Ter

De Dicionrio de Potica e Pensamento

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: (1) PESSOA, Fernando. ''Alberto Caeiro''. S. Paulo: Cia. das Letras, 2004, p. 60, 84.
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[[Existir]] é [[habitar]] no sentido de [[ter-se]], no sentido de apossar-se do que recebemos para [[ser]], pois nosso [[ser]] é uma [[doação]]. Não [[ter]] algo externo a nós, mas o [[ter]] que se tem porque nos foi dado: o [[próprio]]. [[Habitar]] enquanto [[ter]] é apropriar-se do que é [[próprio]]: o [[ser]]. Então o [[ter]] deve ser pensado no [[horizonte]] em que Emmanuel Carneiro Leão o pensa no [[ensaio]] "Uma leitura órfica de uma [[sentença]] grega" (1).
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: [[Existir]] é [[habitar]] no sentido de ter-se, no sentido de apossar-se do que recebemos para [[ser]], pois nosso [[ser]] é uma [[doação]]. Não [[ter]] algo externo a nós, mas o [[ter]] que se tem porque nos foi dado: o [[próprio]]. [[Habitar]] enquanto [[ter]] é apropriar-se do que é [[próprio]]: o [[ser]]. Então o [[ter]] deve ser pensado no [[horizonte]] em que Emmanuel Carneiro Leão o pensa no [[ensaio]] "Uma leitura órfica de uma [[sentença]] grega" (1).
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: (1) In: ''Aprendendo a pensar II''. Petrópolis: Vozes, 1992.
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: "[[Ter]] pode [[significar]]: o acrescentar e acumular de fora o que nos é oferecido para [[consumo]]. Porém, [[ter]] pode [[significar]] outra coisa, mas que não pode ser vendida nem comprada nem agregada nem somada: O [[ter]] que se [[é]]. É um apossar-se que nos afeta e enche de [[afetos]]: é o apossar-se amoroso do que nos foi [[dado]] para posse, onde tal possuir só é [[ter]] se nos apossamos do que nos foi [[doado]] para [[sermos]]. E o que já desde sempre nos foi [[doado]]? O que nos é [[próprio]], do qual nos devemos [[apropriar]] para [[ser]]. Um tal [[apropriar]] se dá na [[apropriação]] como manifestação e [[realização]] do que [[essencial]] e já desde [[sempre]] nos pertence: o [[ser]] que nos é [[próprio]]. [[Ter]], então, é tomar posse do que nos é [[próprio]]" (1).
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: (1) CASTRO, Manuel Antônio.''' "As três [[pragas]] do século XXI". In: Confraria - 2 anos. Rio de Janeiro: Confraria do Vento, 2007, p. 17.'''

Edição atual tal como 22h21min de 10 de março de 2025

1

"Ter e ser não são opostos, porque só podemos ter o que somos e só podemos ser o que temos" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Interdisciplinaridade poética: o entre". In: Revista Tempo Brasileiro. Rio de Janeiro: número 164, jan.-mar. 2006, p. 24.

2

"Alberto Caieiro, o poeta-pensador, já o disse poeticamente:
 : Mas isto (tristes de nós que trazemos a alma vestida!),
 : Isso exige um estudo profundo,
 : Uma aprendizagem de desaprender . (Poema XXIV)
 : Procuro despir-me do que aprendi,:
 : Procuro esquecer-me do modo de lembrar que me ensinaram,
 : E raspar a tinta com que me pintaram os sentidos ... (Poema XLVI)" (1)

´

Isso é enigmático porque devemos aprender para desaprender, ter para renunciar, porque só renunciando chegamos a ser o que temos, porque só podemos ter o que somos e só podemos ser o que temos, que nos foi doado. Nosso ser é doação. Portanto, não há uma incompatibilidade entre ter e ser. Entra aí uma terceira dimensão nesse jogo dialético entre ter e ser, e ser e ter: o desprendimento, a renúncia, porque a renúncia não tira, dá. Nesse jogo dialético se torna também claro o jogo entre identidade e diferença. A identidade nos remete para o horizonte do fundar, do ser, do nada. Já a diferença nos mostra em que consiste o próprio, (ter), que só o nada, (ser), pode fundar. Enfim, toda aprendizagem é um desaprender.
Manuel Antônio de Castro.


Referência:
(1) PESSOA, Fernando. Alberto Caeiro. S. Paulo: Cia. das Letras, 2004, p. 60, 84.

3

Existir é habitar no sentido de ter-se, no sentido de apossar-se do que recebemos para ser, pois nosso ser é uma doação. Não ter algo externo a nós, mas o ter que se tem porque nos foi dado: o próprio. Habitar enquanto ter é apropriar-se do que é próprio: o ser. Então o ter deve ser pensado no horizonte em que Emmanuel Carneiro Leão o pensa no ensaio "Uma leitura órfica de uma sentença grega" (1).


- Manuel Antônio de Castro


Referência:
(1) In: Aprendendo a pensar II. Petrópolis: Vozes, 1992.

4

"Ter pode significar: o acrescentar e acumular de fora o que nos é oferecido para consumo. Porém, ter pode significar outra coisa, mas que não pode ser vendida nem comprada nem agregada nem somada: O ter que se é. É um apossar-se que nos afeta e enche de afetos: é o apossar-se amoroso do que nos foi dado para posse, onde tal possuir só é ter se nos apossamos do que nos foi doado para sermos. E o que já desde sempre nos foi doado? O que nos é próprio, do qual nos devemos apropriar para ser. Um tal apropriar se dá na apropriação como manifestação e realização do que essencial e já desde sempre nos pertence: o ser que nos é próprio. Ter, então, é tomar posse do que nos é próprio" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio. "As três pragas do século XXI". In: Confraria - 2 anos. Rio de Janeiro: Confraria do Vento, 2007, p. 17.
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