Ter
De Dicionrio de Potica e Pensamento
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- | : Isso é [[enigmático]] porque devemos [[aprender]] para [[desaprender]], [[ter]] para [[renunciar]], porque só renunciando chegamos a [[ser]] o que temos, porque só podemos [[ter]] o que somos e só podemos [[ser]] o que temos. Portanto, não há uma incompatibilidade [[entre]] [[ter]] e [[ser]]. Entra aí uma terceira [[dimensão]] nesse [[jogo]] dialético [[entre]] [[ter]] e [[ser]], e [[ser]] e [[ter]]: o [[desprendimento]], a [[renúncia]], porque a [[renúncia]] não tira, dá. Nesse [[jogo]] [[dialético]] se torna também claro o [[jogo]] [[entre]] [[identidade]] e [[diferença]]. A [[identidade]] nos remete para o [[horizonte]] do [[fundar]], do [[ser]], do [[nada]]. Já a [[diferença]] nos mostra em que consiste o [[próprio]], (ter), que só o [[nada]], (ser), pode [[fundar]]. Enfim, toda [[aprendizagem]] é um [[desaprender]]. | + | : Isso é [[enigmático]] porque devemos [[aprender]] para [[desaprender]], [[ter]] para [[renunciar]], porque só renunciando chegamos a [[ser]] o que temos, porque só podemos [[ter]] o que somos e só podemos [[ser]] o que temos, que nos foi doado. Nosso [[ser]] é [[doação]]. Portanto, não há uma incompatibilidade [[entre]] [[ter]] e [[ser]]. Entra aí uma terceira [[dimensão]] nesse [[jogo]] dialético [[entre]] [[ter]] e [[ser]], e [[ser]] e [[ter]]: o [[desprendimento]], a [[renúncia]], porque a [[renúncia]] não tira, dá. Nesse [[jogo]] [[dialético]] se torna também claro o [[jogo]] [[entre]] [[identidade]] e [[diferença]]. A [[identidade]] nos remete para o [[horizonte]] do [[fundar]], do [[ser]], do [[nada]]. Já a [[diferença]] nos mostra em que consiste o [[próprio]], (ter), que só o [[nada]], (ser), pode [[fundar]]. Enfim, toda [[aprendizagem]] é um [[desaprender]]. |
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- | [[Existir]] é [[habitar]] no sentido de | + | : [[Existir]] é [[habitar]] no sentido de ter-se, no sentido de apossar-se do que recebemos para [[ser]], pois nosso [[ser]] é uma [[doação]]. Não [[ter]] algo externo a nós, mas o [[ter]] que se tem porque nos foi dado: o [[próprio]]. [[Habitar]] enquanto [[ter]] é apropriar-se do que é [[próprio]]: o [[ser]]. Então o [[ter]] deve ser pensado no [[horizonte]] em que Emmanuel Carneiro Leão o pensa no [[ensaio]] "Uma leitura órfica de uma [[sentença]] grega" (1). |
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- | : (1) In: ''Aprendendo a pensar II | + | : (1) In: '''[[Aprendendo]] a [[pensar]] II. Petrópolis: Vozes, 1992.''' |
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+ | : "[[Ter]] pode [[significar]]: o acrescentar e acumular de fora o que nos é oferecido para [[consumo]]. Porém, [[ter]] pode [[significar]] outra coisa, mas que não pode ser vendida nem comprada nem agregada nem somada: O [[ter]] que se [[é]]. É um apossar-se que nos afeta e enche de [[afetos]]: é o apossar-se amoroso do que nos foi [[dado]] para posse, onde tal possuir só é [[ter]] se nos apossamos do que nos foi [[doado]] para [[sermos]]. E o que já desde sempre nos foi [[doado]]? O que nos é [[próprio]], do qual nos devemos [[apropriar]] para [[ser]]. Um tal [[apropriar]] se dá na [[apropriação]] como manifestação e [[realização]] do que [[essencial]] e já desde [[sempre]] nos pertence: o [[ser]] que nos é [[próprio]]. [[Ter]], então, é tomar posse do que nos é [[próprio]]" (1). | ||
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+ | : (1) CASTRO, Manuel Antônio.''' "As três [[pragas]] do século XXI". In: Confraria - 2 anos. Rio de Janeiro: Confraria do Vento, 2007, p. 17.''' |
Edição atual tal como 22h21min de 10 de março de 2025
1
- "Ter e ser não são opostos, porque só podemos ter o que somos e só podemos ser o que temos" (1).
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Interdisciplinaridade poética: o entre". In: Revista Tempo Brasileiro. Rio de Janeiro: número 164, jan.-mar. 2006, p. 24.
2
- "Alberto Caieiro, o poeta-pensador, já o disse poeticamente:
- : Mas isto (tristes de nós que trazemos a alma vestida!),
- : Isso exige um estudo profundo,
- : Uma aprendizagem de desaprender . (Poema XXIV)
- : Procuro despir-me do que aprendi,:
- : Procuro esquecer-me do modo de lembrar que me ensinaram,
- : E raspar a tinta com que me pintaram os sentidos ... (Poema XLVI)" (1)
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- Isso é enigmático porque devemos aprender para desaprender, ter para renunciar, porque só renunciando chegamos a ser o que temos, porque só podemos ter o que somos e só podemos ser o que temos, que nos foi doado. Nosso ser é doação. Portanto, não há uma incompatibilidade entre ter e ser. Entra aí uma terceira dimensão nesse jogo dialético entre ter e ser, e ser e ter: o desprendimento, a renúncia, porque a renúncia não tira, dá. Nesse jogo dialético se torna também claro o jogo entre identidade e diferença. A identidade nos remete para o horizonte do fundar, do ser, do nada. Já a diferença nos mostra em que consiste o próprio, (ter), que só o nada, (ser), pode fundar. Enfim, toda aprendizagem é um desaprender.
- Referência:
- (1) PESSOA, Fernando. Alberto Caeiro. S. Paulo: Cia. das Letras, 2004, p. 60, 84.
3
- Existir é habitar no sentido de ter-se, no sentido de apossar-se do que recebemos para ser, pois nosso ser é uma doação. Não ter algo externo a nós, mas o ter que se tem porque nos foi dado: o próprio. Habitar enquanto ter é apropriar-se do que é próprio: o ser. Então o ter deve ser pensado no horizonte em que Emmanuel Carneiro Leão o pensa no ensaio "Uma leitura órfica de uma sentença grega" (1).
- Referência:
- (1) In: Aprendendo a pensar II. Petrópolis: Vozes, 1992.
4
- "Ter pode significar: o acrescentar e acumular de fora o que nos é oferecido para consumo. Porém, ter pode significar outra coisa, mas que não pode ser vendida nem comprada nem agregada nem somada: O ter que se é. É um apossar-se que nos afeta e enche de afetos: é o apossar-se amoroso do que nos foi dado para posse, onde tal possuir só é ter se nos apossamos do que nos foi doado para sermos. E o que já desde sempre nos foi doado? O que nos é próprio, do qual nos devemos apropriar para ser. Um tal apropriar se dá na apropriação como manifestação e realização do que essencial e já desde sempre nos pertence: o ser que nos é próprio. Ter, então, é tomar posse do que nos é próprio" (1).
- Referência:
- (1) CASTRO, Manuel Antônio. "As três pragas do século XXI". In: Confraria - 2 anos. Rio de Janeiro: Confraria do Vento, 2007, p. 17.