Hermes. Todo rito pressupõe uma poética, pois todo rito reúne momentos de música, poesia, dança, pintura, escultura... O rito reúne as linguagens poéticas no mito como linguagem. A poética do mito se dá na consideração da tensão entre mito e rito.
Rito e mito se dão também como culto na cerimônia ritual. O que seria o culto? Diz Ronaldes de Melo e Souza: "[...] o culto explica a cultura que o desenvolve, e a cultura implica o culto que a envolve. Não subsiste a cultura senão enquanto existe o sortilégio da pulsão mítica que a dinamiza e da compulsão ritual que a potencializa. O ato cultual do conato pulsional é que processualiza o fato cultural. O mito dramaticamente ritualizado não é unicamente o prodigalizador das razões da sociedade, mas principalmente o inseminador das paixões da humanidade. A cultura persiste em sua duração histórica somente enquanto insiste na perduração mitológica do seu culto" (1).


- Manuel Antônio de Castro


Referência:
(1) SOUZA, Ronaldes de Melo e. Hermenêutica da concriatividade. 1988. Tese de doutorado - Faculdade de Letras, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, p. 356.


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"O mito tem a força da verdade, a manifestação do real. O mito como palavra coloca a linguagem como a manifestação do ser. Nesse sentido, a linguagem também é mito. Ela restitui a essência ao ser. É a manifestação pela qual o real eclode em sua essência. Em grego, mýthos originou-se do verbo mytheomai, que significa: desocultar pela palavra. Palavra essa, organizada na forma de discurso sagrado. Tem o sentido de palavra divina, através do canto poético aquecido como uma fonte referente ao sentido do ser e às formas divinas do mundo. Assim, dizemos que o mito aparece como o próprio real. O real a se doar, a eclodir como Linguagem" (1).


Referência:
(1) GROETAERS, Elenice. A poética da noite em Vinicius de Moraes. São Paulo: Scortecci, 2007, pp.58-9.


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"Mýthos já diz o manifestar-se do real em sua essência originária, em ser o próprio extra-ordinário em seu vigor atuante, em sua concreticidade, pois o concreto é a vigência do vigente na pergunta que a questão nos põe. Todo mito é uma pergunta gerada pelas questões. Dialogar e interpretar os mitos é sempre experienciar como rito a resposta à pergunta que o mito sempre e permanentemente coloca" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Permanência e atualidade da Poética". In: Revista Tempo Brasileiro, nº 171. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2007, p. 11.


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"O mito, em seu vigor imperante, está presente, como não podia deixar de ser, em todos os momentos e acontecimentos do homem, Poesia que é" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. O acontecer poético - a história literária. Rio de Janeiro: Antares, 1982, p. 39.
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