Permanência

De Dicionrio de Potica e Pensamento

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:Quando se fala do ''ón'' na metafísica, geralmente, não se atenta para a questão que está no centro. Trata-se para o grego da questão da [[mudança]] e da permanência. A mudança é muito evidente. Mas o que é a permanência? Esta questão tem um fundo filosófico e ao mesmo tempo político. A pro-cura do substantivo e do ''subjectum'' se dá nesse âmbito, ou seja, mais especificamente, procura-se o [[conceito|con-ceito]]. Este vai estar ligado à [[verdade]], que se vai opor à ''dóxa'', à aparência. Mas esta se relaciona à mudança e, nesta, não há verdade. Por isso ''dóxa'' significa fundamentalmente opinião. Mas da opinião tratavam os [[sofista|sofistas]]. E aqui entra o aspecto político. Mas e o [[ontologia|ontológico]]? Três questões vão estar ligadas a esta dimensão: ''lógos'', ''tékhne'', ''poíesis''. Entendê-las é entender as opções metafísicas nas quais os grandes pesadores Platão e Aristóteles nos lançam. ''lógos'', fundamentalmente, é o que perdura. Por isso, irá ser identificado com o [[fundamento]] e com o dizer. O verbo ''eíro'', de onde se originou depois a [[retórica]], não terá esta dimensão, pois a retórica funda as opiniões, tendo perdido o seu caráter de um dizer "sagrado". Esse é substituído pelo dizer do ''lógos''. Por isso, este, enquanto dizer, como [[proposição|pro-posição]], diz a verdade na medida em que é lógica. Mas, por outro lado, a verdade de uma tal lógica está ligada à pro-posição na sua constituição de [[sujeito]] e predicativo. Se bem observarmos, a verdade lógica sempre se deduz, desde que aceita a proposição constituída de sujeito e predicativo. Mas nesta o [[ser]] foi substituído pelo substantivo. O que vai corresponder à verdade lógica é, por outro lado, o conhecimento técnico, ou seja, a ''tékhne'' é aquele conhecimento que permite o [[agir]] como permanência, não muda. A ''tékhne'' substitui o ser. Por isso, ''lógos'' e ''tékhne'' substituem a ''poíesis'', pois está ligada à ação e a ação não é o fundo da mudança? Para afirmar a permanência e a verdade silencia-se a ''poíesis''. Mas qual é a essência do agir enquanto ''poíesis''? É a mudança? Não. É mais. É um entre, é um acontecer-poético-apropriante. A [[filosofia]] abandonou a ''poíesis'' e fica entre: ''tékhne'', ''epistéme'' e ''máthesis''. A [[epistemologia]] nunca se abre para a ''poíesis'', daí nunca conseguir se apropriar do próprio da [[arte]], reduzindo-a a conceitos, quando, na verdade, a arte é e será sempre [[questão]], onde se dá sempre a essência do agir. Devemos pensar não só a ação, mas também a não-ação. Não podemos esquecer que Aristóteles se centraliza na questão do agir, e por isso nos joga nos enigmas da ''enérgeia'' e da ''dýnamis''.  
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:Quando se fala do ''[[ón]]'' na [[metafísica]], geralmente, não se atenta para a questão que está no centro. Trata-se para o grego da questão da [[mudança]] e da permanência. A mudança é muito evidente. Mas o que é a permanência? Esta questão tem um fundo filosófico e ao mesmo tempo político. A pro-cura do [[substantivo]] e do ''subjectum'' se dá nesse âmbito, ou seja, mais especificamente, procura-se o [[conceito|con-ceito]]. Este vai estar ligado à [[verdade]], que se vai opor à ''dóxa'', à aparência. Mas esta se relaciona à mudança e, nesta, não há verdade. Por isso ''dóxa'' significa fundamentalmente opinião. Mas da opinião tratavam os [[sofistas]]. E aqui entra o aspecto político. Mas e o [[ontologia|ontológico]]?  
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:Três questões estão ligadas a esta dimensão: ''lógos'', ''tékhne'', ''poíesis''. Entendê-las é entender as opções metafísicas nas quais os grandes pensadores Platão e Aristóteles nos lançam. ''[[Lógos]]'', fundamentalmente, é o que perdura. Por isso, irá ser identificado com o [[fundamento]] e com o dizer. O verbo ''eíro'', de onde se originou depois a [[retórica]], não terá esta dimensão, pois a retórica funda as opiniões, tendo perdido o seu caráter de um dizer [[sagrado]]. Esse é substituído pelo dizer do ''lógos''. Por isso, esse, enquanto dizer, como [[proposição|pro-posição]], diz a verdade na medida em que é lógica. Mas, por outro lado, a [[verdade]] de uma tal lógica está ligada à pro-posição na sua constituição de [[sujeito]] e predicativo. Se bem observarmos, a verdade lógica sempre se deduz, desde que aceita a proposição constituída de sujeito e predicativo. Mas nesta o [[ser]] foi substituído pelo substantivo.  
