Pintura

De Dicionrio de Potica e Pensamento

Edição feita às 14h05min de 12 de Agosto de 2019 por Profmanuel (Discussão | contribs)

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Sem dúvida nenhuma a matéria do pintor é a cor. Mas o que é isto - a cor? Não é que a cor se torne linguagem. Ao se manifestar como obra de arte, ela se torna mundo, que é linguagem dando sentido à matéria. Tal manifestação na pintura tornando-se verdade, está ligada a duas dimensões fundamentais: O que se dá a ver no ver e no brilhar, sendo sua essência e verdade, que podemos olhar e ver ou olhar e não-ver. Por isso, no ensaio de Heidegger: "A teoria platônica da verdade" (1), há uma passagem em que diz que o olho é conatural (originário do) ao Sol (helioeidés). Mas o Sol que tudo ilumina e origina não se pode ver. Se o tentarmos ver ficaremos cegos. E Édipo só viu quando ficou cego ou ficou cego porque viu, isto é, renunciou à sua vontade. A segunda dimensão diz respeito ao pintor: ele é aquele que na cor (e seu brilhar) vê o Sol e o manifesta enquanto obra/verdade. Não ele como sujeito, mas o Sol se fazendo poeticamente linguagem no operar desta nele. A linguagem fala, não o homem. O pintor só fala quando responde e corresponde ao apelo da Linguagem do Sol: a cor. Não há perspectiva para o pintor sem horizonte/limite e não-limite (fronteira), e não há horizonte sem luz/Sol. Eis aí a criação do artista-pintor: deixar o Sol deslimitar as fronteiras liminares do ser humano e do Ser na luminosidade da linguagem da cor enquanto obra. A obra operando é o Ser sendo enquanto verdade e mundo. Pintura é Terra, é mundo.


- Manuel Antônio de Castro


Referência:
(1) HEIDEGGER, Martin. "A teoria platônica da verdade". In: Marcas do caminho. Petrópolis: Vozes, 2008, pp. 215-50.

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No filme Sofie (1) de Liv Ullmann, a personagem Sofia se apaixona pelo pintor Holvi e ele por ela. Para agradar à amada, pede para fazer um retrato dos pais dela. No dia em que o retrato está praticamente pronto, ela visita o estúdio. Ao olhar para o retrato e para os pais que, sentados num sofá, pousavam para o pintor, cai no choro, pois vê e é tomada por algo novo e estranho. Após alguns momentos explica ao pintor a sua surpresa: "Foi como se os tivesse visto pela primeira vez. Foi como se até agora nunca tivesse capatado sua verdadeira essência". Essa, penso, é a essência da pintura, de toda arte. Isso é o universal concreto da arte, da poética.


- Manuel Antônio de Castro


- (1) ULLMANN, Liv. Sofie, 1992.
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