Representação

De Dicionrio de Potica e Pensamento

(Diferença entre revisões)
Linha 121: Linha 121:
:(2) HEIDEGGER, Martin. "A coisa". In: ''Ensaios e conferências''. Petrópolis, Vozes, 2002.
:(2) HEIDEGGER, Martin. "A coisa". In: ''Ensaios e conferências''. Petrópolis, Vozes, 2002.
 +
 +
 +
== 17 ==
 +
:É um conceito complexo. Mas para além das relações internas ou externas, há aí todo um problema epistemológico e ontológico. Por isso, Heidegger viu perfeitamente que está ligado à questão da [[verdade]], no mito da caverna. É que este é a expressão vigorosa e essencial da questão. Todo o mito da caverna trata da questão do real e da sua representação. Também é importante aí a questão da luz. Esta pode ser vista em relação ao externo, ao interno e ao transcendente, daí a questão da luz estar ligada à razão. Mas como já Platão o indica, o sol, fonte de toda luz, é o que não pode ser visto. No fundo, a questão da representação é também a questão da verdade. Como pensador, Platão pensa a questão do que permanece no fluxo das mudanças, no parecer e aparecer. A sua marca de pensador está na criação original do "eidos". Mas o que no todo de seu pensamento quer dizer, é a grande questão. Muitas foram as leituras no decorrer do percurso do Ocidente. Isso apenas mostra o quanto o seu pensamento é fundamental.

Edição de 19h25min de 30 de Dezembro de 2008

Tabela de conteúdo

Coisa

O conceito de representação tem muitos aspectos, mas um se torna fundamental com o advento da ciência: "O que a ciência faz ao tornar o cântaro com vinho por uma cavidade com líquido não é propriamente falso, é apenas exato. Mas, com isso, falamos do ser da coisa cântaro? Do ponto de vista da experiência originária da coisa, uma cavidade com líquido nunca é um cântaro com vinho. Nesse sentido, o saber representativo, ao invés de mostrar a coisa, acaba por escondê-la e anulá-la." (1)


Referência:
(1) MICHELAZZO, José Carlos. Do um como princípio ao dois como unidade. S. Paulo: Annablume, 1999, pp. 184-5.


Objeto

Este é um dos conceitos mais difíceis quanto ao vigor da representação ou à sua proveniência. Martin Heidegger dá uma visão que radica no destinar-se; "E somente o que já se destinou a uma representação objetivante torna acessível, como objeto, o histórico da historiografia, isto é, de uma ciência." (1)


Referência:
(1) HEIDEGGER, Martin. "A questão da técnica". In: Ensaios e conferências. Petrópolis, Vozes, 2002, p. 27.



Arte

Ernesto Grassi(1) trata a arte como representação, a partir do conceito aristotélico de mimesis. E não se detém na questão filosófica de Aristóteles. Mas quando chega na questão de relacionar arte/mundo surge a questão histórica da interpretação da obra a partir do seu mundo. E aí questiona a validade do conceito de representação. Então utiliza o conceito de representação em mais de um sentido. E problematiza mais a imagem como representação quando examina a arte gótica, onde a imagem não representa: "... não é cópia ou reprodução ou retrato - é algo em si. A imagem é algo de próprio em substância e significado, em aparência e aspecto," (2) Ou seja, cai o conceito de representação. Daí: "Todavia, a espiritualização ocidental de tudo quanto é humano, levada a efeito e atestada pela arte gótica, remonta a um novo mito universal que alicercou uma nova representação do homem: a doutrina cristã." (3) Quando não se enfrenta a representação do ponto de vista filosófico gera-se esse impasse. O uso da palavra representação gera contradições.


Referência:
(1) GRASSI, Ernesto. Arte e Mito. Lisboa: Livros do Brasil, s/d, p. 178.
(2) Idem, p. 179.
(3) Idem, p. 179.


Papel epistemológico

Uma compreensão profunda da representação e do seu papel epistemológico, o que implica num duplo simulacro, está bem caracterizado na passagem de Ronaldes de Melo e Souza: "O confinamento das relações vitais se consuma na clausura do presente único da comparência, iludindo-se a presencialização da presença das coisas enquanto coisas ainda não destruídas pela representação desintegradora da subjetividade." (1) É necessário ver o restante do parágrafo porque é muito esclarecedor.


