Não-verdade

De Dicionrio de Potica e Pensamento

Tabela de conteúdo

1

A tese central de Heidegger em A origem da obra de arte (1) é a de que arte é verdade e a obra é a verdade operando. Mas então o que Heidegger entende por verdade é a realidade eclodindo, desvelando-se na disputa com o velar-se. Por isso, à verdade corresponderá a não-verdade. Esta não pode ser definida logicamente a partir de um modelo ideal ou de uma ideia geral, mas deve corresponder ao acontecer da realidade. E seu acontecer é sempre na tensão de não-verdade e verdade, inseparáveis. Então verdade enquanto desvelamento é a realidade se dando como presença. E a não-verdade enquanto velamento é a realidade acontecendo como ausência. E presença é sempre corpo denso e inteiro, tendendo à plenitude, à esfericidade. E isso é o ser humano: corpo-presença entre-sendo, na dobra de verdade e não-verdade, presença e ausência. É o vigorar do nada criativo.


- Manuel Antônio de Castro
Referência:
(1) Cf. HEIDEGGER, Martin. A Origem da obra de arte. Trad. Idalina Azevedo da Silva e Manuel Antônio de Castro. São Paulo: Edições 70 / Almedina-Brasil, 2010.

2

"Uma percepção me veio, ó Govinda, que talvez se te afigure novamente como uma brincadeira ou uma bobagem. Reza ela: O oposto de cada verdade é igualmente verdade" (1). O oposto da verdade é a não-verdade e não o erro. Toda verdade já vigora originariamente na não-verdade.


- Manuel Antônio de Castro.
Referência:
(1) HESSE, Hermann. Sidarta. Trad. Herbert Caro. Rio de Janeiro: O Globo, 2003, p. 117.
Ver também
*Alétheia

3

"Não podemos julgar a verdade e não-verdade por um critério prévio de verdade, seja da ou dos paradigmas da representação racional. Se assim for, estaremos agindo de acordo com fatos prévios e não estaremos deixando vigorar o agir, o agir-ser. Ele sempre se na dobra de não-verdade e verdade, e só no agir é que podemos distinguir e julgar (krinein, verbo grego, quer dizer criticar distinguindo, discernindo) o alcance da errância como verdade e não-verdade. Errância não é erro (este tem seu critério de julgamento numa representação)" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. "Liberdade, vontade e uso de drogas". In: ----. Arte: o humano e o destino. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2011, p. 276.

4

"Ser sábio é o ser humano responder e corresponder ao apelo do que ele é e sempre será como ser-in-augural. Um tal apelo se dá pela escuta da fala do silêncio e da experienciação do vigor da não-verdade" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio. "As três pragas do século XXI". In: Confraria - 2 anos. Rio de Janeiro: Confraria do Vento, 2007, p. 18.

5

"... todos reconhecem que nossa fala e conhecimento jamais podem dar conta do mistério em que estamos irremediavelmente mergulhados. O mistério tem voz e rosto: é o silêncio, é a sabedoria, é a não-verdade" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio. "As três pragas do século XXI". In: Confraria - 2 anos. Rio de Janeiro: Confraria do Vento, 2007, p. 19.

6

"A verdade para ter o poder operante em cada sistema e não se esgotar em cada um deles só pode ser a não-verdade. Assim como o Deus que concede realidade à legitimidade e veracidade de cada religião e funda cada e a de cada um só pode ser o Não-deus. Este, por ser “Não-”, é inominável como o silêncio e a sabedoria. A Ele só cabe o nome do não-conhecer, do não-nomear, do não-ver: mistério vivo e pulsante, nada e fonte de tudo.
Um tal mistério sempre adveio na não-verdade de todas as grandes obras poético-sagradas. Impulsionados pelo apelo inominável da não-verdade, todos os grandes poetas sempre responderam e corresponderam com suas obras – desajeitada e incompleta resposta – à manifestação concreta da poiesis como não-verdade. E nisso e por isso todas as grandes obras, sejam dos poetas, sejam dos que receberam o apelo de anúncio do mistério, proclamam a verdade da não-verdade" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio. "As três pragas do século XXI". In: Confraria - 2 anos. Rio de Janeiro: Confraria do Vento, 2007, p. 20.

7

"Ação e não-ação. O mito do homem acha seu sentido no mito do real na medida em que o mito do homem se liberta no e pelo mito do real para o sagrado do mito, ou seja, como a plenitude (hólos, em grego) da procura do agir como não-agir, não-ver, não-saber e não-verdade. É o que nos diz a imagem-questão de “furar” os olhos que Édipo faz ao final da tragédia. É um furo que leva a ver mais fundo: o essencial, o silêncio e o vazio. É um furo que, vazando, deixa saber e ver o não-ver e o não-saber. Isso é narrado dramática e poeticamente por Sófocles na tragédia Édipo em Colono" (1).


Referência:
(1) CASTRO, Manuel Antônio de. “Heidegger e as questões da arte”. In: Manuel Antônio de Castro, (org.). Arte em questão: as questões da arte. Rio de Janeiro: 7Letras, 2005, p. 25.
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