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:O que corresponde à verdade lógica é, por outro lado, o conhecimento técnico, ou seja, a ''[[tékhne]]'' é aquele conhecimento que permite o [[agir]] como permanência; não muda. A ''tékhne'' substitui o ser. Por isso, ''lógos'' e ''tékhne'' substituem a ''[[poíesis]]'', pois esta está ligada à ação e a ação não é o fundo da mudança? Para afirmar a permanência e a verdade silencia-se a ''poíesis''.  
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:Mas qual é a essência do agir enquanto ''poíesis''? É a mudança? Não. É mais. É um entre, é um acontecer-poético-apropriante. A [[filosofia]] abandonou a ''poíesis'' e fica entre: ''tékhne'', ''epistéme'' e ''[[máthesis]]''. A [[epistemologia]] nunca se abre para a ''poíesis'', daí nunca conseguir se apropriar do próprio da [[arte]], reduzindo-a a conceitos, quando, na verdade, a arte é e será sempre [[questão]], onde se dá sempre a essência do agir. Devemos pensar não só a ação, mas também a não-ação. Não podemos esquecer que Aristóteles se centraliza na questão do agir, e por isso nos joga nos enigmas da ''[[enérgeia]]'' e da ''[[dýnamis]]''.  
:- [[Manuel Antônio de Castro]]
:- [[Manuel Antônio de Castro]]
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:A mudança é visível e evidente por si. A grande questão é a permanência. E então temos algumas palavras no [[pensamento]] para apreender este grande enigma: [[identidade]], memória, o [[mesmo]], razão, conceito, essência, sujeito, lei, necessidade, preciso, medido. Mas isso gerou e gera uma oposição excludente. Por isso, Hegel tentou reconciliar essa oposição com o método dialético-especulativo, que, em vista disso, pretende não ser um método instrumental-gnosiológico, mas [[ontologia|ontológico]], pois no conceito absoluto (método especulativo) não há mais dicotomia entre [[pensar]] e [[ser]]. Se tivermos em mente, no entanto, para reflexão o fragmento 123 de Heráclito: "a excessividade poética apropria-se no nada excessivo", percebemos que fica impensado em Hegel o ''krýptesthai'', esse velar-se que nenhum conceito abrangerá, nem o vir-a-ser. No vir-a-ser devemos distinguir a negação como antítese que se re-flete e se torna espírito e o como do ''entre'', em que acontece o ''krýptesthai''. Heidegger faz desta questão a questão central do seu pensamento. E para isso repensa a questão da [[coisa]], o que significa repensar a própria verdade e sentido do ser. Pensar o sentido é pensar o ser como questão, isto é, como verdade e [[não-verdade]]. Isso implica repensar a própria dinâmica e vigência do ''lógos'' como diá-logo. Esta dinâmica remete automaticamente para a tensão ''tékhne''/''poíesis'' e para a própria ''poíesis'' como integrante de ''phýsis'', na dimensão da disputa originária da ''phýsis'' como desvelar e velar, ou seja, [[terra]] e [[mundo]]. Por isso, no parágrafo 110 de ''A origem da obra de arte'' (1), pensa-se a verdade como não-verdade, mas sem exclusão e oposição, e rejeita-se a solução de Hegel. Nesse aspecto, esse parágrafo é essencial. Por outro lado, o que aí não fica tematizado é a questão maior da ''poíesis'', que, como essência do agir, automaticamente inclui mudança e permanência. A ''poíesis'' inclui ação e não-ação, mas esse não indica in-ação. Tal é o enigma da ''poíesis'', da arte, da própria linguagem, pois todos os termos citados só vigem como questão na dimensão da linguagem, daí estar associada a ''lógos'', interpretado como razão, quando o mais indicado é associar linguagem a ''poíesis''. Esta é na vigência da ''phýsis'' a identidade máxima, o vigor da própria identidade enquanto a [[diferença]] das diferenças.
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: A mudança é visível e evidente por si. A grande questão é a permanência. E então temos algumas palavras no [[pensamento]] para apreender este grande enigma: [[identidade]], memória, o [[mesmo]], razão, [[conceito]], [[essência]], sujeito, [[lei]], necessidade, preciso, medido. Mas isso gerou e gera uma oposição excludente. Por isso, Hegel tentou reconciliar essa oposição com o método dialético-especulativo, que, em vista disso, pretende não ser um método instrumental-gnosiológico, mas [[ontologia|ontológico]], pois no conceito [[absoluto]] (método especulativo) não há mais dicotomia entre [[pensar]] e [[ser]]. Se tivermos em mente, no entanto, para reflexão o fragmento 123 de Heráclito: "a excessividade poética apropria-se no nada excessivo", percebemos que fica impensado em Hegel o ''[[krýptesthai]]'', esse velar-se que nenhum conceito abrangerá, nem o vir-a-ser. No vir-a-ser devemos distinguir a negação como antítese que se re-flete e se torna espírito e o como do ''entre'', em que acontece o ''krýptesthai''.  