Referência:
(1) SOUZA, Ronaldes de Melo e. In: Revista Tempo Brasileiro. Rio: 94, jul.-set., 1988, p. 72.


Ensaios e conferências

Cf. HEIDEGGER, Martin. Ensaios e conferências. Petrópolis: Vozes, 2002, pp. 48, 52, 53, 54, 55.


Heráclito

Cf. HEIDEGGER, Martin. Heráclito. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 1998, p. 129.


Chemins

Cf. HEIDEGGER, Martin. Chemins. Paris: Gallimard, 1962, p. 53.



A origem da obra de arte

Cf. HEIDEGGER, Martin. A origem da obra de arte. Trad. Manuel Antônio de Castro e Idalina Azevedo da Silva. Acessível para uso acadêmico em: Travessia Poética. Parágrafo: 148.

A essência do fundamento

Cf. HEIDEGGER, Martin. A essência do fundamento. Lisboa: Edições 70, 1988, p. 23. Aí faz a relação com Ser e tempo e com a clareira enquanto verdade.



Dissimulação

A questão da representação é complexa quando vista não apenas do ponto de vista racional mas também ético. Nesse sentido, Luiz Guilherme Merquior(1) faz uma observação importante em seu livro Saudades do carnaval. Na relação natureza/razão há a questão da dissimulação. Ver esta questão.
Referência:
(1) MERQUIOR, Luiz Guilherme. Saudades do carnaval. Rio de Janeiro: Forense, 1972, p. 124.



Razão

A representação provém da interpretação metafísica e moderna do real, através da razão. Essa concepção da razão está bem expicada nA representação provém da interpretação metafísica e moderna do real, através da razão. Essa concepção da razão está bem expicada no livro de Bárbara Freitag A teoria crítica ontem e hoje (1).Mas também a dialética é metafísica. Ver, por isso, também o item a partir da p. 34. Nesse tópico discute a razão e é fundamental para a compreensão da razão na modernidade. Também entra aí o dado da compreensão que surge com as ciências históricas.


Referência:
(1) FREITAG, Bárbara. A teoria crítica ontem e hoje. São Paulo: Brasiliense, 1986, segundo momento, p. 43.



Simulacro

A representação é uma questão, porém foi reduzida a um conceito. É que, na realidade, não há ontologicamente "representação". Há mimesis. E esta, sem ser pensada seu vigor como questão, é que deu origem ao reducionismo dela à representação. Se penso que posso representar uma casa, um homem, uma mulher e tantas e tantas outras "coisas" em nomes, não é verdade. O nome não dá, recebe. Por isso, a palavra é o jogar ambíguo do "entre" (pará-ballo). Para entender o alcance da representação em seu valor de verdade, basta notar que a representação, no que ela tem de representação, já nos diz de algo aparente, falso, simulacro. Isto quer dizer, por exemplo, que o amor, se é amor, não pode ser representação. A justiça, se é justiça, não pode ser representação. E assim por diante. Que representação há na dança? Na música? O que um templo representa? A representação não diz diretamente respeito à "coisa", mas aos conceitos de "coisa" e, por isso, ela se inscreve na tensão entre verdadeiro e falso. Ocorre que para além destes dois conceitos existe a "coisa" e sua manifestação e ocultamento. Desta tensão é que provém essa estranha sensação de que em muitos "casos" a "coisa" nos advém "como" representação". A representação está ligada ao signo. Porém, este já diz respeito à linguagem entendida e reduzida a um instrumento e à "coisa" como objeto.


Linguagem

A questão da linguagem enquanto representação, que começa como homoiosis (semelhança, da qual surge o conceito de verdade por adequação), ou seja, como instrumento representacional, se exacerba na pós-modernidade. De mediação entre a "coisa" e o conceito, ela se torna cada vez mais autônoma e passando a ser não só um instrumento de representação, em função da coisa transformada em instrumento, ela mesma substitui a coisa e passa a ser o "real". A representação vale pelo real, um real intrumental, onde o principal instrumento é a própria linguagem. Esse é o real da pós-modernidade: o real como representação e simulacro, o real como "real virtual" e não mais o virtual do real. A esse real virtual como representação corresponde a redução da "coisa" à instrumentalização do conceito. O conceito sem a questão torna-se o real instrumental, apreendido e compreendido na redução do real à sociedade do conhecimento em rede. O início disso está na modernidade, construída a partir do predomínio da "razão instrumental". Esta se expande de tal maneira que transforma a Mãe Terra em recursos naturais e os seres humanos em recursos humanos. Recurso é aí a disposição das "coisas" para serem instrumentos em-si e em instrumentos para fazer instrumentos. É o que Heidegger chama Ge-stell. É o que Heidegger trata como essência da técnica em "A questão da técnica"(1). Porém, é importante perceber que isso se dispõe no próprio programa e sistema educativo: é um saber representativo-instrumental. Só a arte resiste. Mas que arte?


