Narcisismo

De Dicionrio de Potica e Pensamento

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"Pareceu-lhe então, meditativa, que não havia homem ou mulher que por acaso não se tivesse olhado ao espelho e não se surpreendesse consigo próprio. Por uma fração de segundo a pessoa se via como um objeto a ser olhado, o que poderiam chamar de narcisismo mas, já influenciada por Ulisses, ela chamaria de: gosto de ser. Encontrar na figura exterior os ecos da figura interna: ah, então é verdade que eu não imaginei: eu existo" (1). A referência a Narciso nos remete para o mito de Narciso. Vemos por esta referência que o mito não diz respeito a algo simbólico nem falso e muito menos irreal. É que não podemos nos limitar a considerar meramente o nosso exterior, mas desde o antiquíssimo mito de Narciso, isto é, desde que o ser humano é ser humano, descobrimos aquela nossa dimensão muito viva e real do interior e seu abismo sem fundo, plenitude a ser alcançada. Tentar sondá-lo, especulá-lo, como relata o mito, é nos defrontarmos com a questão da morte, a sorte de Narciso conforme narra o mito. Descobrir-se existindo é se defrontar com a presença certa da morte, mas agora lida na dimensão do existir. Só morre quem existe, isto é, o ser humano. Os demais seres vivos fenecem. A morte nos projeta, como o mito narra, para além do narcisismo como auto-contemplação do eu pelo eu e nos faz mergulhar no mais insondável e misterioso de nós: o sou do eu.


- Manuel Antônio de Castro


Referência:
(1) LISPECTOR, Clarice. Uma aprendizagem ou o livro dos prazeres. 4. e. Rio de Janeiro: José Olympio, 1974, p. 1.


2

" ... do mito de Narciso. A leitura mais corrente, embora válida, empobrece a complexidade e riqueza deste mito, ao reduzi-lo ao chamado narcisismo" (1). "Na interpretação da psicologia, o mito de Narciso representa a vaidade, a auto-admiração (o narcisismo), condenados não apenas pela ética, mas pelo próprio subconsciente do indivíduo" (2).


Referência:

(1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Literatura brasileira: sob o signo de Narciso”. In: Origens da Literatura Brasileira. Coleção Comunicação 4. Diversos autores. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1979, p. 11.
(2) MITOLOGIA. São Paulo, Abril Cultural, 1973, v. 2, p. 435.
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