Mudança

De Dicionrio de Potica e Pensamento

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:Diz Nietzsche: "Os meios de expressão da [[linguagem]] são inutilizáveis para expressar o "[[devir]]": pertence à nossa inevitável necessidade de conservação o estabelecer (''setzen'') insistentemente um mundo grosseiro de permanência, de "coisas" etc. Isto é, de objetos" (1). Há uma contradição inerente a esta fala, pois ela mesma se conserva até hoje e não é objetiva, não só porque sua interpretação muda, mas porque surgem outras interpretações, de onde se comprova que não há uma correlação de verdade entre o que se afirma e o que muda. Além disso, só se considera aí o conceito, não a questão e nem a imagem-questão em que se dão a ''poíesis'' e o mito. Há uma modulação entre "muda" e "desvela". O "muda" só acentua o fluir não tanto do consistente na sua manifestação/desvelamento, mas de um aspecto mutante como fluir temporal. E tanto o "muda" como o "manifesta" estarão ligados à ''poíesis'', inerente à ''phýsis''/ ser/ realidade e ao tempo e à linguagem. Por isso, é que o tempo se dá como verbo/ação. E estes são linguagem. O "manifesta"/desvela é consistente porque ele não significa um "muda" em si [[vazio]], como se pode observar no não mudar ou não mover aleatório do vácuo. É o que pensamos a partir de uma passagem de ''Grande Sertão: Veredas'' que diz: "a mó do moinho, que, nela não caindo o que moer, mói assim mesmo, si mesma, mói, mói" (2). Isto se refere ao personagem em questão Zé Bebelo, que perdeu o sentido do [[agir]] e passa a se auto-moer, como um molnho que nada tivesse para moer, isto é, passa a ser o moer vazio, o moer a si mesmo no vazio. Por isso, não se pode falar de "muda" (movimento da pedra) sem o "manifesta/desvela" (manifesta/desvela algo enquanto o que é desvelado). Mas o mesmo deve ser dito de [[permanência|"permanece"]] e "vela". Na realidade, a questão que aí se faz presente desde os pensadores originários é a questão da ''arché / arkhe]]''.
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: Diz Nietzsche: "Os meios de expressão da [[linguagem]] são inutilizáveis para expressar o "[[devir]]": pertence à nossa inevitável [[necessidade]] de conservação o estabelecer (''setzen'') insistentemente um [[mundo]] grosseiro de [[permanência]], de "[[coisas]]" etc. Isto é, de [[objetos]]" (1). Há uma contradição inerente a esta fala, pois ela mesma se conserva até hoje e não é [[objetiva]], não só porque sua [[interpretação]] muda, mas porque surgem outras [[interpretações]], de onde se comprova que não há uma correlação de [[verdade]] [[entre]] o que se afirma e o que muda. Além disso, só se considera aí o [[conceito]], não a [[questão]] e nem a [[imagem-questão]] em que se dão a ''[[poíesis]]'' e o [[mito]]. Há uma modulação entre "muda" e "desvela". O "muda" só acentua o fluir não tanto do consistente na sua manifestação/desvelamento, mas de um aspecto mutante como fluir temporal. E tanto o "muda" como o "manifesta" estarão ligados à ''poíesis'', inerente à ''[[phýsis]]''/[[ser]]/[[realidade]] e ao [[tempo]] e à [[linguagem]]. Por isso, é que o [[tempo]] se dá como [[verbo]]/[[ação]]. E estes são [[linguagem]]. O "manifesta"/desvela é consistente porque ele não significa um "muda" em si [[vazio]], como se pode observar no não mudar ou não mover aleatório do vácuo. É o que pensamos a partir de uma passagem de '''Grande Sertão: Veredas''' que diz:  
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: "...a mó do moinho, que, nela não caindo o que moer, mói assim mesmo, si mesma, mói, mói..." (2).
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:- [[Manuel Antônio de Castro]]
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: Isto se refere ao [[personagem]] em [[questão]] Zé Bebelo, que perdeu o [[sentido]] do [[agir]] e passa a se auto-moer, como um moinho que nada tivesse para moer, isto é, passa a ser o moer [[vazio]], o moer a si mesmo no [[vazio]], pois suas ações não têm mais o motivo que lhes daria sentido e perambula sem direção, sem [[finalidade]] [[real]]. Por isso, não se pode falar de "muda" (movimento da pedra) sem o "manifesta/desvela" (manifesta/desvela algo enquanto o que é desvelado). Mas o mesmo deve ser dito de [[permanência|"permanece"]] e "vela". Na realidade, a [[questão]] que aí se faz presente desde os [[pensadores]] [[originários]] é a [[questão]] da ''[[arché]] /[[arkhe]]''.
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:Referências:
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: - [[Manuel Antônio de Castro]]
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:(1) HEIDEGGER, Martin: "O problema de um pensamento e de uma linguagem não objetivantes na teologia atual". In: ''Phaenomenologie und Theologie''. Frankfurt: Victorio Klostermann, 1970.
 