Referência:
(1) HEIDEGGER, Martin. "A questão da técnica". In: Ensaios e conferências. Petrópolis: Vozes, 2002.


14

A questão da representação ganha uma clareza, no seu encaminhamento metafísico-carteseano, muito evidente naquilo que hoje se torna tão evidente: a virtualização. O virtual é a manifestação de uma ausência. Nesse sentido, em virtude da "virtualização", termos tradicionais como "real", "virtual", "atual" e "potencial" ganham novos sentidos. Toda ciência é representação. O nó da representação está no fato de que ela pressupõe que há a apreensão de um real gerado a partir de um anterior. Ocorre que a existência do real é que é o problema. O que é o real para que dele se possa fazer uma representação? Por isso, a representação só se dá em cima de uma idéia de real. E isto é metafísica.


15

Há uma tendência a ver na relação com a cidade um mimetismo de representação. O termo representação é muito limitado. Visto pela ótica da memória/fluxo de tempo/realidade/o-que-fica, não há representação, mas a apropriação pela memória poética, como transfiguração, do que flui e acontece e fica enquanto imagem poética (ou não será arte, poiesis), não como cópia, mas como transfiguração e manifestação de mundo/cidade/sentido/verdade. Mas quer-se insistir na representação, esta, talvez, indique muito mais a falta do que disse antes. Daí a solidão, a predominância de vivências em vez de experienciações e junto com as vivências uma forte estetização de tudo, até da morte e da dor, daí a sensação de um presente em contínuo fazer-se, sem passado (de certo modo também memória) e sem futuro (não pregnância da morte).


16

Sem dúvida, a representação é uma dimensão básica para a construção da realidade e do homem. Mas o que entender por representação? Ela gira basicamente em torno da construção de uma determinada realidade e do homem, na medida em que toda representação implica uma construção do espaço e do tempo. É nesse sentido que deve ser pensada a proximidade e a distância. Stuart Hall faz observações importantes sobre a relação espaço e tempo e representação: "O que importa para nosso argumento quanto ao impacto da globalização sobre a identidade é que o tempo e o espaço são também as coordenadas básicas de todos os sistemas de representação..." Hall, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Rio, DP&A, 2001, p. 70. Seria necessário confrontar estas afirmações com o que desenvolve Martin Heidegger no início do ensaio "A coisa". In: Ensaios e conferências. Petrópolis, Vozes, 2002. Enquanto Hall pensa em contexto de espaço e tempo, Heidegger pensa a clareira como lugar.


Referências:
(1) HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Rio, DP&A, 2001, p. 70.
(2) HEIDEGGER, Martin. "A coisa". In: Ensaios e conferências. Petrópolis, Vozes, 2002.


17

É um conceito complexo. Mas para além das relações internas ou externas, há aí todo um problema epistemológico e ontológico. Por isso, Heidegger viu perfeitamente que está ligado à questão da verdade, no mito da caverna. É que este é a expressão vigorosa e essencial da questão. Todo o mito da caverna trata da questão do real e da sua representação. Também é importante aí a questão da luz. Esta pode ser vista em relação ao externo, ao interno e ao transcendente, daí a questão da luz estar ligada à razão. Mas como já Platão o indica, o sol, fonte de toda luz, é o que não pode ser visto. No fundo, a questão da representação é também a questão da verdade. Como pensador, Platão pensa a questão do que permanece no fluxo das mudanças, no parecer e aparecer. A sua marca de pensador está na criação original do "eidos". Mas o que no todo de seu pensamento quer dizer, é a grande questão. Muitas foram as leituras no decorrer do percurso do Ocidente. Isso apenas mostra o quanto o seu pensamento é fundamental.