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: Heidegger faz desta questão a questão central do seu pensamento. E para isso repensa a questão da [[coisa]], o que significa repensar a própria verdade e sentido do ser. Pensar o sentido é pensar o ser como questão, isto é, como verdade e [[não-verdade]]. Isso implica repensar a própria dinâmica e vigência do ''[[lógos]]'' como diá-logo. Esta dinâmica remete automaticamente para a tensão ''tékhne''/''poíesis'' e para a própria ''poíesis'' como integrante de ''phýsis'', na dimensão da [[disputa]] originária da ''[[phýsis]]'' como desvelar e velar, ou seja, [[terra]] e [[mundo]].  
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: Por isso, no parágrafo 110 de ''A origem da obra de arte'' (1), pensa-se a verdade como não-verdade, mas sem exclusão e oposição, e rejeita-se a solução de Hegel. Nesse aspecto, esse parágrafo é essencial. Por outro lado, o que aí não fica tematizado é a questão maior da ''[[poíesis]]'', que, como essência do agir, automaticamente inclui mudança e permanência. A ''poíesis'' inclui ação e não-ação, mas esse não indica in-ação. Tal é o enigma da ''poíesis'', da arte, da própria [[linguagem]], pois todos os termos citados só vigem como questão na dimensão da linguagem, daí estar associada a ''lógos'', interpretado como [[razão]], quando o mais indicado é associar linguagem a ''poíesis''. Esta é na vigência da ''phýsis'' a identidade máxima, o vigor da própria identidade enquanto a [[diferença]] das diferenças.
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:(1) HEIDEGGER, Martin. ''A origem da obra de arte''. Trad. Manuel Antonio de Castro e Idalina Azevedo da Silva. Acessível em: [http://www.travessiapoetica.blogspot.com Travessia Poética] estritamente para uso acadêmico.
:(1) HEIDEGGER, Martin. ''A origem da obra de arte''. Trad. Manuel Antonio de Castro e Idalina Azevedo da Silva. Acessível em: [http://www.travessiapoetica.blogspot.com Travessia Poética] estritamente para uso acadêmico.
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: A [[essência]] do agir é [[consumar]] o que é, daí [[ser]] e [[tempo]], tempo e ser. Mas que tempo? O da [[memória]] enquanto [[linguagem]] ou ''logos''. Por sua vez, [[atual]] é o que se manifesta a partir da essência do [[agir]], pois atual provém do verbo latino: ''agere'', isto é, agir. [[Permanência]] é o per-durar no dar-se e retrair-se de tempo e ser.
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: - [[Manuel Antônio de Castro]]
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: Podemos [[dizer]] que [[impermanência]] é aquilo que não permanece. Porém, aí tocamos em algo [[essencial]] que acontece permanentemente na [[realidade]]. Por isso, a [[questão]] da [[impermanência]] remete diretamente para [[questões]] [[essenciais]], que podem ser apreendidas quando se tematiza a [[questão]] da [[permanência]]. E elas remetem, por isso, imediatamente para as [[questões]] de [[ser]] e [[tempo]], implicando, portanto, o [[ser humano]] e a [[realidade]]. Pensando tais [[questões]] apreenderemos imediatamente o que diz respeito a e implicam tanto [[permanência]] quanto [[impermanência]].
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: - [[Manuel Antônio de Castro]]
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: "O [[permanecer]] da [[noite]] é a [[possibilidade]] do [[mudar]] do [[dia]]. O [[mudar]] do [[dia]] é a [[possibilidade]] do [[permanecer]] da [[noite]], porque esta não pode [[permanecer]] sem o [[dia]] [[ser]] [[mudança]]. A [[mudança]] do [[dia]] é a [[permanência]] da [[noite]]. A [[permanência]] da [[noite]] é a [[mudança]] do [[dia]]. Não podemos nunca [[apreender]] e [[aprender]] a [[permanência]] como o que se tornou [[estático]]. A [[permanência]] não é [[estática]] nem [[dinâmica]], porque não é. [[Vigora]]. Acontece. O [[acontecer]] é o [[vigorar]] que se presenteou em [[sentido]]. O [[sentido]] é a [[vigência]] da [[linguagem]] do [[ser]]. O [[vigorar]] jamais pode tornar-se apenas [[devir]]. [[Ser]] [[devir]] é [[estar]] sendo. O [[ser]] nunca está sendo, só sendo no [[estar]]. Apenas o [[sendo]] pode e deve [[estar]] sendo. O [[sendo]] é o [[estar]] que vigora no [[permanecer]] e [[mudar]]. Só o [[sendo]] permanece e muda, torna-se, [[é]] [[devir]], aparecer e desaparecer, parecendo no [[estar]]" (1).
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: Referência:
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Passado". In: ------. '''Arte: o humano e o destino'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 259.

