Hermenêutica

De Dicionrio de Potica e Pensamento

(Diferença entre revisões)
Linha 1: Linha 1:
__NOTOC__
__NOTOC__
== 1 ==
== 1 ==
-
:Diz Carneiro Leão sobre a hermenêutica originária: "Por isso se impõe sobretudo questionar o próprio poder da ciência em sua impotência de pensar. É o que nos proporciona uma hermenêutica originária. O verbo ''hermenéuein'' significa trazer mensagens. O ''hermeneus'', o mensageiro, pode ser posto em referência com Hermes, o mensageiro dos deuses. Ele traz e transmite a mensagem do [[destino]] que trama as vicissitudes da [[história]] de homens e deuses. Nem toda [[interpretação]] é uma hermenêutica (originária). Somente a que descer até o vigor do [[mistério]] que estrutura a história". (1) "O propósito desta hermenêutica não é corrigir ou substituir-se à ciência. Nem mesmo é o diálogo pelo diálogo, mas exclusivamente o que no diálogo se faz linguagem: a identidade que misteriosamente reivindica de modo diferente, a nós modernos e aos gregos antigos, por ter aviado a aurora do pensamento no dia do Ocidente" (2).  
+
:Diz Carneiro Leão sobre a hermenêutica originária: "Por isso se impõe sobretudo questionar o próprio poder da ciência em sua impotência de pensar. É o que nos proporciona uma hermenêutica originária. O verbo ''hermenéuein'' significa trazer mensagens. O ''hermeneus'', o mensageiro, pode ser posto em referência com Hermes, o mensageiro dos deuses. Ele traz e transmite a mensagem do [[destino]] que trama as vicissitudes da [[história]] de homens e deuses. Nem toda [[interpretação]] é uma hermenêutica (originária). Somente a que descer até o vigor do [[mistério]] que estrutura a história" (1). "O propósito desta hermenêutica não é corrigir ou substituir-se à ciência. Nem mesmo é o diálogo pelo diálogo, mas exclusivamente o que no diálogo se faz [[linguagem]]: a identidade que misteriosamente reivindica de modo diferente, a nós modernos e aos gregos antigos, por ter aviado a aurora do pensamento no dia do Ocidente" (2).  
Linha 13: Linha 13:
-
==2==
+
== 2 ==
-
:Ronaldes de Melo e Souza distingue muito bem uma hermenêutica [[ontologia | ontológica]] de uma hermenêutica metodológica ao comentar a hermenêutica filosófica de Gadamer através de algumas oposições esclarecedoras: 1) [[Verdade]] x [[método]], 2) Ontologia x metodologia, 3) Hermenêutica x epistemologia. Ele faz aparecer a hermenêutica ontológica na medida em que a vai contrapondo à epistemologia. Outra faceta que vai aparecer é a ligação da hermenêutica ontológica com a [[ética]]. Essa dimensão é sutil porque a ética não é algo ao lado da hermenêutica ontológica, mas seu traço mais fundamental. Isso se pode compreender na afirmação de Ronaldes: "compreender é compreender-se" (1). A hermenêutica epistemológica se decide no ato de interpretar. Essa pode se abrir para a ontologia da compreensão ou pode simplesmente ficar numa epistemologia da interpretação.  
+
:Ronaldes de Melo e Souza distingue muito bem uma hermenêutica [[ontologia|ontológica]] de uma hermenêutica metodológica ao comentar a hermenêutica filosófica de Gadamer através de algumas oposições esclarecedoras: 1) [[Verdade]] x [[método]], 2) Ontologia x metodologia, 3) Hermenêutica x [[epistemologia]]. Ele faz aparecer a hermenêutica ontológica na medida em que a vai contrapondo à epistemologia. Outra faceta que vai aparecer é a ligação da hermenêutica ontológica com a [[ética]]. Essa dimensão é sutil porque a ética não é algo ao lado da hermenêutica ontológica, mas seu traço mais fundamental. Isso se pode compreender na afirmação de Souza: "compreender é compreender-se" (1). A hermenêutica epistemológica se decide no ato de interpretar. Essa pode se abrir para a ontologia da compreensão ou pode simplesmente ficar numa epistemologia da interpretação.  
Linha 22: Linha 22:
:Referência:
:Referência:
-
:(1) SOUZA, Ronaldes de Melo e. "A ética concriativa de Gadamer". In: ''Revista Tempo Brasileiro'', Rio de Janeiro, 94, jul.-set., 1988, pp. 69-86.  
+
:(1) SOUZA, Ronaldes de Melo e. "A ética concriativa de Gadamer". In: ''Revista Tempo Brasileiro'', nº 94. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1988, pp. 69-86.  
-
:'''Ver também:'''
+
== 3 ==
-
 
