Palavra

De Dicionrio de Potica e Pensamento

Edição feita às 00h39min de 30 de março de 2010 por Bianka (Discussão | contribs)

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Guimarães Rosa diz: "Palavra não dá, recebe". E como! Recebe todas as nossas aventuras e desventuras, vias e desvios, falas e silêncio. A palavra recebe as nossas experienciações do real, havendo aí uma tensão de contrários, porque, ao mesmo tempo que as recebe, ela como palavra e reunião nos dá o real como linguagem. Eis um exemplo de Platão, citado por Heidegger: "Nós, os epigonais, já não possuímos condição de avaliar o significado do fato de Platão aventurar-se a empregar a palavra eídos, para dizer a essência de tudo e de cada coisa. Pois, na linguagem de todo dia, eídos diz da visão que uma coisa visível nos apresenta à percepção sensível. Ora, Platão pretende da palavra algo inteiramente extraordinário. Pretende designar o que jamais se poderá perceber com os olhos" (1).


- Manuel Antônio de Castro


Referência:
(1) HEIDEGGER, Martin. "A questão da técnica". In: Ensaios e conferências. Petrópolis: Vozes, 2002, p. 23.

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Chuang Tzu desenvolve uma verdadeira teoria do agir poético, ou, no fundo, da poíesis. Eis o que diz sobre a palavra/ideia: "O objetivo das palavras é transmitir as ideias. Quando estas são apreendidas, as palavras são esquecidas. Onde poderei encontrar um homem que se esqueceu das palavras? Com ele é que gostaria de conversar" (1). Todos se lembram só das palavras? Separam palavras e ideias? Como conversar sem palavras?
O que o pensador nos quer fazer pensar é muito simples: a palavra no cotidiano se torna veículo comunicativo, onde as palavras transitam vazias, como meras cascas de ovos que, se chocados, nada nascerá. A palavra poética é como o ovo cheio de vida pronto para ser chocado. Poeticamente, chocar é pensar.


- Manuel Antônio de Castro


Referência:
(1) MERTON, Thomas. A via de Chuang Tzu. Petrópolis: Vozes, 1996, p. 196.

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A palavra poética se estrutura em torno da imagem – sonora, gestual ou visual. Mas esta pode se tornar retórica e vazia, mero jogo formal. É a armadilha para muitos pseudo-poetas. Sem densidade inaugural, a palavra-imagem pode se tornar uma casca vazia, mera aparência. O enigma da palavra poética é de tal grandeza que ela, em sua concentração e riqueza ambígua, pode ser misteriosamente deusa. É o caso das palavras do pensamento originário, como Heráclito, Parmênides, Platão e outros. A imagem é poética e não retórica apenas quando nela se dá o vigor da questão. O uso automático das palavras na comunicação e no raciocínio instrumental tende a esvaziar o que há de poético nas palavras. Elas se tornam portadoras de ideias gerais e vazias pela repetição do uso cotidiano. Uma palavra é poética quando provoca em quem a emprega uma ação ética.
A sintaxe gramatical dilui o vigor da palavra, em geral, na proposição. A sintaxe poética concentra seu vigor na palavra. Na palavra poética e de pensamento, estão concentradas as forças centrífugas e centrípetas. No centro dessa tensão, há o mistério do "entre". É no "entre" que a sintaxe tem sua origem. Mas para a gramática a ordem vem das relações entre as palavras na proposição, determinando o sentido e o valor estrutural das palavras. Há, portanto, uma inversão. O operar da obra poética se concentra na sintaxe poética, pois esta institui e constitui o sentido ético-poético da verdade do real.


- Manuel Antônio de Castro


Ver também:

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"Primeiro, há o meu método de que eu utilizo cada palavra como se ela acabasse de nascer; através do qual eu libero a palavra das impurezas da linguagem falada e a reduzo ao seu sentido original [...]. A língua é a única porta para a eternidade, mas infelizmente ela está oculta debaixo de montanhas de cinza. Daí, eu tenho de tirá-la" (1).


Referência:
(1) ROSA, João Guimarães. Literatura deve ser vida. In: LORENZ, Günter W. EXPOSIÇÃO do novo livro alemão no Brasil - 1971. Frankfurt am Main, Ausstellungs und Messe - Gmbh des Borsenvereins des Deutschen Buchandels, 1971, p. 291.

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"É a palavra do poeta que presenteia aos mortais o que lhe foi revelado, indicando a presença do extraordinário no ordinário, favorecendo o aparecimento das coisas no brilho que lhes é próprio, mostrando o jogo da eclosão e retraimento de todo ser, ligando o enraizamento no sensível à altitude do espírito, fazendo o extraordinário do mundo aparecer na linguagem para que nele o homem possa habitar" (1).


Referência:
(1) UNGER, Nancy Mangabeira. "Heidegger e a espera do inesperado". In: Revista Tempo Brasileiro. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, nº 164, 2006, p. 183.

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"O tesouro que a terra do poeta jamais consegue encontrar é a palavra para a essência da linguagem. O poder e a morada da palavra, subitamente contemplados, seu vigor, isso pode nos chegar em algumas palavras. Mas com isso não se garante a palavra para a essência da linguagem" (1).


Referência:
(1) HEIDEGGER, Martin. "A palavra". In: A caminho da linguagem. Petrópolis: Vozes, 2003, p. 187.

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"O reino vigoroso da palavra consiste em dizer, isto é, em mostrar, em trazer para um aparecer a coisa como coisa" (1).


Referência:
(1) HEIDEGGER, Martin. "A palavra". In: A caminho da linguagem. Petrópolis: Vozes, 2003, p. 187.
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