Edição atual tal como 21h51min de 4 de Junho de 2021

1

Quando se fala do ón na metafísica, geralmente, não se atenta para a questão que está no centro. Trata-se para o grego da questão da mudança e da permanência. A mudança é muito evidente. Mas o que é a permanência? Esta questão tem um fundo filosófico e ao mesmo tempo político. A pro-cura do substantivo e do subjectum se dá nesse âmbito, ou seja, mais especificamente, procura-se o con-ceito. Este vai estar ligado à verdade, que se vai opor à dóxa, à aparência. Mas esta se relaciona à mudança e, nesta, não há verdade. Por isso dóxa significa fundamentalmente opinião. Mas da opinião tratavam os sofistas. E aqui entra o aspecto político. Mas e o ontológico?
Três questões estão ligadas a esta dimensão: lógos, tékhne, poíesis. Entendê-las é entender as opções metafísicas nas quais os grandes pensadores Platão e Aristóteles nos lançam. Lógos, fundamentalmente, é o que perdura. Por isso, irá ser identificado com o fundamento e com o dizer. O verbo eíro, de onde se originou depois a retórica, não terá esta dimensão, pois a retórica funda as opiniões, tendo perdido o seu caráter de um dizer sagrado. Esse é substituído pelo dizer do lógos. Por isso, esse, enquanto dizer, como pro-posição, diz a verdade na medida em que é lógica. Mas, por outro lado, a verdade de uma tal lógica está ligada à pro-posição na sua constituição de sujeito e predicativo. Se bem observarmos, a verdade lógica sempre se deduz, desde que aceita a proposição constituída de sujeito e predicativo. Mas nesta o ser foi substituído pelo substantivo.
O que corresponde à verdade lógica é, por outro lado, o conhecimento técnico, ou seja, a tékhne é aquele conhecimento que permite o agir como permanência; não muda. A tékhne substitui o ser. Por isso, lógos e tékhne substituem a poíesis, pois esta está ligada à ação e a ação não é o fundo da mudança? Para afirmar a permanência e a verdade silencia-se a poíesis.
Mas qual é a essência do agir enquanto poíesis? É a mudança? Não. É mais. É um entre, é um acontecer-poético-apropriante. A filosofia abandonou a poíesis e fica entre: tékhne, epistéme e máthesis. A epistemologia nunca se abre para a poíesis, daí nunca conseguir se apropriar do próprio da arte, reduzindo-a a conceitos, quando, na verdade, a arte é e será sempre questão, onde se dá sempre a essência do agir. Devemos pensar não só a ação, mas também a não-ação. Não podemos esquecer que Aristóteles se centraliza na questão do agir, e por isso nos joga nos enigmas da enérgeia e da dýnamis.