+
:"À articulação em que se dá a compreensão dessa mútua e inseparável relação de ser e homem pela existência chamamos hermenêutica. Como compreensão da [[existência]], a hermenêutica articula o [[sentido]] do ser, considera-o em toda sua [[ambiguidade]] e não lhe impõe resistências que não sejam dele mesmo advindas!" (1). "Não há, pois, na hermenêutica qualquer característica de intencionalidade, uma vez que ela não é fruto da consciência subjetiva, mas se encontra numa dimensão de pré-compreensão do próprio ''Dasein'', que nós mesmos somos" (2).
-
:*[[epistemologia]]
+
:Hermes, ao transcender os domínios do [[caos]] e do [[cosmos]] reúne-os como linguagem do sentido e do não-sentido. "Hermes é o nome divino para a instalação do domínio do mistério em meio à vida ensolarada do cotidiano" (3).
-
 
+
-
 
+
-
==3==
+
-
:"À articulação em que se dá a compreensão dessa mútua e inseparável relação de ser e homem pela existência chamamos hermenêutica. Como compreensão da [[existência]], a hermenêutica articula o sentido do ser, considera-o em toda sua [[ambigüidade]] e não lhe impõe resistências que não sejam dele mesmo advindas!" (1) "Não há, pois, na hermenêutica qualquer característica de intencionalidade, uma vez que ela não é fruto da consciência subjetiva, mas se encontra numa dimensão de pré-compreensão do próprio Dasein, que nós mesmos somos." (2)
+
-
:Hermes, ao ''transcender'' os domínios do [[caos]] e do [[cosmos]] reúne-os como linguagem do sentido e do não-sentido. "Hermes é o nome divino para a instalação do domínio do mistério em meio à vida ensolarada do cotidiano." (3)
+
Linha 43: Linha 38:
:(2) Idem, p. 5  
:(2) Idem, p. 5  
:(3) Idem, p. 10.  
:(3) Idem, p. 10.  
-
 
-
 
-
:'''Ver também:'''
 
-
 
-
:*[[sentido]]
 
== 4 ==
== 4 ==
-
:À articulação em que se dá a compreensão da referência de ser e homem, enquanto linguagem como existência, se dá o nome de hermenêutica. Pensar hermenêutica é pensar Hermes ou a linguagem como lugar. Interpretar é sempre o horizonte de articulação de ser e existência enquanto linguagem ético-poética, onde a compreensão enquanto sentido implica o ''éthos'' de ser. Por isso, interpretar é [[interpretar-se]] a partir da medida de todas as dimensões e medidas: o ser/nada ou o real ambíguo de toda realidade como realização. Enquanto ''éthos'', o ser advém sempre como ''lógos'', daí interpretar no sentido hermenêutico é exercitar uma escuta dialogal. Hermenêutica poético-ontológica é sempre diálogo de escuta do ''lógos''.
+
:À articulação em que se dá a compreensão da referência de ser e homem, enquanto linguagem como existência, se dá o nome de hermenêutica. Pensar hermenêutica é pensar Hermes ou a linguagem como lugar. [[Interpretar]] é sempre o [[horizonte]] de articulação de ser e existência enquanto linguagem ético-poética, onde a compreensão enquanto sentido implica o ''éthos'' de ser. Por isso, interpretar é interpretar-se a partir da medida de todas as dimensões e medidas: o ser/nada ou o real ambíguo de toda realidade como realização. Enquanto ''éthos'', o ser advém sempre como ''lógos'', daí interpretar no sentido hermenêutico é exercitar uma escuta dialogal. Hermenêutica poético-ontológica é sempre diálogo de escuta do ''lógos''.
Linha 57: Linha 47:
-
==Ver também==
+
:'''Ver também:'''
-
*[[intencionalidade]]
+
 