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:(2) ROSA, João Guimarães. ''Grande Sertão: Veredas''. Rio de Janeiro: José Olympio, 1968, p. 307.
 
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: Referências:
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:'''Ver também:'''
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: (1) HEIDEGGER, Martin: "O problema de um pensamento e de uma linguagem não objetivantes na teologia atual". In: '''Phaenomenologie und Theologie'''. Frankfurt: Victorio Klostermann, 1970.
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:*[[Osmose]]
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: (2) ROSA, João Guimarães. '''Grande Sertão: Veredas'''. Rio de Janeiro: José Olympio, 1968, p. 307.
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: Referência:
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: - (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Diálogos ''trans-'' e a procura do humano". In: www.travessiapoetica.blogspot.com.
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: - (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Diálogos ''trans-'' e a procura do humano". In: '''www.travessiapoetica.blogspot.com.'''
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: o [[mundo]] está mudando
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:  (1) KAUR, rupi. '''meu corpo / minha casa'''. Trad. Ana Guadalupe. São Paulo: Editora Planeta, 2020, p. 151.
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: "O [[permanecer]] da [[noite]] é a [[possibilidade]] do [[mudar]] do [[dia]]. O [[mudar]] do [[dia]] é a [[possibilidade]] do [[permanecer]] da [[noite]], porque esta não pode [[permanecer]] sem o [[dia]] [[ser]] [[mudança]]. A [[mudança]] do [[dia]] é a [[permanência]] da [[noite]]. A [[permanência]] da [[noite]] é a [[mudança]] do [[dia]]. Não podemos nunca [[apreender]] e [[aprender]] a [[permanência]] como o que se tornou [[estático]]. A [[permanência]] não é [[estática]] nem [[dinâmica]], porque não é. [[Vigora]]. Acontece. O [[acontecer]] é o [[vigorar]] que se presenteou em [[sentido]]. O [[sentido]] é a [[vigência]] da [[linguagem]] do [[ser]]. O [[vigorar]] jamais pode tornar-se apenas [[devir]]. [[Ser]] [[devir]] é [[estar]] sendo. O [[ser]] nunca está sendo, só sendo no [[estar]]. Apenas o [[sendo]] pode e deve [[estar]] sendo. O [[sendo]] é o [[estar]] que vigora no [[permanecer]] e [[mudar]]. Só o [[sendo]] permanece e muda, torna-se, [[é]] [[devir]], aparecer e desaparecer, parecendo no [[estar]]" (1).
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: Referência:
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Passado". In: ------. '''Arte: o humano e o destino'''. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 259.