- Manuel Antônio de Castro


2

A mudança é visível e evidente por si. A grande questão é a permanência. E então temos algumas palavras no pensamento para apreender este grande enigma: identidade, memória, o mesmo, razão, conceito, essência, sujeito, lei, necessidade, preciso, medido. Mas isso gerou e gera uma oposição excludente. Por isso, Hegel tentou reconciliar essa oposição com o método dialético-especulativo, que, em vista disso, pretende não ser um método instrumental-gnosiológico, mas ontológico, pois no conceito absoluto (método especulativo) não há mais dicotomia entre pensar e ser. Se tivermos em mente, no entanto, para reflexão o fragmento 123 de Heráclito: "a excessividade poética apropria-se no nada excessivo", percebemos que fica impensado em Hegel o krýptesthai, esse velar-se que nenhum conceito abrangerá, nem o vir-a-ser. No vir-a-ser devemos distinguir a negação como antítese que se re-flete e se torna espírito e o como do entre, em que acontece o krýptesthai.
Heidegger faz desta questão a questão central do seu pensamento. E para isso repensa a questão da coisa, o que significa repensar a própria verdade e sentido do ser. Pensar o sentido é pensar o ser como questão, isto é, como verdade e não-verdade. Isso implica repensar a própria dinâmica e vigência do lógos como diá-logo. Esta dinâmica remete automaticamente para a tensão tékhne/poíesis e para a própria poíesis como integrante de phýsis, na dimensão da disputa originária da phýsis como desvelar e velar, ou seja, terra e mundo.
Por isso, no parágrafo 110 de A origem da obra de arte (1), pensa-se a verdade como não-verdade, mas sem exclusão e oposição, e rejeita-se a solução de Hegel. Nesse aspecto, esse parágrafo é essencial. Por outro lado, o que aí não fica tematizado é a questão maior da poíesis, que, como essência do agir, automaticamente inclui mudança e permanência. A poíesis inclui ação e não-ação, mas esse não indica in-ação. Tal é o enigma da poíesis, da arte, da própria linguagem, pois todos os termos citados só vigem como questão na dimensão da linguagem, daí estar associada a lógos, interpretado como razão, quando o mais indicado é associar linguagem a poíesis. Esta é na vigência da phýsis a identidade máxima, o vigor da própria identidade enquanto a diferença das diferenças.


- Manuel Antônio de Castro


Referência:
(1) HEIDEGGER, Martin. A origem da obra de arte. Trad. Manuel Antonio de Castro e Idalina Azevedo da Silva. Acessível em: Travessia Poética estritamente para uso acadêmico.

3

A essência do agir é consumar o que é, daí ser e tempo, tempo e ser. Mas que tempo? O da memória enquanto linguagem ou logos. Por sua vez, atual é o que se manifesta a partir da essência do agir, pois atual provém do verbo latino: agere, isto é, agir. Permanência é o per-durar no dar-se e retrair-se de tempo e ser.


- Manuel Antônio de Castro

4

Podemos dizer que impermanência é aquilo que não permanece. Porém, aí tocamos em algo essencial que acontece permanentemente na realidade. Por isso, a questão da impermanência remete diretamente para questões essenciais, que podem ser apreendidas quando se tematiza a questão da permanência. E elas remetem, por isso, imediatamente para as questões de ser e tempo, implicando, portanto, o ser humano e a realidade. Pensando tais questões apreenderemos imediatamente o que diz respeito a e implicam tanto permanência quanto impermanência.


- Manuel Antônio de Castro

5

"O permanecer da noite é a possibilidade do mudar do dia. O mudar do dia é a possibilidade do permanecer da noite, porque esta não pode permanecer sem o dia ser mudança. A mudança do dia é a permanência da noite. A permanência da noite é a mudança do dia. Não podemos nunca apreender e aprender a permanência como o que se tornou estático. A permanência não é estática nem dinâmica, porque não é. Vigora. Acontece. O acontecer é o vigorar que se presenteou em sentido. O sentido é a vigência da linguagem do ser. O vigorar jamais pode tornar-se apenas devir. Ser devir é estar sendo. O ser nunca está sendo, só sendo no estar. Apenas o sendo pode e deve estar sendo. O sendo é o estar que vigora no permanecer e mudar. Só o sendo permanece e muda, torna-se, é devir, aparecer e desaparecer, parecendo no estar" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Passado". In: ------. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 259.