 +
*[[Intencionalidade]]

Edição de 15h38min de 21 de março de 2009

1

Diz Carneiro Leão sobre a hermenêutica originária: "Por isso se impõe sobretudo questionar o próprio poder da ciência em sua impotência de pensar. É o que nos proporciona uma hermenêutica originária. O verbo hermenéuein significa trazer mensagens. O hermeneus, o mensageiro, pode ser posto em referência com Hermes, o mensageiro dos deuses. Ele traz e transmite a mensagem do destino que trama as vicissitudes da história de homens e deuses. Nem toda interpretação é uma hermenêutica (originária). Somente a que descer até o vigor do mistério que estrutura a história" (1). "O propósito desta hermenêutica não é corrigir ou substituir-se à ciência. Nem mesmo é o diálogo pelo diálogo, mas exclusivamente o que no diálogo se faz linguagem: a identidade que misteriosamente reivindica de modo diferente, a nós modernos e aos gregos antigos, por ter aviado a aurora do pensamento no dia do Ocidente" (2).


- Manuel Antônio de Castro


Referências:
(1) LEÃO, Emmanuel Carneiro. Os pensadores originários. Petrópolis: Vozes, 1991, p. 15.
(2) Idem, p. 16.


2

Ronaldes de Melo e Souza distingue muito bem uma hermenêutica ontológica de uma hermenêutica metodológica ao comentar a hermenêutica filosófica de Gadamer através de algumas oposições esclarecedoras: 1) Verdade x método, 2) Ontologia x metodologia, 3) Hermenêutica x epistemologia. Ele faz aparecer a hermenêutica ontológica na medida em que a vai contrapondo à epistemologia. Outra faceta que vai aparecer é a ligação da hermenêutica ontológica com a ética. Essa dimensão é sutil porque a ética não é algo ao lado da hermenêutica ontológica, mas seu traço mais fundamental. Isso se pode compreender na afirmação de Souza: "compreender é compreender-se" (1). A hermenêutica epistemológica se decide no ato de interpretar. Essa pode se abrir para a ontologia da compreensão ou pode simplesmente ficar numa epistemologia da interpretação.


- Manuel Antônio de Castro


Referência:
(1) SOUZA, Ronaldes de Melo e. "A ética concriativa de Gadamer". In: Revista Tempo Brasileiro, nº 94. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1988, pp. 69-86.


3

"À articulação em que se dá a compreensão dessa mútua e inseparável relação de ser e homem pela existência chamamos hermenêutica. Como compreensão da existência, a hermenêutica articula o sentido do ser, considera-o em toda sua ambiguidade e não lhe impõe resistências que não sejam dele mesmo advindas!" (1). "Não há, pois, na hermenêutica qualquer característica de intencionalidade, uma vez que ela não é fruto da consciência subjetiva, mas se encontra numa dimensão de pré-compreensão do próprio Dasein, que nós mesmos somos" (2).
Hermes, ao transcender os domínios do caos e do cosmos reúne-os como linguagem do sentido e do não-sentido. "Hermes é o nome divino para a instalação do domínio do mistério em meio à vida ensolarada do cotidiano" (3).


- Manuel Antônio de Castro


Referências:
(1) AGUIAR, Werner. Música: poética do sentido. Tese de Doutorado. Faculdade de Letras da UFRJ. Pós-Graduação em Ciência da Literatura. Área de Poética, 2004, p. 117.
(2) Idem, p. 5
(3) Idem, p. 10.


4

À articulação em que se dá a compreensão da referência de ser e homem, enquanto linguagem como existência, se dá o nome de hermenêutica. Pensar hermenêutica é pensar Hermes ou a linguagem como lugar. Interpretar é sempre o horizonte de articulação de ser e existência enquanto linguagem ético-poética, onde a compreensão enquanto sentido implica o éthos de ser. Por isso, interpretar é interpretar-se a partir da medida de todas as dimensões e medidas: o ser/nada ou o real ambíguo de toda realidade como realização. Enquanto éthos, o ser advém sempre como lógos, daí interpretar no sentido hermenêutico é exercitar uma escuta dialogal. Hermenêutica poético-ontológica é sempre diálogo de escuta do lógos.


- Manuel Antônio de Castro


Ver também:
Ferramentas pessoais