Edição atual tal como 22h31min de 29 de janeiro de 2022

1

Diz Nietzsche: "Os meios de expressão da linguagem são inutilizáveis para expressar o "devir": pertence à nossa inevitável necessidade de conservação o estabelecer (setzen) insistentemente um mundo grosseiro de permanência, de "coisas" etc. Isto é, de objetos" (1). Há uma contradição inerente a esta fala, pois ela mesma se conserva até hoje e não é objetiva, não só porque sua interpretação muda, mas porque surgem outras interpretações, de onde se comprova que não há uma correlação de verdade entre o que se afirma e o que muda. Além disso, só se considera aí o conceito, não a questão e nem a imagem-questão em que se dão a poíesis e o mito. Há uma modulação entre "muda" e "desvela". O "muda" só acentua o fluir não tanto do consistente na sua manifestação/desvelamento, mas de um aspecto mutante como fluir temporal. E tanto o "muda" como o "manifesta" estarão ligados à poíesis, inerente à phýsis/ser/realidade e ao tempo e à linguagem. Por isso, é que o tempo se dá como verbo/ação. E estes são linguagem. O "manifesta"/desvela é consistente porque ele não significa um "muda" em si vazio, como se pode observar no não mudar ou não mover aleatório do vácuo. É o que pensamos a partir de uma passagem de Grande Sertão: Veredas que diz:
"...a mó do moinho, que, nela não caindo o que moer, mói assim mesmo, si mesma, mói, mói..." (2).
Isto se refere ao personagem em questão Zé Bebelo, que perdeu o sentido do agir e passa a se auto-moer, como um moinho que nada tivesse para moer, isto é, passa a ser o moer vazio, o moer a si mesmo no vazio, pois suas ações não têm mais o motivo que lhes daria sentido e perambula sem direção, sem finalidade real. Por isso, não se pode falar de "muda" (movimento da pedra) sem o "manifesta/desvela" (manifesta/desvela algo enquanto o que é desvelado). Mas o mesmo deve ser dito de "permanece" e "vela". Na realidade, a questão que aí se faz presente desde os pensadores originários é a questão da arché /arkhe.


- Manuel Antônio de Castro


Referências:
(1) HEIDEGGER, Martin: "O problema de um pensamento e de uma linguagem não objetivantes na teologia atual". In: Phaenomenologie und Theologie. Frankfurt: Victorio Klostermann, 1970.
(2) ROSA, João Guimarães. Grande Sertão: Veredas. Rio de Janeiro: José Olympio, 1968, p. 307.


Ver também:
*Osmose

2

"Tudo, absolutamente tudo, está em contínua e permanente mudança ou trans-formação. Esta é uma das constatações mais radicais da ciência, seja da macro-física, seja da micro-física, e de toda a filosofia. É que mudança implica, necessariamente, ser, pensamento, tempo, verdade, sentido, mundo e linguagem. Porém, é radicalmente verdadeiro que só se pode falar em mudança porque há permanência. Isto sempre gerou uma dúvida. O que é mais importante: a mudança ou a permanência? Hoje, com a questão dos trans- vivemos a predominância da mudança" (1).


Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Diálogos trans- e a procura do humano". In: www.travessiapoetica.blogspot.com.

3

o mundo está mudando
será que você o sente
se despindo e depois vestindo
uma roupa desconfortável
e mais justa
- mudanças (1)


Referência:
(1) KAUR, rupi. meu corpo / minha casa. Trad. Ana Guadalupe. São Paulo: Editora Planeta, 2020, p. 151.

4

"O permanecer da noite é a possibilidade do mudar do dia. O mudar do dia é a possibilidade do permanecer da noite, porque esta não pode permanecer sem o dia ser mudança. A mudança do dia é a permanência da noite. A permanência da noite é a mudança do dia. Não podemos nunca apreender e aprender a permanência como o que se tornou estático. A permanência não é estática nem dinâmica, porque não é. Vigora. Acontece. O acontecer é o vigorar que se presenteou em sentido. O sentido é a vigência da linguagem do ser. O vigorar jamais pode tornar-se apenas devir. Ser devir é estar sendo. O ser nunca está sendo, só sendo no estar. Apenas o sendo pode e deve estar sendo. O sendo é o estar que vigora no permanecer e mudar. Só o sendo permanece e muda, torna-se, é devir, aparecer e desaparecer, parecendo no estar" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Passado". In: ------. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 259.
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